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Tuyuka - Povos Indígenas no Brasil

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Tuyuka - Povos Indígenas no Brasil
Os Tuyuka são gente da transformação, pois se originam da Cobra da
Transformação. Única no início da viagem ancestral, a cobra, depois de alcançar
o alto curso do rio de Leite (o Negro), se reproduz em várias outras, que tomam
rumos distintos, seguindo pelos afluentes dos rios Negro e Uaupés. Os Tuyuka
são os Filhos da Cobra de Pedra. No decorrer da viagem ancestral, esses povos e
suas línguas se diferenciaram, alguns permaneceram como parentes entre si,
enquanto outros se tornaram aliados. 
Os Tuyuka são um dos povos da família linguística Tukano Oriental do Noroeste
Amazônico, habitando a fronteira entre o Brasil e Colômbia. 
Nomes
Os Tuyuka autodenominam-se Ʉtapinopona ou “Filhos da Cobra de Pedra”.
Este nome é usado em momentos cerimoniais.
Há um outro que é empregado coloquialmente: Dokapuara, cujo significado
literal é “aqueles que socam e tingüijam” [este último verbo faz referência à
utilização do timbó, veneno de pesca].
Os Tukano os chamam de Diikana ou Diikara (“gente argila”), de onde deriva a
designação em Nheengatu (língua geral amazônica): Tuyuka.
Língua
Língua tuyuka
O tuyuka é a lingua dominante nas comunidades desse grupo do alto rio Tiquié e
alto rio Papuri, usada nas reuniões comunitárias pelos homens e jovens, língua
padrão para transmissão dos conhecimentos do grupo, o que restringe aos
homens o acesso a certos conhecimentos e a certas formas de comunicação,
próprias do seu grupo linguístico.
Mas o grupo local é também lugar de uma pluralidade de línguas faladas pelas
mulheres que se casam com os homens tuyuka. No âmbito doméstico, a criança
tuyuka fala pelo menos duas línguas, a do pai (tuyuka) e a da mãe (tukano, bará,
dentre outras), tendo mais intimidade, inicialmente, com a língua da mãe. Esse
fato garante a persistência do multilinguismo. Na socialização da criança deve-se
levá-la a compreender que há mais de uma subcomunidade lingüística no seu
campo social. E a, progressivamente, substituir a língua da mãe, pela do pai.
Multilinguismo na região do alto Tiquié
O multilinguismo característico do Alto Rio Negro e Uaupés combina, na região
do alto rio Tiquié, falantes sobretudo das línguas tuyuka, tukano, bara,
yebamasa, além do português e espanhol, conforme o grupo local se situe do
lado brasileiro ou colombiano da fronteira, e do hupda (população Maku ou
Nadahup). 
No censo lingüístico realizado no ano 2000 no alto rio Tiquié observou-se
https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Tukano
https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Tukano
http://pib.socioambiental.org/pt/c/no-brasil-atual/linguas/linguas-gerais
http://pib.socioambiental.org/pt/c/no-brasil-atual/linguas/linguas-gerais
https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Bar%C3%A1#L.C3.ADngua
https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Bar%C3%A1#L.C3.ADngua
http://pib.socioambiental.org/pt/c/no-brasil-atual/linguas/multilinguismo
http://pib.socioambiental.org/pt/c/no-brasil-atual/linguas/multilinguismo
http://pib.socioambiental.org/pt/povo/etnias-do-rio-negro/1524
http://pib.socioambiental.org/pt/povo/etnias-do-rio-negro/1524
https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Hupda
https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Hupda
comunidades onde são faladas cinco línguas, até comunidades onde são faladas
doze línguas diferentes, resultado principalmente da exogamia linguística (regra
que exige que os cônjuges sejam de diferentes grupos de descendência e,
portanto, linguístico).
Tendências de tukanização e política linguística entre os
tuyuka do alto Tiquié
Enquanto existe, na região do Uaupes como um todo, cerca de 20 mil falantes da
língua tukano, as outras línguas desta família – tukano oriental - são faladas por
populações menores, predominando em regiões mais limitadas, como é o caso
da língua tuyuka.
