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DANYEL BEZERRA MENDES ANÁLISE DA INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 1.790 DO CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO NO DIREITO SUCESSÓRIO DO(A) COMPANHEIRO(A) Palmas - TO 2016 DANYEL BEZERRA MENDES ANÁLISE DA INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 1.790 DO CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO NO DIREITO SUCESSÓRIO DO(A) COMPANHEIRO(A) Trabalho de Curso em Direito apresentado como requisito parcial da disciplina de Trabalho de Curso em Direito II (TCD II) do Curso de Direito do Centro Universitário Luterano de Palmas – CEULP/ULBRA. Orientador: Prof. Msc. Vinícius Pinheiro Marques Palmas - TO 2016 Dedico este trabalho aos meus filhos Ivyna Mayra (12 anos) minha pepeta, e Samuel (2 anos) a meu pai Veríssimo e irmão Danylo meus melhores amigos e tia Jaqueline pela amizade e carinho, ainda a saudade de minha mãe Telma e irmã Neyla (in memorian). Agradeço a Deus, aos meus avós Valdir e Marinilva, e as minhas tias Neyde e Érica, meus tios, a todos pelo apoio e estímulo que possibilitou a minha formação e realização deste trabalho. Ao profº. Vinícius Pinheiro pela dedicação a execução desta. Ao prof. Marcelo Amaral e prof. Sinvaldo Neves pelas várias conversas e esclarecimentos. “Família, um sonho ter uma família, família um sonho de todo dia, família é quem você escolhe pra viver, família é quem você escolhe pra você, não precisa ter conta sanguínea, é preciso ter sempre, um pouco mais de sintonia.” (Banda: O Rappa) RESUMO A presente pesquisa está consubstanciada na finalidade de discutir em seu contexto argumentos após a análise da inconstitucionalidade do artigo 1.790 do Código Civil no direito sucessório do(a) companheiro(a). Tendo em vista a necessidade de debater esta temática da inconstitucionalidade do artigo 1790 do Código Civil vigente que resulta no fato de alguns juristas ainda não reconhecer o companheiro como herdeiro necessário, garantindo-lhe somente direito à concorrência sucessória quanto aos bens adquiridos na vigência da união e excluindo-o dos bens particulares. Em contrapartida, a Constituição Federal vigente, com o escopo de conferir proteção especial à família, reconheceu a união estável como entidade familiar, em posição de igualdade com o casamento. Tal diferenciação resultou em nítido desprestígio ao companheiro, cujos direitos sucessórios são gravemente violados. A relevância deste artigo volta-se para a defesa da incompatibilidade desse dispositivo com a Carta Magna, por representar afronta desse tratamento diferenciado dado ao companheiro em relação ao cônjuge, perante o ordenamento jurídico brasileiro, à luz das Leis: 8.971/94 e 9.278/96 e do Código Civil de 2002, analisar o seu regime jurídico na atualidade e, também, demonstrar juridicamente os direitos sucessórios do companheiro sobrevivente na obrigatoriedade do regime parcial de bens, a comunicabilidade dos bens particulares no casamento e também na união estável e indistintamente, tendo em vista as profundas alterações introduzidas no direito sucessório brasileiro nas últimas décadas, faz necessário que haja isonomia na forma originária da família. O Superior Tribunal de Justiça tem buscado discutir o assunto e encontrado divergências entre a 3ª e a 4ª Turmas, quando trata-se da (in)constitucionalidade do artigo 1.790 de lei infraconstitucional, que ainda não foi pacificado pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal. A partir do posicionamento da jurisprudência através de Acórdãos ou do Controle de Constitucionalidade, fazendo com que o artigo 1.790, seja revogado e adotado alterações no 1.829, ambos do Código Civil, A pesquisa foi realizada com apontamentos teórica conceitual doutrinária, projetos de lei, artigos de lei e jurisprudencial. Palavras-chave: União estável – Companheiro – Direito sucessório SUMÁRIO INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 9 1. A EVOLUÇÃO DO IDEAL DE FAMÍLIA NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO ......................................................................................................................... 11 1.1 A FAMÍLIA DECORRENTE DO CASAMENTO ........................................................ 12 1.1.1 Forma de constituição ........................................................................................... 13 1.1.2 Os tipos de regimes de bens .................................................................................. 14 1.1.3 Dissolução ............................................................................................................... 16 1.2 A FAMÍLIA DECORRENTE DA UNIÃO ESTÁVEL .................................................. 17 1.2.1 Forma de constituição ........................................................................................... 18 1.2.2 O tipo de regime de bens ....................................................................................... 19 1.2.3 Dissolução ............................................................................................................... 19 1.3 ARRANJOS DE FAMÍLIA ............................................................................................ 20 1.3.1 Monoparental ......................................................................................................... 20 1.3.2 Anaparental ............................................................................................................ 21 1.3.3 Pluriparental .......................................................................................................... 22 2 A EVOLUÇÃO DO DIREITO SUCESSÓRIO DO COMPANHEIRO NO BRASIL ... 35 2.1 CÓDIGO CIVIL DE 1916 .............................................................................................. 24 2.2 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 ........................................................................ 25 2.2.1 Princípio da Proteção da unidade familiar ......................................................... 27 2.2.2 Princípio da Função social da família .................................................................. 28 2.2.3 Princípio da Solidariedade familiar ..................................................................... 28 2.2.4 Princípio da Afetividade ........................................................................................ 29 2.2.5 Princípio da Igualdade ou Isonomia entre os Cônjuges e Companheiros ........ 30 2.2.6 Princípio da Não intervenção ou da Liberdade .................................................. 30 2.2.7 Princípio de Proteção à Dignidade da pessoa humana ...................................... 31 2.2.8 Princípio da Vedação ao Retrocesso social .......................................................... 32 2.3 LEI Nº 8.971/1994 – REGULA O DIREITO DO COMPANHEIRO A ALIMENTOS E À SUCESSÃO ...................................................................................................................... 32 2.4 LEI Nº 9.278/1996 – REGULA O § 3º DO ARTIGO 226 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL ............................................................................................................................ 34 2.5 CÓDIGO CIVIL 2002 .................................................................................................... 36 2.6 PRINCÍPIO DE SAISINE .............................................................................................. 42 2.7 PRINCÍPIO DA INDIVISIBILIDADE DA HERANÇA ............................................... 43 2.8 ESPÉCIES DE SUCESSÃO ..........................................................................................45 2.8.1 Legítima .................................................................................................................. 45 2.8.2 Testamentária ......................................................................................................... 47 3 DA ANÁLISE DA INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 1.790 DO CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO NO DIREITO SUCESSÓRIO DO(A) COMPANHEIRO(A) ...... 50 3.1 O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE ........................................................ 50 3.1.1 Repressivo ............................................................................................................... 51 3.1.2 Por ação .................................................................................................................. 51 3.1.3 Por vício material ................................................................................................... 52 3.1.4 Parcial ..................................................................................................................... 52 3.2 O POSICIONAMENTO DA JURISPRUDÊNCIA ........................................................ 53 3.2.1 Tribunal de Justiça ................................................................................................ 53 3.2.2 Superior Tribunal de Justiça ................................................................................ 56 3.2.3 Supremo Tribunal de Federal ............................................................................... 59 3.3 DOS ARGUMENTOS A CERCA DA INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 1.790 DO CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO NO DIREITO SUCESSÓRIO DO(A) COMPANHEIRO(A) ............................................................................................................ 