Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Estudos Bíblicos: Cristologia Material Teórico Responsável pelo Conteúdo: Prof. Me. Reuberson Rodrigues Ferreira Revisão Textual: Prof.ª Me. Luciene Oliveira da Costa Granadeiro Estudos Bíblicos: Cristologia • Introdução; • Da Pergunta Bíblica às Sistematizações Teológicas; • Cristologia: Objeto Material, Formal e Ciências Afins; • Estatus Questiones da Cristologia: Breve Sumário Histórico; • Questões Abertas à Cristologia Hoje e no Futuro; • Conclusão – Revisão. • Entender o estágio atual da reflexão sobre Cristologia, definir seus conceitos e apresentar fontes sobre o tema. OBJETIVO DE APRENDIZADO Estudos Bíblicos: Cristologia Orientações de estudo Para que o conteúdo desta Disciplina seja bem aproveitado e haja maior aplicabilidade na sua formação acadêmica e atuação profissional, siga algumas recomendações básicas: Assim: Organize seus estudos de maneira que passem a fazer parte da sua rotina. Por exemplo, você poderá determinar um dia e horário fixos como seu “momento do estudo”; Procure se alimentar e se hidratar quando for estudar; lembre-se de que uma alimentação saudável pode proporcionar melhor aproveitamento do estudo; No material de cada Unidade, há leituras indicadas e, entre elas, artigos científicos, livros, vídeos e sites para aprofundar os conhecimentos adquiridos ao longo da Unidade. Além disso, você tam- bém encontrará sugestões de conteúdo extra no item Material Complementar, que ampliarão sua interpretação e auxiliarão no pleno entendimento dos temas abordados; Após o contato com o conteúdo proposto, participe dos debates mediados em fóruns de discus- são, pois irão auxiliar a verificar o quanto você absorveu de conhecimento, além de propiciar o contato com seus colegas e tutores, o que se apresenta como rico espaço de troca de ideias e de aprendizagem. Organize seus estudos de maneira que passem a fazer parte Mantenha o foco! Evite se distrair com as redes sociais. Mantenha o foco! Evite se distrair com as redes sociais. Determine um horário fixo para estudar. Aproveite as indicações de Material Complementar. Procure se alimentar e se hidratar quando for estudar; lembre-se de que uma Não se esqueça de se alimentar e de se manter hidratado. Aproveite as Conserve seu material e local de estudos sempre organizados. Procure manter contato com seus colegas e tutores para trocar ideias! Isso amplia a aprendizagem. Seja original! Nunca plagie trabalhos. UNIDADE Estudos Bíblicos: Cristologia Introdução Caro(a) aluno(a), Nesta unidade, serão apresentados elementos introdutórios ao estudo da disciplina de Cristologia. Trata-se de um percurso conciso que visa, antes de mais, fazer uma imersão do leitor/estudante no vasto campo dessa relevante e nevrálgica ciência do universo teológico. O itinerário a ser trilhado propõe-se a apresentar ao leitor uma visão panorâmica sobre as sistematizações históricas que foram feitas em torno da reflexão sobre Jesus, o Cristo. Tentará, de igual modo, após mais de dois mil anos de história do cristianismo, situar o interlocutor na dimensão daquilo que atualmente é refletido sobre figura do galileu de Nazaré, que para os seus discípulos é reconhecido como Kyrios, Senhor (Cf. At 2, 36). Título assumido desde a primeira hora quando seus discípulos, atra- vés da infusão do Espírito Santo, após passarem do torpor e da tristeza pela morte de seu mestre à certeza e à convicção de que aquele a quem eles seguiram, era de fato o Salvador de Israel (At 3,18; 13,23), o Messias esperado, como atesta o con- teúdo do primeiro anúncio, o chamado kerigma (At 2,36; 9, 22). Do ponto de vista metodológico, para que você entenda o conteúdo de ma- neira fácil e organizada, esta unidade está dividida em três partes. Uma primeira, que nomeamos da pergunta bíblica às sistematizações teológicas, buscará reve- lar as bases e os instrumentais teóricos que avalizam uma pesquisa em termos cristológicos. Contíguo a esse fragmento, uma segunda sessão apresentará uma breve panorâmica e introdutória visão histórica sobre a reflexão acerca do Cris- to. Por fim, elementos que podem ajudar a Cristologia a ser mais pertinente ao homem hodierno serão apresentados numa última fração desse texto. Três pas- sos que emergirão você nesse curioso universo da reflexão cristológica. De modo sintético, esta unidade pretende inserir-nos no amplo, encantador e profundo universo da reflexão sobre Jesus Cristo, nomeada de Cristologia. Nesse galileu de Nazaré, filho de Deus, as esperanças messiânicas do povo ju- deu foram cumpridas plenamente e assumidas por homens e mulheres que, ao longo da história, passaram a chamar-se de cristãos (Cf. At 11, 26). Iniciemos, portanto, repetindo à “pergunta fundante” dos primeiros discípulos, passemos pelos conceitos-chaves e avancemos pelas sistematizações ao longo da história executadas pela comunidade cristã. Da Pergunta Bíblica às Sistematizações Teológicas Consoante a Sagrada Escritura, em um dado momento da relação de Cristo com os discípulos, houve uma causticante questão sobre a identidade de Jesus. Marcos, Mateus e Lucas, três evangelhos conhecidos com sinóticos, em vertentes e acentos distintos, apresentam o mesmo questionamento acerca do homem a quem seguiam (Mc 8,27-29; Mt 16, 13-20; Lc 9, 18-21). Percebe-se, aos olhos dos escritores e daqueles que os leem, o interesse de apresentar quem é Jesus. 