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DAS POLÍTICAS EDUCACIONAIS À ECONOMIA DA EDUCAÇÃO BATISTELA. Airton Carlos1 – FESC / UNILAGOS / UNIVEST Grupo de Trabalho - Políticas Públicas, Avaliação e Gestão da Educação Agência Financiadora: não contou com financiamento Resumo A Teoria do Capital humano de Theodore Schultz tem em sua essência a ideia de que o indivíduo gasta em si mesmo de formas diversas, não apenas buscando desfrutar o presente, mas procurando rendimentos futuros, pecuniários ou não. Os seguidores desta teoria defendem que o sucesso das organizações modernas em um ambiente instável, dinâmico e competitivo de negócios - tal como ocorre hoje - está sendo uma decorrência cada vez maior de uma administração realmente eficaz de recursos humanos. Assim, dizem eles, o fator que realmente constitui o elemento dinâmico e empreendedor das organizações - sejam elas privadas ou públicas, industriais ou prestadoras de serviços, lucrativas ou não lucrativas, grandes ou pequenas - são as pessoas. A qualidade inerente as pessoas de uma organização, seus conhecimentos, habilidades e competências, seu entusiasmo e satisfação com suas atividades, seu senso de iniciativa para gerar valor e riqueza, tudo isso tem forte impacto na produtividade e lucratividade da organização, no nível de serviços oferecidos ao cliente, na reputação, imagem e na competitividade. Schultz destaca a importância da educação como investimento e reflete sobre a importância do processo educacional na preparação do ser humano para enfrentar os constantes ajustamentos a que é submetido, como resultado dos desequilíbrios econômicos e sociais tão frequentes na sociedade moderna. Embora a educação não assuma publicamente que é pensada a partir da teoria do capital humano, isto fica patente nas posturas oficiais das políticas educacionais, principalmente no ensino superior e na pesquisa. Este artigo pretende estruturar o arcabouço da teoria do capital humano, a partir de alguns conceitos básicos de sua construção, olhando para a forma como é encaminhada para o campo da educação e da pesquisa, objetivando fornecer subsídios de reflexão aos docentes e discentes de todas as áreas. Palavras-chave: Capital Humano. Educação. Economia da Educação. 11 Mestre em Educação/PURS , Doutor em Educação/PUCPR e docente da FESC/UNILAGOS/FACVEST Atua nos Grupos de Estudos e Pesquisas em História, Sociedade e Educação, HISTEDBR e Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Ensino de Filosofia e Educação Filosófica - Regional Planalto Catarinense ,. Participa das seguintes Linhas de Pesquisa: Ensino de Filosofia, História e Políticas da Educação e Políticas e Processos Formativos em Educação. E-mail: batistela.airton@gmail.com 828 Introdução Esta pesquisa faz parte de um corpo maior de estudo que vai desde a busca das origens da Teoria do Capital Humano, até este ramo, mais recente, da aplicação deste modelo à educação, na sua versão, que aqui designamos de Economia da Educação. A pesquisa é de matriz teórica, construída reflexivamente. Desde que foi formulado, no final dos anos 1950, o conceito de Capital Humano passou a exercer influência sobre as políticas educacionais de muitos países, por diversos meios, a partir dos ideais de Schultz2. Entre os meios utilizados pela Teoria do Capital Humano, um se destaca na atualidade: a tomada da educação como investimento econômico em capital humano. Sheehan (1973, p. 98-100), diz, em termos próximos, que os ideais da Economia da Educação foram viabilizados pelo esforço da OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico, antiga Organização para a Cooperação Econômica Europeia) para introduzir o planejamento educacional nos países europeus, nos anos 1960. Além do fomento de estudos e pesquisas, a OCDE promoveu o chamado “Projeto Regional Mediterrâneo”, que visava “[...] traduzir as previsões de crescimento econômico em previsões de demanda de mão-de-obra e, a seguir, traduzir estas em previsões da demanda de várias qualificações e níveis de aproveitamento educacionais”, envolvendo países de renda per capita consideradas muito baixas para o continente (Grécia, Itália, Portugal, Espanha, Turquia e Iugoslávia). No âmbito desse projeto e sob o incentivo dado por ele, vários estudos3 e tentativas de avaliação de realidades nacionais se desenvolveram contribuindo para o robustecimento de um corpo teórico e de um conjunto de técnicas analíticas que deram importante impulso ao que viria a ser a Economia da Educação. Os teóricos da Economia da Educação entendem que 2 As determinações da Teoria do Capital Humano não são só encontradas na educação, aparece na economia, na administração, na sociologia, etc. Estamos frisando esta influência na educação por tratar-se de estudo especificamente direcionado à este campo. 