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TEMA-04-CREDITO DIGITAL-Controle Social Penal e Estado Democrátco de Direito

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DEFINIÇÃO
Relação entre as missões e a seletividade normativa do Direito Penal com a legitimidade do
poder punitivo do Estado. Características e análise comparativa do processo penal inquisitivo e
acusatório. Garantias constitucionais e processuais penais do acusado no Estado Democrático
de Direito. Leis penais simbólicas e os desafios quanto a sua efetividade normativa.
PROPÓSITO
Analisar criticamente como o controle social penal no Estado Democrático de Direito permite
tratar adequadamente as garantias constitucionais do acusado; os desafios da efetividade
normativa das leis penais simbólicas; o papel e a missão do Direito diante do poder punitivo do
Estado.
PREPARAÇÃO
Tenha em mãos o Código Penal brasileiro vigente (DECRETO-LEI No 2.848, DE 7 DE
DEZEMBRO DE 1940), o Código de Processo Penal (DECRETO-LEI Nº 3.689, DE 3 DE
OUTUBRO DE 1941) e a Constituição brasileira de 1988, legislações disponíveis no Portal de
Legislação do Planalto.
OBJETIVOS
MÓDULO 1
Relacionar as missões e a seletividade do direito penal com o poder punitivo do Estado
MÓDULO 2
Comparar os sistemas processuais penais
MÓDULO 3
Descrever as leis penais simbólicas
INTRODUÇÃO
Neste tema, você estudará os fundamentos teóricos e conceituais que permitem o
entendimento da missão, do papel, da proposta e dos parâmetros críticos e constitucionais do
Direito Penal. Discutiremos se essa área da ciência do Direito pode ser considerada um
instrumento de seletividade e controle social, fortalecendo o poder do Estado em detrimento da
segregação e marginalidade dos indivíduos. Você também analisará criticamente a
criminalização da homossexualidade como ferramenta hábil a demonstrar o intervencionismo
estatal na criação de tipos penais, que objetivam fortalecer as estruturas sociais de
discriminação sexual, preconceito e marginalização de homens e mulheres gays.
Vamos verificar que o estudo comparativo dos sistemas processuais penais, inquisitivo e
acusatório, demonstra que o direito penal e o processo penal não podem ser vistos como
ferramentas de etiquetação de condutas que visam fortalecer a segregação, desigualdade,
marginalização e exclusão de pessoas. Por isso, veremos os princípios constitucionais da
presunção de inocência, do contraditório, da ampla defesa, do devido processo legal, da
individualização da pena e da inadmissibilidade de provas ilícitas no entendimento crítico do
processo penal democrático, caracterizado pela ampla dialogicidade das questões
controversas, exaltando o dever do poder estatal desconstituir o estado de inocência
assegurado constitucionalmente como critério da dignidade humana.
Ao final, vamos estudar as leis penais simbólicas, destacando os desafios da sua efetividade
normativa, além de evidenciar a falência nas propostas legislativas que apresentam objetivos
quase sempre inalcançáveis, como é o caso da Lei Maria da Penha (Lei 11.340, de 7 de agosto
de 2006).
MÓDULO 1
 Relacionar as missões e a seletividade do direito penal 
com o poder punitivo do Estado
DIREITO PENAL E O PRINCÍPIO DA
LEGALIDADE
O direito penal é um ramo do direito público que pretende sistematizar normas jurídicas que
possuem o objetivo de tipificar condutas consideradas penalmente relevantes, bem
como suas sanções correspondentes – penas e medidas de segurança. O Código Penal
brasileiro trouxe expressamente, em seu artigo 1, a literalidade de que não há crime sem lei
anterior que o defina, assim como não há pena sem prévia cominação legal; esse mesmo
conteúdo normativo-legal também está estampado no inciso XXXIX, do artigo 5 da Constituição
brasileira de 1988.
Assim, o princípio da legalidade é o fundamento regente para a definição de quais condutas
serão consideradas crimes pelo Estado. Ou seja, tipificar uma conduta se equipara à lógica da
etiquetação estatal de pessoas criminosas e comportamentos eleitos pelo Estado como crime,
sendo para isso necessário que o legislador defina, previamente, quais são essas questões
estatais consideradas penalmente relevantes.
Na realidade, a lei que institui o crime e sua respectiva pena deverá ser anterior ao fato que se
pretende punir, condição fundamental para proteger a dignidade dos cidadãos. Estes não
poderão ser surpreendidos com proposições normativas que antes não eram condutas ou ilícito
penais, mas repentinamente tornaram-se crimes. Essa previsão legal do que se entende e
define como crime é, além de uma garantia que prima pela segurança jurídica, uma forma de
assegurar a todas as pessoas condições de se planejarem, no sentido de agirem nos moldes
das disposições expressamente previstas no plano legislativo.
O direito de o Estado punir penalmente uma pessoa, por determinada conduta por ela
praticada, exige obrigatoriamente a observância do princípio da legalidade. O Estado tem
o dever de vincular todas as atividades de seus agentes aos ditames legais e o direito penal
“impõe a observância da estrita legalidade para a definição dos crimes e aplicação das penas”
(GALVÃO, 2011, p. 110); uma vez que “a vinculação da atividade repressiva do Estado aos
limites previamente estabelecidos por lei constitui verdadeiro instrumento de contenção da
tirania e do despotismo” (GALVÃO, 2011, p. 110).
A tipicidade penal é um princípio que estabelece o dever de o legislador descrever,
minuciosamente e de forma prévia, quais são as condutas humanas consideradas
ilícitas e relevantes sob a perspectiva penal. Se o Estado possui o interesse em punir e
criminalizar determinada atitude, primeiro deverá descrevê-la de forma clara, pontual, objetiva e
sistematizada, uma vez que isso é o que prevê os princípios da legalidade e taxatividade. A
legalidade é, assim, uma das mais importantes conquistas do direito penal moderno.
 
Esse postulado trouxe, ainda, o debate e a importância de sistematização jurídico-legal da
anterioridade penal como requisito para a punição de atitudes consideradas penalmente
relevantes:
A adequação de uma determinada conduta ao tipo penal exige do aplicador do direito uma
interpretação literal e restritiva: não poderá o magistrado ou o órgão acusador interpretar de
forma analógica, ampla, valorativa ou metajurídica determinado comportamento objetivando
incriminar e punir penalmente seu agente.
TIPO PENAL
Norma jurídico-legal que descreve minuciosamente cada conduta humana considerada crime.

Toda pessoa tem constitucionalmente assegurado o estado de inocência, cabendo ao Estado
desconstituir essa presunção de inocência apenas quando a conduta humana se enquadrar,
literalmente, ao conteúdo descrito na lei como crime.

Havendo qualquer possibilidade de o Estado agir fora dos limites estabelecidos pela lei, tal
ação será reprimida pelo direito penal; uma vez que o princípio da legalidade (reserva legal),
juntamente com a anterioridade penal, tipicidade penal, segurança jurídica e dignidade
humana, trouxeram maior segurança e estabilidade jurídica aos cidadãos.
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O Estado tem o dever de vincular todas as atividades de seus agentes aos ditames legais e o
direito penal:
IMPÕE A OBSERVÂNCIA DA ESTRITA LEGALIDADE
PARA A DEFINIÇÃO DOS CRIMES E APLICAÇÃO DAS
PENAS”, UMA VEZ QUE “A VINCULAÇÃO DA
ATIVIDADE REPRESSIVA DO ESTADO AOS LIMITES
PREVIAMENTE ESTABELECIDOS POR LEI CONSTITUI
VERDADEIRO INSTRUMENTO DE CONTENÇÃO DA
TIRANIA E DO DESPOTISMO.
(GALVÃO, 2011, p. 110)
MAS QUAL É A FINALIDADE E A MISSÃO DO DIREITO
PENAL NO ESTADO MODERNO DE DIREITO?
ESTADO MODERNO
É possível considerar a modernidade o período histórico que se inicia no século XVII, após o
absolutismo monárquico, e que se estende até a primeira metade do século XX.
FINALIDADE E MISSÃO DO DIREITO PENAL
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Originariamente, esse ramo da ciência do Direito deixou claro seu propósito de fortalecer o
exercício legítimo do poder estatal, além de ser instrumento de controle social. Pois, no
momento em que o Estado etiqueta e estabelece previamente quais são as condutas humanas
reprimidaspenalmente e consideradas crimes, deixa claro o seu interesse e legitimidade
jurídica quanto à punição dos sujeitos que violarem de forma dolosa ou culposa tais
determinações legais.
Por isso, o Estado foi colocado “à frente de um fenômeno originado pelo desrespeito de alguns
cidadãos aos direitos e garantias individuais de outros, na medida em que bens jurídicos
tutelados por escolhas da sociedade, através de seus legítimos representantes, eram
ofendidos e necessitavam de proteção” (ANDREUCCI, 2008, p. 3).
 