8 9 Num plano geral, os evangelistas Marcos e Mateus situam essas indagações num território concreto em meio à viagem para Jerusalém, nos arredores de Cesareia de Filipe (Mc 8, 27; Mt 16, 13), cidade situada no extremo norte da Palestina, junto às fontes do rio Jordão. Chamada por esse nome pelo soberano Herodes Filipe para distingui-la das outras Cesareias. Essa precisão topográfica não é apontada pelo autor do evangelho atribuído a Lucas a quem a geografia é tão importante em sua literatura evangélica. O questionamento sobre a identidade de Jesus, contudo, é similar aos três hagiógrafos. Deve-se dizer que no evangelho de João, embora seja tacitamente marcada por uma resposta concreta a esse questionamento, a pergunta sobre a identidade de Jesus não é feita de forma tão explícita quanto a que nos re- ferimos nos escritos sinóticos. Tabela 1 Marcos Mateus Lucas 27Jesus partiu com os seus discípulos, para os povoados de Cesária de Filipe, e no caminho perguntou aos seus discípulos: Quem dizem os homens que eu sou? 28.E eles responderam: João Batista; e outros, Elias; outros ainda, Um dos profetas. - 29.E vós, perguntou ele quem dizeis que eu sou? E, respondendo Pedro, lhe disse: Tu és o Cristo.30Então proibiu-os severamente de falarem de falara a alguém a seu respeito. (Mc 8, 27-30) 13 Chegando Jesus ao território de Cesareia de Filipe, perguntou aos seus discípulos: Quem dizem os homens ser o filho do homem?14.E Disseram. Uns afirmam que é João Batista, outros Elias, outros ainda que é Jeremias ou um dos profetas. 15.Então lhes perguntou e vós quem dizeis que eu sou? 16Simão Pedro, respondendo disse: Tu és o cristo, o Filho do Deus vivo. 17Jesus. Respondeu-lhe: Bem aventurado és tu, Simão filho de Jonas, porque não foi a carne ou sangue que te revelaram isso, e sim meu pai que está no céus. (Mt, 16, 13-18) 18Certo dia, ele orava em particular, cercado dos discípulos, aso quais perguntou: Quem sou eu, no dizer das multidões? 19Eles responderam: João Batista; Outros, Elias; outros, porém, um dos antigos profetas que ressuscitou. 20Ele replicou: E vós quem dizeis que eu sou? Pedro Respondeu: O Cristo de Deus. 21Ele, porém , proibiu-lhes severamente anunciar isso a alguém. (Mt, 16, 13-18) Os três relatos bíblicos, que discutem incisivamente a identidade de Jesus, ini- ciam-se com uma mesma dinâmica. Jesus interroga os discípulos sobre quem o povo fala que ele é (Mc 8, 27; Mt 16, 13; Lc 9,18) e espera resposta à sua questão. Diante das furtivas, tergiversas e incertas respostas dos discípulos,o Nazareno reor- ganiza o questionamento e dispara uma nova interrogação, desta vez, mais incisiva e direcionada. Formula-a nestes termos, a saber: “[...] vós quem dizeis que eu sou (Mc 8, 29; Mt 16, 13; Lc 9,20). Segue-se a esse diatribe uma lacônica resposta posta na boca de Pedro, com pequenas mutações, por todos os três evangelistas: Tu és o Cristo! (Mc 8, 29; Mt 16, 16; Lc 9,20). Vejamos os textos, numa rápida visão sinótica: Segue-se a essa questão um corolário dito pelo próprio Jesus, nomeado por estudiosos de Sagrada Escritura como primeiro anúncio da Paixão de Jesus, uma catequese sobre a compreensão do que, para Jesus e de maneira pedagó- gica para os seus discípulos, significaria o título filho de Deus (LINDEN, 1999, pp. 59-60). Aquele a quem Pedro chama de “Cristo” na versão de Marcos (Mc 8, 29) de o “Cristo de Deus” na versão de Lucas (Lc 9,20) e de “Cristo, filho do Deus Vivo” na narrativa de Mateus (Mt 16, 16), apresenta sua pró- pria interpretação da sua missão, da sua história e condição de Cristo, ungido, Salvador. Ele é aquele que rejeitado, humilhado, desprezado e ignorado pelos 9 UNIDADE Estudos Bíblicos: Cristologia grandes será ressuscitado por Deus (Mc 8, 31) e assegurará vida plena a todos em nome do Evangelho. (Mc 8, 38). Em termos bíblicos, vejamos: 31E começou a ensinar-lhes: “o Filho do homem deve sofre muito, ser rejeitado pelos anciãos, pelos chefes dos sacerdotes e pelos escribas, ser fosse morto e depois de três dias ressuscitar:32.Dizia isso abertamente. Pedro chamando-o de lado, começou a recriminá-lo.33.Ele, porém vol- tando-se e vendo seus discípulos, recriminou a Pedro, dizendo: arreda-te de mim, Satanás; porque não pensas as coisas que são de Deus, mas as dos homens.34.E chamando a multidão, juntamente com os seus discí- pulos, disse-lhes: Se alguém quiser vir após mim, negue-se a si mesmo, e tome a sua cruz, e siga-me.35.Porque qualquer que quiser salvar a sua vida, perdê-la-á, mas, qualquer que perder a sua vida por amor de mim e do evangelho, esse a salvará. (Mc 8, 31-34) Há um salutar estudo do biblista Shigeyuki Nakanose intitulado Quem dizem os homens que eu sou? Uma leitura de Marcos 8,27-38. Publicado pela Revista Vida Pastoral e dispo- nível em: https://goo.gl/2UaJva. No artigo, o autor aprofunda a questão das esperanças messiânicas latentes na época da redação do Evangelho de Marcos e como elas incidem sobre as esperanças que muitos vislumbravam na figura de Jesus. De igual modo, o texto é salutar em apresentar uma reflexão sobre o convite ao seguimento de Cristo Jesus nos termos apresentados a Pedro. Ex pl or Essa questão preliminar, apresentada pelos evangelistas insere-se na raiz de toda reflexão cristológica. A pergunta sobre a identidade de Jesus é o que sustenta, man- tém e nutre todos os edifícios de fé cristã e favorece as bases para constituição de uma reflexão crível e racional sobre a figura de Jesus Cristo. Deve-se mencionar que, mesmo os evangelhos, como as narrativas acima citadas, são espectros de uma nas- cente e incipiente convergência de conclusões sobre Jesus. Eles estão na base e são os fundamentos daquilo que é organizado em torno da ciência nomeada Cristologia. Os próprios evangelhos, situados dentro de uma cronologia própria de sua redação, são para os interlocutores uma sistematização da comunidade daqueles que professam a fé no Jesus histórico e ressuscitado. São uma Cristologia da “primeira hora” que lança fundamentos de toda Cristologia posterior. Ou como afirma Calimam (2018): A fé cristológica se