61 CONCLUSÃO ......................................................................................................................... 67 REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 70 INTRODUÇÃO A presente pesquisa monográfica teve o intento de abordar o tema análise da inconstitucionalidade do artigo 1.790 do Código Civil Brasileiro no direito sucessório do(a) companheiro(a). Tendo em vista a importância do presente tema e objetivando apresentar conceitos e as mudanças na entidade familiar sempre de acordo com o que dispõem a Constituição Federal. Para a realização deste trabalho de conclusão do curso de direito busca-se enfocar os direitos sucessórios do companheiro descritos em seu artigo 1.790 do Código Civil Brasileiro. Comenta-se sobre a aplicabilidade da relação patrimonial, no que couber, o regime da Comunhão Parcial de Bens apontado no Artigo 1.725 do mesmo código, que assegura ao companheiro sobrevivente seus direitos na sucessão. Serão abordados relativos ao que tange o tema os bens particulares no direito sucessório, os direitos e garantias fundamentais, os direitos e deveres individuais e coletivos, os princípios constitucionais: Proteção da entidade familiar, Função social da família, Solidariedade familiar, Afetividade, Igualdade entre os cônjuges e companheiros, Não intervenção ou liberdade, Proteção à dignidade da pessoa humana e Vedação ao retrocesso social. O posicionamento dos tribunais e as divergências referidas ao tema. A visão dos doutrinadores em seus artigos, sites, revistas jurídicas e livros. A Análise se refere também a adequada preocupação no cenário jurídico com o futuro até hoje, incerto, estando em situação de desamparo à família originária da união estável no direito sucessório do companheiro em relação ao cônjuge sobrevivente, este casado no regime parcial de bens, na qual apresenta-se argumentos em que ficam evidenciados que não deveria haver entendimentos que limitem na forma da composição originária da família brasileira, em relação aos aspectos de contemplar e reconhecer este direito de suceder e configurar como herdeiro necessário, já que a Constituição Federal assevera em seu artigo 226, §3º que é uma entidade familiar a União Estável. O presente trabalho tem também como objetivo o estudo da consideração jurídica da inconstitucionalidade do artigo 1.790, e assim, informar a sociedade sobre esta análise verificando que o companheiro também faz jus configurar como herdeiro de bens particulares do autor da ação, evitando a que o Estado declare Jacente e por sua vez Vacante a herança do autor. Abordando ainda as situações em que os tribunais em cada caso estudado, ora consideram inconstitucional o artigo 1.790 e seus incisos. 10 Cumpre também a esta pesquisa esclarecer que o tema presente é um estudo em discussão, buscando um viés no debate quanto ao entendimento pacífico e a nível acadêmico. Este estudo foi dividido em quatro capítulos, onde se procura desconstruir os conceitos preestabelecidos no ideal de família diante do direito sucessório do cônjuge e do companheiro ao longo dos tempos iniciando-se, o primeiro capítulo, com um breve histórico de família, em seus conceitos doutrinários e formatados em lei, ainda sobre casamento e a união estável, sobre seus regimes e origens. O segundo capítulo foi direcionado para a estrutura descrita no código civil de 2002, do direito sucessório baseado nos princípios que regem a abertura da sucessão da saisine e o da indivisibilidade do patrimônio, ainda as espécies de transmissão da herança aos sucessores legítima e testamentária. No terceiro capítulo, passando pelo Código Civil de 1916 que mencionava a concubina, a mulher amante do homem casado, sem nenhum direito sucessório, também a Carta Magna de 1988 em seus princípios fundamentais, ainda pelas leis: 8.971/94 que regula o direito do companheiro a alimentos e à sucessão e a 9.278/96 que regula o Artigo 226, § 3º da Constituição Federal até o Código Civil de 2002. Para concluir, o quarto capítulo a abordagem é direcionada a análise do tema proposto, a partir do posicionamento da jurisprudência, através de Acórdãos que admitem a inconstitucionalidade do Artigo 1.790 do código Civil, incluindo-se um breve contexto a respeito do entendimento dos tribunais na tentativa de buscar compreender que somente deve prevalecer o direito da família e suas formas de serem constituídas ou originalizadas. A pesquisa foi realizada com base em referências bibliográficas com um estudo analítico, tomando como referência a literatura jurídica em sua maior abrangência, julgados dos tribunais e teses publicadas sobre o respectivo tema. Por fim, apresenta conclusões com um ponto de vista da problemática proposta como resultado da pesquisa e as referências bibliográficas, consultadas para a elaboração do presente trabalho. 1. A EVOLUÇÃO DO IDEAL DE FAMÍLIA NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO A família como é conhecida e aceita em nossa sociedade era aquela formada pelo papai, mamãe e filhos, onde qualquer outra forma espécie ou originária era reprimida. O advento da liberdade e da democracia trouxe consigo o reconhecimento de entidades familiares, antes excluídas diante do inconformismo social. Para iniciar essa esta pesquisa faz- se necessário conhecer os conceitos de família e sua origem. Entende-se que a família não é apenas uma instituição de origem biológica, mas, sobretudo, um organismo com nítidos caracteres culturais e sociais. Conforme a autora Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka, define família como “uma entidade histórica, ancestral como a história, interligada com os rumos e desvios da história ela mesma, mutável na exata medida em que mudam as estruturas e a arquitetura da própria história através dos tempos.” (HIRONAKA, 2004, p.3) Trata-se da sociedade, do seu núcleo inicial, básico e regular. É onde os pilares desta são assentados e valorizados de modo a garantir a adequada formação do indivíduo social. A família é uma realidade em nossa sociedade, pois constitui“o núcleo fundamental em que pousa toda a organização social” e ainda “o vocábulo família abrange todas as pessoas ligadas por vínculo de sangue e que procedem, portanto, de um tronco ancestral comum, bem como unidas pela afinidade e pela adoção. Compreende os cônjuges e companheiros, os parentes e os afins.” (Carlos Roberto Gonçalves, 2013. p.17) Conforme SILVEIRA (2012, p.63) apud ENGELS, em seu artigo acadêmico sobre a origem da família, da propriedade privada e do Estado a origem da família especialmente em relação à história antiga e das sociedades primitivas aconteceu segundo esta pesquisa com a necessidade do homem caracterizar os sistemas de parentesco e formas de matrimônio que levaram à formação da família. Quando o incesto se deu entre os grupos de homens e mulheres que se juntavam para compor a família marcou, então, como sendo um passo decisivo na organização da família propriamente dita. As famílias eram formadas a partir de grupos consanguíneos individualizados, segundo Claudia da Silveira: 12 A família consanguínea, que é expressão do primeiro progresso na constituição da família, na medida em que excluem os pais e os filhos de relações sexuais recíprocas, os grupos conjugais classificam-se por gerações, ou seja, irmãos e irmãs são, necessariamente, marido e mulher, revelando que a reprodução da família se dava através de relações carnais mútuas e endógenas. (SILVEIRA, 2012, p.65) Descrevia a família monogâmica, onde os filhos homem, apenas, herdariam os direitos do pai na administração e posse de seus bens, surgiu o desejo de transmitir essas riquezas por herança, aos filhos desse homem, simbolizando, na relação conjugal, a propriedade privada. Todas as manifestações de família ou arranjos de afeto são válidas e devendo ser socialmente compreendidos em torno do que já foi consagrado pela nossa Constituição de 1988. Conceitue assim, Maria Cláudia Crespo Brauner sobre a pluralidade de família: (...) com efeito, o reconhecimento da pluralidade de formas de constituição de família é uma realidade que tende a se expandir pelo amplo processo de transformação global, repercutindo na forma de tratamento das relações interindividuais. A reivindicação e o reconhecimento de direitos de igualdade, respeito à liberdade e à intimidade de homens e mulheres, assegura a toda pessoa o direito de constituir vínculos familiares e de manter relações afetivas, sem qualquer discriminação. (BRAUNER, 2004, p.259) A primazia de tratamento descrita na constituição de entidade familiar faz com que não se possa mais ignorar o reconhecimento e sua origem e evitar tratamento diferenciado na relação entre pessoas, pois sua história é inegável e aceitação por parte dos tribunais e da sociedade. A pluralidade de família e alguns conceitos doutrinários no âmbito jurídico de família modernizado e adequado as novas vertentes que surgiram e vieram colaborar com a constituição da construção de família. 