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ACH1518 - Poder Público e Terceiro Setor no Lazer e Turismo (2021) Resenha descritiva a partir da obra “O que é poder?” de Gerard Lebrun ANA GABRIELA GOMES PINHEIRO DOS SANTOS (10724802) São Paulo 2021 O autor faz questão de iniciar salientando que esta obra não busca conceituar “Poder” detalhadamente de acordo com a filosofia política. Ele busca revestir o conceito de inúmeros e diversos significados, livrando o leitor de preconceitos e ideias pré estabelecidas em torno do “Poder” e fomentar uma curiosidade genealógica. O texto inicia-se com a distinção entre potencialidade e atualidade, conceitos debatidos por Aristóteles. Através de um exemplo político, relacionando o FMI e uma super potência, o autor propõe a potencialidade como capacidade determinada, ainda que seja utilizada ou não. Ele usa este conceito para definir a “política” que por sua vez é responsável por através de força garantir direito e segurança, colocando de forma simples. No entanto, esta força que se funda a política, raramente é caracterizada por uma arma ou violência, está força está diretamente ligada a capacidade determinada de influenciar e mobilizar pessoas. Na política, a força é a determinação da potencialidade. Mas existe uma diferença entre poder e potencialidade. O Poder dispõe de um elemento adicional. Existe poder quando uma potência, determinada por força, se expressa de maneira muito clara e incisiva. O Poder é expressado como uma ordem direta, a qual, a quem se dirige, espera-se o cumprimento da mesma. É o grau de probabilidade de determinação da potencialidade. E neste momento, o autor refere-se a um conceito pensado por Max Weber, traduzido por Raymond Aron como dominação. Em suma, o poder/dominação exerce papel coercitivo não isento de intenções em uma sociedade civil complexa. Existem autores que negam e dissociam o caráter impositivo do poder na política. Talcott Parsons, por exemplo, o define como “imperative control” e elimina de sua semântica as características hierárquicas e ligadas quase sempre à desigualdade social. Para ele, o poder político vem de um lugar de conhecimento prévio e garantidor de uma confiança a qual lhes garantem a potencialidade de influenciar e impor idéias. O Autor a partir destas linhas de raciocínio, nos convida a questionar o que achamos. E pretensiosamente, levanta a dúvida: Os comportamentos de um cidadão a partir de um sistema democrático seria diferente de um sistema autoritário? e sobre um sistema totalitário? No geral, quando um indivíduo se submete a alguma ordem do Estado é porque este, caso não a cumpra, sofrerá uma punição. E assim somos levados novamente, ao conceito de força e dominação para fomentar a obediência política. E então o autor apresenta uma segunda tese acerca do Poder. A tese consiste na dependência da coerção entre os indivíduos. Um ator apenas tem poder, caso o outro, não o tenha. E esta teoria aplica-se a todas as relações, sejam elas profissionais ou afetivas. É sempre necessário que haja um ator em posição inferior, para que o outro exerça este poder. Aceitando a veracidade destes argumentos, existem autores com pensamentos divergentes acerca disso, e estas divergências nos encaminham para uma bifurcação ideológica. Michel Foucault, em A vontade do Saber, mostra rejeitar esta tese: 1- o poder não se limita à proibição. Há muito é responsável por garantir a eficiência de inúmeras instituições imprescindíveis à vida em sociedade. 2- O poder expressá representação jurídica e carece de compreensão de seus mecanismos além do entendimento raso. 3- O poder-dominação se estabelece em todas as relações sociais e em relações demasiadamente distintas. De modo que, não exista uma oposição binária e global entre dominador e dominado, é absolutamente limitante enxergar o poder apenas como o poder do Estado. O autor completa o pensamento dizendo que há e houveram sociedades que sobreviveram sem o poder do Estado. Exemplifica com a situação de tribos indígenas que com poucos prazeres e recursos escassos sobrevivem sem relações de dominação. Desta forma, atribui a origem do poder à necessidade da guerra e a perda da força das leis de justiça que passam a