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1 2 3 Juliana Magalhães Linhares Rafael Ricarte da Silva Luciane Azevedo Chaves METODOLOGIA DA PESQUISA EM HISTÓRIA 1ª Edição Sobral/2017 4 5 Sumário Palavra dos Professores autores Sobre os autores Ambientação à disciplina Trocando ideias com os autores Problematizando UNIDADE I: PESQUISA HISTÓRICA: PROBLEMAS E ABORDAGENS TEÓRICO-METODOLÓGICAS. A pesquisa no campo da história Abordagens UNIDADE II: FONTES DOCUMENTAIS, ACERVOS E METODOLOGIAS DE TRABALHO. O documento e a escrita da História Fontes históricas e suas tipologias UNIDADE III: PROJETO DE PESQUISA EM HISTÓRIA. Como elaborar um projeto de pesquisa Explicando melhor com a pesquisa Leitura obrigatória Pesquisando com a Internet Saiba mais Vendo com os olhos de ver Bibliografia Bibliografia Web Vídeos 6 7 Palavra dos professores autores Olá estudantes, Sejam bem-vindos a disciplina de Metodologia da Pesquisa em História. Nesta disciplina vamos estudar sobre a pesquisa no campo da História, buscando esmiuçar metodologias, abordagens, tipologias de fontes, concepções teóricas e o processo de elaboração de seu projeto de pesquisa. Destacamos neste módulo algumas possibilidades no campo da investigação histórica, não tendo assim, a pretensão de esgotar as diversas compreensões e abordagens da escrita da História. Desejamos uma excelente leitura do material. Participe e interaja no Ambiente Virtual de Aprendizagem. Os Autores. 8 Sobre os autores Juliana Magalhães Linhares, mestre em História Social pela Universidade Federal do Ceará (2011), Licenciada em História pela UFC (2007). Atualmente, professora do curso de Pedagogia e História das Faculdades INTA e coordenadora de área do PIBID - História. Atuou no Departamento de História da Universidade Estadual Vale do Acaraú - UVA, atuando também na rede privada de ensino superior na Graduação e Pós-Graduação na área de Ciências Humanas e Educação, com experiência em Educação a Distância - EAD. Doutor em História Social pela Universidade Federal do Ceará, com Estágio de Doutorado Sanduiche no Instituto Universitário de Lisboa - ISCTE, Mestre em História Social (2010) e Licenciado em História pela UFC (2007). Especialista em Planejamento, Implementação e Gestão da Educação a Distância pela Universidade Federal Fluminense (2012). Participa do Grupo de Estudo e Pesquisa - História do Ceará Colonial: economia, memória e sociedade. Tem experiência na área de História, com ênfase em História Moderna e História do Brasil Colonial, atuando nos seguintes temas: História Agrária, História das Elites, História e Direito e História do Ceará Colonial. Atualmente é professor do Curso de Graduação a distância em História das Faculdades INTA, setor de História do Brasil. 9 Luciane Azevedo Chaves, mestre em História Social pela Universidade Federal de Uberlândia – UFU, Especialista em História do Brasil pelo Instituto Superior de Teologia Aplicada (2011). Possui graduação em História Licenciatura Plena pela Universidade Estadual Vale do Acaraú – UVA (2007). Tem experiência na área de História, com ênfase em História Social, atuando principalmente nos seguintes temas: educação; memória e história oral; cultura; trabalho e ensino de história. Atualmente é Professora do Instituto Superior de Teologia Aplicada - INTA: no Curso de Graduação em História na modalidade a distância. 10 11 Ambientação à disciplina Caros Estudantes, Esta disciplina tem como objetivo o desenvolvimento de seu Projeto de Pesquisa, buscando evidenciar o debate acerca da escolha da temática de investigação, dos problemas, das abordagens metodológicas e teóricas, da seleção e análise de fontes e da escrita histórica. Para tanto, dividimos este livro em três unidades: a primeira unidade foi destinada a discussão sobre a pesquisa no campo da História e as diversas abordagens teórico- metodológicas; a segunda unidade foi destinada a apresentação de fontes e suas tipologias, ressaltando algumas possibilidades de investigação; na terceira e última unidade, abordamos o processo de escrita do Projeto de Pesquisa e suas partes constitutivas. 12 Trocando ideias com os autores Sugerimos que você leia a obra: A pesquisa em história. O tema é apresentado como "experiência humana", entendida como experiência de classe, o que permite reconhecer a identidade global das pessoas e das classes. O pesquisador, ao recuperar essa experiência vivida, realiza também a construção da memória. A questão dos documentos, atos e testemunhos da história é tratada de acordo com a objetividade necessária à pesquisa, passando pelo desafio que as linguagens, com sua dimensão própria, apresentam para o historiador. VIEIRA, Maria do Pilar; PEIXOTO, Maria do Rosário; KHOURY, Yara. A pesquisa em história. São Paulo: Ática, 2000. Sugerimos também a obra: O projeto de Pesquisa em História: da escolha do tema ao quadro teórico. O lema principal deste livro é a construção do Projeto de Pesquisa em História, abordando a escolha da temática, os problemas de investigação, a construção de hipóteses de trabalho, as discussões teóricas, etc. Portanto, a leitura deste livro é essencial para a fundamentação dos estudantes no campo da pesquisa histórica. BARROS, José D‟ assunção. O projeto de Pesquisa em História: da escolha do tema ao quadro teórico. Petrópolis: Vozes, 2013. Guia de estudo: Após a leitura dessas obras, escreva uma resenha crítica acerca de um dos livros recomendados. Aproveite para compartilhar sua resenha e análise no Ambiente Virtual de Aprendizagem com os demais colegas e tutor. 13 Problematizando Caro estudante, A pesquisa em História requer, por parte do investigador, atenção quanto aos procedimentos teóricos e metodológicos. No transcorrer desta disciplina veremos diversas abordagens teóricas, tipologias de fontes e metodologias de trabalho na pesquisa histórica. Guia de estudo: E você estudante, saberia nos dizer quais elementos são essenciais em uma investigação historiográfica? Convidamos você a debater tais questões no Ambiente Virtual de Aprendizagem com os demais alunos e tutor. 14 15 PESQUISA HISTÓRICA: PROBLEMAS E ABORDAGENS TEÓRICO-METODOLÓGICAS 1 Conhecimentos Compreender sobre a construção da pesquisa histórica, a partir do conhecimento dos referenciais teórico-metodológicos e acervos documentais existentes. Habilidades Facilitar a aplicação das teorias da História no trabalho com as fontes documentais. Atitudes Estabelecer relações, comparações e contrastes em diferentes realidades de pesquisa e seus contextos históricos. 16 17 A pesquisa no campo da história Ao debruçarmos na pesquisa devemos estar atentos às perguntas que fazemos aos documentos e é o que as historiadoras Maria Vieira do Pilar, Maria do Rosário e Yara Khoury chamam de “agentes da pesquisa”. Essas perguntas são importantes para quepossamos enquanto pesquisadores encontrar os vestígios investigados. Tais perguntas fundamentam-se nas evidências e geralmente apresentam-se incompletas. Essas perguntas deverão estar em conformidade com o objeto analisado. As evidências estão relacionadas com a Lógica Histórica, pensada a partir das reflexões do historiador neomarxista Eduard Palmer Thompson. Sendo assim, para compreender sua definição seria necessária uma leitura apurada do (capítulo 7) a Lógica Histórica do livro: A Miséria da Teoria: um planetário de erros, porém tentaremos simplificar essa definição. Thompson define Lógica Histórica como um método lógico de investigação formado pelo conhecimento histórico, onde compreende os fatos ou as evidências que são constituídas pela existência do “real”. Na evidência histórica nem todas as perguntas elaboradas serão adequadas ao processo investigativo. Mas com relação aos documentos, porque é necessário interrogá-los? Tomando como reflexão os pensamentos de Jacques Le Goff sobre documento monumento, o autor reflete a respeito de sua legitimidade e afirma que todo “documento é uma mentira” (LE GOFF, 1996, p.547-548), desse modo, enquanto pesquisadores precisaram interrogá-los, pois eles foram construídos a partir do interesse de uma época, de uma determinada sociedade. É preciso duvidar, isso não significa dizer que os documentos analisados numa pesquisa serão sempre construções forjadas de uma sociedade ou de um determinado episódio e por isso devem ser considerados ilegítimos. 18 A partir das perguntas podemos encontrar as respostas para nossas inquietações diante dos problemas levantados na pesquisa. Como diz Marc Bloch, é preciso interrogá-lo mesmo a contragosto. Isso serve para os testemunhos do passado os quais também não falam sozinhos a não ser que os interroguem. (BLOCH, 2001, p.78). No espaço acadêmico é possível fazer pesquisa sem ensino? Refletindo os pensamentos de Paulo Freire que diz: “Não há ensino sem pesquisa, e pesquisa sem ensino [...]”