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Via da Dor

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Dor
Vanessa Silva | FV3| MED UFAL
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Além dos receptores mecanossensíveis para o tato, a sensação somática depende demais de nociceptores, que são as terminações nervosas livres, ramificadas, não mielinizadas que sinalizam lesão ou risco de lesão ao corpo. (A palavra deriva do latim nocere, “ferir”.) 
A informação dos nociceptores segue uma via para o encéfalo que é muito distinta da via pela qual segue a informação dos mecanorreceptores; consequentemente, a experiência subjetiva causada pela ativação dessas duas vias é diferente. 
A ativação seletiva dos nociceptores pode levar à experiência consciente de dor. A nocicepção, e a dor, são essenciais à vida. Todavia, é importante esclarecer que a nocicepção e a dor não são sempre a mesma coisa. 
Dor é a sensação, ou a percepção, de sensações, como irritação, inflamação, fisgada, ardência, latejo, ou seja, sensações insuportáveis que surgem de uma parte do corpo. 
A nocicepção é o processo sensorial que fornece as sinalizações que disparam a experiência da dor. Enquanto os nociceptores podem disparar de forma violenta e contínua, a dor pode aparecer e desaparecer. E o oposto também pode ocorrer. 
A dor pode ser agonizante, mesmo sem a atividade dos nociceptores. Mais do que qualquer outro sistema sensorial, as qualidades cognitivas da nocicepção podem ser controladas internamente, pelo próprio encéfalo
Os Nociceptores e a Transdução dos Estímulos Dolorosos
Os nociceptores são ativados por estímulos que têm o potencial para causar lesão nos tecidos, como a estimulação mecânica forte, temperaturas extremas, privação de oxigênio e exposição a certos agentes químicos, entre outras causas. 
As membranas dos nociceptores contêm canais iônicos que são ativados por esses tipos de estímulos. 
Considere, por exemplo, os eventos que se sucedem quando você pisa sobre uma tachinha. O simples estiramento ou dobramento da membrana do nociceptor ativa os canais iônicos mecanossensíveis, que levam à despolarização da célula e ao disparo de potenciais de ação. Além disso, as células danificadas no local da lesão podem liberar uma série de substâncias que provocam a abertura de canais iônicos nas membranas dos nociceptores. Como exemplos de substâncias liberadas estão as proteases (enzimas que digerem proteínas), trifosfato de adenosina (ATP) e K+. 
As proteases podem clivar um peptídeo extracelular abundante, chamado de cininogênio, para formar o peptídeo bradicinina. A bradicinina liga-se a uma molécula receptora específica, que aumenta a condutância iônica de alguns nociceptores. 
De modo similar, o ATP causa a despolarização dos nociceptores por meio da ligação direta a canais iônicos que dependem de ATP para sua ativação. 
E o aumento de [K+] extracelular despolariza diretamente as membranas neuronais. 
Considere, agora, uma situação em que alguém se encosta em um forno quente. O calor acima de 43 °C causa queimadura nos tecidos, e os canais iônicos termossensíveis das membranas dos nociceptores abrem-se nessa temperatura. Obviamente, nós também sentimos calor de forma não dolorosa quando a pele é aquecida de 37 a 43°C. Essas sensações dependem de termorreceptores não nociceptivos e de suas conexões ao SNC. 
Por ora, saiba que as sensações de aquecimento e de queimação são mediadas por mecanismos neurais distintos. Imagine que você seja um corredor de meia idade percorrendo o último quilômetro de uma maratona. Quando os níveis de oxigênio de seus tecidos forem inferiores à demanda de oxigênio, as suas células utilizarão o metabolismo anaeróbio para gerar ATP. Uma consequência do metabolismo anaeróbio é a liberação de ácido láctico. O acúmulo de ácido láctico leva a um excesso de H+ no líquido extracelular. Esses íons ativam canais iônicos dependentes de H+ dos nociceptores. Esse mecanismo está associado à dor cruciante associada ao exercício muito intenso. 