Em algumas comunidades ou grupos locais tuyuka localizados em território de
ocupação tukano, crianças tuyuka começaram a deixar de falar sua própria
língua, usando mais o tukano. Os Tuyuka do igarapé Onça, assim como os do
Cabari, estavam abandonando o uso da própria língua, substituída pelo Tukano.
No caso do igarapé Onça, o processo começou a ser revertido com a participação
dos moradores da comunidade na Escola Tuyuka, onde foram matriculados
crianças e jovens. Já os Tuyuka dos igarapés Cunuri e do Pirá (na Colômbia)
sempre mantiveram sua língua, embora habitando em áreas de predomínio da
língua makuna.
Mesmo nas comunidades tuyuka mais centrais, devido à proximidade e
influência da língua tukano, os jovens vinham usando mais a língua tukano entre
eles. Quando alunos tuyuka frequentavam a escola de Pari-Cachoeira para
cursar a segunda parte do ensino fundamental ou o ensino médio, antes
oferecido apenas naquele local, voltavam para casa com essa forte preferência
de usar o tukano entre si.
Durante algumas oficinas de política linguística no início na Escola Tuyuka (que
surgiu no final dos anos 1990) os Tuyuka observaram outros aspectos que
revelavam a diferença de poder entre as línguas tuyuka e tukano. No encontro
entre três crianças tuyuka com uma tukano, as tuyuka tendiam falar tukano.
Observaram claramente também como o plurilinguismo é muito mais comum
nas gerações mais velhas do que nas mais jovens. O que pode ter relação com a
tendência de tukanização e também com a influência forte do português em
comunidades mais próximas dos centros missionários ou urbanos. É importante
notar que processos de deslocamento lingüístico são bastante comuns na região,
e já haviam relatos similares antes da atuação mais intensiva das missões e da
escolarização (ver, por exemplo, Koch-Grünberg, [1909] 1967).
Caso as tendências de tukanização continuassem muito fortes, poderiam levar ao
desaparecimento do tuyuka, como já aconteceu com muitas línguas indígenas no
mundo. E também já aconteceu em alguns grupos locais tuyuka que se
afastaram dos territórios de seus avós. 
Nos últimos dez anos, os tuyuka do alto rio Tiquié estão conduzindo um
processo de planificação lingüística, com diagnósticos comunitários freqüentes
da situação da língua tuyuka em relação às demais línguas Tukano Orientais e ao
português, e ordenando ações no campo da oralidade e da escrita, fora e dentro
das escolas. Assumiram, no âmbito das comunidades do alto Tiquié e da escola
Tuyuka, a política de estimular novamente a língua (em casa, na comunidade,
em escolas etc.).
Localização
https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Makuna#L.C3.ADngua
https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Makuna#L.C3.ADngua
Os Tuyuka consideram a região da cachoeira Yurupari (localizada no alto rio
Uaupés, na Colômbia) o seu território tradicional, pois foi ali que se deu a sua
transformação primordial. Ainda hoje, em suas cerimônias, referem-se a essa
área como fonte de vida e poder, como sua casa, de onde trazem os nomes para
seus filhos. 
A região ocupada hoje pelos Tuyuka compreende um trecho do alto rio Tiquié,
uma área de interflúvio dos rios Tiquié e Papuri, que é drenada pelos igarapés
Abiu (afluente do Tiquié) e Inambu (afluente do Papuri), e uma outra área de
interflúvio do Tiquié com o igarapé Machado (Komeya em Tuyuka). 
Os rios Tiquié e Papuri, por sua vez, são afluentes do Uaupés, um dos grandes
formadores do rio Negro. A foz do Uaupés fica a montante da cidade de São
Gabriel da Cachoeira, principal centro urbano da bacia do rio Negro depois de
Manaus.
Apesar de ocuparem um território geograficamente contínuo, os Tuyuka
dividem-se em dois subgrupos principais, separados por razões histórico-sociais
específicas, entre os quais se verifica pouca proximidade social: o grupo do
igarapé Inambu e o grupo do Tiquié.
