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A Falência APRESENTAÇÃO Nesta Unidade de Aprendizagem será trabalhado o instituto da falência e suas implicações para a empresa, o empresário e os credores. Bons estudos. Ao final desta Unidade de Aprendizagem, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Identificar quando se está diante da falência.• Distinguir a falência do encerramento da atividade sem falência.• Reconhecer as implicações da falência para a empresa, o empresário e os credores.• DESAFIO Eduardo e Mônica, após idealizarem por anos a abertura de seu próprio negócio, finalmente conseguiram instalar, na próspera Cidade de Cajuru, uma pequena distribuidora de bebidas. Tiveram dois anos de muito sucesso e expansão de clientes a cada mês. Todavia, uma epidemia restringiu a aglomeração de pessoas e isso se refletiu diretamente nas vendas do casal. Sendo vedada a realização de festas, isso impactou diretamente os negócios. Eles se viram obrigados a realizar diversas promoções a preço de custo, mas nem isso foi capaz de reerguer a empresa. As restrições às aglomerações aumentavam a cada mês e eles não viam saída para a situação. A vacinação teve início no município, porém com um cronograma lento, o que os desanimou. As dificuldades financeiras se acumulavam e os credores passaram a cobrá-los diariamente. Parecia não haver saída. Foi, então, que Eduardo soube que, no município vizinho, as atividades já estavam sendo retomadas, pois a vacinação já havia alcançado quase toda a população e a economia estava aos poucos se reerguendo. Era uma ótima notícia. Ele e Mônica conversaram e decidiram que seria uma excelente ideia abrir uma nova distribuidora na cidade vizinha, deixando a antiga sede fechada. Seria apenas por alguns meses e, assim que conseguissem se capitalizar novamente, retornariam para Cajuru e pagariam todas as dívidas. Mônica gostou da ideia, mas se mostrou um pouco receosa. Ela convenceu Eduardo a procurar você, um advogado amigo da família há muitos anos, para tranquilizar ambos sobre o plano que traçaram. O que você responderia ao casal? INFOGRÁFICO O termo "falência" deriva de fallere, que significa fraudar ou faltar. O infográfico apresenta motivos que levam o devedor à falência. Confira! CONTEÚDO DO LIVRO Leia mais no capítulo A Falência que faz parte do livro Legislação Empresarial Aplicada e é a base teórica desta Unidade de Aprendizagem. Boa leitura. DIREITO COMERCIAL Miguel do Nascimento Costa A falência Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: � Identificar quando se está diante da falência. � Distinguir a falência do encerramento das atividades. � Reconhecer as implicações da falência para a empresa, o empresário e os credores. Introdução Falência é uma situação jurídica decorrente de uma sentença decretatória proferida por um magistrado. Nesse caso, uma empresa ou uma sociedade comercial se omite quanto ao cumprimento de determinada obrigação patrimonial e tem seus bens alienados para satisfazer seus credores. Neste capítulo, você será apresentado ao instituto da falência, além de conhecer as suas implicações para a empresa, para o empresário e para os credores. 1 Definição A necessidade de regular juridicamente o fracasso na atividade econômica surgiu com o avançar do tempo. Ao fim da República, o direito pretoriano admitiu garantir ao credor, como meio de execução forçada, o direito de posse e venda dos bens do devedor, sendo que tais bens ficavam a encargo de um curador, o qual era nomeado pelo juiz (VIGIL NETO, 2008). No período de colonização do Brasil, já ocorria a aplicação do direito falimentar. O decreto-lei nº 7.661, chamado de Lei de falências, vigorou de 1945 até 2005, e regulou dois regimes jurídicos: a falência e a concordata. Posteriormente, a lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005, revogou o decreto-lei, mantendo a falência, porém, extinguindo a concordata e a substituindo pela recuperação, possibilitando ser judicial ou extrajudicial (BRASIL, 2005). A noção inicial de empresa advém da economia, ligada à ideia central da organização dos fatores da produção (capital, trabalho, natureza) para a realização de uma atividade econômica. De acordo com o art. 966 do Código Civil (BRASIL, 2002), podemos concluir que a empresa é a atividade econô- mica organizada para a produção ou a circulação de bens ou serviços para o mercado (TOMAZETTE, 2013). Segundo Rubens Requião (2015), os organismos econômicos que se con- cretizam na organização dos fatores de produção e se propõem a satisfazer as necessidades alheias, bem como as exigências do mercado geral, levam, na terminologia econômica, o