Uma abelha o ferroa. Sua pele e seus tecidos contêm mastócitos, um componente do seu sistema imune. Os mastócitos podem ser ativados pela exposição a substâncias exógenas (p. ex., o veneno da abelha), levando-os à liberação de histamina. A histamina pode ligar-se aos receptores específicos na membrana do nociceptor, causando a despolarização da membrana. A histamina também aumenta a permeabilidade dos capilares sanguíneos, levando ao edema e ao rubor no local da lesão. Pomadas contendo fármacos que bloqueiam os receptores histaminérgicos (anti-histamínicos) podem auxiliar tanto no alívio da dor como na diminuição do edema.
	A Miséria de uma Vida Sem Dor
A dor nos ensina a evitar situações prejudiciais
Insensibilidade congênita à dor – As pessoas passam a vida inteira em constante perigo de autodestruição, pois não conseguem se dar conta das consequências prejudiciais de seus atos. Essas pessoas comumente morrem precocemente
As pessoas com insensibilidade congênita à dor revelam que a dor é uma sensação particular e não simplesmente um excesso de outras sensações
Entre as possíveis causas do distúrbio estão uma falha no desenvolvimento periférico dos nociceptores, transmissão sináptica alterada nas vias no sistema nervoso central que transmitem a dor e mutações genéticas. Pesquisas revelou mutações no gene SCN9A, o qual codifica um tipo especial de canal de sódio dependente de voltagem que se expressa apenas em neurônios nociceptivos. A mutação leva a canais de sódio não funcionais, o que determina uma ausência de potenciais de ação nos nociceptores e uma profunda insensibilidade à dor
Tipos de Nociceptores
A transdução dos estímulos dolorosos ocorre nas terminações nervosas livres das fibras não mielinizadas C e nas pobremente mielinizadas delta. 
A maioria dos nociceptores respondem a estímulos mecânicos, térmicos e químicos e são chamados, portanto, de nociceptores polimodais. Contudo, assim como os mecanorreceptores de tato, muitos nociceptores mostram seletividade nas respostas a estímulos diferentes. Dessa forma, também existem nociceptores mecânicos (mecanonociceptores), que mostram respostas seletivas à pressão intensa; nociceptores térmicos (termonociceptores), que respondem seletivamente ao calor queimante ou ao frio extremo; e nociceptores químicos, que respondem de forma seletiva à histamina e a outros agentes químicos. 
Os nociceptores estão presentes na maioria dos tecidos corporais, como a pele, os ossos, os músculos, a maioria dos órgãos internos, os vasos sanguíneos e o coração. Eles estão notadamente ausentes no sistema nervoso em si, porém estão presentes nas meninges.
	Quente e Apimentado
Se você gosta de comida apimentada, provavelmente sabe que o ingrediente ativo de uma ampla variedade de pimentas ardentes é a capsaicina
Essas pimentas são “quentes” porque a capsaicina ativa nociceptores térmicos, que também sinalizam elevações térmicas que causam dor (acima de, aproximadamente, 43°C), a capsaicina ativa um canal iônico específico, denominado TRPV1, o qual também é ativado por aumentos de temperatura que atinjam 43°C. Esse canal iônico permite a entrada de Ca2+ e Na+, despolarizando o neurônio
A capsaicina parece imitar o efeito de substâncias endógenas liberadas por tecidos lesados. Essas substâncias (e a capsaicina) provocam a abertura do canal TRPV1 em temperaturas mais baixas, o que explica a sensibilidade aumentada de áreas lesadas da pele a aumentos de temperatura
Hiperalgesia e Inflamação
Os nociceptores normalmente respondem apenas quando os estímulos são suficientemente intensos para provocar lesão tecidual. No entanto, todos nós sabemos que a pele, as articulações ou os músculos que já estão lesionados ou inflamados estão mais sensíveis que o normal. 