. (FREIRE, 2002). Desse modo, para Freire o processo da pesquisa é algo que faz parte “da natureza da prática docente” e; durante o processo de sua formação, na qual é permanente, é necessário que o professor se reconheça como um pesquisador. Então, por que pesquisar? A pesquisa nos dá uma constatação, e assim poderemos intervir e com essa intervenção nos educamos e realizamos a educação. A pesquisa nos leva a que? Ao conhecimento, e nos revela o não dito. Quando nos propomos a pesquisar uma referida temática, temos que pensar qual a relevância dessa temática para a sociedade, que contribuições ela trará. No caso da História, qual a relevância de uma pesquisa para a historiografia. Refletindo mais uma vez as palavras de Pilar, Rosário e Khoury, quando falam sobre a pesquisa em História apontam que “a pesquisa está ao alcance de qualquer pessoa [...]” (VIEIRA; PEIXOTO; KHOURY, 1991, p.68). Desde que você se coloque disposto a recuperar o passado para entender os campos de tensões e conflitos daquela época e como são constituídos no tempo presente. Sendo assim, o pesquisador (historiador) se coloca como ser político, onde procura soluções para o futuro, sendo também um sujeito do conhecimento. Essa descoberta com certeza trará benefícios para a sociedade. Isso nos leva a refletir sobre o quanto é longo e árduo o caminho da pesquisa. O pesquisador vai além do estudo, da análise dos documentos. Ele precisa ter paciência e persistência, pois o fato de o documento estar arquivado numa instituição pública não significa que não haverá empecilhos. O historiador precisa estar preparado para imprevistos e, diante deles, buscar soluções para 19 que sua pesquisa não seja prejudicada pelos percalços encontrados no caminho. Desse modo, é importante pensarmos o quanto essa dificuldade de acesso aos documentos prejudica a construção de uma memória social, na perspectiva da História Social. É importante refletirmos sobre esses espaços enquanto lugares de memória e enquanto espaços propícios a inves- tigação social, como lembram Heloísa de Faria Cruz e Maria do Rosário Cunha Peixoto, levando em conta que tais documentos, como exemplo podemos citar a imprensa, devem ser problematizados e que nenhum documento deve ser percebido como um monumento. Durante a análise dos documentos, o pesquisador desenvolve também a função de perito. Tomemos como exemplo a análise de um jornal impresso em mau estado de conservação. O pesquisador ao analisá-lo deverá muitas vezes deduzir quais números correspondem àquelas páginas localizadas nas emendas do jornal ou aqueles trechos de reportagens e títulos corroídos que dificultam a compreensão do texto. Em alguns momentos, é preciso procurar entender nos fragmentos da notícia aquela palavra ilegível ou corroída pelo tempo. Desse modo, não basta apenas ter o documento em mãos. Embora o modo como se chega a ele seja fundamental para o bom desenvolvimento da pesquisa, por outro lado também é precisamos analisá-lo com precisão, e isso significa ir além de uma simples leitura. Quando aquela página está praticamente danificada pelo tempo, então é importante identificarmos o eixo central da notícia de maneira mais criteriosa e contextualizada. Sobre a escolha do tema a ser desenvolvido numa pesquisa, é fundamental deixar claro que não se trata apenas de escolhermos um assunto, é preciso pensarmos num objeto para ser problematizado e assim ser construída uma discussão que será a problemática desenvolvida na trajetória da pesquisa. 20 Com relação à escolha das fontes, deverá acontecer antes da problematização do objeto. Vejamos o que Pilar Rosário e Khoury nos dizem a respeito dessa questão. Neste sentido não dá para fazer a seleção de fontes depois da problematização, como geralmente recomendam os manuais. O pesquisador, no encaminhamento da pesquisa, se depara com registros que funcionam como elemento perturbador, ou porque não consegue explicá-los, ou porque questionam linhas importantes de sua reflexão. (VIEIRA; PEIXOTO; KHOURY, 1991, p.46). As fontes nos norteiam para o desenvolvimento da pesquisa, mas é a partir do diálogo com as evidências que conseguimos pensar e discutir nosso objeto de estudo, onde poderá ser repensado, dependendo do que as fontes revelarão ao serem analisadas. Com a finalização de um trabalho de pesquisa, não significa dizer que foram esgotadas às discussões a respeito do trabalho produzido. Enquanto pesquisadores, apresentamos um conhecimento sobre o objeto, mas isso não significa dizer que finalizamos toda uma discussão sobre a temática proposta. A pesquisa é sempre um produto inacabado e sujeito a novas reflexões. Contudo, sua problematização constitui-se em se pensar a história enquanto experiência humana, onde envolve a classe, a luta, em refletir o conhecimento histórico “[...] como aquele que é capaz de apreender essa experiência vivida por sujeitos ativos que problematizam sua própria experiência [...]”. (VIEIRA; PEIXOTO; KHOURY, 1991, p.37-38). Abordagens Nessa discussão conheceremos as abordagens historiográficas, são elas: História Oral, História do Discurso, História Imediata, História Serial e Quantitativa, História Regional e Micro-História. Mas antes de iniciarmos a discussão sobre tais abordagens, será importante conhecermos os campos da História na qual estão inseridas. 21 O Campo da História contempla História Cultural, História do Imaginário, História Política e História Social e História Econômica. A História Cultural ganha força no campo historiográfico do finaldo século XX. Seus estudos contemplam a cultura popular, a cultura letrada, as representações dentre outras práticas sociais vivenciadas e ocorridas na sociedade. Eduard Palmer Thompson foi pioneiro nos estudos culturais relacionados ao social. Esse historiador distancia-se do pensamento marxista ortodoxo quando, por exemplo, entende que a classe social não é abstrata, portanto como “relação e processo em meio ao devir histórico” (BARROS, 2010, p.63). Outros pensadores, entre eles filósofos e sociólogos, fizeram parte da construção deste campo historiográfico, porém não entraremos numa discussão apurada de seus pensamentos, pois neste momento o importante é que compreendamos que a cultura se entende para além de um pensamento intelectual, sendo assim, é refletida sobre uma cultura dita popular. Lynn Hunt chama essa história cultural de Nova História Cultural que “[...] pensa a cultura como um conjunto de significados partilhados e construídos pelos homens para explicar o mundo [...]”. (PESAVENTO, 2005, p. 15). Cultura popular para Thompson é entendida como um conceito abstrato, pois acredita que não devemos separar a cultura erudita de uma cultura popular, ambas estão interligadas, pois sofreram influências uma da outra. Com isso, quando a cultura é percebida como hegemônica, ela estará se tornando superior, uma cultura pertencente a uma elite dominante. Essas reflexões poderão ser aprofundadas a partir da leitura de seu livro: Costumes em Comum: estudos sobre a cultura popular tradicional. Hegemonia: remete a algo que é dominante, superior ao outro. Exemplo: um país ou povo que se coloca como dominante a outro. Com relação à História do Imaginário, é um campo da história que está relacionado também com a História Cultural. Este campo histórico está vinculado ao estudo das imagens visuais, verbais e mentais. A construção deste conceito associado à área de Humanas foi pensada no início da década de 1970 por Cornelius Castoriadis, também teve a influência dos historiadores 22 Jacques Le Goff e Georges Duby. Com isso, temos o imaginário interligado ao estudo das representações e símbolos. Por exemplo, uma cadeira, enquanto objeto, pode ser refletida de maneira simbólica para se pensar sobre uma época. Ao pensarmos em História Política e Social é importante enfatizarmos que no século XIX a História Política refletia as grandes personalidades, os feitos heroicos, estando voltada para uma história do Estado a partir de um olhar positivista. Essa história, denominada hoje como Velha História Política, foi repensada a partir do século XX, quando surgiu a chamada Nova História Política, a “História Vista de Baixo” com ênfase no social, que passou a observar o cotidiano, os grupos de sujeitos sociais e o próprio indivíduo, antes invisíveis pela história positivista. José D‟ Assunção Barros coloca que a História Social é percebida no contexto atual como um campo historiográfico voltado para o estudo da sociedade, embora seja “[...] direcionada para as dimensões política, econômica ou cultural [...]” (BARROS, 2010, p. 116). Ao pensarmos a História Social relacionada às abordagens, pode ser pensada tanto como uma