nome de empresa. A empresa tem um papel econômico-social relevante para a sociedade. Contudo, segundo Luiz Vigil Neto (2008, p. 62), “[...] assim como os seres vivos, as empresas nascem, crescem e morrem”. É cediço que os bens do patrimônio do devedor (nesse caso, a empresa) representem a garantia do credor. Assim, ocorrendo inadimplência do devedor, o credor pode recorrer ao Poder Judiciário para promover a execução dos bens que forem necessários para a satisfação de seu crédito. Porém, quando o devedor (a empresa) possui bens com valores inferiores à totalidade de suas dívidas, a regra da execução individual se torna injusta. Isso porque o credor que se antecipa e ingressa com ação judicial possivelmente receberá o valor total do seu crédito, enquanto aquele que ingressa posteriormente, ou aquele em que a obrigação ainda não está vencida, provavelmente não conseguirá receber pelo seu crédito. A fim de evitar essa disparidade, o direito trouxe a possibilidade de oferecer um tratamento igualitário aos credores do falido, promovendo a obrigatoriedade da execução concursal dos credores (COELHO, 2016). Nos casos em que o devedor é legalmente empresário, a execução concursal de seu patrimônio se dá pela falência. Com o regime concursal dos credores, a falência oportuniza um tratamento mais benéfico à empresa, pois faculta a extinção das obrigações com o rateio entre os credores quirografários de mais de 25% do devido após a realização de todo o ativo, conforme expressa o inciso II do art. 158 da lei nº 11.101 (COELHO, 2016). Mas o que é a falência? Fábio Ulhoa Coelho assim leciona (2016, p. 352): [...] quando o devedor explora sua atividade econômica de forma empresarial — caracterizada pela conjugação dos fatores de produção: investimento de capital, contratação de mão de obra, aquisição de insumos, desenvolvimento ou compra de tecnologia —, não sendo capaz de honrar suas obrigações no vencimento (ou estando presentes outros fatos tipificados em lei), o juiz deve inaugurar um procedimento de execução concursal destinado à satisfação dos credores, no quanto for possível. A falência2 No entanto, nem todas as modalidades de empresa estão incluídas no regime falimentar. De acordo com o art. 2º da lei nº 11.101 (BRASIL, 2005), estão totalmente excluídos: as empresas públicas e as sociedades de economia mista, as instituições financeiras públicas ou privadas, as cooperativas de crédito, os consórcios, as entidades de previdência complementar, as sociedades operado- ras de plano de assistência à saúde, as sociedades seguradoras, as sociedades de capitalização e outras entidades legalmente equiparadas às anteriores. Coelho (2016) lembra, ainda, que há empresários parcialmente excluídos do regime falimentar: � instituições financeiras; � sociedades arrendadoras, que tenham por objeto exclusivo exploração de leasing; � sociedades que se dediquem à administração de consórcios, fundos mútuos e outras atividades assemelhadas; � companhias de seguro; � entidades abertas de previdência complementar e as de capitalização; � operadoras de planos privados de assistência à saúde. Para essas categorias, embora a falência possa ser decretada, serão obser- vadas condições específicas previstas em legislação própria.Em relação às hipóteses autorizadoras para a decretação da falência, a legislação traz um rol taxativo, que descreve comportamentos típicos de quem se encontra insolvente, sendo tal insolvência presumida. De acordo com o art. 94 da lei nº 11.101 (BRASIL, 2005, documento on-line), a falência do devedor poderá ser decretada quando ele: I — sem relevante razão de direito, não paga, no vencimento, obrigação líquida materializada em título ou títulos executivos protestados cuja soma ultrapasse o equivalente a 40 (quarenta) salários-mínimos na data do pedido de falência; II — executado por qualquer quantia líquida, não paga, não deposita e não nomeia à penhora bens suficientes dentro do prazo legal; III — pratica qualquer dos seguintes atos, exceto se fizer parte de plano de recuperação judicial: a) procede à liquidação precipitada de seus ativos ou lança mão de meio ruinoso ou fraudulento para realizar pagamentos; b) realiza ou, por atos inequívocos, tenta realizar, com o objetivo de retardar pagamentos ou fraudar credores, negócio simulado ou alienação de parte ou da totalidade de seu ativo a terceiro, credor ou não; 3A falência c) transfere estabelecimento a terceiro, credor ou não, sem o consentimento de todos os credores e sem ficar com bens suficientes para solver seu passivo; d) simula a transferência de seu principal estabelecimento com o objetivo de burlar a legislação