1.1 A FAMÍLIA DECORRENTE DO CASAMENTO O casamento como instituição, por sua vez, tem sua origem em um sistema organizado em nossa sociedade, repleta de normas e regras a serem seguidas. Existe uma cerimônia nupcial, presença de testemunhas e presença de autoridade jurídica civil, a fim de tornar o ato legítimo e reconhecidamente social aceita. Sintetizando esse instituto, Sílvio de Salvo Venosa (2013, p.1), assevera que a família em um conceito amplo, “é o conjunto de pessoas unidas por vínculo jurídico de natureza 13 familiar”, em conceito restrito, “compreende somente o núcleo formado por pais e filhos que vivem sob o pátrio poder.” A partir da formação da família “estabelecida entre os componentes da entidade familiar em sociedade com a utilização do matrimônio ou a intenção de se constituí-la”, através de sua estruturação e perpetuação, em via de regra, “terem filhos a quem possam transmitir seu nome e patrimônio, fazendo nascer então em consequência inclusive como instrumento para reunião de patrimônios, como se fosse uma negociação financeira o direito de família”, assim comentam STOLZE E PAMPLONA (2013, p.113). O direito de família é entre todos os ramos do Código Civil, é aquele que está ligado mais intimamente à vida de cada pessoa no sentido de vínculos afetivos, consanguíneos, por e adoção e tomando o casamento como sacramento, a igreja que influenciou e lucrou com esse ato, durante muitos séculos, onde homens e mulheres estariam unidos pelo sagrado matrimônio religioso sobre as bênçãos de Deus. Dentre os vários conceitos na doutrina jurídica, assim preleciona Silvio de Salvo Venosa, sobre os estudos do direito de família: O direito de família estuda, em síntese as relações de pessoas das pessoas unidas pelo matrimônio, bem como daqueles que convivem em uniões sem casamento (...), e em sua modernidade apresenta como regra geral, uma definição restrita, considerando membros da família as pessoas unidas por relação conjugal ou de parentesco. (VENOSA, 2013, p.19) Esta lição visa a busca da ampliação do sentido estrutural conceitual de família oriunda da relação conjugal entre pessoas, como base dos pilares que sustentam o entendimento da entidade familiar moderna. 1.1.1 Forma de constituição A sociedade civil e o Código Civil exigem que seja formalizado o casamento entre pessoas oriundas de um relacionamento, que sigam o rito da solenidade nupcial. Nesse sentido, Paulo Luiz Netto Lôbo com habitual precisão destaca em seu conceito uma definição formal sobre o casamento e descreve que “o casamento é um ato jurídico negocial solene, público e complexo, mediante o qual um homem e uma mulher constituem família, pela livre manifestação de vontade e pelo reconhecimento de Estado.” (LÔBO, 2008, p. 76). 14 O autor demonstra que se deve encarar com seriedade e respeito o ato do casamento, e que todos devem ter, quando se menciona o casamento como constituição de família. As formas de casamento de acordo com STOLZE e PAMPLONA (2013, p.145) “a modalidade básica como: casamento civil e casamento religioso com efeitos civis e conversão de união estável em casamento e ainda as formas especiais de casamento como: por procuração, nuncupativo, em caso de moléstia grave e perante autoridade diplomática.” Neste sentido, STOLZE e PAMPLONA (2013, p.124) os autores apontam o Casamento Civil como sendo “aquele celebrado em cartório ainda nas dependências do cartório, na sala de audiência ou local previamente determinado de forma pública, a portas abertas durante todo o ato, perante autoridade oficial do Estado o Juiz de Direito ou Juiz de Paz podendo ainda estar presente os padrinhos, familiares e amigos.” A Carta Magna de 1988 prescreve em seu artigo 226, parágrafo 1º, sobre e a celebração do casamento, pois “O casamento é civil e gratuita a celebração.” A gratuidade da celebração é garantida pela Constituição Federal, facilitando o acesso de todos à formalidade do casamento. Para gerar efeitos jurídicos eficaz no direito sucessório ao cônjuge. 1.1.2 Os tipos de regimes de bens No Brasil a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, prescreve 5 (cinco) regimes de bens todos especificados no Código Civil. O regime de bens tem como objetivo determinar a maneira como a família administrará seus bens após o fim da união do casal pelo divórcio ou falecimento de um dos cônjuges ou companheiro. A lei brasileira mencionam os regimes: da comunhão universal, participação final nos aquestos, separação total, separação obrigatória de bens e comunhão parcial. Na comunhão universal de bens descrita no artigo 1.667 do Código Civil, menciona o interesse entre os cônjuges de informar que todos os bens adquiridos anteriormente e os bens futuros se comunicam, a seguir: Art. 1.667. O regime de comunhão universal importa a comunicação de todos os bens presentes e futurosdos cônjuges e suas dívidas passivas, com as exceções do artigo seguinte. (Art. 1.640) 15 Neste artigo a interpretação é de que todo o patrimônio adquirido individualmente por cada cônjuge fará parte do bem de família comum, tanto os bens atuais como aqueles que serão adquiridos pelo casal. Agora, na participação final dos aquestos disposto no artigo 1.672 do Código Civil de acordo com a divisão dos bens entre o casal: Art. 1.672. No regime de participação final nos aquestos, cada cônjuge possui patrimônio próprio, consoante disposto no artigo seguinte, e lhe cabe, à época da dissolução da sociedade conjugal, direito à metade dos bens adquiridos pelo casal, a título oneroso, na constância do casamento. A preservação dos bens particulares de cada cônjuge no casamento fazendo com que haja a individualização do patrimônio e a incomunicabilidade desses durante o casamento e até mesmo após o fim dele, onde a cônjuge sobrevivente a título oneroso compartilha metade daquilo que foi adquirido pelo casal salvo aquele bem individualizado e que não configura com bem do casal. O artigo 1.673 e no seu parágrafo único a menção da individualização e da incomunicabilidade dos bens particulares e dos adquiridos durante o casamento: Art. 1.673. Integra o patrimônio próprio os bens que cada cônjuge possuía ao casar e os por ele adquiridos, a qualquer título, na constância do casamento. Parágrafo único. A administração desses bens é exclusiva de cada cônjuge, que os poderá livremente alienar, se forem móveis. Quando mencionado que integra o patrimônio individual que cada cônjuge tinha antes de casar e ainda aquele da constância que também fica de fora e ainda fica exclusivamente administrado pelo cônjuge e não é compartilhado. No regime da separação total, bem mais simplificado, mencionado no artigo 1.687 do Código Civil de 2002, onde os bens particulares e os adquiridos na constância do casamento não se comunicam em nenhum momento, mesmo no divórcio ou em caso de morte de um dos cônjuges: Art. 1.687. Estipulada a separação de bens, estes permanecerão sob a administração exclusiva de cada um dos cônjuges, que os poderá livremente alienar ou gravar de ônus real. Observa-se que a grande maioria dos casais acaba de optar ou permitir que a própria lei defina o regime de bens, não concedendo aos cônjuges qualquer participação no patrimônio um do outro. 16 Na separação obrigatória de bens descrita no artigo 1.641, incisos I ao III do Código Civil, prescreve algumas condições que torna nulo a constituição do casamento, são elas: Art. 1.641. É obrigatório o regime da separação de bens no casamento: I - das pessoas que o contraírem com inobservância das causas suspensivas da celebração do casamento; II – da pessoa maior de 70 (setenta) anos; III - de todos os que dependerem, para casar, de suprimento judicial. Estas condições são observações importantes que podem facilitar sua constância e sua constitucionalidade regulada pelo casamento em seu sentido completo, pois se faz necessário preservar o patrimônio de eventuais aventureiros sucessórios. No regime da comunhão parcial, no casamento civil, prescreve o artigo 1.640 do Código Civil em seu caput: Art. 1.640. Não havendo convenção, ou sendo ela nula ou ineficaz, vigorará, quanto aos bens entre os cônjuges, o regime da comunhão parcial. Existe aqui uma observação que implica diretamente no regime, caso não haja acordo elaborado anteriormente entre o casal, será considerado automaticamente a comunhão parcial de bens. 1.1.3 Dissolução A Constituição Federal em seu § 6º do art. 226 que dispõe sobre a dissolubilidade do casamento civil pelo divórcio, suprimindo o requisito de prévia separação judicial por mais de 1 (um) ano ou de comprovada separação de fato por mais de 2 (dois) anos. Dispõe o Artigo 6º da Carta Magna de 1988: § 6º O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio. Assegurado constitucionalmente a dissolução do casamento pelo rito do divórcio, garante-se a efetivo direito disposto a cada cônjuge quando for este o caminho decidido pelo casal. A Lei infraconstitucional nº 6.515/1977 que regula os casos de dissolução da sociedade conjugal e do casamento, seus efeitos e respectivos processos, destaca em seu artigo 1.571, sobre o termino da sociedade conjugal: Art. 1.571. A sociedade conjugal termina: 17 I. pela morte de um dos cônjuges; II. pela nulidade ou anulação do casamento; III. pela separação judicial; IV. pelo divórcio. O casamento pode deixar de se configurar com a morte de um dos cônjuges, também nos casos de nulidade ou anulação, separação judicial ou pelo divórcio, efetivando o termino do casamento perante o ordenamento jurídico. É correta a explicação de Maria Helena Diniz, quando menciona a separação: A separação judicial dissolve a sociedade conjugal, mas conserva íntegro o vínculo, impedindo os cônjuges de convolar novas núpcias, pois o vínculo matrimonial, se válido, só termina com a morte de um deles ou com o divórcio. (DINIZ, 2009, P.84) Fica clara a explicação da autora quando destaca que o vínculo matrimonial só se encerra como o evento morte de um dos cônjuges ou com o divórcio judicial. Porém, após proferida a sentença com o trânsito em julgado através do divórcio não consensual mais conhecido como litigioso, obtém-se a validade e o reconhecimento da dissolução do casamento. 