precisar de coerção para se manterem em vigor. Mais adiante é possível se discutir a teoria do príncipe soberano, a qual pode-se compreender que o Poder garante ao soberano de uma nação, sendo ele indivíduo ou instituição, isenção às leis. Pois o mesmo detém o poder de criá-las e revogá-las, portanto, em situação adversa, pode recorrer a isto estando totalmente acima dos outros poderes. Nesse momento o autor faz uma ligeira associação a monarquia absolutista. Tal período sofreu diversas mutações e hoje se dá por encerrado. Mas há questionamentos em torno de sua evolução. O autor indaga se o fim da monarquia tem motivação apenas na economia e necessidades do capital, como muitos outros autores acreditam, ou se também teve origem na readequação do sistema feudal e novas condições de vida. Observa-se que desde o fim da idade média, a concentração de poder era incompatível com o avanço da comercialização e circulação capitalista de mercadorias. E então, passa-se a refletir sobre uma dualidade cada vez mais polarizada, entre a centralização e burocratização do poder, e o desenvolvimento de tecnologia comercial e transações de mercado. Enxerga-se então uma tese amparada por Perry Anderson, uma relação de dependência da ascensão do capitalismo à sociedade absolutista. Doravante, o autor pensa em como a concepção antiga de cidade diferencia-se da concepção moderna e como esta pode variar em muitos aspectos. Em suma, os indivíduos existem previamente aos grupos que existem previamente as cidades que passam a formar uma república a partir de bens comuns (públicos). Mas para que sejam considerados uma república e que estejam unificados, é necessário uma instância que os coordene. Para Hobbes, uma república é a personificação de um homem artificial, um autômato, formado para e por homens naturais com um objetivo em comum que é sua própria defesa e proteção. E é este o Leviatã, de Hobbes. No entanto, essa “vontade coletiva” é depositada no soberano, que passa a representar a opinião de cada homem que o compõe, não de forma harmoniosa e voluntária, mas sim coesa e dominadora, por ser detentor de todo o poder. Em síntese, não há república sem unificação, não há unificação sem soberania, mas não há soberania sem poder-dominação. A partir disso, pensar a soberania pressupõe uma grande transformação na dinâmica política. Com a coerção por parte do Estado, os homens com seus anseios pessoais, se tornam inimigos de todos os outros e são capazes de "quebrar" a vontade coletiva em prol de seu próprio bem (Aqui se presume, principalmente, ascensão econômica) . E o desafio da “política” é ordenar todas essas vontades pessoais de forma que elas sirvam como engrenagens desse sistema e funcionem em prol de um bem comum. Muito diferente dessa concepção de Hobbes, o Autor menciona Locke, imaginando que a solidariedade do Soberano não contemplaria nada além de si próprio, o outro burguês acredita que ao existir na sociedade civil, o indivíduo abandona dois princípios: fazer tudo pela sua sobrevivência e seguir exclusivamente as leis naturais. Portanto, se torna possível o fim da conservação absoluta das propriedades. Dessa forma, o homem se torna refém da jurisdição do governo acerca de suas propriedades, mas presume que o mesmo não o utilizará para sua ruína e que o contrário disso seria um completo absurdo. O Autor sintetiza que o esquema proposto por Hobbes, limita ao máximo o poder, o estabelecendo como um instrumento dos proprietários. Já Locke o enxerga como uma superestrutura confiada a indivíduos que serão vigiados e rigorosamente analisados por outros indivíduos. Entende-se então que, para Locke a ideia proposta em “O Leviatã” de Hobbes o ser humano frente a um soberano absoluto se colocaem estado de natureza completa sem conhecimento de um mediador a quem possa recorrer. Pode-se concluir com a dissolução dos dois pensadores burgueses, que o Poder é apenas uma estância com função social determinada. Não o núcleo da política. E assim, para o autor, deve-se temer o abuso do poder. Pois, retornar ao estado de completa natureza coloca o indivíduo em contraposição a outros indivíduos isolados, e não em contraposição a um soberano com milhares de subordinados. Neste ponto da