Macro- História (aquela que faz uma análise mais ampla de um determinado lugar) e como uma micro-História (aquela que se analisa o cotidiano de maneira mais minuciosa). Quanto a História Econômica, está interligada com a História Política e a História Social e visa um estudo sobre, por exemplo, os ciclos econômicos, o sistema financeiro. Desse modo, uma história que tem como interesse estudar com a História Política, por exemplo: os meios de produção, as técnicas de produção, enquanto relacionada com a História da Cultura Material, irá abranger o Consumo: os hábitos de consumo, os salários, as moedas. Quando falamos em relações sociais associando-as as relações de consumo, então, é quando se estabelece um diálogo da economia com a História Social. A História Econômica também percorre de modo geral a História da Economia Antiga, da Economia Medieval e também a da Economia Capitalista. Todas essas discussões dependerão do interesse de pesquisa do historiador. O fato é que elas estarão sendo relacionadas com a sociedade. Isso implica 23 em dizer que não se trata de uma discussão de uma História puramente econômica, mas de uma história econômica que dialoga com os demais campos da história. Diante disso, percebemos que cada campo historiográfico se interliga, dependendo do objeto de pesquisa do historiador. Dentro desses campos ou dimensões historiográficas encontramos as abordagens que tratam em discutir as metodologias que cada um trabalha dentro do campo da história. Cabe ressaltarmos que são estabelecidas divisões, por exemplo, na abordagem da História Oral o historiador poderá enfocar ou uma História Política ou uma História Cultural. Desse modo, temos uma abordagem historiográfica, no caso a História Oral, que é um dos caminhos metodológicos da História, que se subdivide entre uma História Política e Cultural. Mas afinal, do que trata a História Oral? Como abordagem metodológica, diz respeito a documentos produzidos através de depoimentos, relatos de vida realizados por meio de gravações das falas ou imagens das/os entrevistadas/os. Mas como diria Portelli “ [...] uma entrevista é uma troca entre dois sujeitos[...]”(PORTELLI, 1997, p.9). Diante disso, temos uma troca “mútua” de experiência entre pesquisador e entrevistado. E isso nos coloca, enquanto pesquisadores, em pé de igualdade com os nossos entrevistados. A História Oral possibilita ao pesquisador estar diante de acontecimentos peculiares contados por pessoas capazes de transmitirem em sua fala emoções e danos psicológicos jamais revelados. Na história Oral podemos nos deparar com a subjetividade do narrador e isso, em nenhum outro trabalho com outras fontes será possível de ser vivenciado. (PORTELLI, 1997, p.31). Para compreendermos melhor a próxima abordagem, História do Discurso, é importante fazermos uma rápida reflexão sobre fonte Histórica, onde qualquer texto, dependendo de sua relevância para a pesquisa, poderá ser considerado como fonte. Não necessariamente um documento precisa ser 24 oficial para ser uma fonte. Uma receita de bolo, uma música, um poema, todos podem ser percebidos como documentos. José D‟ assunção Barros enfatiza que “A fonte histórica é aquilo que coloca o historiador diretamente em contato com o seu problema [...]” (BARROS, 2010, p.134). Com isso, é através dela que o historiador poderá realizar uma reflexão mais profunda da sociedade. Diante disso, a fonte se transforma num discurso de um determinado período histórico, por sua vez, esse discurso se converte num texto de uma determinada época. Como prática historiográfica, tais discursos históricos obviamente não se tratam aqui de discursos positivitas, eles se constituíram na História do Discurso ou História Textual que é analisada tanto como uma abordagem qualitativa como quantitativa. É importante salientarmos que a História do Discurso é utilizada pelos historiadores de diferentes abordagens e isso deixa a sensação de que ela poderia não ser entendida como um campo de abordagem. Para analisarmos esse discurso ou texto são realizados estudos mais profundos denominados de Apostes Teóricos Metodológicos. Estes estudos constituem em uma análise interna e externa dos documentos levantados para a pesquisa. A análise externa percebe as intenções ou motivações de quem as produziu. É preciso atentar para qual o significado daquele documento enquanto objeto de estudo, levando em consideração a dualidade em ser percebido como um objeto de „significação e de comunicação‟. Para Barros, a análise do discurso de um texto (documento) ocorre em três dimensões simultâneas denominadas de: intratexto, intertexto e contexto.O intratexto diz respeito ao que o autor chama de “aspectos internos”. Ao avaliarmos tais aspectos, estamos dando significado ao objeto avaliado. Já o intertexto implica em relacionáramos um texto a outros textos e por fim, o contexto é a relação do texto com a realidade na qual foi construído. Sendo assim, é a partir do intertexto e do contexto que o objeto de significação se torna um objeto de comunicação. Essa tríplice é fundamental para quem trabalha com o discurso textual como fonte. 25 Quanto a História Imediata, esta se aproxima da área do jornalismo. Como o próprio nome enfatiza, trata-se de algo que acontece no mesmo espaço de tempo em que o pesquisador está inserido. O historiador analisa tanto os sujeitos sociais do passado como a si próprio enquanto sujeito atuante dessa história. Vejamos o exemplo de Barros com relação a esse campo de abordagem historiográfica. Quando Leon Trotski escreveu uma História da Revolução Russa, estava naturalmente escrevendo uma história imediata, que em alguns pontos iria encontrar a ele mesmo como ator social envolvido nos acontecimentos que estava estudando. Neste sentido, também Júlio Cesár, ao escrever uma história das Guerras das Gálias, ou Tucídides, ao começar a escrever a História da Guerra do Peloponeso após ter sido destituído do cargo de estratego ateniense, estavam cada qual à sua maneira produzindo uma modalidade de História Imediata. [...]. (BARROS, 2010, p.146). É importante não confundirmos esse tipo de abordagem com uma história do tempo presente, aquele em que os acontecimentos ocorrem num período contemporâneo, porém, não envolvem o historiador como sujeito atuante daquele momento. Contudo, ao enveredarmos numa pesquisa de uma História Imediata, estaremos compartilhando dos acontecimentos de uma sociedade na qual estamos inseridos. Na História serial, a quarta abordagem a ser discutida nesse capítulo, surgiu na historiografia em meados do século XX. Sua perspectiva de abordagem consistia na análise de umas séries de fontes a partir de técnicas que eram diferenciadas da história tradicional. As fontes são analisadas de forma homogênea, onde irão quantificar as informações levantadas. A História serial trabalha não apenas com fontes, mas com eventos ou dados, sendo assim, o historiador analisa diversas séries de eventos históricos em certos períodos de tempo. Como exemplo desse tipo de estudo, podemos mencionar os eventos econômicos, as análises das curvas de preços e de curvas demográficas. A História serial surgiu a partir da História Econômica, tendo esses dois campos se estendido para a História Demográfica e História Social. 26 E quais tipos de fontes podem ser analisados na História Serial? Alguns procedimentos metodológicos da Historia Serial se relacionam com os campos da História Econômica e História Demográfica e da História das Mentalidades. Ela também está relacionada com a História Quantitativa que discutiremos adiante. Conforme Barros variadas fontes podem ser percebidas nesse tipo de abordagem histórica, são elas: fontes cartoriais, administrativas, comerciais, paroquiais, testamentais, dentre outras, onde também estão trabalhadas pela História Quantitativa. Mas, qual a diferença entre História Serial e História Quantitativa? Na História Serial, as fontes são homogêneas e são relacionadas a um período que corresponde ao problema a ser analisado, onde posso trabalhar com séries de fontes, mas isso não significa que serão analisados os números. Com relação à História Quantitativa, é definida a partir do campo de observação, onde a realidade é observada através dos números, da quantidade, corresponde a tudo aquilo que envolve medidas de valores numéricos, onde sua abordagem está associada às estatísticas e aos gráficos. “[...] A “série” é o que canaliza a atenção do historiador na modalidade da História Serial; o “número ou a medida é o que canaliza a atenção do historiador no caso da História Quantitativa.” (BARROS, 2010, p.150)”. Ao se dedicarmos a abordagem da História Quantitativa, deveremos tomar cautela para não produzir uma história restrita à descrição de