ou a fiscalização ou para prejudicar credor; e) dá ou reforça garantia a credor por dívida contraída anteriormente sem ficar com bens livres e desembaraçados suficientes para saldar seu passivo; f) ausenta-se sem deixar representante habilitado e com recursos suficientes para pagar os credores, abandona estabelecimento ou tenta ocultar-se de seu domicílio, do local de sua sede ou de seu principal estabelecimento; g) deixa de cumprir, no prazo estabelecido, obrigação assumida no plano de recuperação judicial. Sobre a decretação de falência, é crível que o devedor apresente contestação, podendo requerer a sua recuperação judicial (art. 95). Além disso, a falência não será decretada se o devedor comprovar: I — falsidade de título; II — prescrição; III — nulidade de obrigação ou de título; IV — pagamento da dívida; V — qualquer outro fato que extinga ou suspenda obrigação ou não legitime a cobrança de título; VI — vício em protesto ou em seu instrumento; VII — apresentação de pedido de recuperação judicial no prazo da contestação, observados os requisitos do art. 51 desta Lei; VIII — cessação das atividades empresariais mais de 2 (dois) anos antes do pedido de falência, comprovada por documento hábil do Registro Público de Empresas, o qual não prevalecerá contra prova de exercício posterior ao ato registrado (BRASIL, 2005, documento on-line). O pedido de falência pode ser proposto pelo próprio devedor que, em crise econômico-financeira, julgue-se incapaz de atender aos requisitos para pleitear sua recuperação judicial. Nesse caso, ele deve expor as razões da impossi- bilidade de continuidade da atividade empresarial, respeitados os requisitos previstos nos arts. 105 a 107 da lei nº 11.101 (BRASIL, 2005). Ainda, podem requerer falência o cônjuge sobrevivente, qualquer herdeiro do devedor ou inventariante, o cotista ou o acionista do devedor na forma da lei ou do ato constitutivo da sociedade, e, por fim, qualquer credor. A falência4 O não cumprimento das obrigações legais por parte do falido, o cometimento de fraude a credores ou o descumprimento de determinação judicial fica sujeito o falido a crime falimentar, regulamentado pelo art. 168 e seguintes da lei nº 11.101 (BRASIL, 2005). 2 O encerramento das atividades A falência tem como um de seus resultados o encerramento das atividades da empresa pela impossibilidade de saldar seus compromissos. Todavia, esse fechamento também pode ocorrer sem a decretação de falência. Sempre que uma empresa encerra as suas atividades, o normal e esperado é que ocorra um procedimento formal que culminará em sua dissolução re- gular. Tal opção envolve uma série de ações, entre elas a liquidação do seu patrimônio e a extinção da personalidade jurídica, com a respectiva baixa nos órgãos competentes. De acordo com o art. 1.033 do Código Civil (BRASIL, 2002, documento on-line), são hipóteses de dissolução de uma sociedade: I - o vencimento do prazo de duração, salvo se, vencido este e sem oposição de sócio, não entrar a sociedade em liquidação, caso em que se prorrogará por tempo indeterminado; II - o consenso unânime dos sócios; III - a deliberação dos sócios, por maioria absoluta, na sociedade de prazo indeterminado; IV - a falta de pluralidade de sócios, não reconstituída no prazo de cento e oitenta dias; V - a extinção, na forma da lei, de autorização para funcionar. Parágrafo único. Não se aplica o disposto no inciso IV caso o sócio remanes- cente, inclusive na hipótese de concentração de todas as cotas da sociedade sob sua titularidade, requeira, no Registro Público de Empresas Mercantis, a transformação do registro da sociedade para empresário individual ou para empresa individual de responsabilidade limitada, observado, no que couber, o disposto nos arts. 1.113 a 1.115 deste Código. 5A falência Diversos são os motivos que ensejam o encerramento de uma empresa, seja por mera vontade dos sócios, seja por inviabilidade do negócio em virtude de estar enfrentando crise financeira, sendo esse último motivo o mais comum devido ao cenário atual de crise econômica. O encerramento empresarial regular requer o pagamento integral dos débitos de todas as naturezas e todos os procedimentos contábeis de baixa junto aos órgãos fiscais e de registro, além de pressupor a elaboração de um distrato entre os sócios. Todavia, ele não ocorre por acaso, sendo necessário identificar seu marco inicial: O processo de encerramento da sociedade deve ter um marco inicial, isto é, deve ocorrer um fato para desencadear todo o processo. Esse fato é o que denominamos dissolução stricto sensu, que pode ser entendida como a causa do encerramento da sociedade, ou