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DIREITO CIVIL III: TEORIA GERAL DOS CONTRATOS Patricia Fernandes Fraga Classificação dos contratos Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Identificar as diversas formas de classificação dos contratos. Caracterizar cada uma das formas de classificação dos contratos. Interpretar as decisões de tribunais que tratem da classificação dos contratos. Introdução O Direito é uno. A divisão por ramos — como Direito Penal, Constitucional e Civil — é uma forma de facilitar, didaticamente, a compreensão do fenômeno jurídico. No Direito dos Contratos, realiza-se a mesma técnica, seccionando o estudo contratual pela sua natureza jurídica, definição, características e classificação. Considerando que os contratos são instrumentos de suma relevância social, econômica e, por conseguinte, jurídica, a sua análise pormeno- rizada é fundamental. O estudo da classificação dos contratos permite desvendar peculiaridades desses instrumentos negociais que repercutirão nos seus efeitos. Em outras palavras, as peculiaridades de cada contrato servirão de guia para a avaliação da sua validade e eficácia. Neste capítulo, você vai ler sobre a classificação dos contratos, conhe- cer as formas de classificação e verificar como os tribunais se posicionam acerca do tema para resolver as questões concretas. Formas de classificação dos contratos Serão apresentadas, nesta seção, as formas mais usuais de classifi cação dos contratos. Por parecer mais coerente, iniciaremos pela classifi cação dada pelo Direito Romano. No Direito Romano, para haver contrato, deveriam ser utilizados deter- minados objetos, pessoas, palavras apropriadas ou, ainda, gestos simbólicos, C02_Direito_Civil_III.indd 1 24/08/2018 10:27:45 de modo a confirmar a vontade de se vincular dos sujeitos (GIRARDI, 1984). Conforme as Institutas de Gaio, os contratos eram distintos, ou classificados, por meio de quatro modalidades (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2010), conforme Quadro 1. Fonte: Adaptado de Girardi (1984). Reais Contratos que exigiam a entrega da coisa. P.ex.: atualmente, enquadram-se nessa classificação os contratos de comodato, mútuo, depósito e penhor. Consensuais Contratos concluídos apenas com o consenso, com o acordo de vontades, não necessitando da entrega da coisa. Os contratos consensuais, ou convencionais, baseavam-se na boa-fé, na confiança das partes, que “assumiam compromisso de honra” (GIRARDI, 1984, p. 68) e manifestavam o seu consentimento dando as mãos olhando para o templo da deusa Bona Fides (vinculação também religiosa). P.ex.: atualmente, enquadram-se nessa classificação os contratos de compra e venda, locação, mandato, doação, troca, entre outros. Verbais ou orais Contratos que se perfaziam por meio da enunciação de certas palavras que vinculavam os sujeitos (em regra, cidadãos romanos). A formalidade consistia no uso de determinadas palavras, como: Spondes? — Spondeo!; Promittis? — Promitto!; Dabis? — Dabo! Literais Eram os contratos escritos. A origem desses contratos estaria no livro de contas dos indivíduos, no qual eram lançados os créditos e as dívidas. A transcrição dava origem e comprovava a existência do contrato. Quadro 1. Classificação dos contratos Essa forma de classificação romana adequava-se a um momento histórico, econômico, social e jurídico, em que ainda não havia uma profusão de relações negociais tão vasta e complexa como a atual. Agora, passaremos, então, às formas contemporâneas de classificação contratual. A primeira forma de classificar os contratos será analisá-los sem qualquer relação com outros, ou seja, de forma autônoma: considerados em si mesmos. A segunda forma de classificá-los, neste capítulo, considera a relação dos contratos uns com os outros, consoante a sua relação de dependência, ou seja, os contratos reciprocamente considerados. Classificação dos contratos2 C02_Direito_Civil_III.indd 2 24/08/2018 10:27:45 Ressaltamos que nem todos os doutrinadores seguem a mesma estrutura de classificação. Neste capítulo, optamos pela forma de classificação adotada por Gagliano e Pamplona Filho (2010). O Quadro 2 apresenta os tipos de contratos considerados em si mesmos. Contratos considerados em si mesmos Quanto à prestação pactuada ou à natureza da obrigação Contratos unilaterais, bilaterais ou plurilaterais Contratos onerosos ou gratuitos Contratos comutativos ou aleatórios Contratos paritários ou por adesão Contratos evolutivos Quanto à disciplina jurídica Quanto à forma Contratos solenes ou não-solenes Contratos consensuais ou reais Quanto à designação ou à disciplina legal específica Quanto à pessoa do contratante Contratos pessoais ou impessoais Contratos individuais ou coletivos Quanto ao tempo Em razão da função econômica Quadro 2. Tipos de contratos considerados em si mesmos O Quadro 3 apresenta os tipos de contratos reciprocamente considerados. Contratos reciprocamente considerados Quanto à relação de dependência Contratos principais ou acessórios Quanto à definitividade Contratos preliminares ou definitivos Quadro 3. Tipos de contratos reciprocamente considerados 3Classificação dos contratos C02_Direito_Civil_III.indd 3 24/08/2018 10:27:45 Contratos considerados em si mesmos A seguir, serão abordados os tipos de contratos considerados em si mesmos. Quanto à prestação pactuada ou à natureza da obrigação Abordaremos a seguir os tipos de contratos considerados quanto à prestação pactuada ou à natureza da obrigação. Contratos unilaterais, bilaterais ou plurilaterais Como ensina Pereira (2017), todo contrato é negócio jurídico bilateral, visto que a sua constituição requer a manifestação de vontade das partes para a formação do consenso. Essa categorização