3Para aprofundar o estudo, é fundamental consultar as obras de Theodore Schultz, O valor econômico da educação (1963) e O capital humano – investimentos em educação e pesquisa (1971); Frederick H. Harbison e Charles A. Myers, Educação, mão-de-obra e crescimento econômico (1965); Cláudio de Moura Castro, Investimento em educação no Brasil: comparação de três estudos (1971) e Educação, educabilidade e desenvolvimento econômico (1976); Mário Henrique Simonsen, Brasil 2001 (1969). Sobre as influências dessa disciplina no pensamento educacional brasileiro, é fundamental consultar as obras de: José Oliveira Arapiraca, A USAID e a educação brasileira (1982); Gaudêncio Frigotto, Educação e crise do capitalismo real (1995); José Willington Germano, Estado militar e educação no Brasil (2000); Wagner Rossi, Capitalismo e educação: contribuição ao estudo crítico da economia da educação capitalista (1978); 829 O sistema educacional, tal como qualquer outra atividade econômica, usa uma certa proporção dos recursos escassos da sociedade. Esses recursos poderiam ser usados em outras coisas: a despesa em edifícios escolares significa renunciar a edifícios residenciais e comerciais; a despesa em salários de professores representa oportunidades de emprego perdidas em outro ramo da economia. (SHEEHAN, 1973, p. 10). Como as raízes da concepção de economia da educação estão na teoria do capital humana, faremos a seguir uma abordagem de sua principal tese e sua estrutura, como fonte seminal da economia da educação. Desenvolvimento A Teoria do Capital humano4 de Theodore Schultz5 (1973) e seus seguidores defende que o sucesso das organizações modernas em um ambiente instável, dinâmico e competitivo de negócios é decorrência de uma administração realmente eficaz de recursos humanos. Afinal, estrutura organizacional, tecnologia, recursos financeiros e materiais ajudam muito na lucratividade e sustentabilidade das organizações, porém constituem apenas aspectos físicos e inertes que precisam ser administrados inteligentemente através de pessoas que constituem a inteligência que vivifica e norteia qualquer organização. A área empresarial brasileira vem entendendo, nas afirmações de Chiavenato (2009), que o fator que realmente constitui o elemento dinâmico e empreendedor das organizações - sejam elas privadas ou públicas, industriais ou prestadoras de serviços, lucrativas ou não lucrativas, grandes ou pequenas - são as pessoas. A qualidade dos funcionários de uma organização, seus conhecimentos, habilidades e competências, seu entusiasmo e satisfação com suas atividades, seu senso de iniciativa para gerar valor e riqueza, tudo isso tem forte impacto na produtividade e lucratividade da organização, no nível de serviços oferecidos ao cliente, na reputação, imagem e na competitividade. É que as pessoas fazem a diferença em um ambiente competitivo de negócios, defende aquele autor. 4 A essência desta teoria consiste na ideia de que o indivíduo gastaem si mesmo de formas diversas, não apenas buscando desfrutar o presente, mas procurando rendimentos futuros, pecuniários ou não. A teoria foi anunciada por Theodore Schultz, em 1960, e seu “nascimento efetivo” teria ocorrido em 1962 em suplemento da revista científica americana Journal of Political Economy, dedicado ao tema do investimento em seres humanos. 5 Theodore William Schultz (1902-1988), economista norte-americano, obteve o Prêmio Nobel de Economia em 1979, compartilhado com Arthur Lewis, por sua pesquisa pioneira no desenvolvimento econômico com atenção particular aos problemas dos países em desenvolvimento. Nascido em Arlington, estudou na Universidade de Wisconsin. Foi professor de economia agrária nas Universidades de Lowa e Chicago. Além de sua especialização em economia agrária, trabalhou em economia do trabalho, campo no qual realizou contribuições importantes relativas à análise do capital humano. 