dados numéricos. É importante que a história produzida seja problematizada para que não se torne mera descrição, uma História Factual, também conhecida como História positivista que predominou no século XIX e na qual foi bastante criticada pela Escola dos Annales. Ao falarmos de História Regional, é importante enfatizarmos que a História Regional é um campo diferente da Micro-História. Na primeira, o 27 historiador realiza um recorte num espaço geográfico, desse modo irá escolher uma região específica para problematizar um determinado assunto que poderá estar relacionado à cultura ou a qualquer outro recorte, percebendo o espaço a partir das relações sociais. Na segunda, há uma preocupação em estudar e observar o espaço a partir de um olhar microscópico da realidade de um pequeno vilarejo, por exemplo, observando esse lugar enquanto um pequeno espaço físico, mas como pequenos detalhes que constituem naquele lugar sejam de nível estadual ou nacional. O historiador que trabalha coma micro-História procura observar as relações sociais, algum problema relacionado ao social ou cultural possível de ser evidenciado pelo pesquisador. Um exemplo de estudo micro-histórico é evidenciado pelo historiador italiano Carlo Ginzburg, um dos pioneiros do micro-história, na obra: O Queijo e os Vermes, onde analisa o caso do moleiro Menócchio, condenado pela Inquisição duas vezes por suas ideias hereges, contrariando assim, o pensamento da Igreja Católica que era a instituição religiosa e oficial da época. Desse modo, Menócchio é o “fragmento” de estudo. Um só caso, estudado por Ginzburg abrangia um pensamento que não fazia parte de uma história oficial, era o reflexo do pensamento e da cultura de sociedade do período medieval que provavelmente não teria sido conhecido. Moleiro: Operário responsável pela moagem da farinha. Operador de moinhos de vento. O que trabalha, ou o que é proprietário de moinhos. Nos anos de 1980, no Brasil, alguns historiadores passaram a estudar a partir do olhar micro-histórico somado com o campo de observação sociocultural proposto pelo historiador inglês Eduard Palmer Thompson, onde se debruçou em analisar uma sociedade a partir do olhar de baixo para cima, a chamada “História Vista de baixo”. Este historiador propõe um olhar do cotidiano a partir dos problemas de uma sociedade e a formação da consciência de classe. 28 A abordagem micro-histórica propõe uma leitura minuciosa dos indícios das fontes, esse modo de tratar as fontes é o que Ginzburg denomina de “paradigma indiciário”, isso implica em dizer que o historiador deve perceber os minuciosos detalhes do cotidiano contraditório de uma sociedade não revelado nos documentos oficiais. Desse modo, para Ginzburg o importante não é desvendar a realidade absoluta dos acontecimentos, mas entender como eles acontecem, como podem ser explicados de diferentes formas que são colocados pelos sujeitos sociais. 29 FONTES DOCUMENTAIS, ACERVOS E METODOLOGIAS DE TRABALHO. 2 Conhecimentos Compreender e permitir a reflexão sobre a construção do conhecimento de história, a partir de fontes documentais diversas. Habilidades Identificar os acervos existentes para a pesquisa histórica. Atitudes Desenvolver as habilidades de escrita da História, como a narrativa e a interpretação das fontes. 30 31 O documento e aescrita da História O trabalho do historiador é realizado com fontes e documentos históricos. Estas são produzidas nas diversas instâncias das experiências vivenciadas pelos homens socialmente e constituem variadas formas: objetos, imagens, músicas, escritos, pinturas, arquitetura, etc. Para analisar as fontes e construir sua escrita os profissionais da história se utilizam de diversas técnicas, abordagens e metodologias. Ou seja, a análise dos documentos históricos é realizada a partir de procedimentos metodológicos e técnicos, subsidiados por variadas leituras e embasamento teórico. O aperfeiçoamento das técnicas de pesquisa e as formas de utilização dos vestígios humanos estão em constante transformação, conforme nos aponta Vavy Pacheco Borges (1992). Entretanto, esta visão alargada sobre as fontes históricas e os procedimentos de análise estava restrita aos documentos escritos e oficiais. No século XIX a História, como área de conhecimento, a partir dos pressupostos da Escola Positivista conferiu ao documento escrito, sobretudo os oficiais, o status de prova e garantidor da objetividade nos estudos históricos. Assim, o historiador deveria ser fiel ao contido nos documentos, descartando qualquer intervenção do pesquisador em estudá-lo ou mesmo o processo de sua criação (VIEIRA; PEIXOTO & KHOURY, 2000). Destaca-se que esta preponderância do documento escrito no trabalho historiográfico perdurou até meados do século XX. Na visão positivista da história, o documento é uma imagem real do acontecimento histórico. Neste sentido, não cabe ao historiador à interpretação, mas a maior proximidade possível do descrito na documentação oficial selecionada para exposição do tema ou fato. Dada a importância do documento histórico como prova, fazia-se necessário a comprovação da autenticidade ou não do registro utilizado. No documento oficial estava contida a verdade sobre o determinado tema e/ou fato em investigação. Desta forma, estava garantida a narrativa sobre os fatos políticos, militares e seus ilustres personagens históricos. 32 A cientificidade da ciência histórica seria construída por meio de pressupostos metodológicos específicos do campo de conhecimento que levassem a análise documental, podendo utilizar-se da comparação entre fontes para se chegar a uma reconstrução dos acontecimentos do passado, garantida pela comparação e pela autenticidade documental. Outros vestígios, para os positivistas, só poderiam ser considerados em estudos temáticos, ou seja, setoriais. Esses estudos seriam feitos mediante a interligação com as ciências auxiliares da história, exemplo da arqueologia e da paleografia (VIEIRA; PEIXOTO & KHOURY, 2000). A ampliação da noção de documento histórico foi efetivada a partir de uma nova compreensão acerca da história e do ofício historiador, alargamento efetuado por meio das problemáticas pensadas pelos integrantes da Escola dos Annales no século XX. Esta nova visão incorpora novas tipologias de fontes, metodologias e técnicas de investigação e escrita. Assim, o processo de pesquisa deixa de ser condicionado ao documento, passando as problemáticas feitas pelo pesquisador. O documento não fala mais por si e cabe ao historiador observar, também, as intencionalidades presentes na sua confecção e seleção. A Revista de História Econômica e Social, fundada pela Escola dos Annales, surgiu a partir de 1929 e teve como principais expoentes Marc Bloch e Lucien Febvre. Esses autores contrapunham-se a perspectiva positivista que privilegiava a história política e as fontes oficiais: Por não aceitarem os pressupostos da historiografia política tradicional, que apenas passava pela superficialidade dos acontecimentos, contrapunham-lhe à História-problema, isto é, as fontes deveriam ser buscadas e interpretadas segundo as hipóteses que partiam do historiador. Todas as atividades humanas deveriam ser consideradas com a mesma importância (JANOTTI, 2008, p. 12- 13). Essa renovação também teve como característica uma maior proximidade com outras áreas do conhecimento, principalmente no campo das ciências humanas. Assim, muitos historiadores passaram a buscar o diálogo com os estudos sociológicos, geográficos, econômicos e linguísticos. 33 Os estudos de Ernest Labrousse são exemplares quanto ao alargamento das temáticas, metodologias e fontes de estudos no campo da história. O autor, ao desenvolver uma história quantitativa, “expandiu ainda mais as fontes históricas ao fazer uso de métodos da economia, construindo gráficos, tabelas e estatísticas para explicar ciclos econômicos de curta e longa duração” (JANOTTI, 2008, p. 14). Na década de 1970 o processo de renovação da pesquisa historiográfica ganhou mais um grande impulso com a publicação do livro organizado por Jacques Le Goff e Pierre Nora, Faire l‟histoire. Publicado em três volumes no Brasil, reuniu estudos sobre os novos problemas, objetos e abordagens no campo da história. Dentre estes novos objetos e documentos encontram-se pesquisas sobre a História das Mentalidades, História da Saúde e da Doença, História e Cotidiano, História da Alimentação, etc. que buscaram utilizar desde documentos escritos, imagens a depoimentos orais. Para Peter Burke, em A Escola dos Annales, a maior contribuição dos historiadores ligados ao movimento dos annales correspondeu ao alargamento dos estudos históricos para diversas áreas do conhecimento. O grupo ampliou o território da história, abrangendo áreas inesperadas do comportamento humano e a grupos sociais negligenciados pelos historiadores tradicionais. Essas extensões do território histórico estão vinculados a descobertas de novas fontes e ao desenvolvimento de novos métodos para explorá-las. Estão também associadas à colaboração com outras ciências, ligadas ao estudo da humanidade, da geografia, à lingüística, da economia, à psicologia. Essa colaboração interdisciplinar manteve-se por mais de sessenta anos, um fenômeno sem precedentes na história das ciências sociais. (BURKE, 1997, p. 126-127). A ampliação do campo de estudos e das fontes foi acompanhada pelas problematizações que o historiador levanta, pela crítica documental, a compreensão da importância de analisar as intencionalidades da construção do vestígio e o contexto em que foi produzido. Neste sentido, o documento não será mais o ponto de partida da investigação. Assim, cabe ao historiador lançar mão de suas problemáticas. 