Nesse cenário sociojurídico, o Estado passou a utilizar o direito penal como instrumento
institucionalizado de controle social, deixando claro o poder estatal de punir mediante
previsões legais estabelecidas no ordenamento jurídico brasileiro. A principal máxima utilizada
pelo Estado para justificar sua atuação punitiva é que :
OS BENS PROTEGIDOS PELO DIREITO PENAL NÃO
INTERESSAM AO INDIVÍDUO, EXCLUSIVAMENTE, MAS
À COLETIVIDADE COMO UM TODO”, POIS “A
RELAÇÃO EXISTENTE ENTRE O AUTOR DE UM CRIME
E A VÍTIMA É DE NATUREZA SECUNDÁRIA, UMA VEZ
QUE ESTA NÃO TEM O DIREITO DE PUNIR.
(BITENCOURT, 2002, p. 4)
A lógica jurídica estabelecida é que o poder punitivo do Estado tem as seguintes vertentes:
Retribuir ao agente a conduta ilícita por ele praticada, objetivando sua ressocialização e
mudança de postura diante do contexto individual e coletivo.
Reforçar a legitimidade em proteger a 
coletividade mediante a demonstração 
simbólica de segurança social.
A partir dessas premissas, fica bastante clara a missão inicial do direito penal na modernidade:
Punir agentes que praticam condutas tipicamente consideradas crimes pela norma legal, além
do interesse de prevenir e desestimular a sociedade civil em geral quanto à prática dessas
atitudes.
A retribuição justa ao agente – autor de um crime – é vista dentre essas missões do direito
penal trazidas pela modernidade, pois sua tarefa seria a “proteção dos elementares valores
ético-sociais da ação e só por extensão a proteção de bens jurídicos” (TOLEDO, 1994, p. 7).
Na realidade, a principal missão do direito penal com o advento da modernidade foi fortalecer o
poder do Estado, legitimando legalmente a aplicação de penas a sujeitos que transgridam a
norma penal, como mecanismo simbólico de proteção da sociedade civil.
A missão do direito penal, nessa perspectiva teórica, é o controle social. Acredita-se que a
norma jurídica em si mesma, especialmente se vier acompanhada de penas severas, é capaz
por si só de desestimular o agente à prática de ilícitos. Na perspectiva trazida pela
modernidade, no momento em que o Estado pune alguém que comete um ilícito penal, estaria
desestimulando outros sujeitos a praticarem a mesma conduta, como se fosse uma lógica
matemática e quantitativa.
 Protesto pela morte da vereadora Marielle Franco, que atuava fortemente nas causas de
direitos humanos e fim do racismo.
A revisitação das respectivas premissas teóricas na sociedade democrática é de fundamental
importância para o entendimento crítico sobre a própria missão democrata-constitucional do
direito penal. A norma jurídico-legal, na sua específica literalidade, não tem o condão de
desestimular de forma automática e vegetativa os seus destinatários de deixarem de praticar
determinada conduta reprimida penalmente.
 COMENTÁRIO
Se essa lógica fosse verdadeiramente real, seria apenas criar um amplo arcabouço normativo,
com penas severas e densas, o que seria suficiente para garantir à sociedade civil sua ampla e
integral proteção.
Vejamos agora a missão efetiva do direito penal no Estado Democrático de Direito.
A democraticidade da atuação do Estado exige inicialmente que os destinatários dos
provimentos estatais tenham a oportunidade de participar discursivamente de sua construção.
Se determinada norma jurídica é pensada para reprimir condutas, consideradas penalmente
relevantes, é importante que seus receptores participem dialogicamente de sua construção e
aplicabilidade, para que consigam enxergar e dimensionar a importância desse conteúdo
normativo, tanto na esfera coletiva, quanto individual.
No momento em que o Estado constrói e elabora unilateralmente uma lei penal, sem se
preocupar em construir um debate, faz com que os destinatários não se sintam partes
integrantes e pertencentes à norma. Quando isso acontece, a consequência automática é um
déficit de efetividade normativa, ou seja, se o receptor da norma não participou do debate
construído no processo legislativo que culminou com sua aprovação, qual é o sentido de
visualizar a importância no que tange à aderência ao conteúdo dessa norma? Se é incapaz de
compreender a sua importância jurídico-social, qual é o sentido de apoiar o seu conteúdo?
Um exemplo que ilustra bem o fato de que a norma jurídico-penal em si seja incapaz de
modificar estruturalmente a realidade social é a Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006). Se
qualquer destinatário de uma norma penal não consegue compreender a dimensão do seu
conteúdo simbólico, fica consequentemente comprometido o seu efetivo propósito, que é
reprimir e desestimular o agente de praticar a conduta penalmente reprovada pelo Estado.
LEI MARIA DA PENHA (LEI 11.340/2006)
Aprovada originariamente para coibir atos de violência doméstica, essa norma objetiva punir o
agente (homem) que pratica violência doméstica contra a mulher (violência psicológica, moral,
física e sexual).
 Maria da Penha, líder de movimentos de defesa dos direitos das mulheres.
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Antes de o Estado aprovar uma norma penal repressora e punitiva, é importante diagnosticar
as razões e motivos que levam as pessoas a praticarem determinadas condutas reprovadas
penalmente, o que é objeto da criminologia.
 
Quando se realiza um estudo preliminar das causas que levam à delinquência, consegue-se
diagnosticar outras estratégias interventivas, que vão além da lei penal, no sentido de prevenir
a prática de condutas delituosas e lesivas aos interesses individuais e sociais.
CRIMINOLOGIA
A criminologia é uma ciência cuja “principal atividade centra-se no estudo das causas do delito,
ou seja, em explicá-lo – a perspectiva etiológica” (SANTOS, 2020, p. 71). “Através de várias
teorias se busca tentar entender por que as pessoas acabam cometendo os crimes e qual o
motivo que na sociedade esses delitos ocorrem” (SANTOS, 2020, p. 71). A criminologia crítica
cumpre seu papel “retendo como material de interesse para o Direito Penal apenas o que
efetivamente mereça punição reclamada pelo consenso social, e denunciando todos os
expedientes destinados a incriminar condutas que, apenas por serem contrárias aos interesses
dos poderosos do momento, política ou economicamente, venham a ser transformadas em
crime” (MIRABETE, 1998, p. 30). “A criminologia moderna também se ocupa atualmente com
as causas do fenômeno delitivo, suas formas de prevenção, controle, sendo considerada uma
ciência causal-explicativa em que enxerga o delito como um fenômeno social e também
individual” (SANTOS, 2020, p. 74).
É preciso deixar de enxergar o delinquente como um inimigo do Estado e da sociedade civil,
procurando-se entender a dimensão em que ele se encontra inserido para, assim,
compreender sistematicamente as razões que o levam à prática delituosa. Nesse sentido,
destaca-se o princípio da intervenção mínima ou da última ratio, que implica a
intervenção do Direito Penal restrita “ao mínimo necessário à manutenção da harmonia
social” (GALVÃO, 2011, p. 116).
 
A força punitiva de intervenção do Estado na esfera penal deve ser bem orientada, pois:
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A INCRIMINAÇÃO SÓ SE JUSTIFICA DIANTE DE
ATAQUE A BEM JURÍDICO CONSIDERADO
RELEVANTE, E A APENAÇÃO, ALÉM DE SER
PROPORCIONAL AO DANO SOCIAL PRODUZIDO,
DEVE SER A MÍNIMA NECESSÁRIA À REALIZAÇÃO
DOS FINS DE PROTEÇÃO ALMEJADOS.
(GALVÃO, 2011, p. 117)
A intervenção mínima do Estado quanto à tipificação penal deixa claro que o direito penal deve
ser utilizado como instrumentosubsidiário – não principal – de controle social.
A criminalização somente se justifica democraticamente quando as instituições – sociedade,
Estado, família – comprovadamente demonstram sua insuficiente atuação no sentido de
prevenir comportamentos delituosos, não restando outra alternativa ao Estado a não ser a
incriminação dessas condutas.
A missão do direito penal democrata-constitucional é proteger amplamente a dignidade
humana, seja na esfera individual ou coletiva, motivo esse que justifica a
imprescindibilidade de intervenção estatal mínima, no que atine à criminalização e punição de
pessoas. Antes de ser instrumento de controle social e fortalecimento do poder punitivo do
Estado, a missão constitucionalizada e democratizante do direito penal é permitir que cada
cidadão seja amplamente protegido em sua dignidade, quando se encontra diante das
arbitrariedades possivelmente praticadas pelo Estado. Isso não foi sustentado pelos
estudiosos da modernidade que, contrariamente a essas premissas aqui expostas, defenderam
a aplicabilidade do principio do direito penal máximo. Os defensores deste preceito insistem na
ideia de eleger o criminoso como um inimigo do Estado, ao invés de procurar entender as
razões que levam ao aumento constante e significativo dos números da criminalidade no Brasil.
MAS QUAIS SERIAM AS RAZÕES PARA O CONSTANTE
CRESCIMENTO DA CRIMINALIDADE NO BRASIL?
FATORES PARA O CRESCIMENTO DE ATOS
CRIMINOSOS NA SOCIEDADE BRASILEIRA
São inúmeras as razões que explicam, na prática, o crescimento de atos criminosos no Brasil.
O déficit de eticidade e alteridade (valorização do outro), o crescente abismo social, além de
aspectos morais, sociais e religiosos, são alguns fatores que podem elucidar inicialmente a
questão.
 Morador de rua e a falta de acesso aos direitos fundamentais básicos.
O comportamento tipicamente individual e patrimonialista de muitos sujeitos, além da
incapacidade de conseguir se colocar no lugar do outro (ausência de alteridade), influencia de
forma direta na prática de alguns ilícitos penais, como os crimes contra o patrimônio e contra
administração pública.
 