830 No centro da teoria de Theodore Schultz está a importância da educação como investimento. Ele reflete sobre a centralidade do processo educacional na preparação do ser humano para enfrentar os constantes ajustamentos a que é submetido na sociedade moderna. Baseando-se em grande medida na ideia proposta por Irving Fisher (2007) em uma obra que trata dos princípios elementares de economia de 1918, que defendia que se o capital é uma fonte de rendimento, ao produzir fluxos de rendimentos e serviços, o homem também poderia ser um capital, ainda que de natureza diferente, Schultz elabora, em 1961, um artigo de grande repercussão acadêmica, intitulado “Investment in Human Capital”, onde construiu o conceito de capital humano, procurando estabelecendo sua essência e as condições da sua formação. A partir disto Schultz passa a entender o trabalho como uma forma de capital, contrariando a ideia tradicional que tomava o trabalho e os trabalhadores como uma entidade homogênea, com capacidades apenas para realizar trabalho manual que exigia pouco conhecimento e especialização. Em Schultz (1973) a ideia de homem é tomada como um bem similar a outras formas de “capital”. O ideário do capital humano defende ser ele, algo produzido enquanto fruto de decisões deliberadas de investimento em educação ou em formação. Para completar esta premissa, Schultz abarca a ideia de que os indivíduos são detentores de certas características pessoais (umas parcialmente inatas, como as aptidões intelectuais, e outras que vão sendo adquiridas ao longo da vida, tais como a educação formal e informal, a formação profissional e a experiência), que contribuem para o aumento da sua produtividade e, consequentemente, dos salários auferidos ao longo do ciclo de vida. Visto desta forma, há uma nítida analogia entre a produtividade física do capital e a educação, justificando-se o tratamento dado à educação como capital, isto é, como capital humano, posto que se torna parte da pessoa que a recebe. A principal hipótese que está subjacente a este tratamento da educação é a de que alguns aumentos importantes no rendimento nacional são uma consequência de investimento nesta forma de capital. Além disso, a educação, enquanto investimento, obedece a uma opção racional entre custos atuais e rendimentos futuros, no contexto mais amplo da maximização dos retornos individuais ou sociais. Logo, a distribuição da educação corresponde à distribuição das preferências, que é considerada uma variável determinada a partir de fora, por vezes influenciada pelo progressivo melhoramento do padrão de vida. 831 O raciocínio não para aí, a Teoria do Capital Humano se encaixa perfeitamente na inventiva da priorização do ensino voltado e organizado para o trabalho, ou seja, para a produção e formação de trabalhadores e/ou de novas medidas transplantadas no trabalho produtivo da sociedade capitalista. A meta é o desenvolvimento da capacidade profissional na busca do desenvolvimento da economia globalizada e da integração da sociedade mediante as atribuições que seriam de responsabilidade do Estado. Respondendo às reorganizações e reformas econômicas, tem-se a educação propalada pela égide da Teoria do Capital humano sendo vista como alavanca para o desenvolvimento (sustentável ?) da economia. Nessa consonância, a Teoria do Capital Humano vai permear as diretrizes educacionais do país, negando os paradigmas do conhecimento e impondo as políticas educacionais de modo tecnocrático, visualizando somente o desenvolvimento econômico. Ao se referir a Teoria do Capital Humano, Cattani (2002, p. 51) destaca que: A Teoria do Capital Humano apresenta-se sob duas perspectivas articuladas. Na primeira, a melhor capacitação do trabalhador aparece como fator de aumento de produtividade. (...) Na segunda perspectiva, a Teoria do Capital Humano destaca as estratégias individuais com relação aos meios e fins. Cada trabalhador aplicaria um cálculo custo benefício no que diz respeito à constituição do seu “capital pessoal”, avaliando se o investimento e o esforço empregado na formação seriam compensados em termos de melhor remuneração pelo mercado. [...] é uma derivação da teoria econômica neoclássica e, ao mesmo tempo, uma atualização do axioma liberal do indivíduo livre, soberano e racional. Observe-se que a educação é vista como formadora de força de trabalho, de uma maneira