dos contratos como negócios jurídicos bilaterais é diversa da classifi cação dos contratos como unilaterais, bilaterais ou plurilaterais. Assim, a bilateralidade dos negócios jurídicos contratuais é seu elemento constitutivo — sem ela, não há contrato. Entretanto, os contratos, cuja natureza jurídica é de negócios jurídicos bilaterais podem ser classificados segundo a forma como a prestação foi acordada pelas partes ou segundo os efeitos obrigacionais ajustados, como unilaterais, bilaterais ou plurilaterais. Unilaterais — há, nos contratos unilaterais, a imposição de direitos e obriga- ções para apenas uma das partes do negócio. Signifi ca dizer que: [...] quando o contrato estabelecer apenas uma “via de mão única”, com as partes em posição estática de credor e devedor, pelo fato de se estabelecer uma prestação pecuniária apenas para uma das partes, como na doação sim- ples, falar-se-á em contrato unilateral (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2010, p. 112). De modo simplificado, pode-se afirmar que unilaterais “[...] são os contratos que criam obrigações unicamente para uma das partes” (GONÇALVES, 2010, p. 90). São exemplos de contratos unilaterais: comodato; mútuo; depósito; Classificação dos contratos4 C02_Direito_Civil_III.indd 4 24/08/2018 10:27:45 mandato; doação; fiança. Bilaterais — há, nos contratos bilaterais, a imposição de direitos e obriga- ções para ambos contraentes (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2010). São exemplos de contratos bilaterais: compra e venda — gera a obrigação de pagar o preço para o devedor e de entregar a coisa por parte do credor. troca ou permuta — gera a obrigação mútua aos contratantes de entregar um bem por outro bem. locação — obriga o proprietário a permitir o uso do bem locado e obriga o outro contratante a pagar o preço por se utilizar de coisa alheia. Doutrinariamente, é comum encontrar as expressões contrato bilateral e contrato sinalagmático como sinônimas, pois todo contrato sinalagmático é bilateral. Porém, podem ser notadas algumas distinções. O sinalagma é a mútua dependência das obrigações em um contrato. Traduz a relação ou o nexo decausalidade (reciprocidade) entre as prestações opostas pac- tuadas — a prestação de uma parte é a causa da prestação da outra (o vendedor entrega a coisa para receber o preço; o comprador entrega o preço para receber a coisa — a obrigação do vendedor de transferir a propriedade da coisa é correlata, é recíproca, à obrigação do comprador, de pagar o preço). Em outras palavras, as partes são reciprocamente credoras e devedoras uma da outra. Se uma obrigação deixa de ser cumprida, a outra perde sua causa de existir. A diferença técnica entre a bilateralidade e o sinalagma consistiria no fato de a bilateralidade dizer respeito à existência, em um contrato, de obrigações para ambas as partes, enquanto que, no sinalagma, essas obrigações teriam de ser recíprocas. Nesse sentido, uma doação com encargo (por exemplo, dar uma moto desde que a outra parte faça uma doação de roupas e cobertores a uma instituição de caridade), por exemplo, não pode ser considerada sinalagmática, vez que, embora haja obrigações para ambos contratantes, a prestação de um não é causa da prestação do outro (a doação da moto é mera liberalidade; a doação de roupas e cobertores é apenas um ônus a ser desempenhado para garantir a doação prometida), pois o encargo não é o preço a ser pago, não configura permuta e não necessariamente se reverte em prol do doador. Desse modo, há dificuldade em classificar esse tipo de contrato — doação com encargo — sendo, por vezes, classificado como unilateral impuro ou, ainda, como bilateral imperfeito (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2010). 5Classificação dos contratos C02_Direito_Civil_III.indd 5 24/08/2018 10:27:45 Plurilaterais (ou multilaterais) — são os contratos que necessitam de mais de dois contraentes, tendo todos eles prestações a serem cumpridas. São exemplos de contratos plurilaterais (GONÇALVES, 2010): contrato de sociedade; contratos de consórcio; contrato de condomínio. A pluralidade de partes é diversa da mera pluralidade de pessoas. Um contrato em que vários amigos contratam uma banda para animar sua festa não é plurila- teral, mas bilateral, polarizado entre credores e devedores. Para haver pluralidade de partes, vários contratantes emitem suas vontades, cada uma representando seus próprios interesses, como no contrato de sociedade (PEREIRA, 2017). Sobre as consequências da bilateralidade, em função de haver obrigações para ambas as partes contratantes, surgem consequências jurídicas relevantes nos contratos bilaterais (GONÇALVES, 2010, GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2010), como: Cláusula resolutiva expressa ou tácita — mesmo que não esteja expressamente previsto no contrato que o descumprimento contratual propicia a resolução do vínculo, o inadimplemento culposo da prestação por uma das partes dá justa causa à outra parte, caso não tenha mais interesse no adimplemento, para pedir a resolução do contrato. O art. 475 do Código Civil dispõe: “A parte lesada pelo inadimplemento pode pedir a resolução do contrato, se não preferir exigir-lhe o cumprimento, cabendo, em qualquer dos casos, indenização por perdas e danos” (BRASIL, 2002, documento on-line). Exceção de contrato não cumprido ou exceptio non adimpleti con- tractus — o art. 476 do Código Civil dispõe: “Nos contratos bilaterais, nenhum dos contratantes, antes de cumprida a sua obrigação, pode exigir o implemento da do outro. Trata-se de exceção (defesa) a ser oposta pelo devedor, quando da exigência do cumprimento de sua obrigação contratual, em razão da contraparte sequer ter cumprido a sua obrigação”. Na