34 Fontes históricas e suas tipologias A compreensão hoje sobre o que são fontes históricas é ampla e engloba uma diversidade de tipologias, fundos arquivísticos e espaços de produção e guarda. Neste material, buscaremos apresentar três tipologias de fontes: escritas e impressas, audiovisuais e orais. Destacamos estas por representarem o maior número de documentos utilizados contemporaneamente nos trabalhos acadêmicos. Fontes escritas e impressas As fontes escritas e impressas representam uma gama de documentos produzidos pelos homens ao longo do tempo. Você, caro estudante, saberia responder que exemplos de documentos poderíamos citar neste caso? Certamente, você deve ter respondido com facilidade esta questão. Nosso cotidiano é repleto de documentos escritos, tais como: jornais, fichas cadastrais, legislação, agendas, diários, etc. Pensando nesta diversidade de fontes escritas (manuscritas) e impressas, vamos apresentar algumas considerações do trabalho investigativo com as mesmas. Devemos ressaltar que a prática de pesquisa, certamente, é o momento mais rico para o desenvolvimento das habilidades do ofício do historiador. Nossa tarefa aqui será a de apresentarmos os tipos de arquivos e documentos, buscando esmiuçar possibilidades de investigação por acadêmicos e/ou profissionais, sem, contudo, termos a pretensão de esgotarmos os cenários possíveisda análise historiográfica. Caro estudante, Cite aqui exemplos de fontes escritas e impressas que você conhece. 1. __________________ 3. __________________ 2. __________________ 4. __________________ 35 Instituições arquivísticas e acervo de documentos Partindo do cenário evidenciado acima, apresentamos abaixo o quadro elaborado por Carlos Bacellar sobre os tipos de arquivos e documentos nestes reunidos. Logicamente, trata-se de um quadro geral e que não contempla os diversos acervos que os compõem. ARQUIVOS DOCUMENTOS Arquivos do Poder Executivo Correspondência: ofícios e requerimentos; Listas nominativas; Matrículas de classificação de escravos; Listas de qualificação de votantes; Documentos sobre imigração e núcleos coloniais; Matrículas e frequências de alunos; Documentos de polícia; Documentos sobre obras públicas; Documentos sobre terras. Arquivos do Poder Legislativo Atas; Registros. Arquivos do Poder Judiciário Inventários e testamentos; Processos cíveis; Processos crimes. Arquivos Cartoriais Notas; Registro civil. Arquivos Eclesiásticos Registros paroquiais; Processos; Correspondências. Arquivos Privados Documentos particulares de indivíduos, famílias, grupos de interesse ou empresas.. Fonte: BACELLAR, Carlos. Fontes documentais: uso e mau uso dos arquivos. In: PINSKY, Carla Bassanezi (Org.). Fontes Históricas. 2ª edição. São Paulo: Editora Contexto, 2008, p. 26. O quadro elenca importantes espaços de pesquisa para os trabalhos de investigação de estudantes e profissionais. Ressaltamos que o acesso, organização e conservação desses acervos são variados, indo da permissão a consulta a total indisponibilidade, especialmente quando falamos do acesso aos arquivos cartoriais, eclesiásticos e privados. Infelizmente, ainda temos 36 muitos acervos em péssimos estados de conservação e sem a mínima organização arquivística com a divisão por fundos, séries e subséries. Um conjunto documental extremamente acessado por historiadores e outros sujeitos é o que se refere à questão da propriedade territorial no Brasil. Neste conjunto temos registros de datas de terra, cartas de sesmarias, recenseamentos de propriedades territoriais e registros de terra, especialmente após a extinção da concessão de sesmarias e a implementação da Lei de Terras em 1850. Ainda com relação à posse/propriedade territorial temos uma vasta legislação que se iniciou com a transplantação das Ordenações do Reino para a América portuguesa, passou pela criação de uma copiosa legislação complementar com decretos, alvarás, éditos régios e prosseguiu no império com a Lei de Terras. Segundo Ruy Cirne Lima: (...) a legislação e o processo das sesmarias se complicam, emaranham e confundem, sob a trama invencível da incongruência dos textos, da contradição dos dispositivos, do defeituoso mecanismo das repartições e ofícios de governo, tudo reunido num amontoado constrangedor de dúvidas e tropeços (LIMA, 2002, p. 47). O historiador que irá trabalhar com este corpo legislativo deve estar atento para esta situação, observando a própria contradição da legislação e sua inserção nos registros e datas de terras. A carta de sesmaria, por exemplo, dependendo da época de sua concessão, variou em seu trâmite administrativo, composição e legislação regulatória. Nas Capitanias do Norte do Estado do Brasil, nos séculos XVII e XVIII, o padrão estabelecido para as concessões de sesmarias foi o seguinte: o primeiro passo consistia na apresentação do requerimento pelo solicitante com sua identificação, localização da terra pretendida e a(s) justificativa(s) de argumentação para obtenção da sesmaria. Em seguida, o documento traz a recomendação do Capitão-Mor ao escrivão das datas para investigar se as terras estavam livres para doação. A terceira etapa consistia na verificação e despacho do escrivão sobre a possibilidade da doação. Ao ter ciência da situação, o Capitão-Mor emitia seu parecer, concedendo a terra. Por fim, o registro informava do deferimento e recapitulava os dados já descritos, com o 37 acréscimo das obrigações que o sesmeiro deveria cumprir para garantir a posse da doação. Abaixo, caro estudante, você poderá visualizar esta estruturação descrita. Note que se trata de uma documentação com enorme possibilidade de temáticas a serem analisadas e que apresenta uma escrita da época, o que para muitos estudantes e profissionais é um desafio no início de seu contato com a documentação. Você, ao ler o documento, saberia apontar que informações e possibilidades de análise a fonte permite? FONTE - CARTA DE DOAÇÃO DE SESMARIA Data de sesmaria nº 03. Vol. 01. In: Datas de sesmarias do Ceará e índices das datas de sesmarias: digitalização dos volumes editados nos anos de 1920 a 1928 (Org.). Arquivo Público do Estado do Ceará. Fortaleza: Expressão Gráfica/Wave Media, 2006. CD-ROM. Certamente, caro estudante, você deve ter pensando em várias possibilidades de pesquisa que podem ser realizadas a partir da análise desta série documental. A partir dos dados nela contidos, podemos, por exemplo, 38 investigar os espaços requeridos, as formas de pedido (individual ou coletivo), o gênero dos requerentes, os tamanhos da área solicitada, as justificativas e deveres contidos e as autoridades envolvidas no processo. Outro corpus documental extremamente relevante é formado pelas fontes de processos cíveis e criminais, em poder de arquivos do executivo e do judiciário. Para Carlos Bacellar: Os processos crime e cíveis são fontes igualmente [aos testamentos e inventários] abundantes e dão voz a todos os seguimentos sociais, do escravo ao senhor. São fontes preciosas para o entendimento das atividades mercantis, já que são recorrentes os autos de cobrança de dívidas e os papéis de contabilidade de negócios de grande e pequeno porte. A convocação de testemunhas, sobretudo nos casos dos crimes de morte, de agressões físicas e de devassas, permite recuperar as relações de vizinhança, as redes de sociabilidade e de solidariedade, as rixas, enfim, os pequenos atos cotidianos das populações do passado (BACELLAR, 2008, p. 37). A utilização dos processos crimes e cíveis permite aos historiadores explorarem as diversas dimensões das relações sociais estabelecidas entre os sujeitos, conforme nos expõe Carlos Bacellar. Questões de ordem econômica, cultural, administrativa, familiar e social podem ser investigadas a partir dos casos arrolados. Os arquivos de ordem eclesiástica (registros de batismo, casamento e óbito) são importantes fontes na constituição de trabalhos sobre família, composição social e demografia. Essas fontes, geralmente, estão sob a guarda da Igreja Católica em paróquias e dioceses. O acesso a tais arquivos está sujeito à autorização do religioso responsável pela guarda da documentação e, muitas vezes, o estudante/pesquisador encontrará dificuldades para consultar os registros. Um bom exemplo de trabalho historiográfico que fez uso da análise dos registros paroquiais foi o estudo de Sheila de Castro Faria, A Colônia em Movimento, que buscou reconstituir o universo social e familiar do Brasil setecentista. Devemos ressaltar, também, que os registros paroquiais são fontes essenciais em estudos genealógicos e prosopográficos (estudo da carreira de um sujeito ou grupo de pessoas – biografias coletivas). 