Um toque leve e condoído de uma mãe sobre uma área da pele queimada de seu filho pode desencadear gritos devido à dor insuportável. Esse fenômeno é conhecido como hiperalgesia e é o exemplo mais familiar da capacidade corporal de autocontrole da dor. 
A hiperalgesia pode ser um limiar reduzido à dor, uma intensidade aumentada dos estímulos dolorosos ou, até mesmo, dor espontânea. 
A hiperalgesia primária ocorre na área dotecido lesado, porém os tecidos que envolvem a região da lesão também podem se tornar supersensíveis, pelo processo de hiperalgesia secundária. 
Muitos mecanismos distintos podem estar envolvidos na hiperalgesia, alguns no nociceptor ou perifericamente no tecido a seu redor e outros no SNC. 
Como foi observado anteriormente, quando ocorre lesão na pele, diversas substâncias, que são chamadas algumas vezes de sopa inflamatória, são liberadas. A sopa contém certos neurotransmissores (glutamato, serotonina, adenosina, ATP), peptídeos (substância P, bradicinina), lipídeos (prostaglandinas, endocanabinoides), proteases, neurotrofinas, citocinas, quimiocinas, íons, como K+ e H+, entre outras substâncias 
Em conjunto, essas substâncias podem causar inflamação, que é uma resposta natural dos tecidos corporais na tentativa de eliminar a lesão e estimular o processo de cura. 
Os sinais característicos de inflamação na pele são dor, calor, rubor e edema. Várias daquelas substâncias também podem modular a excitabilidade dos nociceptores, tornando- -os mais sensíveis aos estímulos térmicos ou mecânicos 
A bradicinina é uma substâncias que despolariza diretamente os nociceptores. Além desse efeito, a bradicinina estimula mudanças intracelulares de longa duração, que tornam mais sensíveis os canais iônicos ativados por calor. 
As prostaglandinas são substâncias produzidas pela clivagem enzimática dos lipídeos da membrana celular. Não causam dor diretamente, mas aumentam muito a sensibilidade dos nociceptores a outros estímulos. O ácido acetilsalicílico e outros fármacos anti-inflamatórios não esteroides são um tratamento utilizado para tratar a hiperalgesia, uma vez que inibem as enzimas necessárias à síntese de prostaglandinas. 
A substância P é um peptídeo sintetizado pelos próprios nociceptores. A ativação de uma ramificação do neurito periférico do nociceptor pode levar à secreção de substância P por outras ramificações do neurito do mesmo nociceptor nas áreas vizinhas da pele. A substância P causa vasodilatação (aumento do diâmetro dos capilares sanguíneos) e a liberação de histamina dos mastócitos. A sensibilização de outros nociceptores pela substância P em torno do local da lesão é uma das causas da hiperalgesia secundária. Os mecanismos do SNC também contribuem com a hiperalgesia secundária. Após a lesão, a ativação dos axônios mecanorreceptores beta por um toque leve pode resultar em dor. Portanto, outro mecanismo de hiperalgesia envolve uma interação sináptica (linha cruzada) entre a via do tato e a via da dor na medula espinhal.
Prurido
O prurido é definido como uma sensação desagradável que induz um desejo ou um reflexo de coçar. 
O prurido, ou coceira, e o ato de coçar que ela evoca pode servir como uma defesa natural contra parasitos e toxinas de plantas sobre a pele e a cabeça. 
O prurido é, em geral, uma irritação breve e de menor importância, porém pode se tornar uma condição crônica e seriamente debilitante. 
O prurido crônico pode ser causado por uma grande variedade de condições cutâneas, como reações alérgicas, infecções, infestações e psoríase; pode ser causado por distúrbios como câncer, hipertireoidismo, deficiência de ferro, doença hepática, estresse e condições psiquiátricas. Imagine que sua pior coceira se espalhou pela maior parte do seu corpo e persiste por todos os minutos de seu dia. A necessidade de coçar pode ser implacável e irresistível. 