Dados populacionais
Em revisão feita em 2008 (Cabalzar, 2009), considerando as fontes mais
confiáveis, os Tuyuka estavam distribuídos em 19 grupos locais, cuja população
variava entre 7 e 149 pessoas. A população total de dezoito desses subgrupos
somava 988 pessoas, mas o número seguramente ultrapassava 1.200 pessoas,
considerando os Tuyuka de Vila Nova (baixo Tiquié) e de povoados de outros
grupos de descendência, onde há Tuyukacomo aliados, em moradias mais ou
menos permanentes (como Bela Vista, Pari-Cachoeira, São Paulo do Tiquié e
San José del Timiya), sem contar aqueles que vivem em cidades - em São
Gabriel, segundo levantamento (Lasmar et al., 2005), há 71 tuyuka.
Atualmente (2014), com programas do governo federal que desfavorecem a
permanência das famílias indígenas em suas comunidades, como é o caso do
Programa Bolsa Família (que exige que as mesmas façam deslocamentos de
vários dias para acessar os recursos da bolsa), é possível que essa população
esteja mais dispersa e a população tuyuka em seus próprios territórios tenha
decrescido, principalmente no lado brasileiro. Esse levantamento está por ser
feito. O que é certo é que há uma maior mobilidade das famílias entre suas
comunidades, por mais distantes que sejam, e a cidade de São Gabriel da
Cachoeira.
Contexto regional
Os povos Tukano Orientais estão representados, além dos Tuyuka, por dezoito
grupos linguísticos.
A região do Noroeste Amazônico, como um todo, assume o aspecto de um vasto
sistema social formado por vários grupos lingüísticos inter-relacionados.
Os Tuyuka mantêm relações diversas com os outros povos Tukano: com alguns,
estabelecem intensas trocas matrimoniais (principalmente com os Tukano, Bará
e Yebamasa); com outros, esse tipo de união é vetado, pois são concebidos como
irmãos que se separaram geograficamente no passado. 
http://pib.socioambiental.org/pt/povo/etnias-do-rio-negro/1524
http://pib.socioambiental.org/pt/povo/etnias-do-rio-negro/1524
http://pib.socioambiental.org/pt/povo/etnias-do-rio-negro/1524
http://pib.socioambiental.org/pt/povo/etnias-do-rio-negro/1524
https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Etnias_do_Rio_Negro
https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Etnias_do_Rio_Negro
https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Tukano
https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Tukano
https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Bar%C3%A1
https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Bar%C3%A1
https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Makuna
https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Makuna
Atualmente, os Tuyuka habitam uma região distante de onde estão os povos
Aruak, como os Baniwa do Içana e os Baré do rio Negro. Relações diretas com os
Baniwa e Kuripako ocorreram no passado, quando os Tuyuka moravam no alto
Uaupés. Guerras entre esses grupos, que também envolviam os Kubeo,
determinaram o afastamento geográfico, com os Tuyuka retirando-se mais para
o sul. 
Hoje, as relações ocorrem tanto nos encontros na cidade de São Gabriel da
Cachoeira, centro político-comercial e regional comum de serviços, quanto no
âmbito do movimento indígena, ou seja, nos intercâmbios entre as escolas
indígenas, nas reuniões e assembleias da Federação das Organizações Indígenas
do Rio Negro (FOIRN) etc.
Os sibs tuyuka
Os Tuyuka, assim como todos os outros grupos indígenas da região do alto rio
Negro (incluindo os Maku e os Aruak da bacia do rio Içana-Ayari e do rio Xié) e
do rio Pirá-paraná, são constituídos por grupos de descendência patrilinear
nomeados e hierarquizados (os sibs ou clãs). O que mantém a estrutura é a
noção de uma ancestralidade comum. Partindo do âmbito do grupo linguístico
para seu interior, essa noção é permanentemente atualizada por meio de
procedimentos rituais. 
por Stephen Hugh-Jones, King´s College - Universidade de Cambridge.
2003.
Os grupos Tukano são patrilineares e exogâmicos, isto é, os indivíduos
pertencem ao grupo de seu pai e falam a sua língua, mas devem se casar com
membros de outros grupos, idealmente falantes de outras línguas.