1.2 A FAMÍLIA DECORRENTE DA UNIÃO ESTÁVEL A união entre homem e a mulher, sem casamento, foi chamada, por muito tempo em nossa evolução histórica das relações ente pessoas de concubinato. O Código Civil de 1916 apontava restrições a esse modo de convivência, proibindo e deixando de fora da sucessão. Na verdade o concubinato era a relação amorosa praticada pelo homem casado fora do casamento, como se a concubina fosse uma suposta prostituta ou aventureira em que o homem casado procurava pra fugir de sua rotina do casal civil. Diante dessa visão de Francisco Cavalcante Pontes de Miranda chegou a afirmar que: O concubinato não constitui, no direito brasileiro, instituição de direito de família. A maternidade e a paternidade ilegítimas o são. Isso não quer dizer que o direito de família e outros ramos do direito civil não se interessem pelo fato de existir, socialmente, o concubinato. (MIRANDA, 1971, p.211) O concubinato como união livre, independente de casamento, de fato tem em sua constituição o status de modalidade não admitida no ordenamento jurídico, por isso no direito sucessório não abrange assistência. A lei 11.340/2006, conhecida com a Lei Maria da Penha, também dispõe sobre o conceito de família no âmbito familiar: 18 II - no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa; Diferente da união estável e do casamento o concubinato está conceituado no Código Civil, em seu artigo 1.727: Art. 1.727. As relações não eventuais entre o homem e a mulher, impedidos de casar, constituem concubinato. Para evitar que qualquer relação entre o homem e a mulher, como o namoro, o ficar ou um encontro eventual fosse considerado união estável, o ordenamento caracterizou essa diferenciação e passou inegavelmente a gerar um novo conceito de concubina, quando passou a efetivar o registro dessa união em cartório de registro civil. Vê-se em sua definição precisa LÔBO (2009, p. 148) quando descreve que a “união não matrimonial no direito romano era comum e considerada como casamento inferior, de segundo grau, sob denominação de concubinato”, ou seja, desprovido em sua totalidade de amparo jurídico. Agrupando momentos de rejeição e até mesmo de absoluta ausência de tutela jurídica, a união estável foi considerada um fenômeno que integrava arealidade da sociedade familiar em que não se podia mais ficar escondida, mas, para tanto existe uma forma de ser constituída e que possa gerar efeitos. 1.2.1 Forma de constituição A forma em que a união estável é tida como válida, diferentemente do casamento, que exige um ato solene já mencionado nesta pesquisa, basta a simples manifestação da vontade dos interessados, porém deve ser pública e notória e registrada em Cartório de Notas. O Art. 1.723 do Código Civil de 2002, que prescreve como se dá o reconhecimento de sua constituição: Art. 1.723. É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família. Ainda se exige para o reconhecimento da união estável que seja estabelecida com o objetivo de formar uma família, não só constituída de pai e mãe, caso queiram, como também ter filhos e que seja integrada a sociedade familiar, com seus quatro elementos 19 caracterizadores: publicidade, continuidade, estabilidade e objetivada em constituição de família. Presentes os requisitos básicos da união estável o homem e a mulher que já convivem de maneira estável, precisam realizar o registro de sua situação, perante a autoridade Civil. Contudo os conviventes podem celebrar contrato de união estável ou escritura declaratória de união estável. Ainda, podem caso necessário, requerer judicialmente o reconhecimento da união estável, através de uma ação declaratória. Nesta feita não restará dúvidas da existência, evitando eventuais questionamentos futuros sobre a união estável. Ainda é importante frisar que na Resolução nº 175, de 14 de maio de 2013, no Conselho Nacional de Justiça, que “é vedada às autoridades competentes recusa de habilitação, celebração de casamento civil ou de conversão de união estável em casamento entre pessoas de mesmo sexo.” Posteriormente, comenta-se o regime único aceito na união estável, salvo menções firmadas em contrato, aceito na união estável o da comunhão parcial de bens a seguir. 1.2.2 O tipo de regime de bens O regime de bens utilizado quase que automaticamente na união estável é o regime da comunhão parcial de bens, onde não deveria é inconstitucionalmente utilizado em nosso ordenamento jurídico. Diante do artigo 1.725 do Código Civil que prescreve: Art. 1.725. Na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às relações patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens. O regime único aceito na união estável é o de parcial de bens ou limitada ao constituído durante a vigência da união, onde o direito sucessório vai contemplar o que cabe ao companheiro sobrevivente em caso de morte ou dissolução de união estável. 1.2.3 Dissolução A dissolução da união estável pode acontecer tanto judicialmente quanto extrajudicialmente, de acordo com a situação em que os companheiros se encontrem. 20 MIRANDA, (1971, p.223) sinaliza que, “tranquilamente, é possível firmar um contrato de convivência por escritura pública, ou instrumento particular, após o rompimento do relacionamento para regular os efeitos da união desfeita.” Quando por meio de ação judicial, a dissolução terá que ser declarada pelo juiz competente, com sentença, onde é declarada a extinção da união estável, transitada em julgado. Porém, extrajudicialmente a dissolução ocorrerá diretamente no Cartório de Notas, ainda perante autoridade e lavrada certidão. A Súmula 380 do Supremo Tribunal Federal reconhece o concubinato com registro em cartório ou contrato, como sociedade de fato e concede partilha do patrimônio entre direitos aos concubinos, descrita a seguir: Súmula 380. Comprovada a existência de sociedade de fato entre os concubinos, é cabível a sua dissolução judicial, com a partilha do patrimônio adquirido pelo esforço comum. Neste momento, após a dissolução os companheiros passam a configurar como sucessores numa eventual partilha de bens constituídos durante o período compreendido da união do casal. As restrições existentes para os companheiros no direito sucessório, tem como intenção do legislador o de proteger possíveis vítimas de aventureiros interessados apenas no patrimônio. 1.3 ARRANJOS DE FAMÍLIA Em que pese a existência de família abordada na Constituição Federal faz-se necessário conhecer e compreender alguns arranjos familiares oriundos de lares que de alguma maneira sofreu um desmembramento de seus elementos, como o pai e mãe ao mesmo tempo e outras pessoas complementam a criação dos filhos daquela família. 1.3.1 Monoparental A palavra expressa monoparental significa único pai, ou em outras palavras a família pode ter em sua constituição apenas um dos membros pai ou mãe, acompanhados, claro com filhos. A constituição Federal de 1988, prescreve em seu artigo 226, parágrafo 4º, sobre a família monoparental: 21 Art. 226. § 4º Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes. Em uma eventualidade qualquer da vida a família não deixa de figurar com o divórcio ou dissolução da sociedade, pois a monoparentalidade tendo o pai com o filho ou ainda a mãe com o filho, tem amparo constitucional. Comenta Maria Berenice Dias (2012, p.163), comenta sobre a família monoparental e traz consigo, um ponto de vista constitucional, pois “O fato de mencionar primeiro o casamento, depois a união estável e após a família monoparental, não significa qualquer preferência e nem releva escala de prioridade entre elas.” No mesmo sentido o autor Eduardo de Oliveira Leite, destaca em sua lição: Na realidade, a monoparentalidade sempre existiu – assim como o concubinato – se levarmos em consideração a concorrência de mães solteiras, mulheres e crianças abandonadas. Mas o fenômeno não era percebido como uma categoria específica, o que explica a sua marginalidade do mundo jurídico. (LEITE, 2009 Revista dos Tribunais). A situação de mãe solteira, após enfrentar um divórcio se casada ou uma dissolução na união estável, não ocasiona o fim deste ente familiar, ainda que por morte do cônjuge ou companheiro. Por adoção de criança por um só membro familiar pai ou mãe é outro exemplo de família monoparental. 1.3.2 Anaparental Não se pode negar que a perda dos pais pelos filhos, seja qual for a situação de morte ou por condenação e perda do poder familiar, a família seja desfeita, pois existem outras composições de família, uma delas é quando as crianças são criadas por parentes próximos consanguíneos ou por laços afetivos de amizade, devido a ausência dos pais. Os autores Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, descrevem com primazia este instituto da família: A situação em que, falecidos ambos os pais, continuam os filhos, alguns ou todos maiores, residindo na mesma casa, com pessoas outras que colaboraram com a sua criação, uma “tia ou um tio de consideração”, um padrinho ou madrinha, por exemplo. (STOLZE e PAMPLONA, 2013 p. 516) Demonstra-se que a família em sua constituição vai muito mais além do padrão pré- estabelecido pai, mãe e filhos, pois o amor de família supera a intempérie e perdura sua 22 existência, através de parentes, tios, padrinhos entre outros membros consanguíneos ou por afinidade como é o caso de amigos que criam os filhos de seus amigos. 