A desigualdade social e o grande número de pessoas vivendo ou sobrevivendo abaixo da linha
da pobreza, desempregadas e sem acesso a direitos fundamentais básicos, também
contribuem significativamente para a prática de ilícitos penais, como é o caso do crime de
tráfico de drogas.
Razões morais explicam, por exemplo, a prática de crimes contra a dignidade sexual,
homicídios, ressaltando-se que a dominação masculina reflete de forma direta em muitos
crimes contra mulheres, assim como há o interesse do Estado em criminalizar a sexualidade,
ao penalizar atos praticados contra a integridade sexual da vítima.
MAS SERÁ QUE ESSA ATUAÇÃO PUNITIVA DO
ESTADO, NO SENTIDO DE PENALIZAR ESSAS E
DIVERSAS OUTRAS CONDUTAS, ASSEGURA A
MODIFICAÇÃO DE ESTRUTURAS SOCIAIS QUE
EXPLICAM MUITOS DESSES COMPORTAMENTOS?
ATUAÇÃO PUNITIVA DO ESTADO
O direito penal é uma ciência normativa que institui como crime condutas consideradas, em
princípio, anormais no campo social. Em contrapartida, a criminologia considera o crime um
problema social, um fenômeno comunitário, que possui quatro componentes.
INCIDÊNCIA MASSIVA NA POPULAÇÃO
1
Não se pode tipificar como crime um fato isolado.
INCIDÊNCIA AFLITIVA DO FATO PRATICADO
O crime deve causar dor à vítima e à comunidade.
PERSISTÊNCIA ESPAÇO-TEMPORAL DO FATO
DELITUOSO
É preciso que o delito ocorra reiteradamente por um período significativo de tempo no mesmo
território.
CONSENSO INEQUÍVOCO ACERCA DE SUA
ETIOLOGIA E TÉCNICAS DE INTERVENÇÃO EFICAZES
A criminalização de condutas depende de uma análise minuciosa desses elementos e sua
repercussão na sociedade.
A criação de um tipo penal deve ser reflexo de uma decisão amadurecida do Estado, após
análise cuidadosa dos critérios aqui expostos. O crime não pode ser visto como um
instrumento normativo-legal, por meio do qual o Estado institucionaliza uma guerra contra
quem é por ele declarado como inimigo.
 COMENTÁRIO
Definitivamente, essa não pode ser a missão do direito penal: criminalizar condutas com o
propósito de objetificar sujeitos, fortalecendo a marginalidade e a exclusão reproduzida
naturalmente pela sociedade civil.
2
3
4
Na perspectiva da Constituição de 1988, o direito penal tem a missão de reprimir condutas
comprovadamente danosas à coletividade, quando não restar outra alternativa a não ser
punir o agente mediante a intervenção da norma jurídica. Ou seja, seguindo-se a lógica da
intervenção mínima, apenas quando as demais estruturas sociais demonstrarem insuficiência
em sua atuação, é que se deve criar um tipo penal.
A missão democrata-constitucional do direito penal é punir o agente (autor do ilícito penal) de
forma a assegurar-lhe, tanto durante o processo judicial quanto ao longo do cumprimento da
pena, a proteção ampla e efetiva de sua dignidade. Não se pode admitir a atuação repressiva
do Estado na sociedade democrática, ignorando-se os direitos fundamentais
constitucionalmente assegurados a todos os sujeitos, especialmente àqueles que praticam
ilícitos penais.
SOB A PERSPECTIVA CRÍTICA, QUAL A UTILIDADE
PRÁTICA E A IMPORTÂNCIA TEÓRICA DO DIREITO
PENAL PARA O ESTADO?
Por meio da criação de figuras típicas (crimes), o Estado fortaleceu seu poder na modernidade,
explicitando sua autoridade de punir pessoas que praticavam condutas por ele consideradas
ilícitos penais. Além disso, o direito penal era visto como um instrumento estatal para
marginalizar pessoas, tornar formalmente invisível aqueles sujeitos que já o são socialmente.
 
É o caso do jovem negro e periférico, peça fundamental para o tráfico de drogas, que se
desenvolve naturalmente sob os olhos do Estado, sem que o mesmo assim implemente
políticas públicas de repressão efetiva ao negócio de substâncias entorpecentes ilícitas. Ao
invés disso, o que o Estado faz? Criminaliza a conduta do jovem negro periférico,
objetificando-o e reforçando a ação das estruturas sociais que naturalizam sua exclusão
e marginalidade.
Agindo dessa forma, o Estado simbolicamente oferece à sociedade civil – composta pelos ditos
sujeitos de “bem” – uma situação de aparente conforto e segurança jurídica, sem atacar o
problema central que permeia a respectiva temática: o combate ao tráfico de drogas
mediante o planejamento e a execução de políticas públicas. Estas deveriam objetivar a
geração de empregos, a punição dos chefes do tráfico de drogas e o oferecimento de
condições dignas para o jovem negro periférico – emprego, educação, moradia.
 Protesto contra operação policial.
No momento em que o Estado opta pela punição do jovem negro periférico, em razão de seu
envolvimento com o tráfico de drogas, deixa claro que a missão do direito penal é meramente
punitiva, segregacionista e marginalizadora, contrariando os ditames constitucionais da
dignidade humana e igualdade. Em contrapartida, no Estado Democrático de Direito, a missão
do direito penal deve ir muito além do seu caráter condenatório, de controle social e exercício
autocrático do poder punitivo estatal.
A missão democrática da norma penal deve ser excepcionalmente punir o sujeito (intervenção
mínima), ressaltando-se que a tipificação de condutas como ilícitos penais deve ser a última
ratio, apenas quando comprovada a insuficiência das demais estruturas sociais (sociedade,
família, Estado) em garantir a dignidade, inclusão e igualdade, especialmente das pessoas em
absoluta condição de vulnerabilidade social.
A missão do direito penal brasileiro não pode ser o encarceramento em massa, mediante a
criminalização da pobreza, com a punição massificada e institucionalizada daqueles sujeitos
categorizados legalmente como os inimigos do Estado. 
MISSÃO DO DIREITO PENAL
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Proteção da dignidade humana no tratamento igual das pessoas, mediante a intervenção
mínima do Estado na criminalização e penalização de condutas.MAS QUEM SERIAM OS INIMIGOS DO ESTADO?
OS INIMIGOS DO ESTADO
Antes de identificar os efetivos inimigos do Estado, no campo penal, é importante compreender
o instituto do lawfare . O modelo do lawfare contraria as premissas democráticas do processo
penal e direito penal constitucionalizado, que se fundem na presunção da inocência, além de
assegurarem amplamente aos sujeitos o direito de se defenderem, mediante a implementação
e efetividade dos princípios constitucionais do contraditório, ampla defesa e devido processo
legal.
LAWFARE
O lawfare pode ser definido como “guerra a partir das leis”, haja vista que lei é vista como mais
um desses instrumentos e ferramentas ideologicamente construídos para atacar aqueles
sujeitos considerados inimigos do Estado ou das instituições que conduzem as diretrizes do
sistema jurídico vigente. O LAWFARE é uma proposição teórica que possui relação direta com
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o modelo de processo penal e direito penal inquisitivo. O Estado se utiliza da lei como
instrumento de guerra, construindo aprioristicamente os sujeitos que são considerados inimigos
do Estado. Trata-se de proposições que dialogam diretamente com o “direito penal do inimigo”,
ressaltando-se que seu surgimento se deu inicialmente na China, robustecendo-se as
proposições teóricas apresentadas nos Estados Unidos da América, especialmente após o
atentado de 11 de setembro de 2001. A partir desse acontecimento histórico, o próprio EUA
institucionalizou o LAWFARE em seu país, deixando claro em sua legislação que terroristas e
estrangeiros suspeitos de atentar contra a segurança nacional são considerados os sujeitos
legalmente inimigos do Estado. Importante esclarecer que o Brasil adotou expressamente em
sua legislação o instituto do LAWFARE, por meio da Portaria 666, de 25 de junho de 2020,
elegendo terroristas, pedófilos, traficantes de drogas e outros sujeitos como inimigos do
Estado, presumindo que esses sujeitos são perigosos à segurança nacional. O conteúdo dessa
portaria institucionalizou no Brasil a possibilidade dessas pessoas serem extraditadas ou
expulsas sem o direito de defesa, sistematizando de forma clara o modelo de processo penal e
direito penal inquisitivo.
Políticos, traficantes de drogas, pedófilos, policiais, além dos sujeitos negros e pardos de
periferia, são considerados os inimigos legais do Estado brasileiro. Quando essas pessoas são
denunciadas pelo Ministério Público passam a conviver com o calvário da presunção da
culpabilidade, devendo provar perante o Estado a sua condição constitucional de inocência –
que deveria ser presumida. Nesse contexto, temos decisões judiciais autocráticas,
fundadas na discricionariedade judicial, num modelo hermenêutico com forte carga
axiológica. O que torna inviável a participação desses sujeitos na construção discursiva e
racional do provimento final de mérito, uma vez que, quando são processados, assumem a
obrigação de desconstituir a presunção de culpabilidade suportada em razão de serem vistos
como inimigos expressos do Estado.
 