configurou nas primeiras comunidades cristãs pela confrontação da realidade histórica de Jesus de Nazaré (a experiência his- tórica feita no seguimento histórico dos discípulos) com a experiência do Ressuscitado (a fé que nos abre à admiração da ação gratuita de Deus em Cristo), para só depois afirmar que Jesus é o Cristo, ou seja, que Jesus é o Messias, o Ungido de Javé. (CALIMAM, 2018, s/p) 10 11 Cristologia: Objeto Material, Formal e Ciências Afi ns O estudo sistemático sobre o Cristo (Cristologia), assim como toda ciência, tem um objeto formal e material claramente definidos. Ela não constituir-se-ia com tal se não gozasse dessa prerrogativa bem estabelecida, bem definida e palpável de ex- plicitação e reflexão. Através desse viés, é possível estabelecer onde se encontram as bases da reflexão cristológica. O objeto material de estudo da Cristologia, mesmo que tacitamente já dito, é o Cristo. A base de toda reflexão e de todo edifício deste saber volta-se para esse elemento distintivo. Ele, contudo, não é uma abstração, um fantasma ou abantesma, antes é uma figura real, concreta, histórica e encarnada na pessoa de Jesus. Portanto, o objeto material da Cristologia é o Cristo revelado em Jesus. A Cristologia, desse modo, não é uma reflexão quimérica, mas concreta e assentada sobre uma base histórica, a encarnação de Jesus, Filho de Deus. Associado a esse objeto material está a maneira de compreender o significado do Cristo revelado em Jesus. A interpretação que aí subjaz, a hermenêutica daquilo que sua revelação apresenta é objeto formal da Cristologia. Cristologia também não pode ser compreendida de maneira isolada, tampouco pode ser relegada a um ostracismo em relação aos outros saberes. Ela se associa a várias outras áreas do conhecimento. Algumas se alinham de maneira mais pe- remptória a ela, a saber: a Teologia, a Soterologia e Antropologia. No que tange à Teologia, a Cristologia coloca-se em linha contígua e contínua. A matéria primeira da Teologia é Deus e tudo que a ele direta ou indiretamente diz respeito. Em Jesus, Deus se revela, mesmo que ainda permaneça em sua essência um mistério incognoscível (cf.DUPUIS, 1999, p.11). Cristo, a rigor, revela a huma- nidade, na sua condição de filho à imagem de Deus. Desse modo, a centralidade de Cristo na reflexão cristológica requer, inevitavelmente, a centralidade de Deus ou uma correlata associação. Não podendo, desse modo, o Cristo ser entendido fora dos umbrais do universo teológico. Cristologia, portanto, pressupõe a reflexão teológica como explicita Jaques Dupuis (1999, p.12): [...] A Cristologia leva-nos à Teologia, ao Deus que se revela, de modo mais decisivo em Jesus Cristo, e ao mesmo tempo permanece envolvido no mistério. Nestes últimos tempos, o desenvolvimento dos estudos cris- tológicos e teológicos confirma esse processo: a reflexão teológica vai do Cristo ao Deus de Jesus, da Cristologia à Teologia. 11 UNIDADE Estudos Bíblicos: Cristologia De igual modo, uma outra categoria que precisa estar implicada no processo refle- xão cristológica é a acepção de salvação, ou aquilo que tecnicamente costuma-se de- nominar enquanto reflexão sistemática, soteriologia. A “soteriologia é essencialmente constitutiva da própria Cristologia” (BINGEMER, 2008, p. 21). Esse fato porque, nas ações de Jesus, enquanto homem-Deus-encarnado, revela-se o desígnio de salvação de Deus. Na pessoa concreta de Jesus, encontra-se o Salvador (Soter), somente a partir da fé naquilo que ele realizou enquanto obra salvífica é que podemos afirmar classicamente que chegou a plenitude e foi reconhecido como nosso Senhor. A Cristologia é constitutivamente soteriológica. Em outras palavras, o significado da pessoa de Jesus é inseparável da história, do agir e do des- tino do próprio Jesus. Por conseguinte, isolada dessa história, desse agir e desse destino, a pessoa de Jesus perde sua verdadeira significação para nós. É isso que o primeiro anuncio da comunidade apostólica repetiu incessantemente. (BINGEMER, 2008, p.21) Para uma leitura atualizada da relação entre Cristologia e Antropologia com vista à fer- mentar uma espiritualidade da alteridade inspirado na humanidade de Cristo é opor- tuno ler: pertinente ler o artigo do “Da antropologia à Cristologia. da Cristologia à antropologia” dos teólogos”, Anderson Fasano, Pedro Donizeti de Campos disponível na revista cultura Teológica da Pontifícia universidadede São Paulo( PUC/SP). Disponível em: https://goo.gl/9wwtbz. Ex pl or Deve-se ainda mencionar que a Cristologia, buscando ser significativa e atinen- te ao homem que a circunda, bem como levando em consideração sua inextrincá- vel relação com Deus e com a salvação da humanidade (Teologia /Soteriologia) não pode prescindir de categorias de uma Antropologia atualizada. Não se trata de adotar uma antropologia ao sabor das correntes existentes, funcional, ou ide- ológica. Tampouco de eleger uma que se adeque a uma forma predeterminada sobre o Cristo. No entanto, uma antropológica teológica que empreste força a uma Cristologia atualizada, deve ser vista à luz da revelação proposta por Jesus, daquilo que ele atestou como plenamente humano: “É preciso colocar a questão antropológica aos pés de Jesus e dele aprender o que significa a humanidade que partilhamos” (MANZZATO, 2008, p.89). Em outras palavras, a Cristologia com os olhos fitos em Jesus Cristo e naquilo que ele revelou da humanidade e de Deus, respaldo pelas ciências, deve ater-se às categorias antropológicas para suster sua reflexão convergindo para uma humanidade renovada à luz de Jesus, princípio da nova humanidade. Para aprofundar a questão intrínseca entre Cristologia e Antropologia, é pertinente ler o ar- tigo do Teólogo Antônio Manzatto, intitulado: Notas para uma Cristologia para o terceiro Milênio. O texto é publicado pela revista de Teologia da Universidade católica de São Paulo (PUC/SP) e está disponível eletronicamente no link: https://goo.gl/EEtH6U. O artigo é divi- dido em três partes. O autor reflete sobre a Teologia e Cristologia que devem, mesmo fieis à tradição, ser contextualizadas e atinentes às questões e à realidade que as circunda. Desse modo, o autor propõe uma “nova” Cristologia que respeita aquilo que sobre o Cristo foi dito, e leva em consideração novas categorias existenciais, antropológicas. Ex pl or 12 13 Por fim, e não menos importante, a Cristologia reclama necessariamente uma prática cristã, denominada por alguns teóricos de cristopráxis (MOLTMAM, 2009, p.77). Com essa afirmação, quer-se arguir que a profissão de fé em Jesus como Deus vivo e encarnado, bem como o seguimento dele, inevitavelmente, conduzem a uma ação ao estilo do Senhor. Conhecê-lo de per si já implica naturalmente em uma prática. Não se trata de uma reflexão que conduz a uma prática, mas de uma síntese dialética que implica que, ao passo que conhecemos Jesus, seus mistérios, sua história e estamos envolvidos na comunidade, praticamos aquilo que Ele fez e viveu (Cf. MANZATO, 1997, 14-15). Assim, a Cristopráxis é uma explicitação da relação entre o conhecimento sobre o Cristo e prática aos moldes do que ele revelou, assumindo seu lugar entre os pobres, doentes, socialmente excluídos e oprimidos (cf. Mt 10, 7-8; Mt 11, 5-6). Nas palavras de Moltmam (2009, p.80): Conhecer a Jesus não significa simplesmente apreender o dogma cristo- lógico, mas conhecê-lo na prática do discipulado. A Cristologia teológica continua relacionada a esta cristoprática, tem que tomar em consideração suas experiências e tornar pessoas abertas a novas experiências neste caminho. Cristologia procede de vida cristã e conduz para dentro da vida cristã. A insuficiência de uma pura teoria de Cristo surge da improprieda- de do conhecer a Cristo apenas teoricamente. Por isso a teoria cristológi- ca tem que apontar para além de si mesma [..] Jesus of Montreal (Denys Arcand, 1989): https://goo.gl/NqnhAa. Trata-se de um a produção Franco-Canadense que faz uma abordagem sobre a vida de Jesus. O enredo gravita em tor- no da opção de um grupo de artista que tentam encenar aspectos da vida do Cristo, numa leitura nada comum. Inevitavelmente logra a antipatia da Igreja. Curiosamente à medida que os atores estão preocupados em encenar a paixão de Cristo, eles mesmos acabam vi- venciando na própria história aspectos de seus personagens na narrativa da paixão. Trata-se de uma obra que ilustra, do ponto de vista cinematográfi co, uma relação clara entre a vida (sofrimento de Cristo) e a humanidade. Ex pl or A guisa de conclusão deste tópico pode-se recobrar o que até agora foi estudado sintetizando brevemente. Pode-se, desse modo, atestar que a disciplina Cristologia tem objeto formal e material definido. Eles o são, respectivamente, Jesus Cristo e leitura dele enquanto salvador. Essa ciência associa-se de maneira indelével à Teolo- gia, à Soteriologia e, para ser contextualizada e atual, pressupõe uma antropologia contemporânea lida à luz do evento Jesus Cristo. Por fim, essa ciência reclama necessariamente, como um corolário, ao lado do conhecimento de Jesus Cristo, uma prática e vivência existencial, em comunidade, daquilo que é, revelou e viveu. Tendo atingido as acepções basilares, executar-se-á agora uma sumária apresenta- ção dos estudos em Cristologia e atual estatus questiones dessa ciência. • Cristologia: ciência que estuda Jesus, enquanto Cristo da fé. • Pressupõe: Teologia e Soteriologia, entre outra ciências. • Desencadeia: uma Cristopráxis, um conhecimento do Cristo e uma prática em seus moldes. Ex pl or 13 UNIDADE Estudos Bíblicos: Cristologia Estatus Questiones da Cristologia: Breve Sumário Histórico A Cristologia, como é objeto desta sessão do livro apresentar, percorrerá um longo período de sistematização, até chegar ao estágio atual (que ainda é aberto ao futuro). Ela passou por inúmeros níveis e perspectivas de interpretação. Desde as intuições neotestamentárias até as modernas reflexões cristológicas, cunha- das em ambientes e continentes específicos, muitas perspectivas foram utilizadas para refletir à luz da fé sobre Jesus Cristo e, consequentemente, constituir uma tradição cristológica. Sumariamente, apresentamos alguns passos que historica- mente foram datas até constituir chegar-se à atual reflexão teológica, focando, sobretudo, os concílios universalmente aceitos por todas as denominações cristãs. Já nos primeiros anos, após a concessão do Édito de Milão que permitia a livre prática da fé Cristã, despontou e já há anos vinha avolumando-se uma aporia em torno de definições dogmáticas sobre a figura de Jesus Cristo. No Concílio de Niceia, eclodiu uma primeira de sintomática aporia em torno de Jesus. A questão que se punha aos padres do primeiro Concílio de Niceia (325) era a divindade de Cristo. Ninguém duvidava da noção de que Jesus fosse um homem, mas dizer que era Deus encontrava forte resistência. Corrente diversas propunham, sobretudo influenciadas por filosofias gregas, resposta a essa questão, atestando que Jesus, se Deus, era ape- nas subordinado a Deus todo poderoso, ou então, um modo de ser de Deus. Outros, ainda, negavam que ele fosse de igual natureza que a de Deus. O Concilio de Niceia, no entanto, proclamou a doutrina da consubstancialidade de Deus. Não mais que cinquenta anos após o primeiro Concílio de Niceia, despontou uma nova aporia em torno da reflexão de Jesus. Dessa vez, relativa à sua natureza huma- na. Uma corrente filosófica, que tinha seu principal paladino