mesma linha, o art. 477 do Código Civil dispõe que: Se, depois de concluído o contrato, sobrevier a uma das partes contratantes diminuição em seu patrimônio capaz de comprometer ou tornar duvidosa a prestação pela qual se obrigou, pode a outra recusar-se à prestação que lhe incumbe, até que aquela satisfaça a que lhe compete ou dê garantia bastante de satisfazê-la (BRASIL, 2002, documento on-line). Classificação dos contratos6 C02_Direito_Civil_III.indd 6 24/08/2018 10:27:45 Enriquecimento sem causa — também não é possível ocorrer nos contratos unilaterais, apenas nos contratos em que todos os partícipes têm direito e obrigações. Configura-se no incremento do patrimônio de alguém em detrimento do patrimônio de outrem, sem que exista causa juridicamente idônea que justifique essa situação. No enriquecimento sem causa, deixa de haver o equilíbrio entre as obrigações acertadas pelas partes. Um exemplo é o comprador que paga o preço e não recebe a coisa ou o contratante que paga pelo serviço e não recebe a prestação de serviços do contratado. Desaparecimento da base contratual — ao tempo do negócio, a presta- ção e contraprestação devem ser equivalentes no julgamento das partes contratantes (a equivalência não é considerada objetivamente, basta que cada parte compreenda estar recebendo compensação suficiente ao seu sacrifício). Os contratos bilaterais necessitam dessa equivalência entre as prestações, pois é da essência do negócio. Assim, se um evento futuro transformar as circunstâncias nas quais o contrato foi firmado, a ponto de a relação de equivalência desaparecer, podemos dizer que a base do contrato também deixou de existir — essa situação pode dar ensejo à resolução ou à revisão contratual. Riscos contratuais — a teoria dos riscos, em que se procura apurar qual dos contratantes responderá nos casos de perda da coisa ou im- possibilidade de cumprimento, só se aplica aos contratos bilaterais. Vícios redibitórios — em regra, somente nos contratos bilaterais e one- rosos, poderá ser reivindicada a resolução do contrato ou o abatimento do preço, caso existam vícios ocultos na coisa que a tornem imprópria para uso ou diminuam o seu valor (BRASIL, 2002, art. 441). Chamamos de autocontrato quando há um sujeito dotado de poderes de represen- tação que efetua compra e venda consigo mesmo (de um lado, agindo em nome e no interesse de terceiros, como representante apenas, e de outro, agindo em nome próprio). O autocontrato não altera a bilateralidade do negócio jurídico contratual. O contrato realizado pelo representante consigo mesmo é contrato bilateral — a dita unilateralidade no autocontrato é superficial, pois o mandatário age, na realidade, em nome e no interesse de outro, o mandante. 7Classificação dos contratos C02_Direito_Civil_III.indd 7 24/08/2018 10:27:45 Contratos onerosos ou gratuitos (ou benéficos) A classifi cação dos contratos em onerosos ou gratuitos considera como são distribuídas as vantagens e os ônus patrimoniais entre os contraentes. Onerosos — nos contratos onerosos há vantagens e ônus para ambos os contratantes. Tartuce (2017, p. 22) ensina que: Os contratos onerosos são aqueles que trazem vantagens para ambos os con- tratantes, pois ambos sofrem o mencionado sacrifício patrimonial (ideia de proveito alcançado). Ambas as partes assumem deveres obrigacionais, havendo um direito subjetivo de exigi-lo. Há uma prestação e uma contraprestação. Gratuitos — nos contratos gratuitos, ou benéfi cos, apenas uma das partes auferirá benefícios, enquanto a outra apenas obrigações, como na doação pura, no comodato, entre outros. A onerosidade da prestação de uma das partes não poderá ser excessiva, sob pena de enriquecimento sem causa da outra parte. Não há responsabilidade por vícios redibitórios ou evicção nos contratos gratuitos, somente nos onerosos, consoante arts. 441 e 447 do Código Civil (BRASIL, 2002). A maioria dos contratos unilaterais é gratuita, mas há exceções. No con- trato de mútuo feneratício, mais conhecido como contrato de empréstimo bancário, embora seja um contrato unilateral (obrigação de restituir o valor emprestado apenas para o mutuário), o contratante deverá pagar juros, que representam a onerosidade contratual, pela vantagem que obteve em utilizar o dinheiro alheio pelo período contratado (TARTUCE, 2017). Portanto, é exemplo de um contrato unilaterale oneroso. A interpretação dos contratos gratuitos será sempre mais restritiva do que a dos onerosos, isso porque diz respeito a uma liberalidade, conferindo maior proteção ao contratante que agiu por generosidade, gratuitamente. Contratos comutativos ou aleatórios Os contratos cumulativos ou aleatórios são uma subdivisão dos contratos bilaterais (PEREIRA, 2017). Comutativos (ou pré-estimados) — nos contratos comutativos, as partes sabem, desde o início, quais serão suas prestações, isto é, não existe o fator Classificação dos contratos8 C02_Direito_Civil_III.indd 8 24/08/2018 10:27:45 risco inserido nas prestações. Clareando a compreensão, são comutativos os contratos em que as prestações de ambas as partes são de antemão conhecidas e guardam entre si uma relativa equivalência de valores (PEREIRA, 2017). São exemplos: troca; compra e venda de coisa certa; locação. Aleatórios (ou de esperança) — nos contratos aleatórios (álea = risco/sorte), não haverá certeza quanto à ocorrência de, pelo menos, uma prestação. Sig- nifi ca dizer que a prestação, ou ainda, a vantagem esperada por uma das partes somente poderá ser exigida em função de evento futuro e incerto. São exemplos de contratos aleatórios: contratos de seguro; contrato de esperança ou de safra; jogo (máquina de pegar bichinhos de pelúcia, entre outros); aposta (loteria, entre outros). Não caberá