seja, o fato que desencadeia todo o processo de dissolução em sentido amplo (TOMAZZETE, 2013, p. 495). A dissolução lato sensu é um processo de encerramento da sociedade que objetiva a extinção da pessoa jurídica, abrangendo três fases distintas: a dissolução stricto sensu, a liquidação e a extinção (TOMAZZETTE, 2013). Contudo, a dissolução também pode ocorrer de forma irregular, o que tem sido mais comum do que o desejado: “[...] os sócios, em vez de observarem o procedimento extintivo previsto em Lei, limitam-se a vender precipitadamente o acervo, a encerrar as atividades e se dispersarem” (COELHO, 2016, p. 172). A principal consequência de uma empresa encerrar suas atividades de maneira irregular é o fato de, em regra, os sócios poderem ser responsabilizados pesso- almente pelas dívidas da empresa, pois o direito civil possibilita, pelo expresso no art. 50 do Código Civil (BRASIL, 2002), a extensão da responsabilidade dos sócios da empresa pelo incidente processual de “[...] desconsideração da personalidade jurídica” previsto nos arts. 133 a 137 do Código de Processo Civil (BRASIL, 2015, documento on-line). A falência6 A principal diferença refere-se ao aspecto patrimonial, pois a desconsi- deração da personalidade jurídica tem como consequência a possibilidade de o patrimônio dos sócios também passarem a responder pelas dívidas da empresa. Como bem expressa Marlon Tomazette (2002, documento on-line): Desvirtuada a utilização da pessoa jurídica, nada mais eficaz do que retirar os privilégios que a lei assegura, isto é, descartar a autonomia patrimonial no caso concreto, esquecer a separação entre sociedade e sócio, o que leva a estender os efeitos das obrigações da sociedade a estes. Já na via falimentar, se o pedido for formulado antes do encerramento irregular da empresa, se atendidos os requisitos legais, haverá proteção não só dos credores, mas também dossócios da sociedade liquidada — conforme vimos anteriormente, o concurso de credores faculta a extinção das obrigações com o rateio entre os credores quirografários de mais de 25% do devido após a realização de todo o ativo. A jurisprudência tem entendido que a simples inatividade da pessoa jurídica não presume a dissolução irregular da empresa, da qual há de se preencher diversos requisitos, sendo o seu pedido realizado pelo credor e devendo conter prova robusta de cometimento de ato fraudulento a credores, por parte dos sócios. 3 As implicações da falência para a empresa, o empresário e os credores Implicações da falência para a empresa falida Primeiramente, é importante registrar que não são exigíveis do devedor, na recuperação judicial ou na falência, as obrigações a título gratuito, bem como as despesas que os credores fizerem para tomar parte na recuperação judicial ou na falência, salvo as custas judiciais decorrentes de litígio com o devedor. 7A falência Segundo exposto no art. 6º da lei nº 11.101 (BRASIL, 2005), a decretação da falência ou o deferimento da recuperação judicial suspendem os prazos prescricionais e decadenciais nas execuções que correm contra o devedor, porém, em casos de ações e execuções propostas pelo falido, ou seja, nos casos em que ele é o credor, não há suspensão dos prazos prescricionais e decadenciais. No que diz respeito a dívidas fiscais e tributárias, a decretação da recuperação judicial ou da falência não suspendem as execuções fiscais. São muitos os efeitos da decretação da falência em relação à empresa, entre eles, “o vencimento antecipado das dívidas do devedor e dos sócios ilimitada e solidariamente responsáveis, com o abatimento proporcional dos juros, converte todos os créditos de moeda estrangeira para a moeda do país pelo câmbio do dia da decisão judicial” (BRASIL, 2005, documento on-line). Além disso, conforme o art. 81, a decisão que decreta a falência da socie- dade com sócios ilimitadamente responsáveis também acarreta a sua falência, que ficam sujeitos aos mesmos efeitos jurídicos produzidos em relação à sociedade falida e, por isso, deverão ser citados para apresentar contestação, se assim o desejarem. Segundo § 2º do mesmo artigo, as sociedades falidas serão representadas por seus administradores ou liquidantes, os quais terão os mesmos direitos e, sob as mesmas penas, ficarão sujeitos às obrigações que cabem ao falido (BRASIL, 2005). A responsabilidade pessoal dos sócios de responsabilidade limitada, dos controladores e dos administradores da sociedade falida será apurada no próprio juízo da falência, independentemente da realização do ativo e da prova da sua insuficiência para cobrir o passivo, observado o procedimento ordinário previsto no Código