1.3.3 Pluriparental As famílias também podem ser constituídas após seu desmembramento. Os pais que sobreviventes ou aqueles que após um divórcio ou dissolução manifestam interesse em reconstituir sua família, por isso não se pode deixar de comentar sobre essas recomposições familiares. Noutra vertente aquela família cuja morte de um membro seja o pai ou a mãe, não compromete a família, pois muitas vezes filhos de pais separados que sãocriados por padrastos ou madrastas merecem amparo constitucional, tendo pai ou a mãe, ainda vivos. Vê-se o comentário trazido por Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho a respeito deste instituto: Imagine-se a situação em que, na nova família, a mãe vem a falecer e o filho já desenvolveu uma relação afetiva tão forte com o padrasto que preferem ficar sob sua guarda a ficar sob a de seu pai biológico, independentemente de ainda manter com ele um bom relacionamento. (...) formaria um novo núcleo familiar, o grupo composto do padrasto e do enteado, ainda que com o pai vivo. (STOLZE e PAMPLONA, 2013 p. 519) Surge não de fato, pois existe a muito tempo, mas então em nível de valor e norma a pluriparental tem como a formação de dois núcleos pai, filho e padrasto. No caso de morte do genitor ou da genitora e ainda de todos os filhos da família, finda com a extinção da família como núcleo familiar, ainda que se possa classificar o núcleo antes existente como modalidade de entidade familiar. A Carta Magna buscou proteger todos os núcleos, familiares existentes a época de promulgação já conhecida, de certa maneira com a evolução comportamental sempre multável da sociedade, surgiu novos núcleos familiares formados por diversos entes da família comum. A doutrina majoritária deve estar “ligada por laços afetivos e vínculo de convivência, composta de amor e intenção de que a vida seja vivida com a disseminação da paz entre as pessoas que se amam.” E ainda tentam impor a subordinação da família ao Estado e a leis infraconstitucionais conforme comentário vê-se: “A família é uma coletividade humana subordinada à autoridade e condutas sociais” (VENOSA, 2013, p. 8) 2 A EVOLUÇÃO DO DIREITO SUCESSÓRIO DO COMPANHEIRO NO BRASIL O direito sucessório vem sofrendo ao longo dos anos, grandes modificações, adaptações e buscado a modernização e o reconhecimento do direito daqueles que devem suceder, pois precisa ser assegurada a quem de direito. Desde de 1916 com o Código Civil, quando se deu o reconhecimento do cônjuge contribuindo para as formações e conceitos da entidade familiar como conhecemos. A Constituição Federal expandindo a proteção do Estado à família promoveu a mais profunda transformação de que se tem notícia entre as constituições contemporâneas, trouxe à equiparação familiar do companheiro a sucessão do autor da herança, assegurando seus direitos antes marginalizados. Já a Lei nº 8.971/94 que regula o direito dos companheiros a alimentos e a sucessão, elencou a igualdade de direito em suceder o companheiro reconhecido. A Lei nº 9.278/96 que regula o § 3º do artigo 226 da Constituição Federal de 1988, onde a união estável é reconhecida como entidade familiar. A proteção dos direitos sucessórios do cônjuge atingiu seu ápice, enfim, com o Código Civil de 2002, que, trazendo uma série de inovações condicionou o cônjuge como herdeiro necessário em concorrência com descendentes e ascendentes. A Declaração Universal dos Direitos Humanos é considerada o documento mais importante da liberdade do homem em seus direitos fundamentais, homologado pelas Nações Unidas em 1948, onde são descritos todos os seres humanos possuem, que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e dos seus direitos iguais e inalienáveis. Destaca-se seu artigo 1º como relevante a pesquisa: Artigo 1º. Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade. O reconhecimento dos direitos humanos traz neste artigo uma das mais clássicas ponderações que abrangem a Constituição do Brasil de 1988, onde todos são iguais e livres em sua dignidade e direitos. A história dessa evolução passa pelo ordenamento jurídico brasileiro disciplinado nesta pesquisa desde o Código Civil de 1916. 24 2.1 CÓDIGO CIVIL DE 1916 Neste Código Civil Brasileiro, não mencionava ainda a união estável, que a época era mais conhecida como Concubina, àquela amante do homem casado, marginalizada, ela não teria nenhum direito na sucessão ou de receber presentes, podendo a cônjuge reivindicá-lo. O Artigo 248, inciso IV deste Código, contempla o seguinte: Art. 248. Independentemente de autorização, pode a mulher casada: IV. Reivindicar os bens comuns móveis ou imóveis doados, ou transferidos pelo marido à concubina (art. 1.177). Também se quer concubina tinha direito de receber um presente qualquer do seu amante, que pertencesse ao patrimônio da família do cônjuge, quer seja o bem móvel ou imóvel doado ou transferido pelo marido a concubina, sendo reivindicado pelo cônjuge por um determinado período de até dois anos, após sua separação conjugal. O Artigo 1.177, inciso IV e o 1.719, inciso III, ambos deste Código Civil, disciplinavam sobre as doações do cônjuge adultero e anulação dos atos por ele praticado a sua amante, que se quer podia ser legatária, como descreve os mencionados artigos: Art. 1.177. A doação de cônjuge adultero ao seu cúmplice pode ser anulada pelo outro cônjuge, ou por seus herdeiros necessários, até dois anos depois de dissolvida a sociedade conjugal (arts. 178, § 7º, n. VI, e 248, n. IV). Art. 1.719. Não podem também se nomeados herdeiros, nem legatários: III. A concubina do testador casado. A evidência de uma sociedade que privilegiava a relação do casamento e afastava todas as outras relações extraconjugais, eram claras e conforme entendimento da época prevalecia apenas a esposa e os filhos da relação matrimonial. Ensina Maria Berenice Dias, sobre o papel do Estado no Código supracitado que: O Estado solenizou o casamento como uma instituição e o regulamentou exaustivamente. Os vínculos interpessoais passaram a necessitar da chancela estatal. É o estado que celebra o matrimônio mediante o atendimento de inúmeras formalidades. Reproduziu o legislador de 1916 o perfil da família então existente: matrimonializada, patriarcal, hierarquizada e heterossexual. Só era reconhecida a família constituída pelo casamento. O homem exercia a chefia da sociedade conjuga, sendo merecedor de respeito, devendo-lhe a mulher e os filhos obediência. A finalidade essencial da família era a conservação do patrimônio, precisando gerar filhos com força de trabalho. Como era fundamental a capacidade procriativa, claro que as famílias necessitavam ser constituídas por um par heterossexual e fértil. (DIAS, 2012, p. 45). 25 A autora faz alusão à finalidade essencial da família proveniente do casamento diante das formalidades do Estado, a de preservar o patrimônio no seio familiar, com capacidade procriativa, patriarcal, hierarquizada e heterossexual, evitando possíveis aventureiros com interesses patrimoniais e desestabilizadores do matrimônio. 2.2 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 Instituída a sétima Constituição Brasileira, considerada a mais democrática de todos os tempos, promulgada no dia 5 de outubro de 1988, com propostas de mudança, sobretudo na liberdade do povo e nos direitos sociais. Destaca-se a especial proteção do Estado aos direitos da família e sua preservação, ampliando os direitos sucessórios do cônjuge e reconhecendo a união estável como entidade familiar. A Constituição Federal de 1988 trouxe uma inovação na forma de se entender a constituição familiar, proveniente de um casamento com suas formalidades e a união estável, entre um homem e uma mulher, como entidade familiar, cuja proteção deve ser exercida pelo Estado. A Carta Magna de 1988 detém em seu Artigo 226, caput, que: Art. 226 – A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. 3º§ - Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento. Neste diapasão a DeclaraçãoUniversal dos Direitos Humanos, disciplina em seu artigo 16, inciso III, reforçando a Constituição Federal Brasileira de 1988, sobre a proteção do estado a família: Artigo 16º. Inciso III - A família é o elemento natural e fundamental da sociedade e tem direito à proteção desta e do Estado. O cenário constitucional de 1988 elencou a proteção do ser humano em defesa da igualdade plena entre os indivíduos como ser social. De acordo com os princípios constitucionais que integram a base para elaboração de leis infraconstitucionais, pode-se especificar a busca da melhor interpretação condicionada a dignidade da pessoa humana sempre observando as suas relações. Neste intuito DIAS (2011) comenta sobre os princípios: 26 O princípio da interpretação conforme a Constituição é uma das mais importantes inovações, ao propagar que a lei deve ser interpretada, sempre, a partir da lei maior. Assim, os princípios constitucionais passaram a informar todo o sistema legal de modo a viabilizar o alcance da dignidade da pessoa humana em todas as relações jurídicas. (DIAS, 2011. p.57 e 58) O número de princípios constitucionais para os doutrinadores não podem ser mencionado ao certo, pois não há um senso estigmatizado no Direito de Família, visto a existência de inúmeros princípios constitucionais implícitos e explícitos. Ainda refere-se DIAS (2011): A doutrina e a jurisprudência têm reconhecido inúmeros princípios constitucionais implícitos, cabendo destacar que inexiste hierarquia entre os princípios constitucionais explícitos e implícitos. É difícil quantificar ou tentar nominar todos os princípios que norteiam o direito das famílias. Alguns não estão escritos nos textos legais, mas têm fundamentação ética no espírito dos ordenamentos jurídicos para possibilitar a vida em sociedade. (DIAS, 2011, p.61) Neste sentido, é certo que há princípios que se aplicam a todos os ramos do direito como a dignidade da pessoa humana, igualdade e