Apolinário de Laodiceia, negava que Jesus tivesse um corpo, ou seja, ele era apenas um “logos” (Palavra de Deus) encarnado. Reunidos em Concílio na Cidade de Constantinopla (381), o Papa Dâmaso proclamou a inteireza do Cristo humano, possuindo um corpo e uma alma. Na esteira de Calcedônia, uma nova aporia em torno da figura de Jesus Cristo despontou e ela foi solvida no Concílio de Éfeso (431). A aporia gravitava na com- preensão das duplas naturezas de Cristo, humana e divina. Embora já tivessem sidas afirmadas em concílio anteriores, elas ainda geravam dissensões. Uma tensão entre alexandrinos e nestorianos que redundou na excomunhão de Nestório e na procla- mação de um dogma Chamado Teotokos (Mãe de Deus) foi o extrato final dessa questão mesmo que não fosse ainda sorvida total e definitivamente a dupla natureza de Cristo. Essa aporia em torno da dupla natureza de Cristo foi ainda temade um novo Concílio, celebrado em Calcedónia (451). Um monge nomeado Eutiques propu- nha (e influenciou parcela significativa de fieis) que as duas naturezas de Jesus 14 15 Cristo, embora existentes nele, eram excludentes, e ou uma era absorvida pela outra. No caso, a natureza divina suprimiria a humana. Ante tal afirmação, os participantes do Concílio de Calcedônia atestaram que as duas naturezas estão unidas sem fusão, mistura nem confusão. Uma não altera a outra. Sem divisão que concorra para um isolamento ou aniquilação da outra. Sem possibilidade de separação. O humano está unido ao divino para sempre. Nesse ponto reside a garantia da salvação da humanidade. A afirmação da dupla natureza de Cristo coexistente em uma única pessoa, con- tudo, redundou um novo problema que precisou ainda de dois concílios para ser solucionado: II e III celebrados Constantinopla (553 e 681). Em ambos os concílios, a ideia aporia era como entender a dupla natureza de Cristo em uma única pessoa, sem que a dimensão humana suplantasse a divina ou vice- versa. Seria a questão da autonomia entre as duas naturezas. O Concílio de 553 atestou que, em Jesus, há duas vontades: a humana e a divina. Esta afirmação foi um passo determinante para afirmar a plena autonomia de homem Jesus de Nazaré como homem perfeito. A vontade humana e a divina não eram duas forças contrárias, embora fossem duas realidades distintas. O terceiro Concílio de Constantinopla, celebrado mais de cem anos depois do segundo, ainda era palco para reflexões sobre a autonomia entre as duas naturezas de Jesus. O Concílio, desse modo, afirmou tudo que fora dito sobre o Cristo nos concílios que lhe antecederam e pontificou que, em Jesus Cristo, há duas naturezas, as quais permanecem íntegras com as suas propriedades. Atribuiu-se a essa ideia um conceito grego chamado união hipostática para exprimir que o verbo divino é plenamente humano, sem distinção e confusão e que nele há um duplo princípio que não se opõe e não se excluem, antes o humano é otimizado pelo divino. Esses elementos que aportam mais de trezentos anos de história de reflexão conciliar e comunitária sobre o Cristo serve para pontuar que a Cristologia, não obstante gozar da plenitude da revelação, foi pouco a pouco conhecida e afirmada por aqueles que se propunham a conhecer e entender o mistério sobre o messias revelado em Jesus. Perceber essa diversidade ajuda a captar o desenvolvimento histórico da reflexão teológica e, ao mesmo tempo, compreender a originalidade de cada um desses pontos de partida. Ao mesmo tempo, permite propor caminhos para uma reflexão futura totalizante e global sobre a Cristologia. Somente consciente dessa história é que se pode-se sugerir um pensador con- temporâneo que apresenta bases para refletir a Cristologia na atualidade. Em sua reflexão, é possível perceber para onde caminha a reflexão teológica sobre Cristo, qual é o seu estatus questiones. O teólogo Jaques Dupuis, nesse sentido, lança luzes para essa reflexão. Ele asse- gura que a Cristologia na atualidade deve preconizar uma abordagem que ele cha- ma de “integral” (DUPUIS, 199, pp. 46 - 52). Essa perspectiva fundamenta-se em cinco pontos, a saber: 1) Tensão dialética que propõe recuperar elementos que, embora conflitivos, caso fundidos podem agregar novo entendimento à Cristologia; 15 UNIDADE Estudos Bíblicos: Cristologia 2) Princípio da totalidade com o qual se evitam unilateralismos (afirmação ou negação da divindade de Jesus), mas busca-se uma reflexão e globalizante sobre Cristo; 3) Princípio da pluralidade que, respeitando as diversas perspectivas, bus- ca entendê-las e acolhê-las num processo reflexivo; 4) Princípio da continuidade histórica que assegura diferentes versões sobre Cristo e, por vezes, devem ser aproveitadas em seus aspectos positivos para apresentar uma Cristologia integral, superando reducionismos; 5) Princípio de integração, com o qual se devem aglu- tinar dados complementares sobre Cristo. Tendo ante os olhos a perspectiva postulada por Jacques Dupuis, é possível des- lumbrar que os caminhos por onde atualmente caminham, ou se encaminha a Cris- tologia, são um viés que busca amalgamar tensões em torno da reflexão de Cristo que leva em conta a pluralidade de ideias sobre ele estabelecida, que busca integrar pontos divergentes e que não prescinde do lastro histórico ao qual está fundamen- tado o edifício cristológico. Ciente, mesmo que minimamente dessas perspectivas de reflexão, é possível abrir caminhos questões que ajudem a Cristologia a avançar no caminho de ser contextual e atinente ao homem de hodierno. Questões Abertas à Cristologia Hoje e no Futuro O extenso itinerário cumprido até este momento permite, à guisa de divisar o futuro, intuir que a Cristologia, mesmo não prescindindo daquilo que historicamen- te foi asseverado