a rescisão contratual por lesão, nem mesmo ação redibitória, nos contratos classificados como aleatórios. Ademais, a resolução ou revisão por onerosidade excessiva apenas caberá nos casos em que o evento superve- niente, imprevisível e extraordinário não se relacionar com o risco assumido contratualmente (PEREIRA, 2017). A compra e a venda, embora sejam geralmente um contrato comutativo, podem configurar contrato aleatório, como nos seguintes exemplos: Emptio spei — contrato de compra de coisa futura, com assunção de risco pela existência (art. 458 do Código Civil: “Se o contrato for aleatório, por dizer respeito a coisas ou fatos futuros, cujo risco de não virem a existir um dos contratantes assuma, terá o outro direito de receber integralmente o que lhe foi prometido, desde que de sua parte não tenha havido dolo ou culpa, ainda que nada do avençado venha a existir”) (BRASIL, 2002, documento on-line). Nesse tipo de compra e venda, o comprador assume o risco de o objeto da compra e venda não existir. Como exemplo, citamos a máquina de pegar bichinhos de pelúcia: se a contratante não conseguir retirar nenhum bichinho da máquina, não terá devolvido o valor gasto pela tentativa. 9Classificação dos contratos C02_Direito_Civil_III.indd 9 24/08/2018 10:27:46 Emptio rei speratae — contrato de compra de coisa futura, sem assunção de risco pela existência (art. 459 do Código Civil: “Se for aleatório, por serem objeto dele coisas futuras, tomando o adquirente a si o risco de virem a existir em qualquer quantidade, terá também direito o alienante a todo o preço, desde que de sua parte não tiver concorrido culpa, ainda que a coisa venha a existir em quantidade inferior à esperada. Parágrafo único. Mas, se dá coisa nada vier a existir, alienação não haverá, e o alienante restituirá o preço recebido”) (BRASIL, 2002, documento on- -line). Nesse tipo de compra e venda, o comprador não assume o risco pela inexistência da coisa, apenas arrisca-se a receber menos do que o desejado. Utilizando o exemplo da máquina de retirar bichinhos de pelúcia, caso a contratante não conseguisse retirar nenhum bichinho, poderia exigir restituição do valor pago; ou ainda, caso contratasse objetivando retirar dois bichinhos, na mesma jogada, mas, ao fazer sua mira, a garra da máquina acabasse pegando apenas um, teria de ficar com o único que foi obtido, sem restituição do que pagou para jogar. Contratos paritários ou por adesão Paritários — quando o contrato é paritário, as partes encontram-se em situ- ação de igualdade na negociação do conteúdo do contrato, estabelecendo as cláusulas contratuais. Os contratos paritários permitem que as partes esco- lham livremente o conteúdo do contrato de forma mais equitativa. Contudo, direcionado a uma relação contratual individualizada, esse tipo de contrato encarece a negociação (agrega custos) — o próprio custo do tempo, nessas negociações contratuais, chamado de custo de transação (COOTER; ULEN, 2010), deve ser contabilizado. Adesão — ocorre quando por adesão o conteúdo do contrato foi predisposto pelo proponente. Desse modo, a outra parte, o aderente, não delibera acerca das cláusulas (não exerce sua liberdade contratual), apenas aceita (adere) contratar se tiver interesse no produto ou no serviço — persiste, apenas, a liberdade de contratar ou não contratar. Nesse tipo de instrumento contratual, as cláusulas são genericamente confeccionadas para um grupo não individu- alizado de pessoas, ou seja, para a massa. Considerando que não se permite discussão do conteúdo contratual, há uma redução dos custos de transação, assim como garantia de que diferentes sujeitos irão contratar sob as mesmas condições — igualdade e homogeneidade no tratamento dos contratantes. Por outro lado, em razão de ser unilateralmente estipulado, pode dar margem a Classificação dos contratos10 C02_Direito_Civil_III.indd 10 24/08/2018 10:27:46 abusos, isto é, o proponente pode se valer da sua vantagem contratual para realizar um clausulado totalmente em desfavor do aderente. Para evitar abuso, ou oportunismo, nos contratos por adesão, em vez de proibi-los, já que im- prescindíveis e inevitáveis na sociedade de consumo, a legislação e o Poder Judiciário controlam e limitam essa modalidade de contratar — nesse sentido, dispõe o art. 423 do Código Civil: “Quando houver no contrato de adesão cláusulas ambíguas ou contraditórias, dever-se-á adotar a interpretação mais favorável ao aderente” (BRASIL, 2002, documento on-line). Contrato-tipo — há a possibilidade de negociar as cláusulas contratuais, embora, inicialmente, ele venha predisposto por um dos contratantes — nor- malmente, é realizado por empresas e seus clientes ou fornecedores, não sendo destinados a toda a massa, mas a um grupo identifi cável de contratantes (PEREIRA, 2017). Contratos evolutivos Os contratos evolutivos são uma classifi cação proposta pelo professor Arnoldo Wald, que, em geral, diz respeito aos contratos administrativos, nos quais parte das cláusulas contratuais é estática e outra dinâmica, pois obedecem às normas legais, logo, alterando-se conforme a alteração legislativa (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2010). Dessa forma, é possível compensar, no curso da contratação, eventuais alterações na equação fi nanceira do contrato. São exemplos os contratos do Sistema Financeiro de Habitação, Financiamento Estudantil, entre outros. Quanto à disciplina jurídica Nesta classifi cação, os contratos são qualifi cados de acordo com a disciplina, ou melhor, com o microssistema jurídico do qual fazem parte. São exemplos os seguintes contratos: civis; consumeristas; comerciais; administrativos; trabalhistas. 