liberdade, devendo estes princípios servir de base, para a interpretação dos institutos do Direito de Família. Os ensinamentos de Maria Helena Diniz, explica: O moderno direito de família, marcado por grandes mudanças e inovações, rege-se por princípios, tais como o Princípio da “ratio” do matrimônio e da união estável, segundo o qual o fundamento básico da vida conjugal é a afeição e a necessidade de completa comunhão de vida. Princípio da igualdade jurídica dos cônjuges e dos companheiros, no que atina aos seus direitos e deveres, como: O Princípio da igualdade jurídica de todos os filhos (CF, art. 227, § 6º, e CC, arts. 1.596 a 1.629); O Princípio da pluralidade familiar, uma vez que a norma constitucional abrange a família matrimonial e as entidades familiares (união estável e família monoparental); O Princípio da consagração do poder familiar (CC, arts. 1.630 a 1.638), substituindo o marital e o paterno, no seio da família; O Princípio da liberdade, fundado no livre poder de constituir uma comunhão de vida familiar por meio de casamento ou união estável; e o Princípio do respeito da dignidade da pessoa humana, que constitui base da comunidade familiar, garantindo o pleno desenvolvimento e a realização de todos os seus membros, principalmente da criança e do adolescente (CF, art. 227). (DINIZ, 2011, p. 17 a 18) Segue o mesmo pensamento da autora, o doutrinador Humberto Ávila, bem absorve a definição de Karl Larenz para explica o conceito de princípio “como normas de grande relevância para o ordenamento jurídico, na medida em que estabelecem fundamentos normativos para a interpretação e aplicação do direito, deles decorrendo, direta ou indiretamente, normas de comportamento.” (ÁVILA, 2009, p. 35 e 36). 27 Os princípios constitucionais são abordados com primazia pelos autores, como pilares estruturais da constitucionalidade dos direitos sucessórios. A pluralidade familiar do casamento, união estável e monoparental ficam evidenciadas consagrando a família independente da formação e sua origem, pois para eles os princípios são como normas de grande relevância para se estabelecer leis infraconstitucionais. 2.2.1 Princípio da Proteção da unidade familiar A busca constitucional do Estado em proteger a família passa pela preservação plena das relações entre seus entes na convivência, valorizando e perpetuando a família independentemente das influências externas negativas, como o divórcio e a dissolução da união estável. Comenta Dirley da Cunha Júnior, sobre a evolução dos direitos fundamentais e a primeira geração ou dimensão, que: Os direitos de primeira dimensão foram os primeiros direitos solenemente reconhecidos, o que se deu através das declarações do século XVII e das primeiras constituições escritas que despontaram no constitucionalismo ocidental, como resultado do pensamento liberal, (...) correspondem às chamadas liberdades públicas (...) os direitos à vida, à liberdade, à propriedade, à segurança e a igualdade de todos perante a lei, posteriormente complementados pelos direitos de expressão coletiva. (CUNHA, 2011. p.599) Confirma, Maria Helena Diniz, que comenta o pensamento de Pietro Perlingieri sobre o assunto, como disposto completando a ideia firmada: O sentido da unidade familiar encontra fundamento no afeto, na ética e no respeito entre os membros de uma família. Não obstante, estes elementos não podem ser considerados apenas na constância da família, pelo contrário, devem ser sublimados, exatamente, nos momentos mais difíceis das relações. A preservação destes elementos é que é o ponto nodal da unidade familiar. Repita-se, a unidade familiar é um elo que não corresponde nem com a convivência, nem tampouco com a ruptura dos genitores. É um elo que se perpetua, independentemente da relação dos genitores. Por essa razão, entendemos que o afeto, a ética e o respeito devem nortear todos os momentos das relações familiares, por mais adversos que sejam. (DINIZ, 2009, p. 31) Essa realidade apesar da grande importância do fundamento do afeto, na ética da democracia e no respeito a conservação do estado de família que possui posição jurídica destinada e reconhecida na sua qualidade de uma unidade da família. O estado de família é indisponível e deve permitir que o companheiro ou cônjuge aproveitem da proteção 28 constitucional da unidade familiar para que, de forma definitiva, possam gozar dos seus direitos sucessórios sem diferenciações na sua composição originária. 2.2.2 Princípio da Função social da família Há pouco tempo em nossa formação educacional, era mencionada nas escolas que a família era a célula-mãe da sociedade, confirmado no artigo 226 da Constituição Federal de 1988 que assegura a família como base da sociedade, tendo especial proteção do Estado. Comenta Dirley da Cunha Júnior, sobre a evolução dos direitos constitucionais fundamentais da segunda geração ou dimensão, que “são os direitos fundamentais de segunda dimensão, porque que por sua vez são subjetivos e podem ser lesados, não somente por meio de intervenções ilegais do Estado, mas também através de omissões do poder público.” (CUNHA, 2011. p.607 e 608). O contexto social das relações familiares deve observar como função a sua aplicabilidade aos institutos do Direito e perceber as intervenções do Estado e as omissões do poder público em privilegiar a família do casamento em menor consideração a de origem da união estável, pois ambos são formadores da entidade familiar. Por sua vez Ivo Dantas, escreve sobre o tema alegando que a “jurisprudência, por diversas vezes, reconhece a necessidade de interpretação dos institutos privados de acordo com contexto social. Em suma, não reconhecer função social à família e à interpretação do ramo jurídico que a estuda é como não reconhecer função social à própria sociedade.” (DANTAS, 1996). Importante observarque tal característica de interpretação dos institutos da família de acordo com o contexto social, motiva exigir do Estado com base na sociedade, a proteção a família disciplinando seus direitos e organizando a manutenção da paz social. 2.2.3 Princípio da Solidariedade familiar A solidariedade social tem o sentido de construir uma nova sociedade, moderna sem injustiças e adequada as novas mudanças, livre para realizar seus sonhos, por isso reflete nas relações familiares, pois a solidariedade é inerente a cada um dos entes da família. Comenta Dirley da Cunha Júnior, sobre a evolução dos direitos constitucionais fundamentais da terceira geração ou dimensão, que: 29 Como direito fundamental de terceira dimensão, a solidariedade é resultado de novas reivindicações na sociedade, não do homem em sua individualidade, mas do homem em coletividade social, sendo, portanto, de titularidade coletiva ou difusa. São direitos transindividuais na qual sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato assim entendidos os decorrentes de origem comum. (CUNHA, 2011. p.608) Diante desse comentário as pessoas indeterminadas podem ser ligadas por circunstancias de fato de origem comum, como a entidade família, formada por pessoas que integram a sociedade familiar com o interesse de gerar filhos e contribuir com os grupos sociais da família. O artigo 3º, inciso I, da Carta Magna de 1988, oportunamente descreve: Art. 3º. Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I – construir uma sociedade livre, justa e solidária. Entre os fundamentos da solidariedade da família, devem ser valorizados não somente o patrimonial como também o afetivo e psicológico, diante dos deveres recíprocos entre os integrantes do grupo familiar. O artigo 226, § 8º, da Constituição Federal, consagra: Art. 226, §8º. O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações. O princípio da solidariedade familiar está diretamente ligado ao respeito das relações familiares e seus entes mencionados e protegidos na Carta Magna. 2.2.4 Princípio da Afetividade A afetividade como princípio constitucional da relação familiar, tem em sua essência fundamental a valorização da dignidade humana. Observa-se no comentário de Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, que “se o afeto é a base do conceito de família que desenvolvemos ao longo de esta obra, afigurar- se-ia contraditório (é inconstitucional) defendermos um tratamento que resultasse em vantagem ou privilégio do cônjuge, simplesmente porque está amparado pelo matrimonio.” (STOLZE e PAMPLONA, 2013 p. 421). Nas relações familiares deve-se a valorização do afeto no vínculo biológico, fato esse que deve priorizado pelos juristas no momento da elaboração e reformulação de leis que 30 garantam a família o reconhecimento predominante, trazendo a concepção da família de acordo com o meio social. A relação conjugal passa a ser de amor, afeto e companheirismo; a mulher escolhe o homem que deseja compartilhar seus momentos de vida. 2.2.5 Princípio da Igualdade ou Isonomia entre os Cônjuges e Companheiros Com o advento da Carta Maior, as relações entre as pessoas como os cônjuges e companheiros, trouxe uma nova abordagem e reconhecendo o companheiro e o cônjuge como entidades de família. Passamos a ter um novo modelo social, o casamento ou a união estável, não é uma imposição da família. O artigo 5º da Magna Carta dispõe sobre isonomia: Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza (...) a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade (...). Ainda o artigo 226, § 5º, da Constituição Federal de 1988 disciplina sobre os direitos e deveres da sociedade conjugal familiar, como vê-se: § 5º Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher. O reconhecimento da igualdade entre homens e mulheres no que se refere à sociedade conjugal familiar constituída do casamento ou união estável, não impõe privilégios ao cônjuge ou companheiro, apenas a busca da igualdade entre aqueles que são desiguais, respeitando-os na medida de sua desigualdade. 