Quando o Estado legitima aprioristicamente a construção legal de um inimigo,
utilizando-se da norma penal para segregar tal sujeito, assume um papel inquisidor e
autocrático. O direito penal democrático tem a missão de criminalizar condutas, não pessoas
escolhidas previamente pelo legislador. O direito penal, quando opta pela criminalização de
sujeitos específicos (pedófilos, jovens negros periféricos, políticos, policiais), assume uma
missão inquisitiva e de certo modo belicosa, que não se compatibiliza com as diretrizes
normativas trazidas pelo texto da Constituição brasileira de 1988.
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BELICOSA
Etimologicamente a expressão lawfare possui relação direta com as expressões “lei” e “guerra”,
ou seja, a lei é um instrumento utilizado para a realização de uma guerra simbólica, pois o
Estado objetiva eliminar, marginalizar e punir autocraticamente seus inimigos. Pensar a ciência
penal, nessa perspectiva, é reconhecer que o legislador elege um público específico como
destinatário direto dessas normas, até para justificar sua existência, pois, se assim não for,
como o Estado se legitimará socialmente? A criação simbólica dos inimigos penais é uma
estratégia estatal utilizada na busca do controle social e segurança jurídica da coletividade. No
momento em que um desses inimigos se submete à pena autocraticamente aplicada pelo ente
estatal, robustece-se o seu poder, retroalimentando a crença de que a pena é capaz de
modificar estruturas sociais que colaboram diretamente para a práticas de atos delituosos.
Outro ponto importante a ser abordado é o papel higienista assumido como missão do
direito penal moderno. A norma penal é vista como instrumento de limpeza e higienização
social, sendo utilizada como ferramenta para eliminar, objetificar, marginalizar, segregar e
robustecer a exclusão daqueles “ditos” inimigos do Estado, que já são natural e socialmente
excluídos pelas estruturas de poder vigentes. Quando se faz essa afirmação, pretende-se
demonstrar que, sob a ótica do senso comum, os problemas sociais existem como um dado da
realidade, como algo natural.
É frequente a reverberação do discurso que a vida em sociedade é naturalmente conflituosa
por si só, visando justificar a intervenção normativo-penal, cujo objetivo é regular a própria vida
em sociedade. A complexidade de fatores que envolvem tal análise é tamanha que nos leva a
afirmar que o problema da criminalidade social não pode ser reduzido a soluções mágicas
propostas pelo direito penal.
 EXEMPLO
A política criminal de combate às drogas, por exemplo, objetiva criminalizar condutas de
agentes que comercializam e consomem substâncias categorizadas juridicamente como
ilícitas, ignorando-se as razões que explicam a existência de tal fenômeno social.
Quando as estruturas sociais naturalizam o consumo de tabaco e bebidas alcoólicas,
responsável pela movimentação direta da economia, estimula-se consequentemente, de forma
indireta, o consumo de outras substâncias químicas, como a cocaína, maconha e drogas
sintéticas. Visando manter seu poder inato, o Estado criminaliza muitas dessas condutas,
categorizando como ilícito o consumo de apenas algumas substâncias químicas. A partir
dessas premissas, aquele que consome ou comercializa as ditas substâncias entorpecentes
ilícitas será punido criminalmente.
O que se verifica nesse contexto é que o objetivo do Estado, ao criminalizar o uso e o consumo
de drogas ilícitas, não é especificamente reprimir o comércio ilegal dessas substâncias, mas
sim eleger um inimigo (traficante ou usuário) como forma de demonstrar seu poder de controle
social.
O problema da criminalização do consumo e do uso de substâncias proibidas é, além do
fortalecimento do poder estatal, a objetificação dos sujeitos eleitos como pessoas delituosas,
justificando a existência e a atuação do Estado punitivista.
A criminalização do consumo e comercialização de drogas no Brasil representa uma estratégia
de poder muito articulada e pensada pelo Estado. Não se pretende, por meio da norma jurídica,
reprimir efetivamente o consumo de substâncias químicas pela sociedade civil. Objetiva-se, na
verdade, o fortalecimento jurídico dos mecanismos de controle social mediante a solidificação
do poder autocrático-inquisitivo do Estado.
No momento em que o Estado cria legalmente um inimigo, utiliza-se da norma penal para punir
pessoas específicas e institucionaliza um sistema de seletividade normativo-punitivista, como
estratégia simbólica para responder às demandas de uma sociedade que muitas vezes busca a
vingança, não a aplicabilidade de penas nos moldes democrata-constitucional e garantistas.
PODE O DIREITO PENAL SER VISTO COMO UMA
ESTRUTURA DE DOMINAÇÃO E GERAÇÃO DE
VIOLÊNCIA PRATICADA E LEGITIMADA
PRESSUPOSTAMENTE PELO PRÓPRIO ESTADO?
Tem ficado claro que o direito penal, quando utilizado como mecanismo punitivista de seleção
de condutas e pessoasdeterminadas, é considerado uma estratégia que visa fortalecer a
atuação do poder autocrático do Estado. Ao invés de ser visto como forma de controle social,
dominação e segregação de pessoas, o direito penal garantista deve primar pela proteção
ampla, efetiva, sistemática e inclusiva das pessoas, de forma indistinta. Quando o direito penal
assume o papel exclusivamente punitivista, gera violência simbólica contra as pessoas,
especialmente com relação aos sujeitos categorizados como inimigos ou indignos pelo Estado
que, por isso, deverão ser penalizados.
 EXEMPLO
Um clássico exemplo, ainda atual, de utilização do direito penal como espaço de geração de
desigualdades entre as pessoas, é a criminalização da homossexualidade. Nesse contexto,
o direito penal é visto como estrutura que legitima o discurso de ódio contra gays e lésbicas, no
momento em que estabelece como conduta criminosa e tipificada penalmente a relação
afetivo-sexual existente entre duas pessoas do mesmo sexo.
CRIMINALIZAÇÃO DA HOMOSSEXUALIDADE
Relações consensuais entre pessoas do mesmo sexo são consideradas crime em 70 (setenta)
países, conforme relatório intitulado “Homofobia de Estado”, elaborado pela Associação
Internacional de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Trans e Intersexuais (MANTOVANI, 2019). O
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fenômeno da criminalização da sexualidade, além de constituir evidentemente um modo de
praticar violência contra pessoas homossexuais, endossa o discurso homofóbico naturalizado
pelas estruturas sociais que reproduzem as vozes da ditadura binário-heteronormativa.
 Marcha contra homofobia em Brasília.
Verifica-se, nesse cenário, que a violência sofrida pela comunidade LGBTQI+ não é apenas
advinda das estruturas sociais clássicas (família, sociedade, escola), uma vez que o próprio
Estado se apropria desse discurso e o utiliza como fundamento para a criação de tipos penais
que criminalizam a sexualidade. É, no mínimo, preocupante saber que, em pleno século XXI,
ainda existem países que continuam criminalizando a liberdade sexual. Se é crime a conduta
dos gays e das lésbicas, tem-se a norma penal com dispositivo estratégico do Estado para
suprimir a liberdade desses sujeitos, fundamento jurídico-legal absolutamente contrário às
proposições normativo-legais democráticas.
A partir dos conceitos discutidos neste módulo, vamos agora refletir com o Professor Doutor
Fabrício Veiga Costa o verdadeiro papel do direito penal.
Neste vídeo, iremos problematizar o papel do direito penal e suas respectivas premissas.
VERIFICANDO O APRENDIZADO
MÓDULO 2
 Comparar os sistemas processuais penais
SISTEMA INQUISITIVO
O Código de Processo Penal, em sua redação primitiva, adotou o sistema de processo
inquisitivo, fundado na presunção de culpabilidade do acusado. Uma das principais
características do sistema inquisitivo do processo penal é a desigualdade jurídica em relação
ao tratamento conferido ao acusado. O sujeito acusado de praticar uma determinada infração
penal, na perspectiva inquisitiva, carrega em si a presunção de culpa – não o estado de
inocência ou presunção de não culpabilidade, tal como proposto pelo texto da Constituição
brasileira de 1988.
PERSPECTIVA INQUISITIVA
Na realidade, o processo inquisitivo pode ser considerado uma antítese do sistema acusatório,
já que não há o contraditório e “as regras da igualdade e da liberdade processuais”
(TOURINHO FILHO, 1998, p. 92).
No modelo inquisitivo de processo penal, fica claramente comprometida a imparcialidade do
magistrado, pois “é ele quem inicia, de ofício, o processo, quem recolhe as provas e quem,
afinal, profere a decisão, podendo, no curso do processo, submeter o acusado a torturas, a fim
de obter a rainha das provas: a confissão” (TOURINHO FILHO, 1998, p. 92).
No sistema tipicamente inquisitivo, tanto na fase de investigação, quanto na fase de julgamento
e instrução probatória, o acusado é colocado em posição de absoluta subserviência à
autoridade judicial, sendo-lhe cerceado o direito de defesa em virtude da absoluta concepção
teórica que preconiza a presunção de culpabilidade.
Embora o Brasil não adote mais o modelo tipicamente inquisitivo de processo penal, sabe-se
que ainda temos vestígios desse modelo no inquérito policial. O Brasil adota, na realidade, o
sistema misto de processo penal, visto que ainda possui raízes desse modelo, pois “há uma
fase inquisitiva, na qual se procede a uma investigação preliminar e uma instrução
preparatória, e uma fase final, em que se procede ao julgamento com todas as garantias do
processo acusatório” (CAPEZ, 199, p. 39).
O inquérito policial ainda é considerado um resquício do sistema inquisitivo. Nele o Estado
produz provas unilaterais, que serão utilizadas na fase processual, ressaltando-se que, no atual
ordenamento jurídico brasileiro, o contraditório é dispensável. Adota-se o entendimento por
meio do qual os defensores do sistema misto sustentam: o contraditório é dispensável no
inquérito policial, porque tal possibilidade se torna real na fase processual.
 