11Classificação dos contratos C02_Direito_Civil_III.indd 11 24/08/2018 10:27:46 Quanto à forma ou quanto às exigências para a sua constituição Nessa classifi cação, os contratos são qualifi cados de acordo com a forma em: Solenes ou formais — serão formais aqueles contratos cuja validade depende de forma estabelecida em lei. São exemplos a compra e a venda de imóvel de valor superior a 30 salários-mínimos — conforme art. 108 do Código Civil: Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País (BRASIL, 2002, documento on-line). Não solenes ou informais — essa classifi cação diz respeito à maioria dos contratos. O contratoé não solene ou informal quando sua forma é livre, não necessitando cumprir formalidade imposta em lei, como dispõe o art. 107 do Código Civil: “A validade da declaração de vontade não dependerá de forma especial, senão quando a lei expressamente a exigir” (BRASIL, 2002, documento on-line). São exemplos os contratos de compra e venda de bens de consumo em geral e de prestação de serviços em geral. Os contratos consensuais ou reais se relacionam com a maneira como o contrato é concluído, perfectibilizado: Consensuais — os contratos consensuais são aqueles que se aperfeiçoam, que se tornam perfeitamente constituídos, apenas com o consentimento das partes, bastando-lhes o consenso. São exemplos: locação; compra e venda; mandato. Reais — são reais os contratos que só se aperfeiçoam com a entrega da coisa que constitui seu objeto, pois apenas o consentimento das partes não basta para o contrato estar constituído. A entrega da coisa (tradição), nos contratos reais, é consi- derada requisito de existência (VENOSA apud GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2010), portanto, enquanto não tiver sido entregue o bem, haverá no máximo uma promessa de contratar. Signifi ca dizer que, ao contratar um empréstimo bancário (contrato de mútuo feneratício), o correntista não será considerado devedor antes Classificação dos contratos12 C02_Direito_Civil_III.indd 12 24/08/2018 10:27:46 que o valor do empréstimo esteja em sua conta corrente; ou, se o sujeito contratar um comodato, antes de sair da biblioteca com a posse do livro. São exemplos: comodato; mútuo; depósito; penhor. Em geral, os contratos reais são também unilaterais, pois, após a entrega do bem, momento de constituição do negócio, só há obrigação de restituição da coisa por aquele que a possui (o penhor, por outro lado, seria uma exceção — um contratante paga os juros e o outro devolve o bem que ficou como garantia). Quanto à designação ou disciplina legal específica Nesta classifi cação, os contratos são qualifi cados em nominados ou inominados: Nominados — possuem nomen juris específi co. Serão nominados os contratos que tiverem terminologia ou nomenclatura defi nida. Podemos, assim, concluir que todos os contratos típicos são nominados, já que possuem nomenclatura própria. São exemplos a compra e venda, comodato, entre outros. Outrossim, boa parte dos contratos atípicos também é nominada, como o leasing, a hospedagem, entre outros. Inominados — contratos que não possuem nomenclatura defi nida. Seriam as fi guras contratuais novas ou aquelas que conjugam diversos tipos de contratos, fruto da autonomia privada e sem designação específi ca. Nesta classificação, os contratos são qualificados em típicos ou atípicos: Típicos — são aqueles que têm previsibilidade legal, ou seja, aqueles regulados pelo Direito Positivo. São os contratos dispostos pela legislação em vigor. São exemplos: compra e venda; doação; locação; depósito; seguro; comodato; mútuo. 13Classificação dos contratos C02_Direito_Civil_III.indd 13 24/08/2018 10:27:46 Atípicos — são aqueles não regulados em lei, como, por exemplo, os contratos de hospedagem, factoring e leasing, entre tantos outros. Atípico é um contrato não disciplinado pelo ordenamento jurídico, embora lícito, pelo fato de restar sujeito às normas gerais do contrato e não contrariar a lei, os bons costumes ou os princípios gerais do Direito. Igualmente aos contratos típicos, os contratos atípicos devem seguir as disposições normativas dos arts. 421 e 422 do Código Civil (BRASIL, 2002, documento on-line): Art. 421 A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato. Art. 422 Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé. O Quadro 4 apresenta os contratos quanto à designação ou disciplina legal específica. Contratos Nominados Inominados Típicos Todos os contratos típicos são nominados. Não há. Atípicos Contratos atípicos nominados: contrato de publicidade, de garagem, de excursão turística, leasing, espetáculos artísticos, feiras e exposições, serviços de bufê em geral, mudança, manutenção de equipamentos, entre outros. Todos aqueles que surgirem da autonomia privada ou da conjugação de elementos de contratos já tipificados. Quadro 4. Contratos quanto à designação ou disciplina legal específica Quanto à pessoa do contratante Nesta classifi cação, os contratos são qualifi cados em pessoais ou impessoais: Pessoais (ou personalíssimos) — celebrados em razão da pessoa contratada, por vínculo de confi ança, por suas qualidades técnicas, artísticas. São, por isso, intransmissíveis, não podendo ser executados por outros; são também chamados de personalíssimos, ou intuitu personae, de modo que a pessoa não pode se fazer substituir por outra. São exemplos o contrato de trabalho e a prestação de Classificação dos contratos14 C02_Direito_Civil_III.indd 14 24/08/2018 10:27:46 serviços de artistas em geral. No caso de descumprimento culposo, difi cilmente o prejudicado conseguirá a tutela específi ca contratada, tendo como consequência, na maioria das vezes, somente a indenização por perdas e danos. Impessoais — nesses contratos, interessa apenas o resultado da atividade contra- tada, independentemente