39 Por fim, no quadro geral das fontes escritas e impressas temos os periódicos (jornais e revistas). Segundo Tania Regina de Luca (2008), nos anos 1970 ainda eram poucos os estudos que utilizavam os periódicos como fontes para trabalhos historiográficos acerca do Brasil. Escrevia-se uma História da Imprensa, mas não a História por meio da imprensa. Para Tania Regina de Luca (2008), a enorme quantidade de fontes periódicaspossibilitam uma gama de investigações de diversas naturezas, com variados procedimentos metodológicos e técnicas de pesquisa. Entretanto, a autora identifica algumas observações e cuidados que o pesquisador deve ter ao trabalhar com esse tipo de documentação. Encontrar as fontes e constituir uma longa e representativa série. Localizar a(s) publicação (ções) na história da imprensa. Atentar para as características de ordem material (periodicidade, impressão; papel, uso/ausência de iconografia e de publicidade). Assenhorar-se da forma de organização interna do conteúdo. Caracterizar o material iconográfico presente, atentando para as opções estéticas e funções cumpridas por ele na publicação. Caracterizar o grupo responsável pela publicação. Identificar os principais colaboradores. Identificar o público a que se destinava. Identificar as fontes de receita. Analisar todo o material de acordo com a problemática escolhida. (LUCA, 2008, p. 142). Esses procedimentos não devem ser vistos como um modelo único a ser seguido. Como a própria autora ressalta, servem apenas como inspiração para que o profissional encaminhe os primeiros passos na investigação. Ademais, os procedimentos técnicos e metodológicos são variáveis e irão depender da análise e do embasamento teórico-conceitual do historiador. Dentre os pontos passíveis de análise podem ser investigados os meios de circulação dos periódicos, o grupo editorial, o formato físico, os temas trabalhados, as abordagens, o grupo de escritores/jornalista, seus editoriais, o público ao qual se destinava, as campanhas publicitárias contidas, a periodicidade, etc. 40 Fontes audiovisuais Nosso cotidiano está marcado pela enorme quantidade de informações que recebemos de diversos meios. Na sociedade da informação, imagens e sons estão sendo difundidos pelas novas tecnologias em constante produção e renovação. Neste cenário, embasados pela renovação dos estudos históricos, historiadores estão cada vez mais se apropriando de fontes audiovisuais para realizarem investigações e debates no campo da pesquisa e do ensino de história. Para Marcos Napolitano as fontes audiovisuais estão ganhando, cada vez mais, espaço nas pesquisas historiográficas, principalmente, quando relacionadas ao contexto do século XX. Entretanto, este alargamento da utilização destes documentos, considerados fontes primárias, se faz em duas perspectivas: Por um lado, as fontes audiovisuais (cinema, televisão e registros sonoros em geral) são consideradas por alguns, tradicional e erroneamente, testemunhos quase diretos e objetivos da história, de alto poder ilustrativo, sobretudo quando possuem um caráter estritamente documental, qual seja, o registro direto de eventos e personagens históricos. Por outro lado, as fontes audiovisuais de natureza assumidamente artística (filmes de ficção, teledramaturgia, canções e peças musicais) são percebidas muitas vezes sob o estigma da subjetividade absoluta, impressões estéticas de fatos sociais objetivos que lhes são exteriores (NAPOLITANO, 2008, p. 235-236). As duas perspectivas, segundo o referido autor, erraram em não observar que a grande questão estava na compreensão das fontes audiovisuais a partir de suas “estruturas internas de linguagem e seus mecanismos de representação da realidade” (NAPOLITANO, 2008, p. 236) e não como fonte histórica objetiva ou subjetiva. Dentre as fontes audiovisuais, podemos citar filmes, documentários, fotografias, quadros, desenhos, gravuras, músicas, programas de rádio e produções televisivas (novelas, séries, jornais, etc.). A seguir, a partir das sugestões de Marcos Napolitano (2008), elencamos algumas questões que 41 devem ser observadas pelos historiadores na utilização e análise de fontes audiovisuais no trabalho historiográfico. Ressaltamos que, se trata de um recorte das sugestões e que estas não esgotam as perspectivas analíticas e metodológicas. Recomendações/Orientações Teoria * Considerar as fontes audiovisuais e musicais um outro tipo qualquer de documento histórico, portadoras de uma tensão entre evidência e representação. * Perceber as fontes audiovisuais e musicais em suas estruturas internas de linguagem e seus mecanismos de representação da realidade, analisando, a partir daí, sua condição de "testemunho" de uma dada experiência histórica e social. * Empreender dois tipos de decodificação: a de natureza técnico-estética e a de natureza representacional. Prática * Delimitar o corpus documental. * Localizar os documentos. * Organizar a ficha técnica das fontes, identificando: gênero, suporte, origem, data, autoria, conteúdo referente, acervo. Música * Escolher o suporte material (fonograma ou partitura). * Coletar a documentação para a análise tendo em vista o período, o objeto e a problemática da pesquisa. * Delimitar historicamente o fonograma ou a partitura analisado. * Empreender uma audição sistemática e repetida diversas vezes. * Analisar letra, estrutura musical, sonoridades vocais e instrumentais, performances visuais e outros efeitos extramusicais (que são indissociáveis, mas devem ser decupados no momento inicial da pesquisa). * Mapear as "escutas" (crítica, público e os próprios artistas) que dão sentido histórico às obras musicais, apoiando-se nos materiais e na linguagem que estruturam cada peça musical. Cinema * Definir a abordagem: o cinema na História, a história no cinema ou História do cinema. * Assistir sistemática e repetidamente aos filmes que constituem o corpo documental da pesquisa, buscando articular análise fragmentada (decupagem dos elementos de linguagem) e síntese (cotejo crítico de todos os parâmetros, canais e códigos que formam a obra). * Buscar os elementos narrativos: "o que um filme diz e como o diz". * Produzir um "fichamento" que tente dar conta da riqueza da imagem em movimento e suas conexões ao longo do filme analisado, procurando informar sobre a natureza da linguagem e as estratégias de abordagem do tema do filme operadas pelos realizadores. * Levar em conta que todo filme, ficcional ou documental, é manipulação do "real". Televisão * Entender a natureza específica dos gêneros televisuais e como eles operacionalizam as regras gerais do audiovisual. * Fazer fichamento do material televisual construindo campos de registro, informação e comentário, de acordo com o gênero, a linguagem e a função do referido programa. * Observar a televisão como uma nova experiência social do tempo histórico que faz confluir o "real" e o "imaginário" no fluxo do presente. Fonte: NAPOLITANO, Marcos. Fontes audiovisuais: a história depois do papel. In: PINSKY, Carla Bassanezi (Org.). Fontes Históricas. 2ª edição. São Paulo: Editora Contexto, 2008, p. 281-283. 