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Discente: Maria Catarina de Andrade Farias Docente: Iran Furtado Resenha crítica – Friedrich Engels, “A origem da família, da propriedade privada e do Estado” Friedrich Engels (1820-1895), foi um filósofo e teórico político alemão, que entre outras obras, idealizou, em conjunto com Karl Marx, o socialismo científico. Engels, utilizando-se das pesquisas do antropólogo Lewis H. Morgan e manuscritos deixados por Marx, publicou o livro “A origem da família, da propriedade privada e do Estado” em 1884, buscando estabelecer uma teoria acerca da constituição das principais instituições sociais, a natureza material e histórica das relações humanas, e a consequente opressão e exploração advindas. Como dito por Alysson Leandro Mascaro no prefácio à 26ª edição brasileira da editora Boitempo, é importante se ater ao fato de que Engels ainda era um homem de seu tempo, tendo observado os aspectos culturais de outros povos sob a ótica eurocêntrica, a defesa da mulher ainda sobre a perspectiva masculina e comentários depreciativos a homossexualidade. Contudo, esse texto, tem como objetivo, esquadrinhar as principais contribuições deste livro, e demonstrar a relevância da sua leitura. A primeira discussão apresentada por Engels é acerca da família; o mesmo, percebe como esse tema era tratado pela sociedade como algo estático – principalmente pela influência da forma patriarcal apresentada pelos Cinco Livros de Moisés, a qual, em muitos lugares, era admitida como o modelo mais antigo existente. É em 1861, com o Direito Materno de J. J. Bachofen, que o estudo da história da família começa; em resumo, a ideia desse autor era que originalmente, os seres humanos viviam no heterismo (em promiscuidade sexual), dessa forma, não havia possibilidade de estabelecer a paternidade, a filiação só podia ser definida pela mãe. Nesse contexto, as figuras femininas era imbuídas de grande respeito, Bachofen acreditava em um domínio absoluto destas – em adição, o autor ainda descreve que a monogamia seria equiparada à violação de uma lei imemorável, devendo ser punida (poderia haver uma tolerância se a mulher em determinados períodos passasse a posse de outros). A passagem do "heterismo" à monogamia e do direito materno ao paterno, segundo Bachofen, processa-se - particularmente entre os gregos - em consequência do desenvolvimento das concepções religiosas, da introdução de novas divindades, representativas de ideias novas, no grupo dos deuses tradicionais, que eram a encarnação das velhas ideias; pouco a pouco os velhos deuses vão sendo relegados ao segundo plano pelos novos. Dessa maneira, pois, para Bachofen, não foi o desenvolvimento das condições reais de existência dos homens, mas o reflexo religioso dessas condições no cérebro deles, o que determinou as transformações históricas na situação social recíproca do homem e da mulher. (ENGELS). Mais uma prova a favor do Direito Materno vem com John Ferguson McLennan, o qual em 1865, acreditava que o costume de matar os nascidos do sexo feminino teria gerado uma escassez de mulheres nas tribos, encontrando padrões entre povos de tempos antigos e modernos sobre a consequente necessidade do rapto de mulheres exteriores à tribo para o casamento (exogamia) e da posse de uma mulher, ao mesmo tempo, por vários homens (poliandria); novamente, o parentesco só poderia ser estabelecido pela linha materna. Apesar de ter tido relevância ao apontar a importância da exogamia, a teoria de McLennan foi facilmente contestada, visto que, o infanticídio não foi praticado sistematicamente nos lugares em que a exogamia vigorava, assim como o rapto de mulheres é mais expressivos entre as sociedades em que predomina a ascendência pela linhagem masculina, e Lubbock reconheceu a existência do casamento grupal. Em 1877, Lewis H. Morgan demonstra em sua principal obra, Ancient Society, que a exogamia e a endogamia não estavam opostas, mas complementares. Morgan, descreveu que à época do casamento grupal, a tribo era dividida entre grupos consanguíneos pela linhagem materna (as gentes), onde era proibido o casamento entre seus membros; dessa forma, os homens deviam buscar mulheres fora de suas gens, geralmente, dentro da própria tribo. Concluindo, a endogamia era regra dentro da gens, a tribo (a reunião das gentes) era endogâmica, além disso, o teórico ainda encontrou a base para a origem gens da linhagem paterna, conseguindo configurar uma linha temporal para sua ascensão, como será visto a seguir. A família é o elemento ativo; nunca permanece