da pessoa que irá realizá-la. Segundo Gonçalves (2010, p. 102), os “contratos impessoais são aqueles cuja prestação pode ser cumprida, indiferentemente, pelo obrigado ou por terceiro. O importante é que seja realizada, pouco importando quem a executa, pois, o seu objeto não requer qualidades espe- ciais do devedor”. São exemplos a compra e venda, a troca ou permuta, entre outros. Nesta classificação, os contratos são qualificados em individuais ou co- letivos (PEREIRA, 2017): Individuais — aqueles formados pelo consentimento de pessoas, cujas von- tades são individualmente consideradas, mesmo que atuem em grupos. São exemplos a doação de roupas para um grupo de moradores de rua, a contratação de um serviço de buffet, entre outros. Coletivos — utilizados, normalmente, nas relações entre patrão e empregados, em razão de que os sindicatos ou as associações acabam por representar uma coletividade e não uma parte individualizada. São exemplos a convenção coletiva de trabalho, o acordo coletivo de trabalho, entre outros. Quanto ao tempo ou ao momento do cumprimento Nesta classifi cação, os contratos são qualifi cados quanto ao tempo ou ao momento do cumprimento: Contratos de execução instantânea ou instantâneos — relações jurídicas contratuais cujos efeitos são produzidos de uma só vez. Nas palavras de Pereira (2017, p. 62), nos contratos de execução instantânea, “[...] a solução se efetua de uma só vez e por prestação única, tendo por efeitos extinção cabal da obrigação”. Signifi ca dizer que não há período entre a conclusão e a execução do contrato. É exemplo a compra e venda à vista. Contratos de execução diferida ou retardada — nessa classifi cação, serão utilizados os ensinamentos dos professores Pereira (2017) e Lôbo (2011), que entendem que os contratos de execução diferida são aqueles em que a 15Classificação dos contratos C02_Direito_Civil_III.indd 15 24/08/2018 10:27:46 prestação de uma das partes não ocorre de pronto, em um só momento, mas a termo. O contrato foi perfeitamente concluído pelas partes, contudo, sua execução fi ca retardada, ou diferida, a exemplo da compra e venda parceladas. Vale mencionar que não ocorrerá a extinção da obrigação enquanto não se completar a solução, ou seja, o pagamento da obrigação. Contratos de execução continuada, de duração, de trato sucessivo ou de débito permanente — aqueles que se cumprem por meio de atos reiterados, como o contrato de locação, o contrato de trabalho, entre outros. Podem ser por tempo determinado, quando delimitarem o termo fi nal do contrato (por exemplo, locação por temporada)ou indeterminado, quando não houver tempo predeterminado (por exemplo, contrato de trabalho). Corroborando, oportuno citar: “[...] o contrato sobrevive, com a persistência da obrigação, muito embora ocorram soluções periódicas, até que, pelo implemento de uma condição ou decurso de um prazo, cessa o próprio contrato” (PEREIRA, 2017, p. 62). Quanto à função econômica Nesta classifi cação, os contratos são qualifi cados quanto à função econômica: De troca — caracterizados pela troca de utilidades econômicas. São exemplos a compra e venda, a troca ou permuta, entre outros. Associativos — caracterizados pela união de interesses ou coincidência de fi ns. Um exemplo é o contrato de sociedade. De prevenção de riscos — caracterizados pela assunção de riscos por parte de um dos contraentes. Um exemplo é o contrato de seguro. De crédito — caracterizados pelo interesse de uma utilidade econômica, por meio da transferência de um bem futuramente restituído, como nos contratos de empréstimo. Um exemplo é o mútuo feneratício. De atividade — caracterizados pela prestação de uma conduta de fato (um fazer). São exemplos: prestação de serviços; empreitada; corretagem. Classificação dos contratos16 C02_Direito_Civil_III.indd 16 24/08/2018 10:27:46 Contratos reciprocamente considerados Nesta classifi cação, os contratos são qualifi cados quanto à relação de depen- dência (GACLIANO; PAMPLONA FILHO, 2010): Principais — existem por si mesmos, sem necessitar da dependência de outros. Um exemplo é a compra e venda de um imóvel ou de um automóvel. Acessórios — sua existência pressupõe a existência do contrato principal. São exemplos: hipoteca; fiança; penhor. Os contratos também podem ser classifi cados quanto à defi nitividade em: Preliminares (ou pactum de contrahendo) — são aqueles que têm por fi nalidade a celebração de um contrato defi nitivo. Um exemplo é a promessa de compra e venda — por meio dessa promessa, as partes comprometem-se a realizar o contrato defi nitivo de compra e venda que irá transferir a propriedade do bem. Defi nitivos — aqueles que atingem o objetivo negocial das partes, sem ne- cessidade de outro que os complemente. Classificação dos contratos aplicada pelos tribunais superiores A seguir, apresentamos Recurso Especial (REsp) julgado pelo STJ sobre contrato de futebol: RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. COMPETÊNCIA INTER- NACIONAL. CONTROVÉRSIA ENTRE CONHECIDO JOGADOR DE FUTEBOL (ROBI- NHO) E A EMPRESA NIKE ACERCA DAS OBRIGAÇÕES CONTRAÍDAS EM “CONTRATO DE FUTEBOL”. COMPETÊNCIA CONCORRENTE. FORO DE ELEIÇÃO. JUSTIÇA HOLANDESA. CONTRATO PARITÁRIO. INEXISTÊNCIA DE ASSIMETRIA. CLÁUSULA CONTRATUAL ELETI- VA DE FORO ALIENÍGENA ADMITIDA. AUTONOMIA DA VONTADE. 17Classificação dos contratos C02_Direito_Civil_III.indd 17 24/08/2018 10:27:46 1. Inocorrência de negativa de prestação jurisdicional ou mesmo nulidade da decisão quando as alegadas omissões inexistem, seja porque devidamente esgotadas as questões submetidas ao Estado-jurisdição, seja porque mostram- -se irrelevantes para o desate da controvérsia à luz dos fundamentos que conduziram à extinção da demanda. 