O prurido crônico pode ser tão incômodo como a dor crônica e é reconhecidamente difícil para se tratar com fármacos e terapias. 
O prurido tem sido uma sensação difícil de se classificar. Embora a dor e o prurido sejam inequivocadamente distintos, também possuem muitas similaridades.Ambas as sensações são mediadas por axônios sensoriais de pequeno calibre, apesar de os axônios que transmitem a sinalização da dor parecerem diferentes daqueles que transmitem a coceira. 
Ambos podem ser ativados por vários tipos de estímulos, como químicos e tátil. Alguns dos fármacos e compostos que regulam a dor também podem desencadear a coceira, e algumas moléculas sinalizadoras transduzem ambas as sensações. A dor e o prurido também interagem
Por exemplo, a dor pode suprimir o prurido, o que explica por que, algumas vezes, coçamos de forma agressiva, lesionando aquela área cutânea com o prurido. Alguns tipos de prurido são transduzidos por moléculas e circuitos neurais específicos. 
As fibras axonais C, de menor diâmetro (velocidade de condução de 0,5 m/s ou menos), são seletivamente responsivas à histamina, a substância que naturalmente produz o prurido e que é liberada dos mastócitos na pele durante a inflamação. 
A histamina desencadeia o prurido por meio de sua ligação aos receptores histaminérgicos que, por sua vez, ativam canais TRPV1; surpreendentemente, esse é o mesmo tipo de canal TRPV1 estimulado pela capsaicina e por altas temperatura 
Anti-histamínicos – fármacos que antagonizam receptores para a histamina – podem suprimir esse tipo de prurido. Entretanto, nem todo prurido é mediado por histamina. A coceira pode ser desencadeada, também, por grande variedade de substâncias endógenas e exógenas, pois os finos axônios que transmitem o prurido expressam, aparentemente, um grande número de outros tipos de receptores, moléculas sinalizadoras e canais de membrana que desencadeiam a coceira. 
Permanece, entretanto, muito mistério sobre o prurido. Não está claro se existem diferentes tipos de axônios que transmitem o prurido. Os circuitos centrais envolvidos no processamento do prurido também são muito pouco conhecidos. Há um estudo muito interessante que demonstra a participação de certos neuropeptídeos em vias específicas de transmissão do prurido na medula espinhal. Se as moléculas sinalizadoras e os receptores específicos que desencadeiam o prurido pudessem ser identificados e compreendidos, seria possível desenvolver fármacos seletivos efetivos para tratar prurido crônico sem interferir no processamento da dor e de outras sensações somáticas
Aferentes Primários e Mecanismos Espinhais
As fibras Aδ e C levam informação ao SNC com velocidades diferentes, em função das diferenças em suas velocidades de condução dos potenciais de ação. Dessa forma, a ativação de nociceptores cutâneos produz duas percepções de dor distintas: uma dor primária, rápida e aguda, seguida de uma dor secundária, lenta e contínua. 
A dor primária é causada pela ativação de fibras Aδ; a dor secundária é causada pela ativação de fibras C
Assim como as fibras mecanossensoriais Aβ, as fibras de pequeno calibre possuem seus corpos celulares nos gânglios da raiz dorsal segmentar e entram no corno dorsal da medula espinhal. Ao penetrarem na medula, as fibras logo ramificam-se e percorrem uma curta distância nos sentidos rostral e caudal na medula, em uma região chamada de tracto de Lissauer, fazendo, depois, sinapse com neurônios da parte mais periférica do corno dorsal, em uma região conhecida como substância gelatinosa 
O neurotransmissor dos aferentes nociceptivos é o glutamato; contudo, como foi mencionado anteriormente, esses neurônios também contêm o peptídeo substância P 
A substância P fica estocada em grânulos de secreção nas terminações axonais e pode ser liberada por salvas de potenciais de ação de alta frequência. 