sobre Jesus Cristo, pode adentrar novas searas com o objetivo de fazer-se contextual, atualizada ao ambiente histórico que hoje vivemos. Tal como em tantos contextos históricos já o fez. Não se trata de formular uma nova doutrina sobre Cristo, muito pelo contrário, trata-se de apresentá-la de uma maneira nova. Um modo muito atual de se reconhecer a verdade de um adágio muito conhecido em outros tempos: “Non novum, sed nove”1. Esse dado seria, em termos práticos, repetir a pergunta feita pelo teólogo italiano Bruno Forte, exarada nas primeiras páginas de sua primeira obra sobre Cristologia intitulada Jesus de Nazaré, história de Deus, Deus da história: “Que sentido tem falar de Jesus Cristo hoje?” (FORTE, 1985, p.9). Nessa pergunta, reside um funda- mento capital para divisar uma exposição cristológica atinente à realidade hodierna. Devem-se apresentar novos questionamentos de ordem contextual para enriquecer a reflexão teológica como um todo e cristológica em particular. Na linha de Bruno Forte, uma Teologia/Cristólogia aberta à história (Cf. Machado, 2010, p.15ss). Para aprofundar a questão da Teologia aberta à história na perspectiva de Bruno forte, é salutar ler a dissertação de mestrado em Teologia de: MACHADO, Renato Silva. Cristologia como história: um estudo sistemático-pastoral da Cristologia de Bruno Forte. O texto está disponível eletronicamente no link: https://goo.gl/HyXwiF. Ex pl or 1 Não coisas novas, mas (apresentadas) de (modo) novo. 16 17 De fato, para apresentarmos um tema de qualquer matiz, é necessário ter pre- sente a relevância do mesmo para a vida do ouvinte ou, de modo diverso, pode não fazer sentido a interlocutor. Podemos intuir esse fato partir de própria experiência humana: quando alguém comunica algo que não é do interesse do ouvinte, pode até ser ouvido, mas sua mensagem nada vai influenciar a vida do destinatário, pois não nos atingiu, não teve significado para os ouvintes. De igual modo, a Cristologia para que verdadeiramente possa realizar seu obje- tivo, que é o anúncio da pessoa de Jesus Cristo, deve ter em conta o contexto e os anseios profundos do seu interlocutor para assim conseguir atingir o coração do ou- vinte possibilitando-lhe a experiência com Jesus Cristo. Não que a mensagem sobre o Cristo esteja atrelada à disposição interior de quem a ouve tampouco que adquira sentido apenas à luz da compreensão do interlocutor. Ante essa questão, duas realidades, dois universos despontam como campos privilegiados que oferecem elementos para uma reflexão cristológica no presente e no futuro. Uma relativa à reflexão sobre Jesus Cristo e disposição para aplicar sua mensagem e seu mistério em favor dos frágeis, a síntese dialética entre a fé professada e a libertação da humanidade. Seria uma Cristologia que implicasse libertação. Outro aspecto, no ambiente plurirreligioso vivido na atualidade, qual a reflexão possível sobre Jesus Cristo e a salvação por ele apresentada com as outras religiões, seria uma Cristologia que considerasse o pluralismo religioso. Esses dois caminhos são ambientes relativamente novos que precisamser apro- fundados para que o mistério redentor apresentado por Jesus Cristo, como projeto do Pai, possa ainda hoje ressoar de maneira mais límpida no ouvido de homens e mulheres que seguem um certo galileu, o messias da fé, o Kyrios-Senhor. Não obs- tante sejam propostos esses dois temas como lugares de reflexão que colaboram com uma Cristologia do futuro, deve-se dizer que eles serão apenas panoramicamente apresentados nesta sessão, e posteriormente aprofundados numa das últimas unida- des desta disciplina. Cristologia e pluralismo religioso A relação entre cristo e pluralismo religioso é um ingrediente salutar para reflexão cristológica no futuro. Ela, contudo, não é uma questão estritamente nova no universo Cristológico. Do ponto de vista do marco formal da Teologia tradicional cristã, ela já se apresenta e tem um espectro determinado em várias latitudes. Nesse campo, há postu- ras que gravitam em torno do inclusivismo, do relativismo e do exclusivismo passando. Historicamente, em se tratando de pluralismo religioso, mormente no universo dominante da Teologia católica, atestava-se a exclusividade da salvação nos um- brais da Igreja. Essa ideia era sintetizada na expressão latina “Extra Ecclesiam nulla salus”, fora da Igreja não há salvação. Negando, desse modo, qualquer pos- sibilidade de reflexão sobre Cristo ou sobre a salvação que contemplasse um prin- cípio pluralista. A Igreja, mormente no húmus católico, atestava que não havia condições de possibilidade de salvação que pudesse contemplar a pluralidade reli- giosa. Concebia-se Jesus como único mediador da salvação, mesmo que as pessoas vivessem em outras tradições religiosas. 17 UNIDADE Estudos Bíblicos: Cristologia Oportuna e digno de aprofundamento é a questão sobre o axioma: Extra Ecclesiam nulla salus apresentada pelo Teólogo LIBÂNIO, João Batista num artigo nomeado “Extra Ecclesiam nulla salus” disponível eletronicamente no link: https://bit.ly/2FLHN7C. No texto, o autor apre- senta as fontes e raízes históricas dessa expressão. De igual modo, explica seu sentido no contexto que foi gerado e como ele pode ser revisitado e revisto à luz dos aprofundamentos teológicos recente. Ex pl or O avanço dos anos e uma oxigenação da reflexão teológica, sobretudo no século XX, postulou da reflexão teológica e cristológica uma postura que ficou conhecida como in- clusivista. Ela, sumariamente, assegura que, mesmo em outras religiões (ou em nenhuma religião), Deus serve-se delas para salvar a todos. Todos estariam incluídos no projeto salvador de Deus. Eles seriam, na expressão do proeminente teólogo do século passado, Kark Hanner “cristãos anônimos”, salvos em Jesus Cristo mesmo sem o reconhecer. Agregar-se-ia aqui à reflexão cristológica uma capacidade, numa perspectiva cósmica de salvação de todos. Há, na atualidade, teólogos como Roger Haigth, Paul Kinter que advogam uma postura mais dialética da reflexão cristológica, situada numa perspectiva para além do exclusivismo ou do inclusivismo. Trata-se de uma posição pluralista. Os autores relacionam Jesus Cristo como princípio normativo da salvação para os que nele creem, sem negar que há outras mediações religiosas que são normativas e fontes de salvação. Jesus Cristo, desse modo, é verdadeiro mais não o único. Justamente essa “relatividade histórica leva o cristão a definir mais exatamente o conteúdo de sua fé em Jesus” (RIBEIRO, 2014, p. 94). Para aprofundar essa questão sobre o Cristo e o pluralismo religioso, consultar: RIBEIRO, Cláudio. Pluralismo e Libertação. São Paulo. Paulus, 2014. Particularmente o capítulo que tem como título “Questões cristológicas em foco” (pp. 83-108). O texto está em formato digital (E-book) no portal da editora. Ex pl or Desse modo, torna-se um imperativo pôr em evidência em toda reflexão cris- tológica a consciência e uma noção que açambarque a pluralidade, diria Claudio Riberio (2018) trata-se de viver não apenas como ética ou catequética um “Prin- cípio pluralista”, dentro do método teológico, consequentemente cristológico. Não se trata de mitigar a importância de Cristo no processo de salvação ou de atenuar verdades sobre ele consolidadas, antes de explicitar sobre uma nova perspectiva, plural, respeitosa e ecumênica já consolidada, extraindo, como um necessário corolário, implicações éticas para viver a fé no Cristo na atualidade. Importante! Uma Cristologia que se propõe contextual e relevante à humanidade contemporânea não pode prescindir em seu arcabouço acadêmico de refletir sobre desde um ponto de vista plural. Em Síntese 18 19 Cristologia e Libertação Inserido no universo de questões que podem dilatar o horizonte da reflexão teo- lógica, particularmente no que diz respeito à Cristologia, apresenta-se a situação de vulnerabilidade, escravidão e sofrimento ao qual uma parcela significativa daqueles que seguem, ou não o Cristo estão submetidos. Convém recordar que essa temática apresenta-se como pertinente, mormente porque a mensagem anunciada por Jesus, em princípio, dirigia-se aos pobres de todos os matizes (Mt 11: 5-6). No espírito do que afirma Moltmann, a Cristologia teórica deve conduzir, naturalmente à comunida- de cristã a uma cristoprática (Cf. MOLTMANN, 2009,p 77-81). De igual modo, tal como a questão da pluralidade religiosa, a dimensão liberta- dora da fé em Cristo foi delineada nos umbrais da tradição teológica, mormente na América Latina. Não sem razão, um proeminente teólogo, numa reunião de signa- tários eclesiásticos latino-americanos, pontificou que a “opção preferencial pelos pobres está implícita na fé cristológica naquele Deus que se fez pobre por nós, para enriquecer-nos com a sua pobreza” (BENTO XVI, 2015). Historicamente, teólogos proeminentes de diversos matizes religiosos já perpe- traram essa articulação entre a fé e libertação, fé cristológica e compromisso com os pobres. No universo cristão-católico, nomes como Gustavo Gutierrez e Leonardo Boff estão atrelados à gênese desse processo teológico. O primeiro é considerado o pai de Teologia que leva em consideração, a partir de Cristo, a realidade concreta do homem empobrecido, sofrido e injustiçado. O segundo, por seu turno, articulou de maneira sistemática categorias que facultavam pensar a Teologia e a Cristologia desde uma opção preferencial pelos pobres. No universo protestante, mesmo com uma variação de nomenclatura, há teólogos que em sua reflexão cristológica arti- culam um compromisso com o universo dos empobrecidos. Nomes como de Elza Tamez, Samuel Escobar, Richard Shaul, Milton Schwantes estão intrinsecamente atrelados ao pensamento teológico/cristológico dentro desse campo particular que é a realidade dos pobres. Desse modo, tendo claro que a situação de muitos seguidores de Jesus Cristo nada, ou muito pouco, alterou-se nos últimos anos, especialmente nas regiões que a geografia designa atualmente como sul-global urge, numa Cristologia que se pre- tende pertinente ao futuro e ao homem hodierno, colocar no bojo de sua reflexão o aspecto intrínseco da fé no Messias, no Cristo ressuscitado, ou seja, a libertação da humanidade. Verdade seja dita, no universo pós-moderno, a realidade torna-se complexa e o clamor dos pobres deve ganhar contornos planetários numa Teologia da criação que vê a plenitude do homem em Cristo, e preocupa-se com o empobrecimento ao qual o a “mãe-terra” está fadada. De Igual modo, a reflexão sobre Cristo não pode descuidar de um discurso que contemple às empobrecidas minorias de todos os tipos e matizes. Enfim, uma reflexão cristológica que se apresenta como pertinente ao homem moderno deve aprofundar em seu arcabouço teórico da reflexão dos empobrecidos que habitam a face da terra. Para aprofundar esta questão de Cristo e libertação é salutar ler o número completo da Revista Perspectiva Teológica, v. 4 n.2 Maio/Agosto de 2016. Disponível em: https://goo.gl/EKJfL9.Ex pl or 19 UNIDADE Estudos Bíblicos: Cristologia Conclusão – Revisão Caro(a) aluno(a):Para conclusão e revisão desta unidade, destacamos, desde a última sessão até o primeiro tópico, os seguintes pontos: 1. A Teologia/ Cristologia, mesmo que seu conteúdo seja de per si impor- tante, decisivo e salvador, deve ser contextual. Ela precisa ser dita de um modo novo, coisas que não precisam ser novas (“Non novum, sed nove”). Assim, na atualidade uma Cristologia que se pretende pertinente ao ho- mem moderno deve levar em consideração o pluralismo religioso e aplicar aquilo que en passant foi pontuado como princípio pluralista. De igual ma- neira, não pode em absoluto, desconsiderar aqueles a quem a mensagem de Jesus Cristo primeiramente foi endereçada, os pobres. 