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Jader Burtet (2020 - UNIFESP) Mulher, 69 anos de idade, refere urgência em urinar no retorno ao seu domicílio e, às vezes, tem perda urinária concomitante, há 6 meses. Qual é o diagnóstico clínico e a conduta? a) incontinência urinária de esforço, indicar cirurgia de Burch b) infecção urinária de repetição, prescrição de antibioticoprofilaxia por 6 meses c) incontinência urinária de esforço, indicar fisioterapia do assoalho pélvico d) síndrome da bexiga hiperativa, prescrição de antagonista de receptor B3 adrenérgico 17.1 INTRODUÇÃO Incontinência Urinária de Esforço (IUE) é a perda de urina pelo meato uretral (para diferenciar-se das fístulas) que acontece quando há aumento da pressão intra- abdominal, geralmente associada ao esforço (tosse, espirro, pulos, atividade física) ou a alterações na musculatura vesical. A instabilidade do músculo detrusor é desencadeada pela contração involuntária desse músculo, levando à perda urinária (incontinência por urgência) por hiperatividade detrusora. Fístulas urogenitais podem ser uretrais, vesicais ou vaginais. As mais comuns são as vesicovaginais. Podem ser ocasionadas por acidentes, sequelas cirúrgicas ou obstétricas, neoplasias, doenças infecciosas ou sequelas pós-radioterapia, e o sintoma associado a elas é a perda urinária contínua, não associada ao esforço. 17.2 FISIOLOGIA MICCIONAL A bexiga e a uretra compõem o trato urinário baixo feminino. A bexiga é formada por um músculo liso chamado detrusor. A uretra é uma estrutura também formada por músculo liso mas envolvida por músculo estriado (compressor) e funciona como esfíncter (porção lisa involuntária e porção estriada voluntária). O esvaziamento e enchimento da bexiga são mediados pelo sistema nervoso autônomo — simpático, parassimpático e somático (voluntário). O sistema simpático tem como principal neurotransmissor a noradrenalina, que age por meio de receptores alfa e beta-adrenérgicos. No esfíncter uretral há receptores alfa- adrenérgicos, e no músculo detrusor (bexiga) há receptores beta-adrenérgicos. Quando a noradrenalina age nos receptores beta-adrenérgicos, ocorre o 17 INCONTINÊNCIA URINÁRIA relaxamento do músculo detrusor. Ao agir nos receptores alfa-adrenérgicos, ocorre a contração do esfíncter uretral. Portanto, a noradrenalina permite o enchimento vesical. O neurotransmissor do sistema parassimpático é a acetilcolina, que age nos receptores muscarínicos M2 e M3 (colinérgicos) e estimula a contração do detrusor, permitindo assim o esvaziamento vesical. Para haver continência vesical, a pressão intrauretral deve ser superior à intravesical, e também é preciso haver estabilidade no mecanismo de contração do músculo detrusor. São aspectos importantes na continência: integridade e competência do assoalho pélvico, nível estrogênico adequado e integridade do controle nervoso sobre o músculo detrusor. 17.3 QUADRO CLÍNICO ▶ Perda urinária aos esforços; ▶ Urgência miccional; ▶ Urgeincontinência; ▶ Aumento do número de micções diárias (acima de oito episódios); ▶ Noctúria; ▶ Disúria. 17.3.1 Exame ginecológico ▶ Investigar prolapsos genitais; ▶ Investigar sinais de atrofia genital por hipoestrogenismo; ▶ Solicitar manobra de Valsalva para verificar a perda urinária. 17.4 DIAGNÓSTICO ▶ Exames subsidiários: compreendem urina tipo I, urocultura e teste urodinâmico; ▶ Teste urodinâmico: compõe-se de três etapas — fluxometria, cistometria e estudo miccional: ▷▷ Fluxometria: avaliação da diurese espontânea; o fluxo (volume/tempo) é comparado a um fluxo-padrão considerado normal; ▷▷ Cistometria ou estudo urodinâmico: a sonda vesical fica localizada no colo vesical e transmite a pressão intravesical. A sonda vaginal ou retal transmite a pressão intra- abdominal. É revelada a pressão do detrusor. Avalia-se o comportamento da pressão do músculo detrusor durante o enchimento, verificando a ocorrência, ou não, de contrações involuntárias, que, quando presentes, significam diagnóstico de hiperatividade desse músculo; ▷▷ Estudo miccional: após a repleção vesical até a capacidade cistométrica máxima, solicita-se à paciente que execute movimentos de aumento da pressão intra- abdominal, como tosse, espirro etc. A seguir, ela deve urinar novamente, e