estacionária, mas passa de uma forma inferior a uma forma superior, à medida que a sociedade evolui de um grau mais baixo para outro mais elevado. Os sistemas de parentesco, pelo contrário, são passivos; só depois de longos Intervalos, registram os progressos feitos pela família, e não sofrem uma modificação radical senão quando a família já se modificou radicalmente. (MORGAN, Lewis, Ancient Society, p. 435) Em acordo com Morgan, houve um estado originário de relações sexuais indiscriminadas (sem restrições impostas pelo costume, ex. concepção de incesto), a partir do qual surge a família consanguínea, repartindo os grupos em gerações para a possibilidade do casamento, avós com avôs, mães e pais, filhas e filhos – os ascendentes e descendentes são excluídos da relação conjugal. Continuamente, chega-se a família punaluana, onde há primeiro a exclusão da relação sexual entre irmãos biológicos (determinados pela mesma mãe), até a proibição entre irmãos colaterais – enxerga-se o seguimento para a proibição da endogamia, e a necessidade da exogamia. A família de um par é a próxima; é importante citar que a formação de pares de maior ou menor tempo já ocorria no casamento grupal, ou antes deste, havendo uma esposa principal entre as diversas mulheres, e um marido principal entre os demais. O impedimento do casamento entre consanguíneos impulsionou a sua estabilização, configurando-se no homem morando com uma mulher, tendo a poligamia mantida como direito dos homens, e exigência da fidelidade da mulher durante o período em conjunto – o casamento pode ser cortado por ambas as partes, onde os filhos continuam a pertencer à mãe. Pela exclusão continuada, primeiro dos parentes afastados e, por fim, dos parentes meramente agregados pelo casamento, todo tipo de casamento grupal acaba sendo inviabilizado na prática; o que sobra no fim é o par, unido ainda por um tempo por laços frouxos, a molécula cuja dissolução faz com que o casamento como o tal deixe de existir. [...] nesse novo estágio as mulheres se tornam raras e requisitadas. [...] começa o rapto e a compra de mulheres. (ENGELS). As condições econômicas se desenvolviam, a população aumentava, os homens que eram responsáveis pela obtenção do alimento – proprietários da renda – começavam a ganhar maior relevância, mas ainda tinham que repassar as suas riquezas pelo direito materno, ao descendente da mulher. Desse modo, há o início da opressão em relação a mulher, exigência da castidade para que haja a comprovação da linhagem pelo lado paterno – as gens passaram a excluir os membros femininos, que deveriam se dirigir a gens do pai, no fim, o direito hereditário materno e linhagem feminina é derrubado. A derrubada do direito materno representou a derrota do sexo feminino no plano da história mundial . O homem assumiu o comando também em casa, a mulher foi degradada, escravizada, tornou-se escrava do desejo do homem e mero instrumento de procriação. Essa posição humilhante da mulher, que aflora principalmente entre os gregos do período heroico e, mais ainda, do período clássico, foi gradativamente floreada e dissimulada e, em parte, revestida de formas atenuadas; mas de modo algum foi eliminada. [...] Marx acrescenta: “A família moderna contém em seu cerne não só a escravidão (servitus ) mas também a servidão feudal,já que desde o início tem relação com os serviços agrícolas. Ela contém em miniatura todos os antagonismos que mais tarde se desenvolveriam na sociedade e em seu Estado” (ENGELS). Consegue-se, claramente, perceber o próximo passo da história: a família monogâmica, explicitada por Engels: “se funda no domínio do homem, com a finalidade expressa de gerar filhos com paternidade inquestionável, e essa paternidade é exigida porque um dia os filhos deverão assumir, como herdeiros naturais, o patrimônio paterno.” A monogamia é dever apenas da mulher, formulada pela necessidade econômica, pela necessidade de manutenção do patrimônio masculino, mais importante, significa a subjugação de um sexo pelo outro. A criação da desigualdade entre homens e mulheres foi um verdadeiro processo econômico, político e social, visando o controle da reprodução biológica, dos bens econômicos, da propriedade privada. A família individual moderna foi fundada sobre a escravização doméstica aberta ou dissimulada da mulher, e a sociedade moderna é uma massa cujas moléculas são as famílias individuais. Hoje em dia, na grande maioria dos casos, o homem precisa ser aquele que ganha o sustento da família, o provedor, pelo menos nas classes possuidoras, e isso lhe