42 Fontes orais Os depoimentos orais ou entrevistas formam nosso último conjunto de fontes históricas. Estes depoimentos são colhidos a partir da metodologia da História Oral, conforme nos esclarece Verena Alberti: A História oral é uma metodologia de pesquisa e de constituição de fontes para o estudo da história contemporânea surgida em meados do século XX, após a invenção do gravador a fita. Ela consiste na realização de entrevistas gravadas com indivíduos que participaram de, ou testemunharam, acontecimentos e conjunturas do passado e do presente. Tais entrevistas são produzidas no contexto de projetos de pesquisa, que determinam quantas e quais pessoas entrevistar, o que e como perguntar, bem como que destino será dado ao material produzido (ALBERTI, 2008, p. 155). Devemos destacar que a História Oral compartilha de procedimentos metodológicos e teóricos de outras áreas do conhecimento das humanidades, exemplo da antropologia e da sociologia. No Brasil, a metodologia começou a ser utilizada a partir dos anos 1970 e teve como fomentador o Programa de História Oral do Centro de Pesquisae Documentação de História Contemporânea do Brasil – CPDOC da Fundação Getúlio Vargas. O desenvolvimento da metodologia da História Oral fora do país é mais antigo, estabelecendo-se o ano de 1948 com a invenção do gravador a fita como sendo o início do chamado período da fase “moderna” da História Oral (ALBERTI, 2008). Uma das experiências possibilitadas com a História Oral foi a coleta de depoimentos/entrevistas com sujeitos históricos das camadas sociais mais baixas, muitas vezes esquecidos nos documentos escritos e oficiais. Para Marieta de Moraes Ferreira e Janaina Amado, organizadoras do livro Usos e Abusos da História oral, o objeto de estudo do historiador com a História oral “é recuperado e recriado por intermédio da memória dos informantes; a instância da memória passa, necessariamente, a nortear as reflexões históricas, acarretando desdobramentos teóricos e metodológicos importantes” (1998, p. 15). Ressaltamos que no passado essas entrevistas/depoimentos não eram bem vistos, pois eram considerados subjetivos e poderiam trazer distorções dos fatos/acontecimentos. Trabalhar 43 com memórias, segundo Verena Alberti (2008), é compreender que estas são formadas a partir de uma contínua negociação, com a criação e recriação de memórias individuais e coletivas. Caro estudante, Você saberia explicar como preparar e usar entrevistas em um trabalho historiográfico? Segundo Verena Alberti (2008), a utilização da metodologia da História oral pressupõe sua divisão em três momentos: preparação das entrevistas, realização e tratamento. Na fase da preparação estão inclusos o projeto e a elaboração dos roteiros (geral e específico) das entrevistas. Neste momento, devem ser levantados os objetivos, o público selecionado e a quantidade. Em seguida, o momento da entrevista. Recomenda-se a reserva de um tempo longo devido as nuances envolvidas no ambiente da gravação e a posse de material para realizar anotações que julgue serem importantes. Por fim, a fase do tratamento consiste, grosso modo, na transcrição das entrevistas e a sua adequação para leitura com maior fluidez. Convém observarmos que as entrevistas, dependendo do objetivo traçado para a investigação, poderão ser temáticas ou histórias de vida. Segundo Verena Alberti, “as entrevistas temáticas são as que versam prioritariamente sobre a participação do entrevistado no tema escolhido, enquanto as de história de vida têm como centro de interesse o próprio indivíduo na história, incluindo sua trajetória” (2008, p. 175). 44 45 PROJETO DE PESQUISA EM HISTÓRIA 3 Conhecimentos Conhecer as etapas de elaboração de um projeto de pesquisa em História. Habilidades Reconhecer a importância das etapas de elaboração do projeto de pesquisa seguindo-as de forma adequada. Atitudes Elaborar um projeto de pesquisa em História considerando todas as etapas de sua construção como parte do processo da elaboração de um projeto acadêmico científico. 46 47 Como elaborar um projeto de pesquisa Ao decidir elaborar uma pesquisa em História devemos partir inicialmente da construção de um projeto de pesquisa. Decidido isso o projeto facilitaria ao pesquisador da área de Ciências Humanas as problemáticas inerentes ao processo de elaboração da proposta. Você pode estar se perguntando por que um projeto é tão importante antes da realização de uma pesquisa cientifica? É o projeto quem vai orientar, através de um planejamento elaborado pelo pesquisador, o passo a passo da pesquisa. Ele irá organizar seu tempo, suas ideias, seu material, ou seja, vai lhe ajudar no desenvolvimento da sua pesquisa. Facilitando assim o processo de escrita e produção, sem deixar o pesquisador metodologicamente “desnorteado”. Sobre a organização de um projeto Barros afirma que: Teoria e Metodologia, quando habilmente conectadas por algumas hipóteses de trabalho pertinentes e bem elaboradas, constituem o grande segredo dos sucessos de empreendimentos relacionados à produção do conhecimento humano de tipo científico. Não importa o campo de estudos ou a disciplina a que se dedique o pesquisador, é, sobretudo neste núcleo mais elementar que começam a aparecer as grandes soluções, a originalidade científica, os avanços possíveis no conhecimento a ser produzido (BARROS, 2005, p. 190). Por isso, tornou-se primordial a projeção do que seria desenvolvido antes da execução, para isso lembre-se de escrever no tempo verbal do futuro, do que ainda será realizado. Diferente da escrita de uma monografia, dissertação ou tese que mostra os resultados da pesquisa já realizada. Existem algumas perguntas que são primordiais na hora de começar uma pesquisa, são elas: 48 Perguntas importantes Respostas esperadas O que pesquisar? Temática escolhida para ser estudada Por que pesquisar? Justificativa para a pesquisa Para que pesquisar? Objetivo geral e objetivos específicos Como pesquisar? Metodologia utilizada Quando pesquisar? Cronograma Como é possível observar a construção do projeto só acontece depois da escolha do tema de pesquisa, esse é o “ponta pé” inicial. O processo começa com o interesse por um tema geral, algum assunto que mais lhe chama a atenção, logo em seguida o pesquisador começa a ler mais sobre o assunto fazendo uma Revisão Bibliográfica, pesquisando tudo que já foi escrito sobre o assunto em questão. A pesquisa precisa ser inserida num diálogo com a bibliografia existente, mesmo que de forma implícita, proporcionando um debate sobre a temática. Ao fazer isso o pesquisador poderá identificar as lacunas deixadas por estes estudos e começar a construir o seu objeto de pesquisa. Podemos citar como exemplos de temas gerais: Escravidão no Brasil, Ditadura Militar, História Colonial, dentre outros. Para Barros: O Projeto de Pesquisa deve ser, naturalmente, um instrumento flexível, pronto a ser ele mesmo reconstruído ao longo do próprio percurso empreendido pelo pesquisador. Se o conhecimento é produto da permanente interação entre o pesquisador e o seu objeto de estudo, como tende a ser considerado nos dias de hoje, as mudanças de direção podem ocorrer com alguma freqüência, à medida que esta interação se processa e modifica não apenas o objeto de estudo, mas o próprio estudioso. (BARROS, 2008, p. 68) Portanto, o projeto precisa possuir esse caráter mutável e flexível, pois ao longo do caminho pode se deparar com novas fontes, hipóteses, conceitos que podem alterar o rumo da pesquisa. Definido o tema e feito uma leitura aprofundada da bibliografia já produzida o pesquisador deverá encontrar a problemática na sua temática, que se trata de um problema identificado nas 49 pesquisas. Diante disso a Problemática ou problema de pesquisa é feita em forma de pergunta, exemplos: “Que fatores contribuíram para a manutenção das relações escravistas na cidade do Rio de Janeiro após a abolição em 1888 - 1938?”. Observe que a pergunta/problema contém o tema mais definido seguido do lugar onde será desenvolvida (Recorte espacial) e o período estudado (Recorte temporal). O Recorte espacial trata-se do lugar ou espaço a ser pesquisado, precisa ser definido para que os leitores saibam qual local o pesquisador está pesquisando, pode ser um país, uma região, um estado, um oceano, dentre outras possibilidades. Já o recorte temporal refere-se ao tempo que será estudado, por exemplo: século XIX, período colonial, durante a ditadura e etc... A Problemática é o ponto de partida do projeto, sempre feita em forma de pergunta, deve ser um problema o qual o pesquisador está se propondo a resolver. Trata-se na maioriadas vezes de uma lacuna historiográfica a ser preenchida, conflitos ou busca pela compreensão de um processo que gere um questionamento. Este deve ser respondido ao longo do desenvolvimento da pesquisa. A investigação precisa possuir uma justificativa pessoal e social, não se pesquisa por pesquisar. Geralmente, um assunto chama sua atenção por uma questão de interesse pessoal, algo que você tem bastante curiosidade ou que faz parte da sua realidade. A justificativa social trata-se de mostrar ao publico leitor que relevância seu estudo trará para compreender algo na nossa sociedade. Podemos citar como exemplo: “O trabalho sobre a escravidão no período imperial nos ajudará a compreender o racismo no Brasil hoje”. A Fundamentação Teórica mostrará o quadro teórico escolhido pelo pesquisador para fundamentar seu projeto. São os conceitos e seus respectivos autores que fundamentaram sua proposta de pesquisa, ligando-a ao tema. O pesquisador deve tomar cuidado para não repetir o que está na revisão de bibliografia, esta etapa trata-se mais de mostrar os instrumentais teóricos utilizados, as categorias de análise e abordagens de pesquisa. 