obra passa a se pensar a trajetória e a origem do liberalismo no século XIX. Rousseau e Constant compartilham de alguns pensamentos que se complementam e suscitam algumas questões. Se a “vontade geral” é soberana ou tem alto grau de “força” sobre a sociedade civil, a quem deve pertencer a arbitragem deste poder? Entendendo que a sociedade é natural e a esfera social política não caracteriza-se pela desnaturação da mesma, o poder estabelece-se como apenas uma função, a qual o desempenho bom ou mal cabe ao povo avaliar. Daí admite-se uma sociedade a qual determina pela “vontade geral” admite um poder não repressivo e mais compreensivo para com os cidadãos. Esta determinação geral, no entanto, é limitada e não interfere na liberdade de opinião, liberdade religiosa, e principalmente gozo da propriedade, importante aspecto do liberalismo. Todavia, Rousseau admite o ser natural como um ser solitário e que apenas será livre com a segurança de que não lhe farão mal e com o pleno exercício da soberania absoluta. Concebendo o indivíduo da sociedade civil com essa premissa, o autor sugere que este não é o indivíduo que o Poder do Estado visa proteger, porque este reivindica sua liberdade à beira do limite do sistema. Assim se estabelece uma relação conflituosa e o poder do Estado, como propõe o autor Jean Baptiste Say, tem como primordial função a manutenção social pela proteção a violência, outros aspectos ficam no escopo da vontade individual de cada indivíduo ou classe de indivíduos. Finalmente, é possível entender que a base a qual se sustenta o liberalismo é uma análise simplória e fraudulenta do problema social pautado apenas na relação indivíduo versus estado. E o controle social que o Estado exerce sobre as atividade individuais aparenta ser irreversível. Durkheim a respeito disso, afirmou que não apenas as classes tidas como “inferiores” que almejam as rédeas do aparelho político, mas também o próprio Estado, que a medida que as expressões econômicas tomam espaço, passa a vigiá-las e regular suas manifestações, ainda que, sua atuação se limite-se a isto, claramente. E por consequência, com o aumento das atividades econômicas e todas as suas influências na sociedade civil, o papel do Estado torna-se cada vez menos garantir a liberdade, mas sim assegurar a segurança e a não privatização de direitos detidos pela maior classe. Isso se dá, não por tendência “marxista”, mas sim pela própria conservação da unidade. Manutenção da vontade geral. Alexis de Tocqueville, levanta o questionamento: como fugir do despotismo administrativo em uma democracia? Como combinar o povo com a exerção do poder, sem que nenhum se esvazie de sentido? Tocqueville, não tem um conceito bem estabelecido de democracia, sua concepção baseia-se em um estado com a ausência hierárquica da nobreza e fortes tendências a igualizar as condições entre os indivíduos, mas não admite como “democrático” um Estado que apesar de, redirecionar suas leis e projetos para a garantia de bem-estar social, não têm atuação do povo em suas dinâmicas políticas. Para o mesmo, o desafio a se enfrentar nas sociedades democráticas, é o individualismo que fomenta o isolamento e a fraqueza dos indivíduos. Sendo sua solução, a participação efetiva nos negócios públicos, para que a ação em conjunto promova a ideia de uma interrelação entre todos. Aliás, neste contexto, o autor faz uma crítica à ideologia Marxista que, para ele, se baseia na subestimação do político, forte característica em pensadores do século XIX. Para ele, um super-estado poderia controlar as condições de produção sem uma dominação e favorecimento de uma parcela seleta da população. O mesmo acredita, diferentemente de Marx, que o poder político não é única e exclusivamente opressor. O autor dedica ao último capítulo, denominado “O último mestre", além da crítica a Marx, para retomar as inúmeras vezes que o “poder” foi limitado, mal compreendido, subestimado, resignado, ou até depreciado, propondo que sua atuação está muito além da proteção da liberdade, da segurança de direitos básicos ou da manutenção dos negócios econômicos, e ainda assim, não passa de uma única e franca questão política.
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