confere uma posição de dominação que não necessita de nenhum privilégio jurídico adicional. Na família, ele é o burguês e a mulher representa o proletariado. No mundo industrial, porém, o caráter específico da opressão econômica que pesa sobre o proletariado só aparece com toda a nitidez depois que se eliminam todos os privilégios legais da classe dos capitalistas e se estabelece a igualdade jurídica de direitos das duas classes. A república democrática não abole o antagonismo das duas classes; pelo contrário, é a primeira a propiciar o terreno em que ele é resolvido. E, do mesmo modo, o caráter peculiar da dominação do homem sobre a mulher na família moderna, assim como a necessidade e o modo de estabelecimento de uma equiparação social real entre os dois, só aparecerá sob uma luz intensa quando ambos tiverem total igualdade de direitos em termos jurídicos. Ficará evidente, então, que a libertação da mulher tem como primeira precondição a reintrodução de todo o gênero feminino na indústria pública e que isso, por sua vez, exige a eliminação da família individual em sua condição de unidade econômica da sociedade. (ENGELS). O Estado vai se firmar como um fato político capitalista, estabelecendo-se após o rompimento dos resquícios feudais, como um poder público distinto da população, mas com a responsabilidade pela violência social oficial; buscando a “harmonia social”, defesa do sistema e reafirmação da sua legitimidade. Antes de tudo, é preciso entender que o desenvolvimento estatal, deve ser analisado na exploração de classes – a qual, já possui a dominação masculina. Nesse contexto, o caminho percorrido pelas sociedades, da estrutura gentílica ao Estado, é determinado pela divisão do trabalho e o direcionamento da produção para a troca, todos os arcabouços políticos, econômicos e sociais são para sustentar esse modo de produção, garantindo na mão dos espoliadores, o produzido pelos espoliados. A velha sociedade, baseada em uniões consanguíneas, explode ao chocar- se com as classes sociais recém-desenvolvidas; seu lugar é tomado por uma nova sociedade, sintetizada no Estado, cujas subdivisões são formadas, não mais por uniões consanguíneas, mas por uniões locais, uma sociedade em que a ordem da família é inteiramente dominada pela ordem da propriedade e na qual passam a desdobrar-se livremente os antagonismos de classe e as lutas de classe, que constituem o conteúdo de toda a história escrita até agora. (ENGELS). As instituições gentílicas são opostas a economia monetária, possuem a economia doméstica comunista, onde há a propriedade comum; a divisão de trabalho só existe entre os sexos – a mulher cuida da casa e o homem busca a subsistência e guerreia. Não existe diferença entre direitos e deveres, não há classes diferentes dentro da tribo, logo, não possuem espaço para a dominação e escravidão. A primeira grande divisão social do trabalho vai ser vista com as tribos de pastores, visto que, estas possuíam vantagens como a carne, o leite e seus derivados (couro, lã etc.), passou a ser possível uma troca regular do excedente com outras tribos. Diante disso, os rebanhos passaram a constituir propriedade especial, como se tratava de matéria de subsistência, permaneciam como propriedade do homem – assim como todas as mercadorias obtidas com a sua troca (a mulher poderia usufruir destes, mas não tinha parcela na questão da propriedade). O desenvolvimento de todos os ramos da produção - criação de gado, agricultura, ofícios manuais domésticos - tomou a força de trabalho do homem capaz de produzir mais do que o necessário para a sua manutenção. Ao mesmo tempo, aumentou a soma de trabalho diário correspondente a cada membro da gens, da comunidade doméstica ou da família isolada. Passou a ser conveniente conseguir mais força de trabalho, o que se logrou através da guerra; os prisioneiros foram transformados em escravos. Dadas as condições históricas gerais de então, a primeira grande divisão social do trabalho, ao aumentar a produtividade deste, e por conseguinte a riqueza, e ao estender o campo da atividade produtora, tinha que trazer consigo - necessariamente - a escravidão. Da primeira grande divisão social do trabalho, nasceu a primeira grande divisão da sociedade em duas classes: senhores e escravos, exploradores e explorados. (ENGELS). A divisão do trabalho na família havia sido a base para a distribuição da propriedade entre o homem e a mulher. Essa divisão do trabalho na família continuava sendo a mesma, mas agora transtornava as relações domésticas, pelo simples fato de ter mudado