2. Em sendo paritária e, assim, simétrica a relação negocial estabelecida entre conhecido jogador de futebol e empresa multinacional do ramo dos artigos esportivos, contrato cujo objeto, ademais, relaciona-se à cessão dos direitos de uso de imagem do atleta, não é possível qualificá-la como relação de consumo para efeito de incidência das normas do Código de Defesa do Consumidor. 3. Regulada pelo disposto no art. 88 do CPC/73, a competência internacional na espécie evidencia-se como concorrente, revelando-se possível a eleição, mediante cláusula prevista no negócio jurídico qualificado pelas partes como “contrato de futebol” (contrato de patrocínio e cessão de uso de imagem), do foro alienígena como competente para a solução das controvérsias advindas do acordo. Precedente da Colenda 4ª Turma. 4. Caso concreto em que a obrigação principal contraída no acordo não deveria ser cumprida exclusivamente no Brasil. 5. Suscitada a incompetência da Justiça brasileira pela parte demandada em momento oportuno, correta a decisão de extinção do feito, sem resolução de mérito, diante da derrogação, pelas partes, com base em sua autonomia privada, da competência da Justiça brasileira e da eleição da Justiça holandesa para dirimir eventuais controvérsias. 6. RECURSO ESPECIAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO (BRASIL, 2016, documento on-line). Nesse REsp, o STJ compreendeu que o contrato entabulado entre o jogador de futebol profissional, Robinho, e a empresa multinacional, Nike, estava classificado como um contrato paritário, no qual as partes encontram-se em situação de igualdade na negociação do conteúdo do contrato, principalmente no que concerne ao estabelecimento das cláusulas contratuais. Assim, não acolheu seu pedido de vulnerabilidade contratual por não se enquadrar em relação típica de consumo, nem considerou o contrato firmado pelas partes como um mero contrato por adesão em que o jogador não teria a liberdade de escolher o conteúdo (liberdade contratual) e negou provimento ao recurso. Cabe analisarmos mais um REsp da mesma corte: RECURSO ESPECIAL. DIREITO DO CONSUMIDOR. AÇÃO CIVIL PÚ- BLICA. MULTA MORATÓRIA. PREVISÃO CONTRATUAL DE COMI- NAÇÃO DE MULTA APENAS EM FACE DA MORA DO CONSUMIDOR. ASSIMETRIA A MERECER CORREÇÃO. HARMONIA DAS RELAÇÕES DE CONSUMO. EQUILÍBRIO CONTRATUAL A SER RESTABELECI- DO. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. INOCORRÊNCIA. PATENTE INOVAÇÃO POR PARTE DO RECORRENTE ACERCA DE Classificação dos contratos18 C02_Direito_Civil_III.indd 18 24/08/2018 10:27:46 QUESTÕES ALEGADAMENTE OMISSAS, MAS NÃO SUSCITADAS EM MOMENTO OPORTUNO. 1. Ação civil pública movida pelo Ministério Público de São Paulo buscando restabelecer o equilíbrio de contrato de adesão relativo a fornecimento de produtos, aplicando a mesma multa prevista para a mora do consumidor para as hipóteses de atraso na entrega das mercadorias ou de devolução imediata dos valores pagos. 2. Inocorrência de violação ao disposto no art. 535 do CPC/73, quando o acórdão recorrido dá expressa solução às questões centrais, mesmo que não examine pontualmente cada um dos argumentos suscitados pelas partes. Caso concreto em que se alega omissão em relação a questões que sequer foram devolvidas quando da interposição de recurso de apelação. 3. Possibilidade de intervenção judicial nos contratos padronizados de con- sumo de modo a restabelecer o sinalagma negocial, fazendo incidir a mesma multa prevista para a mora do consumidor nos casos de atraso na entrega dos produtos ou de devolução imediata dos valores pagos quando exercido o direito de arrependimento, com fundamento tanto no CDC, como no próprio Código Civil (arts. 395, 394 e 422) ao estatuir os efeitos da mora e a submissão dos contratantes à boa-fé objetiva. 4. Manifesta abusividade na estipulação de penalidade apenas para o descum- primento das obrigações imputadas ao consumidor aderente ao contrato sem nada estatuir acerca da mora do fornecedor. 5. Manutenção da decisão que, reequilibrando a relação de consumo, deter- mina a integração dos contratos celebrados pela ré da previsão de multa de 2% sobre o valor do produto no caso de descumprimento do prazo de entrega ou de atraso na devolução dos valores pagos quando exercido o direito de arrependimento. Precedente. 6. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO (BRASIL, 2017, documento on-line). Já, nesse REsp, o STJ compreende que se trata de relação de consumo, protegida pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC) e Código Civil. Ademais, por não se tratar de um contrato paritário, mas de um contrato massificado, por adesão, o STJ compreendeu que a multa contratual imposta contratualmente, apenas para os casos de mora do consumidor aderente, configurava abuso do fornecedor proponente — desequilíbrio da relação contratual. Além de classificar o contrato em discussãocomo um contrato padronizado de consu- mo, ou seja, contrato de adesão ou por adesão, também se utilizou da noção de sinalagma para justificar que as prestações contratuais devem guardar, entre si, uma correlação equilibrada. Assim, não deu provimento ao recurso interposto pelo proponente, considerando que correta a intervenção judicial no sentido de reequilibrar a assimetria entre os contratantes e reestabelecer o sinalagma contratual. A ementa a seguir apresenta decisão do Supremo Tribunal Federal (STF):Ementa: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. CIVIL. DIREITO DO CONSUMI- DOR. PREVIDÊNCIA PRIVADA. CONTRATO DE SEGURO DE VIDA. RENOVAÇÃO NOS TERMOS CONTRATADOS. RECUSA PELA SEGU- RADORA. MATÉRIA INFRACONSTITUCIONAL. OFENSA REFLEXA. INTERPRETAÇÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 454/STF. DECISÃO QUE SE MANTÉM POR SEUS PRÓPRIOS 19Classificação dos contratos C02_Direito_Civil_III.indd 19 24/08/2018 10:27:46 FUNDAMENTOS. [...] 