Experimentos recentes demonstraram que a transmissão sináptica mediada pela substância P é necessária para as sensações de dor moderadas a intensas. É interessante observar que os axônios de nociceptores viscerais entram na medula espinhal pelo mesmo trajeto que os de nociceptores cutâneos. Na medula espinhal, ocorre uma mistura substancial de informação dessas duas fontes de aferências 
Essa linha cruzada origina o fenômeno da dor referida, pelo qual a ativação do nociceptor visceral é percebida como uma sensação cutânea. 
Um exemplo clássico de dor referida é a angina, que ocorre quando o coração não recebe oxigênio em quantidade suficiente. Os pacientes localizam frequentemente a dor da angina na parte superior do tórax e no braço esquerdo. Outro exemplocomum é a dor associada à apendicite, que é referida, em seu estágio inicial, na parede abdominal ao redor do umbigo
Vias Ascendentes da Dor
As vias do tato e da dor diferem em relação às suas terminações nervosas na pele. 
	Vias do Tato
	Vias da Dor
	Possui terminações com estruturas especializadas na pele
	Possui apenas terminações nervosas livres
	Via rápida, utilizando-se de fibras mielinizadas Aβ
	Via lenta e utiliza fibras de pequeno calibre, fibras pouco mielinizadas Aδ e fibras C não mielinizadas
	As ramificações dos axônios Aβ terminam em níveis mais internos do corno dorsal
	As ramificações das fibras Aδ e C percorrem pelo tracto de Lissauer e terminam na substância gelatinosa.
A Via da Dor Espinotalâmica
A informação sobre a dor corporal (como também a temperatura) é conduzida da medula espinhal ao encéfalo pela via espinotalâmica. 
Diferentemente da via coluna dorsal-lemnisco medial, os axônios dos neurônios secundários decussam no mesmo nível da medula espinhal em que ocorreu a sinapse e ascendem pelo tracto espinotalâmico ao longo da superfície ventral da medula espinhal (comparar Figuras 12.14 e 12.27). 
De acordo com os nomes, as fibras espinotalâmicas projetam-se da medula espinhal, passando pelo bulbo, pela ponte e pelo mesencéfalo, sem fazer sinapse, até alcançar o tálamo. 
À medida que os axônios espinotalâmicos percorrem o tronco encefálico, eles posicionam-se ao longo do lemnisco medial, mas permanecem como um grupo axonal distinto da via mecanossensorial. 
Observe que a informação sobre o tato ascende ipsolateralmente, ao passo que as informações nociceptivas (e térmicas) ascendem contralateralmente. Essa organização pode levar a um curioso, ainda que previsível, tipo de déficit em situações de danos ao sistema nervoso. 
Por exemplo, se um lado da medula espinhal sofrer lesão, certos déficits de mecanossensibilidade ocorrem no mesmo lado da lesão espinhal: insensibilidade ao tato leve, às vibrações de um diapasão sobre a pele e à posição de um membro. 
Por outro lado, déficits de sensibilidade à dor e à temperatura ocorrerão no lado do corpo oposto ao da lesão medular. 
Outros sinais, como a deficiência motora e o mapeamento exato dos déficits sensoriais, fornecem informações adicionais acerca do local da lesão medular. Por exemplo, os movimentos ficarão dificultados no lado ipsolateral. O conjunto de sintomas sensoriais e motores que se segue a uma lesão unilateral na medula espinhal é chamado de síndrome Brown-Séquard
A Via da Dor Trigeminal
A informação da dor (e da temperatura) da face e do terço anterior da cabeça segue por uma via ao tálamo, análoga à via espinhal. 
As fibras de pequeno diâmetro do nervo trigêmeo fazem a primeira sinapse com os neurônios sensoriais secundários no núcleo espinhal do trigêmeo no tronco encefálico. 