a divisão do trabalho fora da família. A mesma causa que havia assegurado à mulher sua anterior supremacia na casa - a exclusividade no trato dos problemas domésticos – assegurava agora a preponderância do homem no lar: o trabalho doméstico da mulher perdia agora sua importância, comparado com o trabalho produtivo do homem; este trabalho passou a ser tudo; aquele, uma insignificante contribuição. Isso demonstra que a emancipação da mulher e sua equiparação ao homem são e continuarão sendo impossíveis, enquanto ela permanecer excluída do trabalho produtivo social e confinada ao trabalho doméstico, que é um trabalho ·privado. A emancipação da mulher só se toma possível quando ela pode participar em grande escala, em escala social, da produção, e quando o trabalho doméstico lhe toma apenas um tempo insignificante. Esta condição só pode ser alcançada com a grande indústria moderna, que não apenas permite o trabalho da mulher em grande escala, mas até o exige, e tende cada vez mais a transformar o trabalho doméstico privado em uma indústria pública. (ENGELS). A segunda grande divisão do trabalho veio com a separação da manufatura e da agricultura, aqui, há a produção destinada diretamente à troca, surge o comércio além das fronteiras da tribo – até pelo mar. Pela primeira vez, surge uma classe que, mesmo sem participar da produção, se tem como detentora desta e subjuga economicamente aqueles que produzem. Nesse contexto, a escravidão se tornou integrante da sociedade, sendo requisitada ao aumento constante da produção; os metais nobres se tornaram mercadorias-dinheiro, sendo utilizados por peso como parâmetro de preço. Com a produção de mercadorias, surgiu o cultivo individual da terra e, em seguida, a propriedade individual do solo. Mais tarde veio o dinheiro, a mercadoria universal pela qual todas as demais podiam ser trocadas; mas, quando os homens inventaram o dinheiro, não suspeitavam que estavam criando uma força social nova, um poder universal único, diante do qual se iria inclinar a sociedade inteira. (ENGELS).O crescimento populacional reforça a necessidade de uma força coesiva interna e externa, assim, a confederação das tribos se funde agrupando os territórios tribais em um único espaço, surge a figura do comandante de tropas do povo e da assembleia do povo. A guerra se torna um modo de subsistência, aquisição de poder: As guerras de rapina aumentavam o poder do supremo chefe militar e também dos chefes inferiores; a eleição habitual dos seus sucessores nas mesmas famílias, sobretudo a partir da introdução do direito paterno, passou gradualmente a ser sucessão hereditária - tolerada a princípio, em seguida exigida, e finalmente usurpada; com isso, foram assentados os alicerces da monarquia e da nobreza hereditária. Dessa forma, os órgãos da constituição gentílica foram sendo arrancados de suas raízes populares, raízes na gens, na fratria e na tribo, com o que todo o regime gentílico acabou por se transformar em seu contrário: de uma organização de tribos para a livre regulamentação de seus próprios assuntos, fez-se uma organização para o saque e a opressão dos vizinhos; e, correspondentemente, seus órgãos deixaram de ser instrumentos da vontade do povo, convertendo-se em órgãos independentes, para dominar e· oprimir seu próprio povo. Isso nunca teria sido possível se a cobiça das riquezas não houvesse dividido os membros da gens em ricos e pobres, "se as diferenças de propriedade no seio de uma mesma gens não tivessem transformado a comunhão de interesses em antagonismo entre os membros da gens" (Marx) e se o incremento da escravidão já não tivesse começado a fazer considerar o trabalho para ganhar a vida como algo para escravos, mais desonroso do que a pilhagem. (ENGELS). Chega-se à civilização, em Atenas o Estado é fruto dos antagonismos já configurados na sociedade gentílica; em Roma, se estabelece uma aristocracia fechada no meio de uma plebe numerosa e privada de direitos, mas com obrigações; para os germanos, se origina diretamente da conquista de territórios estrangeiros. O Estado não é pois, de modo algum, um poder que se impôs à sociedade de fora para dentro; tampouco é "a realidade da idéia moral", nem "a imagem e a realidade da razão", como afirma Hegel. É antes um produto da sociedade, quando esta chega a um determinado grau de desenvolvimento; é a confissão de que essa sociedade se enredou numa irremediável contradição com ela própria e está dividida por antagonismos irreconciliáveis que não consegue conjurar. Mas para que esses antagonismos, essas classes com