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A principal crítica realizada a esse modelo de processo penal diz respeito às provas irrepetíveis
produzidas no âmbito do inquérito policial, sem assegurar ao acusado o direito de defesa, veja:
INQUÉRITO POLICIAL
Fase investigativa que antecede a denúncia ou queixa crime.
SISTEMA MISTO
Sistema Inquisitivo = fase de inquérito policial. Sistema Acusatório = fase processual em que se
assegura ao acusado o direito de defesa.
EXAME DE CORPO DE DELITO
O exame de corpo de delito trata-se de prova técnica e irrepetível produzida no inquérito
policial; na fase processual, mesmo que seja oportunizado o direito do acusado de se
manifestar sobre o conteúdo da respectiva prova, sabe-se que o contraditório seria meramente
formal, haja vista a impossibilidade de repetir a produção da prova, outrora gerada
autocraticamente e de forma unilateral na fase investigativa.
Tal possibilidade deixa evidente o cerceamento de defesa e a desigualdade processual em que
o acusado se vê obrigado a suportar, submetendo-se ao cerceamento de defesa
estruturalmente naturalizado em nosso sistema jurídico. Se a fase investigativa fosse vista e
compreendida como processo garantista e democrático, seria possível assegurar o direito de
defesa quanto à produção de provas utilizadas, como parâmetro, para o julgamento do mérito
da pretensão deduzida, especialmente no que tange às provas irrepetíveis.
SISTEMA ACUSATÓRIO E O GARANTISMO
PENAL
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A Constituição brasileira de 1988 ressignificou a forma de estudar e entender o processo penal.
Inaugurou-se o sistema acusatório fundado no garantismo penal, visto que o direito de defesa e
produção de provas deve ser ampla e efetivamente assegurado a todo acusado. Privilegia-se,
dentro dessa lógica, o estado de inocência constitucionalmente assegurado a todo cidadão,
cabendo ao Estado desconstruir a presunção de não culpabilidade como condição para o jus
puniendi.
Significa dizer que havendo indícios de inocência do acusado, deverá o Estado priorizar a
absolvição.
O Sistema acusatório possui duas características importantes:
1ª característica 2ª característica
Separação das funções de acusação e julgamento Imparcialidade do julgador
 Atenção! Para visualizaçãocompleta da tabela utilize a rolagem horizontal
SEPARAÇÃO DAS FUNÇÕES DE ACUSAÇÃO E
JULGAMENTO
A primeira importante característica do sistema acusatório é a separação das funções de
acusação e julgamento; é atribuição do Ministério Público o oferecimento da denúncia,
enquanto é de competência do poder Judiciário o recebimento ou não dela.
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IMPARCIALIDADE DO JULGADOR
A segunda característica evidente do sistema acusatório está na imparcialidade do julgador,
que deverá ser isento e fundamentar racionalmente suas decisões a partir das provas
produzidas nos autos do processo. O julgador deverá garantirigualdade de condições ao
acusado e ao órgão acusador, no que diz respeito à produção de provas e ao debate
processual dos pontos controversos da demanda.
O sistema acusatório inaugurou estudos sobre o processo penal no Estado Democrático de
Direito . A teoria do direito democrático é uma proposição jusfilosófica, que passa pela
superação do entendimento clássico de que a ciência do Direito é mero instrumento de controle
social e exercício do poder. Considera-se que essas novas proposições teóricas são hábeis a
legitimar o entendimento de que o processo constitucional democrático deve ser visto como
lugar de inclusão e implementação dos direitos fundamentais previstos no plano constitucional
e infraconstitucional.
 
Democratizar o entendimento do direito, a partir das proposições teóricas trazidas pela visão do
processo enquanto lugar de ampla discursividade racional dos pontos controversos da
demanda, constitui um meio de resistência da autocracia jurisdicional, decorrente do poder
inato e oracular dos julgadores decidirem, conforme suas percepções valorativas e sensitivas
do caso concreto. O processo constitucional democrático rompe com a dogmática concepção
de que a jurisdição é um recinto de reprodução vegetativo-sensitiva das percepções valorativas
do julgador diante do caso concreto.
ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO
“O Estado Democrático de Direito trouxe para o direito processual substanciais alterações
paradigmáticas, especialmente no sentido de compreender o processo, a jurisdição e a ação
sob o enfoque constitucional” (COSTA, 2012, p. 192). Nesse sentido, “o processo democrático
tem, assim, no âmbito jurisdicional, a tarefa primordial de resgatar e oportunizar a discussão de
todos os interessados” (PAOLINELLI, 2014, p. 25), haja vista que através dele garante-se “a
construção de um espaço procedimentalizado em contraditório, a fim de afastar o protagonismo
e a busca solitária pela aplicação do direito como justiça” (PAOLINELLI, 2014, p. 25).
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Pensar o processo e a jurisdição sob o viés da democraticidade constitucional é reconhecer
que o julgador não poderá substituir a racionalidade crítica pelos seus desejos de decidir,
conforme suas concepções subjetivas e senso inato de justiça.
A construção do direito democrático pressupõe a ruptura com os estigmas da autocracia
jurisdicional, trazidos por proposições dogmáticas que priorizam o protagonismo judicial, em
detrimento do debate racional das questões trazidas para o processo. Sempre que o julgador
se utiliza do processo como um espaço para reprodução de suas percepções sensitivas, fica
comprometida a legitimidade democrática do provimento.
No âmbito da processualidade democrática, deve prevalecer o debate racional, em
detrimento da midiatização de juízes e da espetacularização da vingança mascarada
processualmente . Quando se afasta a participação dos interessados no debate racional dos
pontos controversos, enaltecendo-se a autoridade do julgador, mantém-se a dogmática
concepção de que o processo ainda continua sendo um recinto de autocracia, perpetuação do
poder, exclusão e marginalização de pessoas e violação de direitos fundamentais.
CONSTRUIR REFLEXÕES JURÍDICAS NA
PERSPECTIVA DEMOCRÁTICA PRESSUPÕE,
INICIALMENTE, OBSERVAR AS SEGUINTES
PREMISSAS:
CIÊNCIA DO DIREITO
A ciência do Direito é uma proposição que deve ser vista como um recinto de implementação
dos direitos fundamentais, expressamente previstos no plano constitucional.
PARTICIPAÇÃO
A participação do titular dos bens jurídicos da vida é fundamental na construção dos
provimentos estatais.
ESTADO
O Estado deixa de ser soberano e absoluto, passando a legitimar o diálogo com todos os
titulares dos direitos fundamentais.
IGUALDADE
A igualdade material entre os sujeitos de direito é fundamental para a superação do modelo
histórico-social, preconizado pelo liberalismo, que prioriza a proteção dos direitos individuais.
DIÁLOGO
Toda deliberação coletiva ou individual será legitimada com a possibilidade dos interessados
construírem discursivamente o mérito do provimento estatal, retirando-se dos agentes o
protagonismo e unilateralidade típicos dos estados totalitários e antidemocráticos.
1
2
3
4
5
O fenômeno da democratização e constitucionalização do processo penal busca proteger
amplamente o acusado frente ao direito do Estado de puni-lo e, diante desse contexto, a
presunção de inocência tem um papel determinante como princípio informador de todo o
processo penal democrático. O princípio da presunção de inocência deve ser visto como
fundamento regente e informador de todo o modelo de processo penal democrático e
garantista.
 ATENÇÃO
O acusado goza constitucionalmente dessa condição, cabendo ao Estado o dever de
desconstituir essa presunção de inocência , mediante provas suficientemente lícitas e
legítimas para tornar viável sua punição.
PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA
O artigo 8.2 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, conhecida como Pacto de São
José da Costa Rica, estabelece que: toda pessoa acusada de um delito tem direito a que se
presuma sua inocência, enquanto não for legalmente comprovada sua culpa” (BELTRAN, 2018,
p. 151). No mesmo sentido “o artigo 6.2 do Convênio Europeu para a Proteção dos Direitos
Humanos e das Liberdades Fundamentais de 1950, regula que qualquer pessoa acusada de
uma infração presume-se inocente enquanto a sua culpabilidade não tiver sido legalmente
provada” (BELTRAN, 2018, p. 151). A Declaração Universal dos Direitos do Homem e do
Cidadão, da Organização das Nações Unidas (ONU), em seu art. 11, estabelece
expressamente que todo ser humano acusado de ato delituoso tem o direito de ser presumido
inocente até que sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei. No mesmo sentido
o texto da Constituição brasileira de 1988 estabelece no seu art. 5, inciso LVII, que ninguém
será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória.
A presunção de inocência certamente representa uma das mais importantes conquistas do
processo penal garantista e humanizado da sociedade contemporânea, tendo em conta que o
acusado deixa de ser visto como sujeito presumidamente culpado, passando a ser enxergado
pelo direito brasileiro vigente como alguém que goza do pressuposto da condição em questão.
 
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O entendimento do princípio da presunção de inocência objetiva sistematizar um modelo de
processo penal que venha a romper com os parâmetros inquisitivos de presunção de culpa do
acusado. Conferindo-lhe o estado de inocência, cabe ao Estado o dever de demonstrar com
clareza e objetividade a culpabilidade do agente para, assim, legitimar seu poder punitivo. Por
isso, o órgão acusador deve ser distinto do órgão julgador, cabendo ao magistrado,
responsável pela análise do mérito da pretensão penal deduzida em juízo, fundamentar
racionalmente suas decisões no sentido de demonstrar a desconstituição desse estado
de inocência do acusado, requisito esse considerado fundamental para legitimar o poder
punitivo do Judiciário.
PRINCÍPIOS DO PROCESSO PENAL
CONSTITUCIONALIZADO
Para sistematizar o estudo do processo acusatório garantista, vamos abordar os princípios
regentes do processo penal constitucionalizado. A partir deles vamos identificar parâmetros
racionais utilizados como referenciais interpretativos do modo de entender, compreender e
analisar o direito a ser aplicado diante de um determinado caso concreto.
 