Os axônios desses neurônios decussam e ascendem ao tálamo pelo lemnisco trigeminal. 
Além das vias espinotalâmica e trigeminotalâmica, outras vias relacionadas à dor (e à temperatura) enviam axônios para uma variedade de estruturas, em todos os níveis do tronco encefálico, antes de alcançarem o tálamo. 
Algumas dessas vias são especialmente importantes para fornecer sensações de dor lenta, de queimação e agonizante, ao passo que outras desencadeiam um estado geral de comportamento de alerta. 
O Tálamo e o Córtex
O tracto espinotalâmico e os axônios do lemnisco trigeminal fazem sinapse em uma região mais extensa do tálamo do que os axônios do lemnisco medial. 
Alguns dos axônios terminam no núcleo VP (ventral posterior), tal qual fazem os axônios do lemnisco medial, porém as vias do tato e da dor ainda permanecem segregadas, ocupando regiões separadas do núcleo. 
Outros axônios espinotalâmicos terminam nos pequenos núcleos intralaminares do tálamo 
A partir do tálamo, as informações sobre dor e temperatura projetam-se para várias áreas do córtex cerebral. 
Assim como fazem no tálamo, essas vias cobrem um território muito mais extenso do que as conexões corticais da via coluna dorsal-lemnisco medial.
A Regulação da Dor
A percepção da dor é muito variável. 
Dependendo da atividade concomitante de aferências sensoriais não dolorosas e do contexto comportamental, o mesmo nível de atividade do nociceptor pode produzir mais ou menos dor. 
É muito importante compreender essa modulação da dor, pois ela pode oferecer novas estratégias para o tratamento da dor crônica, uma condição que aflige até 20% da população adulta. 
Regulação Aferente
Vimos que um toque leve pode causar dor pelo mecanismo da hiperalgesia. 
Contudo, a dor provocada pela atividade dos nociceptores também pode ser reduzida pela atividade simultânea de mecanorreceptores de limiar baixo (fibras Aβ). Presumivelmente, esse é o motivo pelo qual você se sente melhor quando massageia a pele da sua canela logo após contundi-la. 
Esse mecanismo também pode explicar o efeito de um tratamento elétrico para alguns tipos de dor crônica intratáveis. 
Fios condutores são fixos à superfície da pele, e, quando o paciente simplesmente liga um estimulador elétrico destinado a ativar axônios sensoriais de grande diâmetro, a dor é suprimida. 
Nos anos 1960, Ronald Melzack e Patrick Wall, do MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts), propuseram uma hipótese para explicar esses fenômenos. 
A teoria do portão da dor sugere que certos neurônios do corno dorsal, os quais projetam seus axônios pelo tracto espinotalâmico, são excitados tanto por axônios sensoriais de grande diâmetro como por axônios não mielinizados. 
O neurônio de projeção também é inibido por um interneurônio, e o interneurônio é simultaneamente excitado pelo axônio sensorial calibroso e inibido pelo axônio nociceptivo 
Por meio desse circuito, a atividade apenas do axônio nociceptivo resultaria em excitação máxima do neurônio de projeção, permitindo que os sinais nociceptivos cheguem ao encéfalo. Contudo, se os axônios de mecanorreceptores dispararem conjuntamente, eles ativarão o interneurônio que suprimirá a sinalização nociceptiva. 
Regulação Descendente
Há inúmeras histórias sobre soldados, atletas e vítimas de tortura que sofreram ferimentos terríveis, mas aparentemente não sentiram dor. 
Emoções fortes, estresse ou determinação estoica podem suprimir de maneira poderosa as sensações dolorosas. Várias regiões encefálicas estão envolvidas na supressão da dor
 
Uma delas é uma região de neurônios do mesencéfalo, chamada de substância cinzenta periaquedutal (PAG, do inglês, periaqueductal gray matter). 
A estimulação elétrica da PAG pode causar analgesia profunda, que tem sido, algumas vezes, explorada clinicamente. 