2.2.6 Princípio da Não intervenção ou da Liberdade O princípio constitucional da liberdade em constituir comunhão entre pessoas pode- se dizer que refere à livre iniciativa das pessoas de constituir família, pois somente haverá liberdade quando existir de forma igual a todos os indivíduos. Conforme Maria Helena Diniz, concluiu em seu estudo sobre “o princípio da liberdade refere-se ao livre poder de formar comunhão de vida, a livre decisão do casal no planejamento familiar, a livre escolha do regime matrimonial de bens, a livre aquisição e 31 administração do poder familiar, bem como a livre opção pelo modelo de formação educacional, cultural e religiosa da prole.” (DINIZ, 2009. p. 27). A liberdade de escolher o regime da união ou casamento é inerente a cada individuo sem indiferenças, pois na verdade não há nenhuma evidenciada na Constituição Brasileira, apenas equívocos na elaboração de leis estabelecidas pelo Poder Público. 2.2.7 Princípio de Proteção à Dignidade da pessoa humana É o princípio formador da base do Estado democrático de direito, mencionado no 1º artigo da Constituição de 1988, que busca desenvolver os direitos humanos e a justiça social. Conforme Maria Helena Diniz, que destaca “a preocupação com a promoção dos direitos humanos e da justiça social levou o constituinte a consagrar a dignidade da pessoa humana como valor nuclear da ordem constitucional.” (DIAS. 2011, p. 62). Com o advento da chamada Constituição cidadã de 1988 no Brasil inserida no princípio da dignidade da pessoa humana, o casamento e a união estável passaram a ocupar seus espaços na sociedade fincados no vínculo da afetividade e não das formalidades, valorados como núcleo da ordem constitucional. STOLZE e GAGLIANO (2013, p. 423) comentam que “nada impedem ao juiz, em situações como essas, reconheça, em concreto, a inequívoca inconstitucionalidade da norma reducionista, para amparar a companheira, como se casada fosse.” neste instante é que a dignidade se destaca para os autores e ainda assim eles defendem a individualização de análise em cada caso concreto, onde vê-se: “por tudo isso, sempre defendemos, no julgamento de todo e qualquer caso concreto, a incessante busca por uma solução justa, que não agrida o valor matricial da dignidade da pessoa humana aplicada à relação de família.” E prossegue Carlos Roberto Gonçalves: O Direito de Família é o mais humano de todos os ramos do Direito. Em razão disso, e também pelo sentido ideológico e histórico de exclusões, (...) cuja base e ingredientes estão, também, diretamente relacionados à noção de cidadania’. A evolução do conhecimento científico, os movimentos políticos e sociais do século XX e o fenômeno da globalização provocaram mudanças profundas na estrutura da família e nos ordenamentos jurídicos de todo o mundo. (...) e lançaram as bases de sustentação e compreensão dos Direitos Humanos, a partir da noção da dignidade da pessoa humana, hoje insculpida em quase todas as instituições democráticas. Prevê o art. 1º, inc. III, da Constituição Federal de 1988 que o nosso Estado Democrático de Direito tem como fundamento a dignidade da pessoa humana e é considerada a base do direito de família brasileiro. 32 Para Miranda (2000) observou-se que “a constituição confere uma unidade de sentido, de valor e de concordância prática ao sistema de direitos fundamentais, que, por sua vez, repousa na dignidade da pessoa humana, isto é, na concepção que faz da pessoa fundamento e fim da sociedade edo Estado.” Verifica-se que a dignidade da pessoa e os interesses constitucionais, estão interligados, pois os direitos fundamentais são inerentes à pessoa humana. 2.2.8 Princípio da Vedação ao Retrocesso social Os direitos sucessórios do companheiro, antes mesmo do Carta Magna, não havia segurança e nem amparo jurídico que assegurasse a sua participação nos bens da sucessão de seu companheiro da entidade familiar. Para o cônjuge, desde o Código Civil de 1.916, onde passou a mencioná-lo como entidade familiar, fato que só veio acontecer ao companheiro com a promulgação da Constituição de 1988. Com o advento do Código Civil de 2002, o cônjuge passou a configurar como herdeiro necessário e na contramão da evolução sucessória o companheiro ainda não lhe foi garantido participação como herdeiro necessário. Os direitos da família não foram recepcionados de maneira isonômica pelo Código Civil de 2002, pois privilegiou o cônjuge como herdeiro necessário e esqueceu o companheiro, fazendo com que a Constituição de 1.988 não prevalecesse em relação ao Código de 2002, ocorrendo um verdadeiro retrocesso na lei. Referem-se na mesma linha Flávio Tartuce e José Fernando Simão (2013, p. 204) que: “com relação aos companheiros, antes da vigência do Código Civil de 2002, a situação sucessória era semelhante àquela dos cônjuges”. O retrocesso social disciplinado pelo Código Civil de 2002, no caso é porque é posterior a Carta Magna de 1988. Ainda Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho (2011, p. 85) aduz que “esse superior princípio traduz a ideia de que uma lei posterior não pode neutralizar ou minimizar um direito ou uma garantia constitucionalmente consagrado”. 2.3 LEI Nº 8.971/1994 – REGULA O DIREITO DO COMPANHEIRO A ALIMENTOS E À SUCESSÃO 33 A lei 8.971/94 assegurou ao companheiro ter para si, em concorrência com os descendestes caso exista, a quarta parte dos bens do de cujus, se este tiver deixado descendentes e usufruto à metade dos bens se existirem ascendentes, apenas, o que era garantido ao cônjuge diante da lei. Esta não conceituou união estável, mas menciona os seus elementos caracterizadores da participação da sucessão do companheiro, como prazo de mais de 5 (cinco) anos de relacionamento estável, ostensivo, boa convivência e afetividade entre o casal ou ainda terem filhos em comum, e ainda a exigência de serem solteiros ou divorciados. No mesmo sentido o artigo 2º da Lei nº 8.971/94, onde participarão da sucessão do(a) companheiro(a) nas seguintes condições Art. 2º As pessoas referidas no artigo anterior participarão da sucessão do(a) companheiro(a) nas seguintes condições: I - o(a) companheiro(a) sobrevivente terá direito enquanto não constituir nova união, ao usufruto de quarta parte dos bens do de cujos, se houver filhos ou comuns; II - o(a) companheiro(a) sobrevivente terá direito, enquanto não constituir nova união, ao usufruto da metade dos bens do de cujos, se não houver filhos, embora sobrevivam ascendentes; III - na falta de descendentes e de ascendentes, o(a) companheiro(a) sobrevivente terá direito à totalidade da herança. A prioridade no direito sucessório era assegurar o direito dos filhos do falecido, autor da herança 3/4 dos bens em concorrência com o companheiro, e na falta de descendentes, os ascendentes lhes era assegurado 1/3 em concorrência com o companheiro. Também disciplina que esse direito somente cabia ao companheiro enquanto não constituísse nova união estável ou casamento, limitando aqui apenas ao usufruto dos bens. A lei que regula o direito sucessório dos companheiros a alimentos e à sucessão descreve em seu artigo 3º quanto aos bens deixados pelo falecido e a meação do companheiro no caso dos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável, onde destaca-se: Art. 3º Quando os bens deixados pelo(a) autor(a) da herança resultarem de atividade em que haja colaboração do(a) companheiro, terá o sobrevivente direito à metade dos bens. A referência da metade dos bens do falecido sendo garantido primeiro ao cônjuge já veio equiparar o companheiro ao cônjuge em conformidade a lei específica, entendimento doutrinário, que a entidade familiar não possui hierarquia e nem diferenciação de sua forma de origem entre o companheiro em relação ao cônjuge. Asseveram Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona: 34 Ao consagrar a união estável como família, fica evidente não haver uma hierarquia ou supremacia de direitos do cônjuge em face do companheiro: uma vez reconhecida a união estável, afrontaria o próprio sistema constitucional conceber-se um tratamento privilegiado ao cônjuge em detrimento do dispensado ao companheiro. (...) Sucede-se que inúmeros pontos da legislação infraconstitucional, percebemos uma amplitude dos direitos da pessoa casada, sem o correspondente reflexo na esfera jurídica daqueles que mantêm, simplesmente, uma união estável. (STOLZE e PAMPLONA, 2013 p. 421) O autor consagra o entendimento constitucional de não ocorrer supracia de uma entidade a outra em detrimento sucessório ou proteção do Estado, para isso a isonomia deve prevalecer e o companheiro e o cônjuge dentro da esfera jurídica amparados, seja de qualquer natureza a exigência daqueles que mantém a família e são chamado a suceder. 