que o investimento educacional possa trazer retorno financeiro para o país, colaborando com seu desenvolvimento. Schultz (1973, p. 58) entende que a educação é uma das fontes principais do crescimento econômico depois de ajustar-se as diferenças nas capacidades inatas e características associadas que afetam os rendimentos, independentemente da educação. Ainda sobre a educação, este autor defende que educar é um processo de revelar ou extrair de uma pessoa algo potencial e latente; significa aperfeiçoar uma pessoa, moral e mentalmente, de maneira a torná-la suscetível de escolhas individuais e sociais, e capaz de agir em consonância; significa prepará-la para uma profissão, por meio de instrução sistemática. Expõe que são diversos os fatores que contribuem para a criação do capital humano, especialmente os seguintes: 832 a) A educação formal, a diferentes níveis (educação pré-primária, escolaridade obrigatória, educação secundária ou profissional, educação superior, educação de adultos, etc.) constitui sem dúvida a principal fonte de capital humano; b) A formação informal no contexto da empresa e a formação no mercado de trabalho; c) A experiência adquirida ao longo da vida profissional, em diferentes tipos de organizações e contextos laborais, entendendo que o nível de qualificação usada no trabalho pode ser uma das mais fortes influências na criação de capital humano; Além destas três, também as aprendizagens que ocorrem em ambientes mais formais como, por exemplo, em redes de amigos, no ambiente familiar e no contato com as comunidades. Outro aspecto importante é que sua construção é individual e, além dos fatores fundamentais anteriormente expostos, há também espaços característicos de cada país (sua estrutura econômica, política, cultural e educacional) para a construção de seu arcabouço. Schultz (1973) propõe alguns critérios para medir o capital humano na população em idade ativa: o primeiro mede o nível mais elevado de escolaridade completo, por adulto que agrega o capital humano (o indicador é, por exemplo, a porcentagem da população que terminou determinado nível de educação). O segundo mede diretamente nos adultos, se eles têm certos atributos relevantes para a atividade econômica (flexibilidade, capacidade de aprendizagem, conhecimentos gerais, competências). O terceiro centra-se em olhar para as diferenças de vencimentos entre os adultos, com o objetivo de estimar o valor de mercado desses atributos e por sua vez o valor agregado do acúmulo de capital humano. Quanto aos principaisretornos que o investimento em capital humano pode propiciar, considerados a partir do equilíbrio entre os custos do investimento e o valor dos benefícios consequentes, destaca-se: a) Custos privados aceitáveis para os indivíduos (incluindo ganhos não mesuráveis como melhor saúde ou maior satisfação pessoal) e ganhos econômicos calculados após o pagamento de todos os impostos. Ou seja, os retornos privados influenciam a decisão dos indivíduos em investir ou não na educação/formação; b) Os ganhos “sociais” da educação incluem tanto os custos privados como públicos: ao olharmos para os rendimentos individuais, vemos que o cálculo inclui um 833 elemento de benéfico público que é o ganho vindo dos elevados impostos pagos pelas pessoas com elevados rendimentos em resultado da sua escolaridade. c) Benefícios sociais do investimento em educação (ex. pagamento taxa mais elevada de impostos, menor criminalidade ou maior coesão social) também influenciam a tomada de decisão acerca do maior ou menor investimento financeiro na educação, por parte das instituições públicas, na medida em que esses retornos indicarão se a despesa pública dedicada à educação será recuperada, a longo prazo, em benefícios públicos. d) Os efeitos internos restringem-se normalmente ao indivíduo que detém o capital humano, refletindo-se, por exemplo, no impacto do nível de escolaridade, da formação ou da experiência profissional, na saúde das pessoas, nos rendimentos salariais do indivíduo (no caso dos trabalhadores por conta de outrem) ou nos rendimentos decorrentes da atividade empresarial (no caso de emprego por conta própria); por outro lado, os efeitos externos envolvem grupos de indivíduos, a sociedade e mesmo conjunto de países, podendo ser empiricamente observáveis através, por exemplo, da relação entre o nível de