interesses econômicos colidentes não se devorem e não consumam a sociedade numa luta estéril, faz-se necessário um poder" colocado aparentemente por cima da sociedade, chamado a amortecer o choque e a mantê-lo dentro dos limites da "ordem". Este poder, nascido da sociedade, mas posto acima dela se distanciando cada vez mais, é o Estado. (ENGELS). Percebemos que, diferentemente da configuração gentílica, o Estado tem seus laços formados pela divisão territorial, independente dos laços de sangue entre gens e tribos; possui a instituição de uma força pública, formada por órgãos administrativos, e principalmente, por homens armados e instituições punitivas, como as prisões – Engels, notou que essa força se mostra mais presente à medida que os antagonismos de classe crescem. Além disso, para sustentar esse sistema passou a ser necessário contribuições dos cidadãos, os impostos. Como o Estado nasceu da necessidade de conter o antagonismo das classes, e como, ao mesmo tempo, nasceu em meio ao conflito delas, é, por regra geral, o Estado da classe mais poderosa, da classe economicamente dominante, classe que, por intermédio dele, se converte também em classe politicamente dominante e adquire novos meios para a repressão e exploração da classe oprimida. Assim, o Estado antigo foi, sobretudo, o Estado dos senhores de escravos para manter os escravos subjugados; o Estado feudal foi o órgão de que se valeu a nobreza para manter a sujeição dos servos e camponeses dependentes; e o moderno Estado representativo é o instrumento de que se serve o capital para explorar o trabalho assalariado. Entretanto, por exceção, há períodos em que as lutas de classes se equilibram de tal modo que o Poder do Estado, como mediador aparente, adquire certa independência momentânea em face das classes. (ENGELS). Engels é até hoje necessário como leitura, sendo uma grande fonte para pensar criticamente acerca das instituições e sistemas considerados “absolutos” na sociedade. O Estado, o capitalismo são conformações humanas, e como tal, são desenvolvidas para atender à interesses específicos de uma determinada classe, mantendo sua soberania ao longo do tempo – mesmo que haja uma ilusão propagada acerca da igualdade entre os integrantes desta sociedade, como se todos detivessem a mesma oportunidade. Yuval Harari, em “Sapiens – Uma breve história da humanidade”, se alia a Engels ao demonstrar como as configurações sociais são fruto do imaginário humano, reiteradas ao longo dos anos até que se tornasse um instinto intrínseco à mente. Somos alienados em instituições desde que nascemos, seja ao ser batizado na igreja sem nem saber falar, seja na doutrinação escolar para ter o sonho de se tornar um peão na cadeia produtiva. É preciso expandir os horizontes, questionar o que origina e determina as formas das instituições, as formas do mundo, é necessário sair da caverna. Desde o advento da civilização, chegou a ser tão grande o aumento da riqueza, assumindo formas tão variadas, de aplicação tão extensa, e tão habilmente administrada no interesse dos seus possuidores, que ela, a riqueza, transformou-se numa força incontrolável, oposta ao povo. A inteligência humana vê-se impotente e desnorteada diante de sua própria criação. Contudo, chegará um tempo em que a razão humana será suficientemente forte para dominar a riqueza e fixar as relações do Estado com a propriedade que ele protege e os limites aos direitos dos proprietários. Os interesses da sociedade são absolutamente superiores aos interesses individuais, e entre uns e outros deve estabelecer-se uma relação justa e harmónica. A simples caça à riqueza não é a finalidade, o destino da humanidade, a menos que o progresso deixe de ser a lei no futuro, como tem sido no passado. O tempo que transcorreu desde o início da civilização não passa de uma fração ínfima da existência passada da humanidade, uma fração ínfima das épocas vindouras. A dissolução da sociedade ergue-se, diante de nós, como uma ameaça; é o fim de um período histórico - cuja única meta tem sido a propriedade da riqueza - porque esse período encerra os elementos de sua própria ruína. A democracia na administração, a fraternidade na sociedade, a igualdade de direitos e a instrução geral farão despontar a próxima etapa superior da sociedade, para a qual tendem constantemente a experiência, a razão, e a ciência. Será uma revivescência da liberdade, igualdade e fraternidade das antigos gens, mas sob uma forma superior. (Morgan, A Sociedade Antiga, pág. 552 ).
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