4. In casu, o acórdão objeto do recurso extraordinário assentou: APELAÇÃO CÍVEL. SEGURO DE VIDA. RECUSA DE RENOVA- ÇÃO DE CONTRATO. ABUSIVIDADE. APLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. MANUTENÇÃO DO PACTO COMO ANTERIORMENTE CONTRATADO. 1. O objeto principal do seguro é a cobertura do risco contratado, ou seja, o evento futuro e incerto que poderá gerar o dever de indenizar por parte da seguradora. Outro elemento essencial desta espécie contratual é a boa-fé, na forma do art. 422 do Código Civil, caracterizada pela lealdade e clareza das informações prestadas pelas partes. 2. A relação jurídica de seguro está submetida às disposições do Código de Defesa do Consumidor, enquanto relação de consumo atinente ao mercado securitário. 3. O litígio em exame versa sobre o reconhecimento da ilegali- dade da não renovação da apólice de seguro, bem como da abusividade da cláusula que prevê a resilição por parte da seguradora. Situações precitadas que rompem com o equilíbrio contratual, princípio elementar das relações de consumo, a teor do que estabelece o artigo 4º, inciso III, do CDC. 4. A estabilidade das cláusulas contratuais a que está submetido o consumidor deve ser respeitada, em especial nos contratos de prestações sucessivas, como é o caso dos autos. Nessa seara, com base no artigo 51, incisos IV, X e XV, § 1º, do CDC. 5. O seguro constitui pacto de trato sucessivo e não temporário o que implica certa continuidade nesta relação jurídica cativa. Se mantidas as mesmas condições da época da contratação, as suas disposições não devem ser alteradas unilateralmente pela seguradora, exceto se durante o período de contratação haja a ocorrência de fatos não previsíveis, com o condão de modi- ficar significativamente o equilíbrio contratual. 6. A comunicação tempestiva não é o único requisito a ser preenchido para não se efetivar a renovação do pacto. Como visto anteriormente, a correspondência com os novos termos de contratação, ao consumidor é abusiva, não merecendo qualquer consideração as informações nela contida, acerca da extinção do contrato. 7. Necessidade de pagamento do valor do prêmio inadimplido no curso da presente deman- da. Dado parcial provimento ao apelo. 5. Agravo regimental a que se NEGA PROVIMENTO (BRASIL, 2013, documento on-line). Nesse julgado, o STF considera o contrato de seguro como um contrato de trato sucessivo ou execução continuada, que, como visto, corresponde aos contratos que se cumprem por meio de atos reiterados — no caso do seguro, contrato de trato sucessivo com prazo determinado e renovável. Destarte, o STF compreendeu ser injustificada a recusa de renovação do contrato de seguro de vida por parte da seguradora, em razão de configurar quebra da estabilidade da relação contratual de trato sucessivo, mantida de boa-fé pelos contratantes. Ademais, por se tratar de relação de consumo entre seguradora e segurado, os deveres de proteção, cuidado e informação — decorrentes da boa-fé objetiva — ficam protegidos, também, pelas disposições do CDC. Classificação dos contratos20 C02_Direito_Civil_III.indd 20 24/08/2018 10:27:47 BRASIL. Lei Federal nº. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 11 jan. 2002. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/ Leis/2002/l10406.htm>. Acesso em: 20 ago. 2018. BRASIL. Superior Tribunal de justiça. Terceira Turma. Recurso Especial nº. 1.518.604/SP (2013/0096653-6). Relator Ministro Paulo de Tarso Sanseverino. Diário de Justiça Eletrônica, Brasília, DF, 29 mar. 2016. Disponível em: <http://www.lexml.gov.br/urn/urn:lex:br:superior. tribunal.justica;turma.3:acordao;resp:2016-03-15;1518604-1523991>. Acesso em: 20 ago. 2018. BRASIL. Superior Tribunal de justiça. Terceira Turma. Recurso Especial nº. 1.548.189/SP (2014/0173222-3). Relator Ministro Paulo de Tarso Sanseverino. Diário de Justiça Eletrônica, Brasília, DF, 6 set. 2017. Disponível em: <https://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/496381992/ recurso-especial-resp-1548189-sp-2014-0173222-3/inteiro-teor-496381994>. Acesso em: 20 ago. 2018. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo Extraordinário com Agravo nº. 720643/RS. Pri- meira Turma. Relator Ministro Luiz Fux. Diário de Justiça Eletrônica, Brasília, DF, 11 jun. 2013. Disponível em: <https://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/23365508/agreg-no-recurso- -extraordinario-com-agravo-are-720643-rs-stf/inteiro-teor-111695903?ref=juris-tabs>. Acesso em: 20 ago. 2108. COOTER, R.; ULEN, T. Direito e economia. 5. ed. Porto Alegre: Bookman, 2010. GAGLIANO, P. S.; PAMPLONA FILHO, R. Novo curso de Direito Civil: contratos. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. v. 4. GIRARDI, L. J. Curso elementar de Direito romano. Porto Alegre: Livraria Acadêmica, 1984. GONÇALVES, C. R. Direito Civil brasileiro: contratos e atos unilaterais. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. v. 3. LÔBO, P. Direito Civil: contratos. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2011 PEREIRA, C. M. S. Instituições de Direito Civil. 21. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2017. v. 3. TARTUCE, F. Direito Civil: teoria geral dos contratos e contratos em espécie.12. ed. São Paulo: Editora Forense, 2017. v. 3. Leituras recomendadas ALMEIDA, C. F. Contratos: conceito, fontes e formação. 5. ed. Coimbra: Edições Almedina, 2014. v. 1. ROPPO, E. O contrato. Coimbra: Edições Almedina, 2009. SILVA, C. V. C. A obrigação como processo. Rio de Janeiro: FGV, 2007. 21Classificação dos contratos C02_Direito_Civil_III.indd 21 24/08/2018 10:27:47 Conteúdo:
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