escolaridade médio da população de um determinado país ou região e a performance de crescimento da mesma, na redução das taxas de crime ou nos níveis de coesão social. Portanto, a Educação pode gerar efeitos de três formas: mudando as preferências individuais; mudando os obstáculos e constrangimentos que os indivíduos enfrentam; ou aumentando o conhecimento e informação em que os indivíduos baseiam o seu comportamento e as suas atividades. Do ponto de vista econômico, tradicionalmente, três razões básicas justificavam a utilização da teoria do capital humano: o custo de educar um ser humano é um custo real, o produto do trabalho de um ser humano faz parte da renda nacional, dessa forma, dispêndios em seres humanos poderiam contribuir para o incremento de sua renda individual e, assim, da renda nacional, já que se defende que as habilidades incorporadas aos seres humanos presumivelmente incrementam sua qualidade enquanto unidade de produção. A posição de Schultz (1973, p.15) é de que “o pensamento econômico tem negligenciado examinar duas classes de investimento que são de capital importância nas modernas circunstâncias. São elas o investimento no homem e na pesquisa, tanto no plano privado quanto no plano público”. O investimento no homem, segundo o autor, é responsável 834 pela maior parte do crescimento dos rendimentos reais por trabalhador. Por isso então a necessidade de que este investimento se estruture sobre uma possibilidade de ampliação, na medida em que as demandas do mercado exigirem. O autor afirma que “Ao investirem em si mesmas, as pessoas podem ampliar o raio de escolha posto a sua disposição. Esta é uma das maneiras por que os homens livres podem aumentar seu bem-estar” (SCHULTZ, 1973, p. 15). O autor apresenta três métodos alternativos de medição do estoque de educação. O primeiro método é o dos anos de escolaridade completados. Pode-se agregar à educação de uma população simplesmente contando o número total de anos de escola completados, ao qual corresponde um número médio por pessoa. O segundo método é o dos anos equivalentes de escolaridade completados. O terceiro método é o do custo como medida da escolaridade. Schultz (1973), por fim, arremata as ideias do capital humano construído pela educação, dizendo que como as instituições de ensino podem ter múltiplas finalidades, devem ser excluídos os gastos com pesquisas, competições esportivas, cuidados médicos, etc, no cálculo deste capital. Por outro lado, enquanto um estudante geralmente tem interesse apenas nos efeitos da educação sobre seus rendimentos, a sociedade precisa conhecer os efeitos da educação sobre a renda nacional. Há uma preocupação central em Schultz (1973): a de determinar a contribuição da educação no desenvolvimento econômico. Para tanto, parte da definição do conceito de educação, que apresenta significados: a) revelar ou extrair de uma pessoa algo potencial e latente; b) aperfeiçoar uma pessoas, moral e mentalmente de maneira a torná-la suscetível de escolhas individuais e sociais, e capaz de agir em consonância; c) prepará-la para uma profissão, por meio de instrução sistemática; e d) exercitar, disciplinar e formar habilidades, como, por exemplo, aperfeiçoar o gosto de uma pessoa (p. 18). Numa visão marcada pelo raciocínio econômico, Schultz (1973, p. 19) afirma que "[...] as escolas podem ser consideradas empresas especializadas em 'produzir" instrução. A instituição educação, que congrega todas as escolas, pode ser encarada como uma indústria". Portanto, a hipótese central da formulação de Schultz (1973) é a atribuição de um valor econômico à educação. É desta forma que a educação pode influenciar concretamente a produção nacional e o desenvolvimento econômico. Por conseguinte, na definição de educação, o único significado utilizado pelo autor é o que forma uma profissão via instrução. 