Vamos estudar os princípios do contraditório, da ampla defesa, do devido processo legal, da
individualização da pena e da inadmissibilidade de provas ilícitas. Esses princípios são
essenciais para o entendimento do modelo de processo acusatório que privilegia amplamente a
proteção da dignidade humana do acusado.
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PRINCÍPIOS REGENTES
Os “princípios são proposições normativas de caráter genérico, utilizados como referenciais de
interpretação, aplicabilidade e efetividade dodireito, além de viabilizar a integração,
compreensão e unidade do ordenamento jurídico-constitucional vigente” (COSTA, 2019, p. 59).
CONTRADITÓRIO
O contraditório é um princípio constitucional explicitamente previsto no artigo 5, inciso LV, da
CF. Estabelece que aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em
geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a eles
inerentes. Trata-se de princípio que objetiva assegurar igualdade entre as partes quanto à
dialogicidade dos pontos controversos que integram a demanda judicial, ou seja, por meio
desse princípio, as partes terão oportunidade de debater as questões controversas da
demanda e, assim, poderem influenciar no julgamento do mérito da pretensão deduzida.
Não basta apenas a oportunização do contraditório. Além disso, é essencial que ele se efetive,
ressaltando-se que esse processo ocorrerá no momento em que o magistrado analisar, na sua
decisão de mérito, todas as questões controversas suscitadas pelas partes.
É dever constitucional de cada magistrado analisar racionalmente cada questão controvertida
alegada pela parte no âmbito processual, devendo justificar juridicamente, em sua decisão de
mérito, se acolherá ou não o que foi alegado e provado nos autos.
 ATENÇÃO
No âmbito do processo penal democrático e garantista, o acusado terá direito a uma decisão
racional, que não seja reflexo de concepções valorativas e metajurídicas do julgador, ou seja, o
magistrado não pode utilizar suas crenças e percepções subjetivas como critério para
fundamentar as decisões judiciais. O artigo 93, inciso IX, da CF, trouxe o princípio da
obrigatoriedade de fundamentação das decisões judiciais, destacando-se que a ausência de
justificação racional tem como consequência a nulidade da decisão.
O contraditório é um princípio que, quando implementado, assegura a legitimidade democrática
do provimento final, pois “faz parte das garantias abrangidas pelo devido processo legal e
consiste no principal elemento estruturador do procedimento democrático, uma vez que
garante que o provimento jurisdicional seja resultado da participação dos interessados”
(FREITAS, 2014, p. 22).
Alguns dos desdobramentos da intepretação extensiva do princípio do contraditório no Estado
Democrático de Direito são:
O direito à ampla dialeticidade dos pontos controversos da demanda.
O direito de resistir às decisões arbitrárias de um julgador que ignora as alegações das partes.
O direito conferido às partes de participarem da construção dialética do provimento final.
O direito de revisão judicial de decisões contrárias aos direitos fundamentais.
O direito de se calar em juízo, permanecendo em silêncio.
O direito de nomeação de assistente técnico em caso de produção de prova técnica (prova
pericial).
O direito de tornar controversos os fatos alegados pela parte contrária.
O direito de se opor à homologação de acordo judicial que comprovadamente causa lesão a
direitos e bens juridicamente tutelados.
O direito de fala e debate assegurado nas audiências judiciais.
O direito de informação de qualquer alegação suscitada no âmbito do processo judicial.
AMPLA DEFESA
Assim como o contraditório, a ampla defesa é um princípio constitucional explícito e previsto no
artigo 5, inciso LV, da CF. Eles são princípios que caminham em uma via de mão dupla, mas
não podem ser confundidos. 
AMPLA DEFESA
CONTRADITÓRIO
AMPLA DEFESA
Este princípio legitima todos os sujeitos do processo a reconhecerem como devem agir, atuar e
conduzir o procedimento legal de esclarecimento objetivo dos pontos controversos da
demanda, mediante a exauriência probatória.
A ampla defesa garante a possibilidade à exauriência probatória, ou seja, o magistrado deverá
zelar pela igualdade processual, para que o acusado tenha as mesmas oportunidades de
debate e de produção de provas conferidas ao órgão acusador (Ministério Público).
CONTRADITÓRIO
O contraditório assegura ao acusado a ampla exauriência argumentativa.
Ler e compreender o referido princípio, a partir dessas colocações teóricas inicialmente
expostas, é uma forma de tornar o processo penal democrático um espaço dialógico. Nele,
todos os sujeitos envolvidos na lide colaboram para tornar possível e viável o julgamento do
mérito, da forma mais próxima com que os fatos alegados ocorreram na realidade.
Eventual sentença condenatória proferida em processo judicial, no qual o acusado não teve a
mesma oportunidade de debate e produção de prova, será considerada nula de pleno direito,
haja vista a existência de error in procedendo.
 
Desse princípio, depreende-se a premissa na qual a ordem na prática de atos no processo
penal exige que a defesa se manifeste sempre em último lugar, ou seja,
ERROR IN PROCEDENDO
Considera-se error in procedendo um ou mais vícios processuais que colocam o acusado em
posição de desigualdade processual perante o Ministério Público, configurando-se evidente
cerceamento de defesa.
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QUALQUER QUE SEJA A SITUAÇÃO QUE DÊ ENSEJO
A QUE, NO PROCESSO PENAL, O MINISTÉRIO
PÚBLICO SE MANIFESTE DEPOIS DA DEFESA [...],
OBRIGA, SEMPRE, SEJA ABERTA VISTA DOS AUTOS
À DEFENSORIA DO ACUSADO, PARA QUE POSSA
EXERCER SEU DIREITO DE DEFESA NA AMPLITUDE
QUE A LEI CONSAGRA.
(CAPEZ, 1999, p. 20)
Existe uma exceção na Lei Processual, no caso o artigo 468 do CPP, quando da realização
sorteio dos jurados para o conselho de sentença, primeiro fala a defesa e depois a acusação (
MP), não existindo, no caso, qualquer irregularidade na manifestação da defesa antes da
acusação. O artigo em comento conceitua as chamadas recusas peremptórias e a defesa se
manifeste sempre em último lugar.
ART. 468. À MEDIDA QUE AS CÉDULAS FOREM
SENDO RETIRADAS DA URNA, O JUIZ PRESIDENTE
AS LERÁ, E A DEFESA E, DEPOIS DELA, O
MINISTÉRIO PÚBLICO PODERÃO RECUSAR OS
JURADOS SORTEADOS, ATÉ 3 (TRÊS) CADA PARTE,
SEM MOTIVAR A RECUSA.
Um outro viés, utilizado como parâmetro ao entendimento constitucionalizado da ampla defesa
no âmbito do processo penal, diz respeito ao direito que o acusado tem quanto à defesa
técnica, que torne controversos os fatos a ele imputados. Haverá cerceamento de defesa e
ofensa ao respectivo princípio quando o procurador, nomeado pelo acusado, deixa de enfrentar
todas as questões fáticas que poderão desconstituir seu estado de inocência, omitindo-se
quanto à produção daquelas provas, consideradas essenciais ao esclarecimento e
desconstituição dos fatos alegados pelo órgão acusador (Ministério Público).
 
Na realidade, a ampla defesa deve ser vista como a garantia isonomicamente assegurada a
cada acusado de ter condições reais e efetivas de rebater e desconstituir toda imputação ou
alegação a ele dirigida, que possa acarretar a sua punição.
A natureza principiológica conferida à ampla defesa justifica-se em razão do interesse do
legislador brasileiro procedimentalizar o processo, como um espaço dialógico de iguais
oportunidades de provas e alegações pertinentes com os fatos inicialmente levados a juízo.
A exauriência argumentativo-probatória constitui um dos pilares do processo penal democrático
e garantista, representando claramente uma forma legítima de resistir à discricionariedade e ao
protagonismo judicial a partir da efetividade do princípio da ampla defesa.
DEVIDO PROCESSO LEGAL
Trata-se de princípio constitucional explícito previsto no artigo 5, inciso LVI, da CF, que
estabelece que ninguém será privado de sua liberdade ou de seus bens sem o devido
processo legal. Esse é um princípio que dialoga com todo o sistema processual vigente, tanto
no plano constitucional, quanto infraconstitucional, uma vez que a ideia trazida pelo princípio
em questão funda-se na obrigatoriedade de procedimentalizar a resolução de conflitos;
garantindo-se aos sujeitos do processo a exauriência argumentativa e a amplitude quanto à
produção das provas necessárias ao esclarecimento dos fatos controversos.
Especificamente no âmbito doprocesso penal, sabemos que observar o devido processo legal
é seguir uma ritualística que oportuniza igualdade argumentativa às partes, legitimando o
direito de participar dialogicamente na construção do provimento final. Observar todas as
etapas processuais previstas em lei; exigir do julgador a fundamentação racional da decisão
judicial; garantir que todas as provas produzidas e argumentos trazidos aos autos sejam
apreciados pelo magistrado como meio de viabilizar a racionalidade discursiva do provimento
final; oportunizar aos sujeitos do processo o direito de sanar vícios processuais, priorizando-se
o julgamento do mérito da pretensão deduzida; e legitimar a criação de técnicas processuais e
procedimentais voltadas a maior efetividade processual são alguns dos desdobramentos
interpretativos do devido processo legal.
Observar o devido processo legal é uma forma de proteger constitucionalmente o estado de
inocência do acusado, impedindo que o Estado-juiz o puna sem que lhes sejam assegurados
todos os meios de defesa e produção de provas. A privação da liberdade ou dos bens do
acusado somente se tornará viável mediante a desconstituição do seu estado e inocência,
após ter assegurado o amplo direito de argumentação e produção de provas, nos moldes
igualitários ao que fora assegurado ao órgão acusador. No momento em que alguém é
condenado, sem antes ter a legítima oportunidade de resistir constitucionalmente aos
argumentos apresentados em seu desfavor, temos o cerceamento de defesa como reflexo
direto da violação do princípio do devido processo legal.
 
 
O princípio do estado ou situação jurídica de inocência “impõe ao Poder Público a observância
de duas regras específicas em relação ao acusado: uma de tratamento, segundo o qual o réu,
em nenhum momento do iter persecutório, pode sofrer restrições pessoais fundadas
exclusivamente na possibilidade de condenação, e outra de fundo probatório, a estabelecer
que todos os ônus da prova relativa à existência do fato e à sua autoria devem recair
exclusivamente sobre a acusação” (OLIVEIRA, 2006, p. 32).
 