A PAG recebe, normalmente, aferências de várias estruturas do encéfalo, muitas das quais são responsáveis pela transmissão de informações relacionadas ao estado emocional. Os neurônios da PAG enviam axônios descendentes para várias regiões situadas na linha média do bulbo, principalmente para os núcleos da rafe (cujos neurônios liberam o neurotransmissor serotonina). Esses neurônios bulbares projetam os axônios, por sua vez, para os cornos dorsais da medula espinhal, onde podem deprimir de maneira eficiente a atividade dos neurônios nociceptivos.
Opioides Endógenos
O ópio era conhecido provavelmente pelos antigos sumérios por volta de 4.000 a.C. Seu pictograma para a palavra papoula traduz-se, a grosso modo, por “planta da alegria”. 
No século XVII, o valor terapêutico do ópio era incontestável. O ópio, os seus ingredientes narcóticos ativos e seus análogos – incluindo a morfina, a codeína e a heroína – são hoje amplamente usados e abusados, na maioria das culturas. 
Essas drogas, e outras com ações similares, chamadas de opioides, produzem analgesia profunda quando administrados de forma sistêmica. 
Os opioides também podem produzir alterações de humor, sonolência, confusão mental, náusea, vômito e constipação. 
A década de 1970 trouxe as impressionantes descobertas de que os opioides atuam se ligando de forma firme e especificamente a vários tipos de receptores opioides no sistema nervoso, e que o própriosistema nervoso produz substâncias endógenas semelhantes à morfina, chamadas coletivamente de endorfinas.
As endorfinas são proteínas relativamente pequenas, ou peptídeos. 
As endorfinas e seus receptores estão amplamente distribuídos no SNC, e estão particularmente concentradas em áreas que processam ou modulam a informação nociceptiva. 
Pequenas quantidades de morfina ou endorfinas injetadas na PAG, nos núcleos da rafe ou no corno dorsal podem produzir analgesia. Pelo fato de esse efeito ser impedido pela administração de um bloqueador específico de receptores opioides, a naloxona, as drogas injetadas devem ter agido, ligando-se a receptores opioides nessas áreas. 
A naloxona também pode bloquear os efeitos analgésicos induzidos pela estimulação elétrica dessas áreas. No âmbito celular, as endorfinas exercem múltiplos efeitos, os quais incluem supressão da liberação de glutamato das terminações pré-sinápticas e inibição dos neurônios pela hiperpolarização das membranas pós-sinápticas. 
Em geral, os extensos sistemas de neurônios que contêm endorfinas na medula espinhal e no tronco encefálico reduzem a passagem de sinais nociceptivos no corno dorsal e nos níveis superiores encefálicos, onde é gerada a percepção da dor.
	Dor e Efeito Placebo
O termo placebo é usado para descrever essas substâncias (1a pessoa do futuro indicativo do verbo em latim placere, que significa “agradar”, “agradarei”), e o fenômeno é chamado de efeito placebo. 
Os placebos podem ser analgésicos muito eficazes. Muitos pacientes sofrendo de dor pós-operatória relataram obter alívio de uma injeção de solução fisiológica estéril. Isso significa que esses pacientes estariam apenas imaginando suas dores? De forma alguma. 
O antagonista do receptor opioide, naloxona, pode bloquear o efeito analgésico do placebo, exatamente como antagoniza os efeitos da morfina, um analgésico real. Aparentemente, a crença de que o tratamento funcionará pode ser o suficiente para causar ativação de sistemas endógenos encefálicos de alívio à dor. O efeito placebo é uma explicação provável para o sucesso de outros tratamentos para a dor, como acupuntura, hipnose e, para as crianças, um beijo carinhoso da mãe
	
Referencias
BEAR, Mark F.; PARADISO, Michael A.; CONNORS, Barry W. Neurociências: desvendando o sistema nervoso. 4º Ed. , 2008

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