Buscar

Resenha Crítica do Livro Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis com discussões de teóricos

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 3 páginas

Prévia do material em texto

RESENHA CRÍTICA POR MARCELO LUCAS
Das dissimulações ao pessimismo: Brás Cubas como ferramenta da crítica machadiana ao Brasil contemporâneo
	Publicado no ano de 1881 pela editora Tipografia Nacional e escrito por Joaquim Maria Machado de Assis, o romance Memórias Póstumas de Brás Cubas, que possui 160 capítulos, reúne temas como a escravidão, as classe sociais, o cientificismo e o positivismo da época. Fundador da Academia Brasileira de Letras, Machado de Assis é considerado pela crítica como um dos maiores nomes da literatura do Brasil, pois, além de jornalista e crítico literário, foi inventor de obras que compreendem boa parte dos gêneros da literatura. O autor de Ressurreição (1872), Helena (1876), Quincas Borba (1891) e Dom Casmurro (1899), em Memórias Póstumas, rompe com a narração linear e com o objetivismo de autores dos cânones da época. Logo, busca retratar, além do Rio de Janeiro, a sociedade em geral com pessimismo, ironia e indiferença, tornando assim esse romance, como diria Alfredo Bosi em documentário a TV Cultura, uma das maiores inovações formais jamais usadas na literatura brasileira, pois apresenta marcas de progresso para o panorama histórico-literário, como a universalidade dos temas e a multissignificação da linguagem (TV CULTURA, 2015). 
Já dizia o ditado popular: “Ao mentiroso convém ter boas memórias”. É partindo dessa premissa que situaremos Brás Cubas — sujeito medíocre, ocioso, mau caráter e extremamente vaidoso — tão vaidoso que atreve-se, mesmo depois de morto, a escrever com a pena da galhofa e a tinta da melancolia um livro intitulado: Memórias Póstumas de Brás Cubas. Em uma espécie de autobiografia póstuma, Brás Cubas compartilha em seu livro as diversas situações de sua existência e do que seria uma das suas maiores conquistas em vida: lançar o Emplasto Brás Cubas. Entretanto, o feito de Brás Cubas é de uma total banalidade, e apesar de seu pai alerta-lo que era preciso ter um bom casamento e que não poderia viver sua vida de forma obscura, o nosso defunto-autor não se casa, não tem uma vida política sustentada e nem é capaz de transmitir a uma criatura, no caso a um filho, o legado de sua miséria. O que seria então sua última façanha para alcançar a glória, um emplasto anti-hipocondríaco capaz de curar a melancolia humana, torna-se na verdade, a causa de sua morte: nos preparos desse medicamento sem eficácia científica e baseado nas crenças religiosas, Brás Cubas recebe uma corrente de ar e é acometido por uma pneumonia.
 	Brás Cubas representa a aristocracia muito comum no Brasil império, de pessoas ricas que não trabalhavam mas sentiam uma grande necessidade de reconhecimento. É um narrador brasileiro, proprietário de escravos e que leva uma vida caprichosa, contada de maneira caprichosa (TV CULTURA, 2016). A engenhosidade dessa obra, podemos por assim dizer, está na contemplação de aspectos até então desconhecidos pela literatura brasileira: no tratamento do personagem-narrador e leitor, onde a cada momento do livro o narrador muda de estilo repentinamente, tentando estabelecer uma certa superioridade em relação a quem está lendo; nas constantes intromissões de Brás Cubas a narrativa, tornando uma escrita digressiva e fragmentada (com seus comentários filosóficos e metalinguísticos) e impedindo muitas vezes o curso da história; na formulação peculiar de capítulos, com microcapítulos compostos apenas por sinais de pontuação; além do humor e ironia como recursos estruturantes da obra, e que estão presentes na própria dedicatória do livro, na carta ao leitor e na circunstância de um defunto autor. 
A esta narrativa, o Bruxo do Cosme Velho concebe a sua fase de escrita amadurecida, correspondente ao que coloca a crítica literária da época como a sua segunda fase. Assim, o romance é considerado um divisor de águas, pois, apesar de possuir características intrínsecas à estética realista (o pessimismo, a visão negativa do homem e de suas relações fruto do realismo psicológico e a economia vocabular), Machado de Assis assume uma postura inovadora ao romper com as tendências literárias dominantes da época. Nem tão realista, que segue a teoria de Flaubert, do "romance que narra a si próprio" e que apaga o narrador atrás da objetividade da narrativa; tampouco naturalista, baseado no que Zola pregava o "inventário maciço da realidade" (COUTINHO, 1986). 
Desse modo, a narração de Memórias Póstumas de Brás Cubas afasta-se do princípio básico de verossimilhança que o Realismo pregava, visto que, quem fala é capaz de pensar e expor suas ideias, situação a qual Brás Cubas, como um narrador cadáver, não é capaz de fazer. Em consonância ao que defende Castello (1953, p. 439), Machado de Assis não deve ser classificado a rigor no conceito das escolas literárias como realismo, naturalismo e romantismo, pois é um “escritor de formação segura, coerente, senhor dos seus processos e possuidor de uma estética bem definida e orientada pelo bom senso”. 
Apesar da narração não possuir uma sequência de fatos, iniciando da morte de Brás Cubas e só depois tratar de seu nascimento, não há grandes prejuízos à compreensão do romance. A essa leitura, se faz pertinente não somente aos que tratam do estudo das letras, mas por todos aqueles que, além do prazer de ler, buscam o entendimento das relações sociais e dos indivíduos, uma vez que, a história é permeada pela reflexão das questões fundamentais do ser humano. Além disso, podemos associar essa narrativa do século XIX ao que vivenciamos no Brasil três séculos depois. Comparando principalmente o Emplasto Brás Cubas ao uso do medicamento “cloroquina” propagado por grandes líderes políticos como a cura da Covid-19, inferimos que ambos os remédios: não possuem eficácia comprovada cientificamente; os discursos religiosos se dão como justificativas para o uso; existem interesses totalmente econômicos, além do alcance da glória ao apresentar para sociedade um medicamento de cura milagrosa. Diante do exposto, levantamos o questionamento: a escrita machadiana é realmente moderna e contemporânea ou a sociedade brasileira não avançou?
REFERÊNCIAS
ASSIS, Machado de. Memórias póstumas de Brás Cubas. São Paulo: Ática, 1994.
______. Várias histórias. São Paulo: Ática, 2001.
CASTELLO, José Aderaldo. Aspectos do Realismo-Naturalismo no Brasil. In: Revista de História. São
Paulo. v. 6, n. 14, 1953.
COUTINHO, Afrânio (direção). A Literatura no Brasil. 3ª ed. Revista e atualizada. Rio: José Olympio, 1986 (Vol. IV).
MACHADO de Assis: a vida é boa. TV Escola. [S. l.], [2015], 1 vídeo (50 min). Publicado pelo canal Rogério Aro. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=HI7OgwvNJ2Q. Acesso em: 11 ago. 2021. 
MESTRES da literatura – Machado de Assis: um mestre na periferia. TV Escola. [S. l.], [2016], 1 vídeo (25 min). Publicado pelo canal Livraria Guia. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=GrsGfvsjkEM. Acesso em: 11 ago. 2021.

Continue navegando