 
Garantir o devido processo legal ao acusado é assegurar-lhe o direito ao silêncio (direito de
ficar calado), até porque é dever do Estado-acusador comprovar de forma efetiva a
materialidade do crime e a autoria do acusado. Tendo em vista que havendo qualquer dúvida
sobre a ocorrência do crime (materialidade) ou sua autoria, deve-se absolver o acusado,
aplicando, no julgamento do mérito da pretensão penal, o princípio da presunção de inocência
ou não-culpabilidade, requisitos esses essenciais para a efetividade do modelo constitucional
de processo penal democrático e garantista.
INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA
O direito de o Estado aplicar determinada pena ao acusado exige que o órgão acusador
(Ministério Público) desconstitua enfaticamente seu estado constitucional de inocência.
Nenhuma pena poderá ultrapassar a pessoa do condenado (artigo 5, inciso LV, da CF),
ressaltando-se que ela não poderá ser estendida aos seus sucessores e nem contra eles
executada. O princípio da individualização da pena (previsto no inciso XLVI, do artigo 5 da CF)
objetiva estabelecer que a pena aplicada ao condenado deverá ser proporcional e equivalente
a sua culpabilidade, bem como ao que foi alegado e provado nos autos do processo pelo órgão
acusador.
 
O fato praticado e provado pelo órgão acusador é que será o fundamento balizador para a
quantificação, extensão e dimensão da pena a ser aplicada ao condenado.
 RESUMINDO
Não será a raça, a condição social do acusado ou qualquer outro fato pessoal ou social que
deverá ser utilizado como referencial para a quantificação da pena a ele aplicada. O
magistrado não poderá se utilizar de critérios subjetivos, pessoais, morais, midiáticos e
religiosos para justificar eventual pena aplicada ao acusado, pois, se isso fosse possível,
teríamos expressa ofensa ao princípio da segurança jurídica, além da violação do princípio da
obrigatoriedade de fundamentação de decisões judiciais .
MODAL
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O artigo 93, inciso IX do texto da Constituição brasileira de 1988 prevê que todos os
julgamentos proferidos pelo poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as
decisões, sob pena de nulidade.
Sempre que o magistrado se utilizar de critérios metajurídicos ou axiológicos (valorativos), para
justificar a aplicabilidade de uma pena a determinado condenado, sua decisão judicial será
considerada constitucionalmente nula de pleno direito, por constituir evidente ofensa ao devido
processo legal, presunção de não-culpabilidade (inocência), contraditório e ampla defesa.
INADMISSIBILIDADE DE PROVAS ILÍCITAS
O artigo 5, inciso LVI, da CF estabelece expressamente que são inadmissíveis provas ilícitas e
aquelas obtidas por meios ilegais no processo. No âmbito do processo penal, a vedação das
provas ilícitas atua no controle e regularidade procedimental (e processual) da atividade estatal
persecutória, objetivando inibir toda e qualquer atividade probatória e ilegal por parte do órgão
acusatório. Vigora, no direito processual penal brasileiro, a premissa de que as provas devem
ser produzidas e obtidas por meios lícitos.
É importante esclarecer a distinção existente entre provas ilícitas e meio ilícito de obtenção da
prova. Considera-se ilícita a prova quando a ilicitude se encontra presente na sua produção,
como é o caso, por exemplo, da falsificação ou adulteração de documentos ou depoimento de
testemunhas obtido mediante coação – a prova já nasce ilícita, uma vez que a ilicitude integra
o elemento estrutural de sua constituição.
A PROVA PODE SER ORIGINARIAMENTE LÍCITA, MAS
SE O MEIO DE SUA OBTENÇÃO DECORRER DE UMA
CONDUTA ILÍCITA HAVERÁ A CONFIGURAÇÃO DA
ILICITUDE DA RESPECTIVA PROVA.
 EXEMPLO
O e-mail, que é uma prova considerada genuinamente lícita, se for obtida mediante violação de
senha de seu titular, tornar-se-á ilícita, não se admitindo sua utilização no âmbito processual
penal.
Antes de ser um princípio que zela pela regularidade processual e procedimental, a
inadmissibilidade de provas ilícitas , no processo penal, estabelece regramentos pontuais
para o órgão acusador. Este não poderá praticar qualquer conduta ilícita objetivando a
desconstituição do estado de inocência do acusado, limitando-se a agir nos ditames
preconizados pelo devido processo legal.
 
Veja o vídeo, a seguir, que explica mais detalhadamente sobre os sistemas penais e as suas
respectivas particulariedades.
INADMISSIBILIDADE DE PROVAS ILÍCITAS
“Nenhuma legislação, exceto a brasileira, proclama, de maneira absoluta e peremptória, a
inadmissibilidade, no processo, das provas obtidas por meios ilícitos” (TOURINHO FILHO,
1998, p. 62). “Em uma ordem jurídica fundada no reconhecimento, afirmação e proteção dos
direitos fundamentais, não há como recusar a estatura fundante do princípio da
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inadmissibilidade das provas ilícitas, sobretudo porque destinado a proteger os jurisdicionados
contra investidas arbitrárias do Poder Público” (OLIVEIRA, 2006, p. 36).
Neste vídeo, iremos fazer uma breve síntese sobre os três sistemas penais: inquisitivo, misto e
o acusatório.
VERIFICANDO O APRENDIZADO
MÓDULO 3
 Descrever as leis penais simbólicas
LEIS PENAIS SIMBÓLICAS
Leis simbólicas são proposições normativas que objetivam sistematizar, regulamentar, instituir
e regular padrões de conduta, relações e situações jurídicas cotidianas, mas que, em razão de
seu conteúdo, esbarram no desafio de sua efetividade.
Considera-se efetiva uma norma jurídica quando alcança, no campo prático, os objetivos por
ela propostos. O Código de Trânsito brasileiro, por exemplo, ao instituir a obrigatoriedade
quanto ao uso do cinto de segurança, pode ser considerado uma norma jurídica efetiva, visto
que os objetivos estabelecidos pelo legislador – o uso obrigatório do acessório – se
concretizaram em termos práticos, considerando-se que essa é a realidade vivenciadapela
maioria de brasileiros.
Quando o destinatário da norma jurídica introjeta e adere ao seu conteúdo normativo, pode-se
considerá-la como uma proposta legislativa, cujas premissas instituídas se consolidaram em
termos práticos.
Compreender a efetividade normativa, como um dos objetivos práticos do direito brasileiro
vigente, é reconhecer que os efeitos buscados pela norma jurídica se realizaram no campo e
na perspectiva das relações humanas, ultrapassando as questões meramente formais para,
assim, reconhecer que o que foi idealizado pelo legislador foi concretamente alcançado.
Em contrapartida, verifica-se no ordenamento jurídico brasileiro vigente uma quantidade
significativa de normas jurídicas, cujos objetivos planejados pelo legislador estão longe de
serem alcançados.
É nesse cenário que surge o debate referente ao conceito de leis simbólicas: são normas
jurídicas cujo conteúdo propositivo, idealizado pelo legislador, não alcança os resultados e os
efeitos práticos esperados.
Há inúmeros exemplos de leis brasileiras que esbarram no déficit ou na limitação de efetividade
normativa, visto que os objetivos desenhados pelo legislador estão longe de serem
concretizados. Um exemplo inicial para ilustrar tal afirmação é a Lei Maria da Penha (Lei
11.340/2006), cujo objetivo do legislador foi combater e reduzir os números de casos de
violência doméstica praticados contra a mulher. Após vários anos de vigência da respectiva
norma jurídica, verificou-se um aumento significativo dos casos de violência doméstica
praticada contra a mulher.
QUAL É A RAZÃO QUE EXPLICA ESSE FENÔMENO
SOCIAL?
É importante esclarecer que o combate à violência doméstica contra a mulher não será
efetivado apenas com a aprovação de uma lei que criminaliza tais condutas. Diz-se isso
porque, antes de reprimir penalmente tais condutas, é relevante saber por que motivos
ocorrem.
 
O machismo estrutural, reflexo do processo histórico-patriarcal brasileiro, é uma das
explicações cientificas da naturalização da dominação masculina, responsável por
simbolicamente despertar nos homens o sentimento de estarem hierarquicamente em posição
de superioridade em relação à mulher.
 EXEMPLO
Quando sua esposa, companheira ou namorada tenta subverter essa lógica patriarcal,
buscando a igualdade de gênero, muitos homens reagem no sentido de praticar os mais
diversos tipos de violência.
 Passeata contra o machismo.
As estruturas sociais de poder reforçam tais práticas, no momento em que legitimam a
dominação masculina institucionalizada historicamente na tradição brasileira. Não será a letra
fria da norma jurídica o instrumento hábil a desconstituir essas estruturas que naturalizam a
dominação masculina, ressaltando-se a importância dos destinatários dessa norma
participarem de sua construção e sistematização jurídica.
No momento em que o homem entende a importância da norma penal incriminadora,
introjetando seu conceito de normatividade, torna-se mais efetiva sua aplicabilidade. A Lei
Maria da Penha (Lei 11.340/2006), então, é exemplo de claro fracasso da própria ciência do
Direito, que mais uma vez esbarra no desafio referente à efetividade normativa: concretização
e aplicabilidade prática dos objetivos propostos e planejados pelo legislador.
Um importante debate é levantado quando se discute a efetividade normativa da legislação
penal brasileira vigente. Por isso, podemos perguntar:
O DIREITO PENAL CONSEGUE ATINGIR
CONCRETAMENTE OS FINS PROPOSTOS E
ESTABELECIDOS PELO LEGISLADOR? QUAL SERIA A
FINALIDADE BUSCADA HOJE PELO LEGISLADOR NO
MOMENTO EM QUE APROVA UMA NORMA PENAL
INCRIMINADORA?
A criação de tipos penais, conforme anteriormente exposto, objetiva fortalecer o poder punitivo
exercido pelo Estado, além da busca incessante de instrumentos de controle social. O objetivo
estabelecido pelo legislador, por meio da institucionalização da sanção penal, é reprimir e
prevenir condutas ilícitas praticadas por agentes, quando agem no sentido de atentar
contra bens jurídicos considerados penalmente relevantes.
Busca-se, ainda, por meio da norma penal, desestimular que seu destinatário a descumpra
para, então, alcançar o fim previamente estabelecido. O objetivo do legislador no momento em
que aprovou, por exemplo, a Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006) foi, além de punir o
agressor, desestimulá-lo quanto à prática de atos de violência doméstica contra a mulher.
Sempre que uma norma penal atinge simultaneamente suas funções punitivas e preventivas,
pode-se dizer que ela é efetiva. Em contrapartida, se uma norma penal, quando aplicada,
atinge apenas sua função punitiva, pode-se dizer que deixou de ser efetiva, uma vez que não é
suficientemente hábil a desestimular seus destinatários quanto ao fim preventivo definido por
ela mesma.
 COMENTÁRIO
Assim, a legislação penal simbólica é aquela que deixa de alcançar a prevenção do ilícito penal
nela contido visando, apenas, a punição do agente com a capacidade de retroalimentar o falso
sentimento de estabilidade social, sem, contudo, resolver com efetividade as razões que
geraram o conflito penal levado ao poder Judiciário.
Dito de outra forma, a função simbólica não tem como objetivo resolver efetivamente os
conflitos de interesse sociais por meio dos recursos punitivos do Estado. Na perspectiva
simbólica, o objetivo da pena e do Direito Penal é tão somente produzir, na opinião
pública, uma impressão de tranquilidade, provocada pela diligência de um legislador que
alegadamente tem consciência dos problemas que a criminalidade gera (ANJOS, 2006).
O que se verifica no Brasil, diante da crise de segurança pública que se arrasta no tempo, é a
adoção por parte do legislador de medidas legislativas simbólicas que não resolvem
efetivamente o problema.
Assim, a norma penal é simbólica porque traz para a sociedade uma aparente sensação de
proteção e de segurança, sem conseguir solucionar, com efetividade, a raiz que desencadeou
concretamente o ilícito penal.