estuda-se a relação entre o volume urinado, a pressão necessária para urinar, o tempo e as contrações vesicais. ▶ Nos casos em que a pressão do ponto de perda (Valsalva Leak Point Pressure — VLPP) é baixa (menor que 60 cmH 2 O), caracteriza-se a IUE como defeito intrínseco do esfíncter fisiológico da uretra; ▶ Quando, ao estudo urodinâmico, verifica-se a perda urinária na presença de contrações do músculo detrusor, a incontinência urinária ocorre por hiperatividade detrusora. #importante O quadro com urgência miccional, eventual urgeincontinência, polaciúria e noctúria é chamado bexiga hiperativa. Quando a urodinâmica não é feita ou não revela contrações detrusoras, mas há queixa clínica, o tratamento segue a orientação da hiperatividade detrusora. 17.5 TRATAMENTO ▶ IUE: ▷▷ Clínico: exercícios para o assoalho pélvico (exercícios de Kegel), uso de pessários (cones) vaginais, biofeedback, eletroestimulação e estrogênios tópicos; ▷▷ Cirúrgico: uretrocistopexia retropúbica ou cirurgia de Burch (alguns serviços ainda realizam este procedimento), faixas sob a uretra (cirurgia mais realizada na atualidade — sling tension-free vaginal tape, retropúbico, principalmente em casos de defeito esfincteriano intrínseco e sling transobturator tape, transobturatório, principalmente em casos de hipermobilidade do colo vesical). A cirurgia de Kelly- Kennedy (uretroplastia com plicatura do colo vesical) não é opção de tratamento, devido à baixa eficácia e ao alto índice de recorrência da incontinência. A prescrição de duloxetina também é uma opção que pode ser considerada para incontinência de esforço. ▶ Hiperatividade do detrusor: a terapêutica é eminentemente clínica: anticolinérgicos (oxibutinina, tolterodina, solifenacina e darifenacina), agonista adrenérgico (mirabegrona), estrogênio vaginal ou drogas de ação no sistema nervoso central (antidepressivos tricíclicos, como a imipramina). Podem-se associar à medicação técnicas como eletroestimulação, reeducação vesical e biofeedback. A aplicação de toxina botulínica intravesical também é uma opção de tratamento; ▶ Incontinência mista: tratar primeiramente o componente da hiperatividade. Em caso de persistência da perda aos esforços, indica-se o mesmo tratamento utilizado na IUE; ▶ Incontinência por transbordamento ou paradoxal: o tratamento baseia-se na cateterização intermitente e em medidas de suporte (tratar constipação intestinal e diminuir medicações que aumentem o tônus esfincteriano ou diminuam a contratilidade vesical); ▶ Medidas comportamentais: o uso é possível para todos os tipos de incontinência — treinamento vesical, diário miccional, redução de 25% da ingesta hídrica, redução do consumo de cafeína (café, chá preto, chocolate) e bebidas carbonatadas (refrigerantes) e alcoólicas. Modificar esquemas terapêuticos com medicamentos que possam agravar sintomas de IUE e tratar causas-base. 17.6 DIAGNÓSTICOS DIFERENCIAIS ▶ Doenças sistêmicas (diabetes mellitus, cardiopatias, neuropatias centrais e periféricas); ▶ Uso de medicamentos (diuréticos, drogas com atuação no sistema nervoso autônomo); ▶ Cirurgias prévias (cirurgias pélvicas ou sobre o próprio trato urinário); ▶ Infecção do trato urinário; ▶ Tumores pélvicos com efeito de massa sobre a bexiga (miomas, cistos anexiais e neoplasias); ▶ Gestação; ▶ Cistite intersticial; ▶ Endometriose de bexiga. 17.7 CONCLUSÃO A incontinência urinária é caracterizada pela perda involuntária de urina. É dividida em IUE, de urgência ou mista. A IUE ocorre pelo aumento da pressão abdominal através de tosse, espirros e alterações da musculatura vesical, como enfraquecimento do assoalho pélvico. A incontinência urinária de urgênciaou hiperatividade detrusora ocorre por contrações involuntárias do músculo detrusor. A investigação é realizada por meio de exame de urina tipo I, urocultura e avaliação urodinâmica. O tratamento conservador consiste em exercícios do assoalho pélvico e estrogenoterapia tópica. O tratamento cirúrgico da IUE é realizado, principalmente, com o sling transobturatório. Na hiperatividade detrusora e bexiga hiperativa o tratamento é clínico, principalmente com a utilização de medicações anticolinérgicas. Gabarito da questão Resposta: e
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