de Processo Civil (conforme art. 82 da mesma lei). Ainda, preveem os arts. 116 e 117 (BRASIL, 2005), a decretação da fa- lência suspende o exercício do direito de retenção sobre os bens sujeitos à arrecadação, os quais deverão ser entregues ao administrador judicial, e o exercício do direito de retirada ou de recebimento do valor de suas quotas ou ações por parte dos sócios da sociedade falida; os contratos bilaterais não se resolvem pela falência e podem ser cumpridos pelo administrador judicial se o cumprimento reduzir ou evitar o aumento do passivo da massa falida ou for necessário à manutenção e à preservação de seus ativos. É importante frisar que o juízo de falências não resolve questões atinentes a causas trabalhistas e fiscais e àquelas não reguladas na lei nº 11.101, em que o falido figurar como autor ou litisconsorte ativo. Há que se observar, ainda, que foi instituída, por meio do art. 129, uma lista taxativa de alguns atos praticados pelo falido que são objetivamente ineficazes, os quais, embora não tenham caráter de fraude ou ilicitude, terão seus efeitos retirados, no entanto, não A falência8 serão nulos ou anulados, sendo apenas retirados o efeito e as consequências desses atos (BRASIL, 2005). Da insolvência A insolvência é assim denominada quando o passivo do devedor é menor do que seu ativo patrimonial. Segundo Coelho (2016, p. 277), “[...] é necessário atentar-se para o fato de que o segundo pressuposto da falência não é a in- solvência entendida em sua acepção econômica, ou seja, como um estado patrimonial”. Dessa forma, podemos concluir que a insolvência do devedor é decretada quando este descumpre as obrigações contraídas, conforme expressa o art. 94 da lei nº 11.101 (BRASIL, 2005). Implicações da falência para o sócio/empresário Conforme expressa o art. 102 da lei nº 11.101 (BRASIL, 2005, documento on-line), “o falido fica inabilitado para exercer qualquer atividade empresarial a partir da decretação da falência e até a sentença que extingue suas obrigações, entre outras consequências [...]”. Na lei, qualquer remissão ao devedor ou falido estende-se aos sócios de responsabilidade ilimitada. Com isso, observa-se que o legislador promoveu a equiparação dos sócios de responsabilidade ilimitada ao devedor ou falido para todos os efeitos decorrentes da lei (art. 190). No art. 103 (BRASIL, 2005), fica estabelecido que o devedor perde o direito de administrar os seus bens ou deles dispor a partir do momento em que é decretada falência ou sequestro. Contudo, o falido poderá fiscalizar a administração da falência, requerer as providências necessárias para a con- servação de seus direitos ou dos bens arrecadados e intervir nos processos em que a massa falida for parte ou interessada, requerendo o que for de direito e interpondo os recursos cabíveis. Depois de decretada a falência, impõe-se, ao falido, deveres expressos no art. 104 (BRASIL, 2005), como pode ser visto a seguir. Em caso de descum- primento, esse falido ficará sujeito à implicação e ao crime de desobediência. São eles: 9A falência Art. 104. A decretação da falência impõe aos representantes legais do falido os seguintes deveres: (Redação dada pela Lei nº 14.112, de 2020) (Vigência) I - assinar nos autos, desde que intimado da decisão, termo de comparecimento, com a indicação do nome, da nacionalidade, do estado civil e do endereço completo do domicílio, e declarar, para constar do referido termo, diretamente Implicações da falência para os credores No que diz respeito aos credores, a lei nº 11.101 apresenta, em seu art. 83, uma lista de ordem para pagamentos dos créditos, iniciando nos trabalhistas e terminando nos credores quirografários (BRASIL, 2005). A falência10 ao administrador judicial, em dia, local e hora por ele designados, por prazo não superior a 15 (quinze) dias após a decretação da falência, o seguinte: (Redação dada pela Lei nº 14.112, de 2020) (Vigência) a) as causas determinantes da sua falência, quando requerida pelos credores; b) tratando-se de sociedade, os nomes e endereços de todos os sócios, acio- nistas controladores, diretores ou administradores, apresentando o contrato ou estatuto social e a prova do respectivo registro, bem como suas alterações; c) o nome do contador encarregado da escrituração dos livros obrigatórios; d) os mandatos que porventura tenha outorgado, indicando seu objeto, nome e endereço do mandatário; e) seus bens imóveis e os móveis que não se encontram no estabelecimento; f) se faz parte de outras sociedades, exibindo respectivo contrato; g) suas contas bancárias, aplicações, títulos em cobrança e processos em andamento em que for autor ou réu; II - entregar ao administrador judicial os seus livros obrigatórios e os demais instrumentos de escrituração pertinentes, que os encerrará por termo; (Redação dada pela Lei nº 14.112, de 2020) (Vigência) III – não se ausentar do lugar onde se processa a falência sem motivo justo e comunicação expressa ao juiz, e sem deixar procurador bastante, sob as penas cominadas na lei; IV – comparecer a todos os atos da falência, podendo ser representado por procurador, quando não for indispensável sua presença; V - entregar ao administrador judicial,para arrecadação, todos os bens, papéis, documentos e senhas de acesso a sistemas contábeis, financeiros e bancários, bem como indicar aqueles que porventura estejam em poder de terceiros; (Redação dada pela Lei nº 14.112, de 2020) (Vigência) VI – prestar as informações reclamadas pelo juiz, administrador judicial, credor ou Ministério Público sobre circunstâncias e fatos que interessem à falência; VII – auxiliar o administrador judicial com zelo e presteza; VIII – examinar as habilitações de crédito apresentadas; IX – assistir ao levantamento, à verificação do balanço e ao exame dos livros; X – manifestar-se sempre que for determinado pelo juiz; XI - apresentar ao administrador judicial a relação de seus credores, em arquivo eletrônico, no dia em que prestar as declarações referidas no inciso I do caput deste artigo; (Redação dada pela Lei nº 14.112, de 2020) (Vigência) XII – examinar e dar parecer sobre as contas do administrador judicial. Parágrafo único. Faltando ao cumprimento de quaisquer dos deveres que esta Lei lhe impõe, após intimado pelo juiz a fazê-lo, responderá o falido por crime de desobediência (BRASIL, 2005, documento on-line). Basicamente, a sentença declaratória de falência produz quatro efeitos (COELHO, 2016): 1. Formação da massa falida subjetiva. 2. Suspensão das ações individuais contra o falido. 3. Vencimento antecipado dos créditos. 4. Suspensão da fluência dos juros. Salienta-se que há exceções à regra de suspensão das execuções individuais. São as seguintes: � ações que versam sobre quantia ilíquida, coisa certa, prestação ou abstenção de fato, inclusive reclamatórias trabalhistas; � execuções fiscais. Após a verificação dos créditos pelo administrador judicial, haverá pu- blicação em edital e os credores terão prazo de 15 dias para apresentar suas habilitações ou divergências quanto aos créditos relacionados. Depois desse prazo, ocorrerá nova publicação em edital, com prazo de 45 dias da lista de credores, estabelecendo o local e o horário em que os credores poderão ter acesso aos documentos que fundamentarão a relação de credores. A habilitação de crédito deverá obedecer aos seguintes requisitos formais (BRASIL, 2005, documento on-line): I — o nome, o endereço do credor e o endereço em que receberá comunicação de qualquer ato do processo; II — o valor do crédito, atualizado até a data da decretação da falência ou do pedido de recuperação judicial, sua origem e classificação; III — os documentos comprobatórios do crédito e a indicação das demais provas a serem produzidas; IV — a indicação da garantia prestada pelo devedor, se houver, e o respectivo instrumento; V — a especificação do objeto da garantia que estiver na posse do credor. Parágrafo único. Os títulos e documentos que legitimam os créditos deverão ser exibidos no original ou por cópias autenticadas se estiverem juntados em outro processo. As habilitações de crédito retardatárias não terão direito a voto na assem- bleia geral de credores. O processo falimentar obedece a essa regra depois de publicada a sentença. 11A falência Procure por “Sobrevivência de empresas no Brasil” em seu navegador para encontrar uma pesquisa realizada pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), publicada em 2016. O estudo apresenta dados de 2008 a 2014 a respeito de sobrevivência e mortalidade de empresas no mercado brasileiro. A seguir, temos um caso em que ocorreu a interposição equivocada do recurso cabível à decretação da falência: Ementa: APELAÇÃO CÍVEL. DECISÃO MONOCRÁTICA. ART. 932, III, CPC. RECUPERAÇÃO JUDICIAL HABILITAÇÃO DE CRÉDITO JULGADA EXTINTA. RECURSO INADEQUADO. FORTE NO ARTIGO 17 E 10, §5 DA LEI N. 11.101/05, A DECISÃO QUE RESOLVE HABILITAÇÃO DE CRÉDITO É IMPUGNADA MEDIANTE AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO NÃO CONHECIDO POR MANIFESTA INADMISSIBILIDADE (RIO GRANDE DO SUL, 2018, do- cumento on-line). A falência12 BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Brasília, DF: Presidência da República, 2002. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/CCivil_03/Leis/2002/ L10406.htm. Acesso em: 9 jun. 2020. BRASIL. Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005. Regula a recuperação judicial, a extraju- dicial e a falência do empresário e da sociedade empresária. Brasília, DF: Presidência da República, 2005. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004- 2006/2005/Lei/L11101.htm. Acesso em: 9 jun. 2020. BRASIL. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil. Brasília, DF: Presidência da República, 2015. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm. Acesso em: 9 jun. 2020. COELHO, F. U. Manual de direito comercial: direito de empresa. 28. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016. REQUIÃO, R. Curso de direito comercial. São Paulo: Saraiva, 2015. v. 1. E-book. RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Sexta Câmara Cível. Apelação Cível Nº 70077209542. Relator: Luís Augusto Coelho Braga. Julgado em: 17 abr. 2018. 13A falência Os links para sites da web fornecidos neste capítulo foram todos testados, e seu fun- cionamento foi comprovado no momento da publicação do material. No entanto, a rede é extremamente dinâmica; suas páginas estão constantemente mudando de local e conteúdo. Assim, os editores declaram não ter qualquer responsabilidade sobre qualidade, precisão ou integralidade das informações referidas em tais links. TOMAZETTE, M. A desconsideração da personalidade jurídica: a teoria, o CDC e o novo Código Civil. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 58, 1 ago. 2002. Disponível em: https:// jus.com.br/artigos/3104/a-desconsideracao-da-personalidade-juridica. Acesso em: 9 jun. 2020. TOMAZETTE, M. Curso de direito empresarial: teoria geral e direito societário. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2013. v. 1. VIGIL NETO, L. I. Teoria falimentar e regimes recuperatórios. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008. Leituras recomendadas FERREIRA, M. C. R. e B.; SILVA JÚNIOR, G. L. Os crimes falimentares na legislação atual e no projeto do novo código penal: uma análise desde a perspectiva do direito penal mínimo. Revista de Estudos Jurídicos UNESP, São Paulo, v. 16, n. 24, p.1-12, 2012. Disponível em: https://ojs.franca.unesp.br/index.php/estudosjuridicosunesp/article/view/756/745. Acesso em: 9 jun. 2020. OLIVEIRA, C. M. de. Direito falimentar brasileiro. Âmbito Jurídico, São Paulo, v. 8, n. 21, maio 2005. Disponível em: http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_ link=revista_artigos_leitura&artigo_id=594. Acesso em: 9 jun. 2020. OLIVEIRA, J. Encerrar corretamente a empresa pode evitar prejuízos maiores. In: CONSELHO Federal de Contabilidade. Brasília, DF, 30 maio 2016. Disponível em: http:// cfc.org.br/noticias/encerrar-corretamente-a-empresa-pode-evitar-prejuizos-maiores/. Acesso em: 9 jun. 2020. ZENI, C. “Em geral, empresas tentam a recuperação quando já estão falindo". [Entrevis- tadora cedida a] Laura Nabuco. MidiaNews. Cuiabá, 2017. Disponível em: http://www. midianews.com.br/entrevista-da-semana/em-geral-empresas-tentam-a-recuperacao- -quando-ja-estao-falindo/295382. Acesso em: 9 jun. 2020. DICA DO PROFESSOR No vídeo a seguir são apresentadas as dúvidas mais comuns que levam o estudante a enganar-se acerca da ocorrência ou não da falência. São estabelecidas as diferenças e as causas da falência na atualidade. Confira! Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino! EXERCÍCIOS 1) A falência é sempre a última alternativa a ser adotada. Perdem-se postos de trabalho, circulação da renda dos trabalhadores e arrecadação de tributos. Trata-se, portanto, de um relevante papel que é desempenhado e deve ser preservado ao máximo. Todavia, mesmo diante dessas ponderações, há situações em que o endividamento da empresa chega a tal ponto que essa é a única possibilidade que resta. Considerando isso, assinale a alternativa correta. A) A empresa pode ser definida como uma atividade econômica ou não,a depender da sua organização societária, mas desde que a sua finalidade esteja voltada para a circulação de bens. B) A falência do devedor poderá ser decretada quando ele, executado por qualquer quantia líquida, não paga, não deposita e não nomeia à penhora bens suficientes dentro do prazo legal. C) Caso uma empresa tenha dívidas, e estas sejam iguais ao seu patrimônio, será cabível a interposição da chamada “ação de pré-falência”. D) O instituto da falência se origina do direito germânico e foi importado para o Brasil apenas com a abertura para o comércio exterior, na implantação do modelo neoliberal. A possibilidade de falência é faculdade estendida a todas as empresas, bastando que E) estejam regularmente constituídas. 