E com a norma penal simbólica não é possível reduzir o número de casos envolvendo o ilícito
penal, ora tipificado.
EXEMPLOS DE LEGISLAÇÕES SIMBÓLICAS
No Brasil, temos diversos exemplos de legislações penais simbólicas, como as seguintes:
LEI 8072/90
Trata-se da lei de crimes hediondos, aprovada no ano de 1990, com o objetivo de punir com
rigor os autores. Refere-se a crime de ampla gravidade e, por isso, possui uma
penalização mais rigorosa por parte do Estado. É inafiançável, insusceptível de graça,
anistia ou indulto. Verifica-se que o legislador estabeleceu penas mais rigorosas, objetivando
prevenir novos delitos e desestimulando seus potenciais agentes.
Após duas décadas de vigência da respectiva lei, verifica-se que o número de crimes
hediondos no Brasil tem aumentado de forma significativa, tornando evidente o déficit de
efetividade normativa pretendida pelo legislador.
sistematizados pelo Atlas da Violência deixam clara a ineficiente atuação do legislador em
tornar concretos os objetivos propostos nessa lei. Trata-se de um primeiro exemplo clássico
que evidencia que a norma jurídica não é suficiente para modificar estruturas sociais.
O fenômeno social da criminalidade deve ser explicado de forma multissetorial. É fantasiosa a
defesa da concepção de que a norma jurídico-penal, por si só, seria instrumento hábil a
resolver o problema que envolve a prática de condutas criminosas. Por isso, essa norma penal
que deixa de alcançar os fins propostos pelo legislador – modificação de estruturas sociais – é
denominada simbólica.
LEI 8429/92
Trata-se de lei que dispõe sobre a aplicabilidade de sanções aos agentes públicos em
casos de enriquecimento ilícito no exercício de mandato, cargo, emprego ou função na
administração pública direta, indireta ou fundacional.
O objetivo específico do legislador foi sistematizar a aplicabilidade de sanções penais com o
propósito de desestimular a prática de atos de improbidade administrativa. A efetividade e
concretudeda norma jurídica, em questão, ocorrerá quando seu conteúdo propositivo for
suficiente para reduzir de forma significativa a prática de atos ilícitos contrariamente ao
interesse público (corrupção).
Mas não é isso que se verifica em termos práticos no Brasil, especialmente pelos inúmeros e
constantes escândalos de corrupção envolvendo agentes públicos.
DESAFIOS DAS LEIS SIMBÓLICAS E A
MÍDIA
É possível considerar no direito penal simbólico uma espécie de onda propagandística dirigida,
particularmente, às massas populares. Isso seria feito por aqueles que têm a intenção de
desviar a atenção dos graves problemas sociais e econômicos.
O artifício utilizado é o encobrimento dos fenômenos ou problemas que desgastam o tecido
social e que, entre outros fatores, contribuem decisivamente para desencadear o aumento da
criminalidade. Esta acaba não sendo tão desenfreada e incontrolável quanto é alardeada pela
onda propagandística (SANTORO FILHO, 2002, p. 87).
Afirmar que existem muitas legislações penais brasileiras simbólicas é reconhecer a falência do
direito penal, enquanto ciência que se propõe a ressignificar e a desconstruir as estruturas
sociais, enquanto espaços que explicam o fenômeno da criminalidade.
A norma penal em si mesma não é capaz de modificar tais estruturas, embora o Estado assim
reproduza a voz que simbolicamente representa um alento à sociedade civil, conferindo-lhe um
conforto irreal de que, por meio da aplicabilidade de proposições normativo-penais, teremos
uma segurança pública mais efetiva. O simbolismo, assim, não busca resolver problemas.
Antes, porém, está mais comprometido em tranquilizar a população.
Nesse sentido, o adjetivo simbólico se aplica porque “o legislador, ao submeter determinados
comportamentos à normatização penal, não pretende, propriamente, preveni-los ou mesmo
reprimi-los, mas tão-só infundir e difundir, na comunidade, uma só impressão – e uma falsa
impressão – de segurança jurídica”. Isso implica dizer que se busca produzir na opinião
pública, se valendo de uma repressão puramente retórica, apenas uma “impressão
tranquilizadora de um legislador atento decidido” (QUEIROZ, 1999, p. 9).
 A mídia possui o poder de influenciar o sentimento público.
A mídia assume um significativo papel em relação à retroalimentação do sistema penal
simbólico, pois é responsável por introjetar, de forma direta no seio da sociedade civil, o
sentimento de que, por meio da aprovação de uma nova norma penal incriminadora, a
coletividade estaria mais segura e protegida diante da criminalidade vigente.
 
Essas premissas difundidas pela mídia, além de irreais e fantasiosas, representam
simbolicamente uma estratégia utilizada pelo Estado para reforçar o controle social, uma das
principais finalidades assumidas pelo direito penal autocrático.
A visão distorcida da realidade produzida pela mídia alimenta um sentimento ou uma sensação
de insegurança generalizada entre o público. Ao mesmo tempo, a mídia explora discursos que
defendem punição mais rigorosa e exemplar, como a prisão perpétua e a pena de morte, com
todos esses meios justificando o fim retributivo. Nesse discurso que escolhe o inimigo e o
estigmatiza, a repressão penal é o principal instrumento (GOMES; ALMEIDA, 2013, p. 4).
A eficácia que se reconhece na lei penal não é outra que não a de trazer tranquilidade à
opinião pública, ou seja, se produz um efeito que acaba conduzindo a um Direito Penal de risco
simbólico. No entanto, ao levar as pessoas a acreditarem que esses riscos não existem, a
ansiedade é diminuída ou, de forma mais clara, se recorre à mentira,
DANDO LUGAR A UM DIREITO PENAL PROMOCIONAL,
QUE ACABA SE CONVERTENDO EM UM MERO
DIFUSOR DE IDEOLOGIA.
(BATISTA, 2007, p.631)
A sociedade civil recebe com naturalidade e uma certa expectativa a ideológica concepção
estabelecida pelo direito penal, que prega a estabilidade social, segurança pública e proteção
coletiva, mesmo que tais promessas contrariem os dados estatísticos que ilustram um aumento
exponencial dos casos de violência e criminalidade.
 
No mesmo sentido, o Estado insiste nesse discurso midiático, com o poder de fortalecer as
estratégias de controle social e fomento de um exercício de poder pressuposto, já que mesmo
contrariando dados estatísticos, o importante é alimentar o sentimento social de segurança
coletiva.
Para encerrar este assunto, veja o vídeo abaixo e entenda a atuação do direito penal quando
instituído pelo Estado e como suas normas impactam a sociedade.
Neste vídeo, iremos fazer uma breve síntese sobre as leis penais simbólicas e os desafios da
efetividade normativa.
VERIFICANDO O APRENDIZADO
CONCLUSÃO
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao longo desta aula, você teve a oportunidade de estudar o tema do controle social penal à luz
do Estado Democrático de Direito, começando pela abordagem das missões e da seletividade
do direito penal relacionada com a legitimação do poder punitivo que o Estado possui. 
Você também pôde comparar o sistema processual penal inquisitivo e acusatório, no contexto
das garantias constitucionais do processo penal no Estado Democrático de Direito, com
destaque para os princípios que regem o processo penal constitucionalizado: contraditório,
ampla defesa, devido processo legal, individualização da pena e inadmissibilidade de provas
ilícitas. 
Finalmente, ao estudar as leis penais simbólicas, você teve a oportunidade de conhecer suas
características, seus reflexos no âmbito penal e os desafios da sua efetividade normativa,
examinando alguns exemplos de legislação simbólica e o caso da chamada Lei Maria da
Penha. 
Assim, por meio dos estudos desenvolvidos neste tema, você ampliou seus conhecimentos na
área do Direito Penal.
 PODCAST
REFERÊNCIAS
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