835 É desta forma que poder considerar a educação como investimento. As outras definições da educação são, do ponto de vista econômico, consideradas como um bem de consumo durável pela pessoa que faz este gasto, não detendo relevância analítica no modelo desenvolvido por ele. Dirige-se Schultz (1973, p 25) a educação afirmando: "[...] sempre que a instrução elevar as futuras rendas dos estudantes, teremos um investimento. É um investimento no Capital Humano, sob forma de habilidades adquiridas nas escolas"6. A inovação da formalização feita Schultz (1973) está no fato de considerar um determinado tipo de gasto em mão-de-obra como um investimento. É uma posição conceitual impar na Ciência Econômica, visto que a variável investimento sempre esteve associada ao capital fixo, ou seja, maquinarias, equipamento e edificações. Na sua essência a Teoria do Capital Humano entende à educação como um instrumento de mobilidade ocupacional e social. Esta conclusão assenta-se em três hipóteses: a) existência de uma relação direta entre habilidade cognitiva e produtividade; b) o mercado de trabalho é contínuo, não havendo barreiras à mobilidade; c) qualquer acréscimo no nível educacional irá resultar em aumentos salariais (TEDESCO, 1984). A Teoria do Capital Humano segue, neste sentido, postura de não considerar a existência de conflitos entre o capital e trabalho, estabelecida pela Escola Neoclássica. Nesta direção, corrobora este princípio fazendo com que na sua formulação conceitual a educação tenha uma função de ascensão social. As causas dos baixos salários são atribuídos ao próprio trabalhador na medida em que ele não "investiu" na sua qualificação. Considerações Finais Para finalizar, cabe um olhar crítico sobre estas questões, que também serve de perspectiva para discussões futuras, como por exemplo: a) Adotar o conceito de capital humano e ver a educação como investimento, coloca- a na posição de ter que defender seu valor em forma de identidade pecuniária; b) Se o trabalho não é uma mercadoria, porque não pode ser separado da pessoa, ou mais precisamente, se não é apenas uma mercadoria, tampouco é um bem de capital, pela mesma razão;6 - Em outra parte do livro de Schultz, encontramos uma aplicação da Teoria da Utilidade: "[...] caso a educação fosse gratuita, as pessoas, provavelmente a "consumiriam" até sentirem-se saciadas, e nela "investiriam" até que seu rendimento fosse nulo" (p. 36). 836 c) Encarando os trabalhadores não apenas como fornecedores de serviços, mas também como uma forma de capital, os investimentos nesse tipo de capital poderiam ser comparados diretamente com outros investimentos; d) Gastos em educação poderiam ser comparados com gastos em irrigação, habitação, estradas, etc. Nesse caso, a escolha social seria governada pelo princípio da maximização, em sua forma mais simples. e) A educação passa a ser um princípio de busca individual, como forma de agregar, em torno de si mesmo, recursos capazes de responder às necessidades de mercado e de consolidar o crescimento econômico, pessoal e social; f) A pesquisa passa a ser vista como uma forma direta de atendimento às demandas de mercado, ou como recurso de qualificação profissional; g) As formas cotidianas de vida (cultura, costumes, o conhecimento popular, etc) perdem espaço e importância à existência de cada pessoa; h) O ensino tecnicista, formalista e mercadológico encontra guarida nos espaços da teoria do capital humano, assim como a ênfase utilitarista da pesquisa. A Teoria do Capital Humano não está isenta de críticas, embora pareça que estas não ameaçam a viabilidade nem atingem o cerne do modelo, ele não pode se furtar daquelas que afirmam que a implementação do capital humano danifica a dignidade humana, comparando as pessoas a contentores de conhecimentos e competências, muito similares aos componentes mecânicos, mesmo quando se afirma a pertinência do conceito de capital humano, entendendo-o como sujeito que realça a crescente importância das pessoas no contexto das atuais economias e sociedades baseadas no conhecimento e nas competências individuais. REFERÊNCIAS CATTANI, A. (org.). Dicionário crítico sobre trabalho e tecnologia. 4ª. Ed. Petrópolis: Editora Vozes, 2002. CHIAVENATTO, Idalberto. Recursos Humanos: o capital humano das organizações. 9 ed. Editora Elsevier, Campus, 2009. FISHER, Irvin. Elementary principles of economics. Nova York, bookstores, 2007. SHEEHAN, John. A economia da educação. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1975. SCHULTZ, T. W. O valor econômico da educação. Rio de Janeiro. Editora: Zahar, 1973. 837 _________. Investiment in human capital. The American Economic Review, v. 51, n. 1, mar.1961, p. 1-17. TEDESCO, Juan Carlos. Os paradigmas da Pesquisa Educacional na América Latina. Em Aberto. Brasília, 3(20), abr. 1984,
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