2. Um segundo aspecto tratado na exposição anterior é a questão da evolução histórica da Cristologia e os recentes campos de interpretação do evento Cristo. Deve ficar claro que, desde o Evangelho, passando pelos concílios aquilo que Cristo anunciou e revelou ao mundo foi sendo interpretado e apresentado de maneira inteligível ao homem do seu tempo. Ainda hoje essa mesma mensagem, em toda sua riqueza e completude, ainda deve ser aprofundada e contextualizada. 3. O objeto formal e material da Cristologia, de igual maneira, deve ser enten- dido e afixado de maneira explícita por você para a compreensão o melhor aproveitamento das unidades futuras. Deve-se ter em mente que o objeto material da Cristologia é o Cristo revelado em Jesus. A Cristologia é uma concreta e assentada numa base histórica, a encarnação de Jesus, Filho de Deus. O objeto formal é a hermenêutica/ interpretação daquilo que sua revelação apresenta. 4. Deve-se, ainda ter em mente que a Cristologia, não é uma ciência isolada. Ele se relaciona e reclama outras ciências que podem ajudar da elucidação clara e objetiva de seus postulados. Dentre várias, as mais contíguas à refle- xão cristológica podem ser nomeadas como a Teologia, que tem em seu ob- jeto material Deus e visto que Cristo revela o pai, Teologia supõe e pressupõe Cristologia; de igual modo, Soteriologia, pois trata da matéria que Cristo veio apresentar. Por fim, a Antropologia, pois somente sob o auspício de uma reta compreensão da humanidade à luz da imagem de Cristo é possível levá- -lo à vida plena almejada por Jesus. 5. Com último ladrilho do complexo mosaico que é a reflexão cristológica, devem-se salvaguardar os textos sagrados, suas diversas interpretações so- bre a vida e o sentido da vida de Jesus, como Cristo e Salvador. Esse aspecto pontuado no início desta unidade será aprofundado nas páginas a seguir. 20 21 Material Complementar Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade: Leitura Perspectiva Teológica Para aprofundar esta questão de Cristo e libertação, é salutar ler o número completo da Revista Perspectiva Teológica, v. 4 n.2 Maio/Agosto de 2016. https://goo.gl/EKJfL9 Cristologia como história: Um estudo sistemático-pastoral da Cristologia de Bruno Forte Para aprofundar a questão da Teologia aberta a história na perspectiva de Bruno Forte, é salutar ler a dissertação de mestrado em Teologia de: MACHADO, Renato Silva. Cristologia como história: Um estudo sistemático-pastoral da Cristologia de Bruno Forte. https://goo.gl/HyXwiF Da Antropologia à Cristologia. Da Cristologia à Antropologia Para uma leitura atualizada da relação entre Cristologia e Antropologia com vista a fermentar uma espiritualidade da alteridade inspirado na humanidade de Cristo é oportuno ler: pertinente ler o artigo do “Da antropologia à Cristologia. Da Cristologia à antropologia” dos teólogos Anderson Fasano, Pedro Donizeti de Campos disponível na revista cultura Teológica da Pontifícia universidade de São Paulo( PUC/SP). https://goo.gl/hgVQcF Quem dizem os homens que eu sou? Uma leitura de Marcos 8, 27-38 Para aprofundar a reflexão bíblica sobre o texto de Mc 8, 27-38 sobre a pergunta de Cristo aos discípulos é salutar ler: NAKANOSE, Shigeyuki. Intitulado Quem dizem os homens que eu sou? Uma leitura de Marcos 8,27-38. Publicado pela Revista Vida Pastoral. https://goo.gl/2UaJva 21 UNIDADE Estudos Bíblicos: Cristologia Referências BENTO XVI, Sessão Inaugural Dos Trabalhos da V Conferência Geral do Epis- copado da América Latina e do Caribe. Disponível em: <http://w2.vatican. va/content/benedict-xvi/pt/speeches/2007/may/documents/hf_ben-xvi_ spe_20070513_conference-aparecida.html>. Acesso em 16.07.2018. BINGEMER, M. C. L. Jesus Cristo: Servo de Deus e messias Glorioso. São Paulo/ Barcelona: Paulinas/Siguem, 2008. CALIMAM, C. O “Jesus histórico” como ponto de partida da Cristologia. Dispo- nível em: <https://ccaliman.wordpress.com/2010/11/03/o-%E2%80%9CJesus- -historico%E2%80%9D-como-ponto-de-partida-da-Cristologia/>. Acesso em: 14.06.2018. DUPUIS, J. Introdução à Cristologia. São Paulo: Loyola, 1999. FORTE, B. Jesus de Nazaré, história de Deus, Deus da história: ensaio de uma Cristologia como história. São Paulo: Paulinas, 1985. LINDEN, P. Van M.; BERGANT, D.; KARRIS, R. (Org). Comentário Bíblico. São Paulo: Loyola, 1999, pp. 59-60. MACHADO, Renato Silva. Cristologia como história: Um estudo sistemático- -pastoral da Cristologia de Bruno Forte. Acesso em: 15 julho 2018. Disponível em: <http://livros01.livrosgratis.com.br/cp129835.pdf>. MANZATTO, Antônio. Notas para uma cristología para o terceiro Milênio. Revista de Cultura Teológica. n.31. p. 79 – 106. Disponível em: <https://revistas.pucsp. br/index.php/culturateo/article/view/23991/17294>. MATIAS, C. Evolução Dogmática da Cristologia. Disponível em: <http://cal- meiro-matias.blogspot.com/2009/02/evolucao-dogmatica-da-Cristologia.html>. Acesso em 17.07.18 MOLTMANN, J. O caminho de Jesus Cristo: Cristologia em dimensões Messiâ- nicos. 14 ed. São Paulo: Loyola/Academia Cristã. 2009. RIBEIRO, C. Pluralismo e Libertação. São Paulo: Paulus, 2014. (E-book) RIBEIRO, C. Princípio Pluralista. Cadernos Teologia Pública. São Leopoldo: Unisinos. Ano XIV. V. 14. n. 128, 2017. Disponível em: <www.ihu.unisinos.br/ images/stories/cadernos/teopublica/128_cadernosTeologiapublica.pdf>. Acesso em. 15.07.2018. SILVIO, C. La cristología en América Latina. Theologica Xaveriana n.81, 1986. p.363-404. 22
Compartilhar