50 Precisamos falar dos objetivos de uma pesquisa, pergunte-se “Pra que pesquisar este assunto?”, a partir deste questionamento é necessário construir seus objetivos. Estes se dividem em Geral, onde como o próprio nome já diz deve ser mostrado de forma geral o que será pesquisado e os Específicos que devem explicar em três objetivos de forma especifica o que você pretende estudar. Estes podem ser: Exploratório: descobrir, identificar, levantar; Descritivo: descrever, apontar as características de, indicar; Explicativo: analisar, explicar. Os objetivos devem ser expostos de forma breve e clara, para que todos consigam compreender a proposta do autor. O próximo passo a ser pensado é a Metodologia, que caracteriza a abordagem que o pesquisador utilizará. Quais são suas ferramentas de pesquisa, suas fontes, como: documentos, entrevistas, imagens, músicas, filmes dentre outros. Seu referencial teórico, os autores que estão dando base a sua pesquisa, seus conceitos abordados e suas críticas. Cardoso afirma que a metodologia depende fundamentalmente de: Da modalidade de tema que se escolheu; Da teoria de que se parte; Das hipóteses; Da documentação disponível. Desta forma poderá mostrar como o pesquisador trabalhará junto as suas ferramentas de pesquisa para produzir conhecimento histórico. Mas, lembre-se que essa etapa não é apenas uma lista de fontes a ser pesquisada. O papel das fontes é permitir que “o historiador concretize o seu acesso a determinadas realidades ou representações que já não temos diante de nós” (BARROS, 2010, p. 02). Desta forma, poderemos observar o passado através de uma enorme possibilidade de representações permitidas pela análise das fontes. 51 Hoje em dia o acesso às fontes foi democratizado pela internet, pesquisadores tem acesso às fontes do mundo todo através de sites que disponibilizam estes documentos, como o site da Biblioteca Nacional. Você já visitou este site? São milhares de jornais de todos os lugares do Brasil digitalizados na Hemeroteca Virtual da Biblioteca Nacional. Visite! http://bndigital.bn.gov.br/todos-os-titulos-disponiveis/ Finalmente, a fase final do projeto que é a elaboração do Cronograma de Execução, consiste na organização do tempo de execução do projeto dividindo-o em etapas e explicando o que será feito em cada etapa, exemplo: O exemplo acima nos mostra um cronograma anual, mas o pesquisador é quem definirá o tempo de execução da pesquisa. Finalmente o ultimo passo, trata-se da Bibliografia, geralmente contem livros e artigos relacionados ao tema e/ou aqueles que deram suporte a pesquisa de forma metodológica ou técnica. Preferencialmente devem ser colocados na http://bndigital.bn.gov.br/todos-os-titulos-disponiveis/ 52 bibliografia em ordem de prioridade os autores citados no trabalho e em seguida aqueles que foram lidos e auxiliaram na escrita. Seguido todos os passos o pesquisador terá como resultado final o Projeto de Pesquisa contemplando todos os aspectos abaixo: Fonte: BARROS Este modelo apresentado pode ser adaptado praticamente para qualquer área de estudo das ciências humanas, por ser um modelo padrão. Ainda há outras possibilidades de elaboração de projetos, sabemos que cada modelo depende do objetivo final do pesquisador. 53 Saiba mais Leia a entrevista do Historiador José D‟Assunção Barros sobre fontes históricas e metodologia de pesquisa: A FONTE HISTÓRICA E SEU LUGAR DE PRODUÇÃO José D'Assunção Barros RESUMO Este artigo busca desenvolver algumas considerações relacionadas à metodologia de tratamento de „fontes históricas‟. Após algumas considerações relacionadas à escolha e constituição de fontes históricas, é discutida uma questão mais específica: o lugar de produção de um texto tomado como fonte histórica. As questões tratadas neste artigo referem-se mais especificamente aos textos autorais. Disponível em: https://www.seer.furg.br/hist/article/view/2289/1812 https://www.seer.furg.br/hist/article/view/2289/1812 54 55 Explicando melhor com a Pesquisa Prezado Estudante, Para aprofundarmos nossos conhecimentos sugerimos que você leia o artigo “A importância das fontes documentais para a pesquisa em História da Educação” de autoria de Eliane Mimesse Prado. Neste artigo você terá a oportunidade de evidenciar a metodologia de pesquisa da autora e a tipologia das fontes em análise. Guia de Estudo: Após a leitura, faça um texto enfatizando o que você identificou de mais relevante e disponibilize na sala virtual. http://www.intermeio.ufms.br/revistas/31/31%20Artigo_08.pdf http://www.intermeio.ufms.br/revistas/31/31%20Artigo_08.pdf 56 Leitura Obrigatória Caros estudantes, Após a leitura deste material didático, convidamos você a realizar a leitura do livro “Fontes Históricas”, organizado por Carla Pinsky. Este livro é essencial para compreendermos o trato metodológico com as fontes e as diversas possibilidades de investigações no campo histórico. PINSKY, Carla Bassanezi (Org.). Fontes Históricas. 2ª edição. São Paulo: Editora Contexto, 2008. Guia de Estudo: Após a leitura da obra, realize uma resenha e disponibilize na sala virtual para compartilhar com seus colegas. 57 Pesquisando na Internet Prezado estudante, Convidamos você a aprofundar seus conhecimentos sobre a metodologia da pesquisa em História pesquisando na internet artigos sobre a História Serial e as abordagens históricas que a utiliza. Pense na seguinte questão: quais elementos são particulares na pesquisa a partir da História Serial? Guia de Estudo: Após a sua pesquisa, compartilhe sua análise com os colegas no Ambiente Virtual de Aprendizagem. 58 Saiba Mais Prezado Aluno, Sugerimos a você que faça a leitura da entrevista intitulada: História, historiografia e historiadores realizada com o professor Francisco Falcon em 2011 sobre o campo do conhecimento da História, detendo-se especificamente nas questões das abordagens teóricas e metodológicas das formações e investigações históricas. Guia de Estudo: Após a leitura da entrevista, faça um texto argumentativo das ideias do professor Francisco Falcon e disponibilize na sala virtual. https://www.historiadahistoriografia.com.br/revista/article/view/319/224https://www.historiadahistoriografia.com.br/revista/article/view/319/224 59 Vendo com os olhos de ver Caro Aluno, Sugerimos a você que assista ao filme “Narradores de Javé”, dirigido e produzido por Eliane Caffé em 2003. Neste filme estão evidenciadas discussões acerca da construção da escrita da História. Sinopse: Somente uma ameaça à própria existência pode mudar a rotina dos habitantes do pequeno vilarejo de Javé. É aí que eles se deparam com o anúncio de que a cidade pode desaparecer sob as águas de uma enorme usina hidrelétrica. Em resposta à notícia devastadora, a comunidade adota uma ousada estratégia: decide preparar um documento contando todos os grandes acontecimentos heroicos de sua história, para que Javé possa escapar da destruição. Como a maioria dos moradores são analfabetos, a primeira tarefa é encontrar alguém que possa escrever as histórias. Guia de Estudo: Após assistir ao vídeo, descreva o que você identificou de mais relevante no filme e disponibilize na sala virtual para compartilhar com seus colegas. https://www.youtube.com/watch?v=Trm-CyihYs8 60 Bibliografia ALBERTI, Verena. Fontes orais: Histórias dentro da História. In: PINSKY, Carla Bassanezi (Org.). Fontes Históricas. 2ª edição. São Paulo: Editora Contexto, 2008, p. 155-202. AMADO, Janaína FERREIRA. Marieta de Moraes (Org.). Usos e abusos da História Oral. Rio de Janeiro: FGV, 1998. BACELLAR, Carlos. Fontes documentais: uso e mau uso dos arquivos. In: PINSKY, Carla Bassanezi (Org.). Fontes Históricas. 2ª edição. São Paulo: Editora Contexto, 2008, p. 23-79. BARROS, José D.‟Assunção. O projeto de pesquisa em História: da escolha do tema ao quadro teórico. Petrópolis: Vozes, p. 9, 2005. ____________. O campo da história: especialidades e abordagens. 7. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2010. _____________. O projeto de Pesquisa em História: da escolha do tema ao quadro teórico. 9. ed. Petrópolis: Vozes, 2013. BLOCH, Marc Leopold Benjamin. Apologia da história, ou, O ofício de historiador. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2001. BORGES, Vavy Pacheco. O que é História? 18 ª ed. São Paulo: Editora Brasiliense, 1992. BURKE, Peter. A Escola dos Annales (1929-1989): a Revolução Francesa da Historiografia. São Paulo: Fundação Editora da UNESP, 1997. 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