2) O termo "falência" deriva de fallere, que significa fraudar ou faltar. Sob o ponto de vista histórico, esse sentido se mostra correto. Todavia, a partir de uma compreensão contemporânea, a falência tem um sentido diverso. Sob essa ótica, e considerando a visão atual do instituto, assinale a alternativa correta. A) Segundo a Lei n.o 11.101/2005, a insolvência que origina a falência é apenas a econômica. B) A falência do devedor poderá ser decretada quando ele se ausenta imotivadamente. C) A falência significa um tratamento igualitário, promovendo a obrigatoriedade da execução concursal dos credores. D) O inadimplemento de obrigação líquida no vencimento é circunstância que permite a decretação da falência. E) O próprio devedor poderá requerer a sua falência, sendo suficiente a sua declaração. 3) A Lei de Falências traz um artigo que contempla, de forma taxativa, as condutas que presumem o estado de insolvência do devedor. São os denominados atos de falência. Essas circunstâncias ensejam a falência, exceto se fizerem parte do plano de recuperação judicial. Assinale a alternativa que apresenta a descrição correta de uma dessas condutas, realizada pelo devedor. A) Transferir estabelecimento ao credor, sem o consentimento de todos os credores e sem ficar com bens suficientes para solver o seu passivo. B) Assumir dívidas em montantes que superam ou ainda se equivalem ao patrimônio total da sua empresa. C) Cumprir, antes do prazo estabelecido, obrigação assumida no plano de recuperação judicial. D) Reforçar garantia ao credor por dívida contraída anteriormente, mantendo bens livres e desembaraçados capazes de saldar o passivo. E) Proceder à liquidação precipitada de seus ativos ou lançar mão de meio ruinoso ou fraudulento para realizar pagamentos. 4) O processo de falência segue uma série de ritos e procedimentos predeterminados. Uma vez citado, o devedor pode apresentar resposta ao pedido de sua falência no prazo de 10 dias. Nesse prazo, a resposta do réu pode ser de acordo com o pedido, sendo decretada a sua falência, ou pode ser formulada em forma de contestação, oferecendo um dos fundamentos de defesa. Sobre o tema, assinale a alternativa correta. A) Um mecanismo muito eficiente, utilizado como forma de defesa contra os pedidos de falência, consiste no depósito elisivo, que pode ser parcial. B) O vício no protesto não poderá ser alegado em sede de defesa contra a falência, pois depende de contraditório a ser aferido em ação própria. C) Caso o devedor tenha apresentado pedido de recuperação judicial, este fato somente será considerado caso tenha iniciado antes da sua citação válida. D) Poderá ocorrer cessação das atividades empresariais mais de 2 anos antes do pedido de falência, comprovada por documento hábil do Registro Público de Empresas, sendo que não prevalecerá contraprova de exercício posterior ao ato registrado. E) Caso o pedido de falência seja formulado com base em títulos líquidos protestados, o devedor não poderá levantar como argumento de defesa a existência do pagamento, exceto como preliminar. 5) A falência é um procedimento que deve ser obrigatoriamente judicializado, pois a sua declaração exige uma sentença proferida por um magistrado. A partir da sentença declaratória, a Lei de Falências aponta uma série de deveres para o falido. Aponte a alternativa que traz uma dessas obrigações. A) Depositar em cartório, assim que for intimado, os seus livros obrigatórios a fim de serem entregues ao Ministério Público depois de encerrados por termos assinados pelo juiz. B) Autorizar previamente as habilitações de crédito apresentadas. C) Dirigir os trabalhos do administrador judicial com zelo e presteza. D) Entregar, sem demora, todos os bens, livros, papéis e documentos ao administrador judicial, indicando-lhe, para serem arrecadados, os bens que porventura estejam em poder de terceiros. E) Cumprir obrigação assumida no plano de recuperação judicial. NA PRÁTICA Um dos indicadores da economia é o índice de falências requeridas no País. Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino! Acesse a guia "Saiba mais" e veja que a oscilação das falências coincide com os períodos de crise econômica. SAIBA MAIS Para ampliar o seu conhecimento a respeito desse assunto, veja abaixo as sugestões do professor: Debate sobre a jurisprudência acerca da falência e recuperação de empresas Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino! É Justo - A nova lei de falência e recuperação de empresas Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino! Indicadores econômicos Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino!
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