2.4 LEI Nº 9.278/1996 – REGULA O § 3º DO ARTIGO 226 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL O legislador buscou nesta lei em relação ao companheiro, causar redução dos direitos já adquiridos anteriormente na Lei nº 8.971/94 que assegurava ao companheiro concorrer com os descendentes do falecido parte dos bens do seu companheiro em união estável, caso este possuísse descendentes e caso existisse ascendentes a metade dos bens, o que para o cônjuge já havia sido concedido no Código Civil de 1.916 em seu parágrafo 1º do artigo 1.611. Art. 1.611 - A falta de descendentes ou ascendentes será deferida a sucessão ao cônjuge sobrevivente se, ao tempo da morte do outro, não estava dissolvida a sociedade conjugal. § 1º O cônjuge viúvo se o regime de bens do casamento não era o da comunhão universal, terá direito, enquanto durar a viuvez, ao usufruto da quarta parte dos bens do cônjuge falecido, se houver filho dêste ou do casal, e à metade se não houver filhos embora sobrevivam ascendentes do “de cujus”. Ainda a Lei 9.278/96 disciplina em seu artigo 5º, que: Art. 5° Os bens móveis e imóveis adquiridos por um ou por ambos os conviventes, na constância da união estável e a título oneroso, são considerados fruto do trabalho e da colaboração comum, passando a pertencer a ambos, em condomínio e em partes iguais, salvo estipulação contrária em contrato escrito. Enquanto a lei 9.278/96 garantiu que o companheiro sobrevivente teria direito real à habitação relativamente ao imóvel destinado à família, o que era garantido ao cônjuge. O direito real de habitação é um direito sucessório previsto no art. 1.831 do Código Civil de 2002, que prevê ao cônjuge sobrevivente, em concorrência ou não, heteroafetivo ou homoafetivo, o direito de residir no imóvel destinado à residência da 35 família, desde que seja o único imóvel que compõe a herança. Pela leitura do dispositivo legal em comento, é expressa a opção do legislador ordinário em beneficiar apenas o cônjuge sobrevivente, deixando de consagrar o companheiro como beneficiário do direito real de habitação sobre o imóvel do casal. Sobre a possibilidade da extensão desse direito ao companheiro, formaram-se duas correntes opostas. Para a corrente que não aceita tal extensão, utilizam-se dos argumentos de que o legislador fez um silêncio, pois se não previu nesse instituto o companheiro é porque não quis fazê-lo, bem como do argumento de que houve uma revogação de todos os dispositivos que não foram incorporados pelo Código Civil de 2002. Desse modo, a Lei n. 9.278/96 teve vários dispositivosreferentes à união estável, consagrados no Novo Código Civil, com exclusão do seu art. 7º, parágrafo único, que tratava do direito real de habitação do companheiro. A segunda corrente se sustenta em uma nova hermenêutica do Direito Civil Constitucional, levando em consideração o fundamento da dignidade da pessoa humana no artigo 1º, inciso III, da Constituição de 1988, descreve “erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais” e a proteção à moradia como direito social previsto no art. 6º, caput, da Constituição Federal/88. Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. Apesar do silêncio do legislador na previsão do companheiro como titular desse direito sucessório, de fato não houve a revogação expressa da Lei n. 9.278/1996, especificamente quanto ao art. 7º, parágrafo único, que tratava do direito real de habitação do companheiro. Ou seja, apesar de o novo diploma civilista ter tratado da matéria, diante de sua omissão em tratar desse direito sucessório ao companheiro sobrevivente, deve prevalecer o princípio da especialidade, a fim de estender a esse direito real de habitação, em consonância com o art. 226, § 3º da Constituição Federal/88. É possível, a partir de uma visão constitucional do Direito Civil, e por meio de uma interpretação sistêmica, harmonizar a fim de estender ao companheiro sobrevivente o direito real de habitação nos mesmos moldes previstos para o cônjuge sobrevivente. 36 2.5 CÓDIGO CIVIL 2002 Quando se menciona o direito das sucessões no Código Civil estudamos o direito específico de transmitir os bens, direitos e obrigações em razão da morte. Assim, a existência de uma pessoa natural termina com o evento morte. A palavra sucessão, em sentido amplo, significa “o ato pelo qual uma pessoa assume o lugar de outra, substituindo-a na titularidade de determinados bens.” (GONÇALVES, 2011. p. 19) Fica evidente que a sucessão é ato em que se transfere um patrimônio do falecido aos seus sucessores legítimos, legitimados e testamentários. Neste sentido o artigo 1.790, incisos I ao IV do Código Civil de 2002, que contêm equívocos e controvérsias que pode, prejudicar o direito sucessório do companheiro sobrevivente considerado inconstitucional por alguns doutrinadores e juristas, a seguir: Art. 1.790. A companheira ou o companheiro participará da sucessão do outro, quanto aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável, nas condições seguintes: I - se concorrer com filhos comuns, terá direito a uma quota equivalente à que por lei for atribuída ao filho; II - se concorrer com descendentes só do autor da herança, tocar-lhe-á a metade do que couber a cada um daqueles; III - se concorrer com outros parentes sucessíveis, terá direito a um terço da herança; IV - não havendo parentes sucessíveis, terá direito à totalidade da herança. Aqui a inconstitucionalidade está ao se verificar todos os seus incisos, porém destaca-se o inciso IV, que ao seu comparado ao caput, vê-se a plena divergência e incoerência constitucional. O caput prescreve que o companheiro ou companheira participará na sucessão um dou outro apenas dos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável, ora ao lemos o inciso IV a incoerência fica evidente, já que o companheiro ou companheira participa na totalidade da herança. A descrição entre o caput e o inciso IV, está controvertida, por isso deve ser arguido pelos guardiões da Constituição, o plenário do Supremo Tribunal Federal e pelo Controle de Constitucionalidade, sendo abolida do Código Civil e equiparado o companheiro ao cônjuge no artigo 1.829 do mesmo código. A diferença imposta pelo Código Civil está afrontando o dito na Constituição de 1988, dai para uma melhor análise desta diferença no direito sucessório está disposta no artigo 1.838 do Código Civil, o seguinte: 37 Art. 1.838. Em falta de descendentes e ascendentes, será deferida a sucessão por inteiro teor ao cônjuge sobrevivente. Entende-se neste artigo supra que cabe ao cônjuge sobrevivente e não ao companheiro em caso da falta de descendentes ou ascendentes, na abertura da sucessão participar de todos os bens do falecido, mesmo sendo ele do regime da comunhão parcial de bens sejam eles bens comuns ao casal e ou ainda os bens particulares, onde será entregue ao cônjuge vivo casado, o privilégio de receber na sua integralidade a herança, pois é sabido que nunca colaborou onerosamente para constituição daquele bem particular. Compreende-se que até mesmo no regime da comunhão parcial de bens o cônjuge participa dos bens também adquiridos anteriormente a constituição do matrimônio, sabendo que o regime parcial de bens permite que os bens particulares se comuniquem no casamento dos cônjuges. Nesse sentido assevera Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka, diretora do Instituto Brasileiro de Direito de Família – (IBDFAM 2006), que aponta a inconstitucionalidade da interpretação do tratamento diferenciado dado ao companheiro em relação ao cônjuge, como se leciona: A Inconstitucionalidade, data vênia, não reside em conceder menos herança para companheiros, mas no tratamento diferenciado dispensado a família. As entidades familiares tem que ser tratadas isonomicamente. A família decorrente do casamento não pode jamais receber mais ou menos bens os parentes que constituem a família originária de união estável. (...) O que é inadmissível é a diferenciação de tratamento destinado aos parentes por causa da origem desta família. A Constituição não igualou o companheiro ao cônjuge, mas garantiu a mesma proteção à família independente de sua origem. Todos são iguais perante a lei. Não tem qualquer sentido os parentes daquele que vivia em união estável receber menos ou mais herança que os parentes da pessoa casada. (...) Dar mais direitos à família da pessoa casada em detrimento da família decorrente de união estável, ou o contrário, preferir a família da união à família constituída pelo casamento é absolutamente inconstitucional. O interesse constitucional não é o de igualar o cônjuge ao companheiro ou vice- versa, mas o de garantir que a família, independente de sua origem venha ter seu direito sucessório prejudicado por ter tido em sua origem o casamento ou a união estável, mas a manifestação da vontade do homem e da mulher em construir uma família. Nestes termos ainda completa Carlos Eduardo de Castro Palermo, após o estudo realizado pelo Instituto Brasileiro da Família, afigurando-se oportuna a transcrição da justificativa apresentada: 38 Deve-se abolir qualquer regra que corra em sentido contrário à equalização do cônjuge e do companheiro, conforme revolucionário comando constitucional que prescreve a ampliação do conceito de família, protegendo de forma igualitária todos os seus membros, sejam eles próprios participes do casamento ou da união estável, como também os seus descendentes. A equalização preconizada produzirá a harmonização do Código Civil com os avanços doutrinários e com as conquistas jurisprudenciais correspondentes, abonando quase um século de vigoroso acesso à justiça, e de garantia da paz familiar. (...) Assim sendo, pugna-se pela alteração dos dispositivos nos quais a referida equalização não esteja presente. O caminho da alteração legislativa, nesses casos, se mostra certamente imprescindível, por restar indene de dúvida que a eventual solução hermenêutica não se mostraria suficiente para a produção de uma justiça harmoniosa e coerente, senão depois de muito tempo, com a consolidação de futuro entendimento sumulado, o que deixaria o indesejável rastro, por décadas quiçá, de se multiplicarem
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