Externamente, os grupos são equivalentes mas distintos; internamente, cada um
consiste em um número de clãs [N.E: também chamados sibs] hierarquicamente
ordenados.
Os ancestrais desses clãs eram os filhos do primeiro ancestral Anaconda e a sua
ordem de nascimento, que corresponde à ordem de emergência do corpo de seu
pai, determina a sua classificação: os clãs de posição mais alta são coletivamente
considerados "irmãos maiores" para aqueles de posição mais baixa. A posição do
clã é associada a uma hierarquia, sendo ainda frouxamente correlacionada a
residência: os clãs de mais alto grau tendem a viver em lugares mais favoráveis
nas partes mais baixas dos rios, enquanto os clãs de menor grau freqüentemente
vivem nas áreas de cabeceiras ou as partes mais altas dos rios.
https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Baniwa
https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Baniwa
https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Bar%C3%A9
https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Bar%C3%A9
http://pib.socioambiental.org/pt/povo/coripaco
http://pib.socioambiental.org/pt/povo/coripaco
https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Kubeo
https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Kubeo
http://www.foirn.org.br/
http://www.foirn.org.br/
http://www.foirn.org.br/
http://www.foirn.org.br/
Piutr Jaxa, antigo habitante de Pari-Cachoeira, no Uaupés, e que
atualmente vive na Terra Indígena Balaio. Foto: Piort Jaxa, 1993.
A classificação do clã também tem os seus correlatos rituais: os clãs de posição
mais alta, as "cabeças da Anaconda", são "chefes" que patrocinam os principais
rituais e controlam os ornamentos de dança do grupo e os Yurupari; os clãs de
posição mediana são especialistas de danças e cânticos; abaixo deles são os
xamãs; e o grau mais baixo é ocupado pelos clãs servos, a "cauda da Anaconda",
que por vezes são identificados com os semi-nômades Maku que vivem nas
zonas interfluviais.
https://img.socioambiental.org/d/209281-1/uaupes_7.jpg
https://img.socioambiental.org/d/209281-1/uaupes_7.jpg
Índios Wanana. Foto: Curt Nimuendaju, década de 1930.
Essa hierarquia de papéis especializados e privilégios rituais fica muito evidente
durante os rituais coletivos em que se recitam as genealogias e enfatizam-se as
relações hierárquicas e de respeito. De modo mais sutil, essa hierarquia reflete-
se também na vida cotidiana. Os habitantes de uma maloca comumente
correspondem a um grupo de homens estreitamente aparentados, como os
filhos do mesmo pai ou de dois ou mais irmãos, que vivem juntos com as suas
esposas e filhos. Quando uma mulher se casa, ela deixa a sua maloca natal e vai
morar junto com seu marido. Hoje, no lado brasileiro, as malocas geralmente
não são usadas mais como residência, mas como casa de festa, de encontros e
refeições comunitárias e cerimonial.
Os Tuyuka distribuem-se atualmente em quinze sibs. Alguns, não mencionados
no quadro abaixo, ainda são lembrados por seu nome e por suas relações com
outros sibs, mas estão provavelmente extintos. À pergunta “mʉ yabu wame?”
(“qual é o nome de seu sib?”), os Tuyuka respondem, de fato, o nome do
correspondente sib; o termo yabu é o que melhor se aproxima, em tuyuka, da
noção de sib.
Habitações de ontem e de hoje
Os grupos locais tuyuka de hoje não se inscrevem mais nas fronteiras de uma
maloca. Até 1970, ainda era comum no lado brasileiro (caso de São Pedro,
Puniya e Ilha, acima de Cachoeira Comprida) a construção da maloca, usada
tanto como residência por parte do grupo - geralmente de seu chefe e a
respectiva família, com os filhos casados e alguns agregados - quanto como
centro da vida local (em certos casos, supralocal) e em torno da qual orbitavam
eventuais casas e sítios menores. Durante as cerimônias mais importantes do
https://img.socioambiental.org/d/209284-1/uaupes_8.jpg
https://img.socioambiental.org/d/209284-1/uaupes_8.jpg
ciclo ritual anual, a maloca recebia pessoas de vários lugares, entre parentes da
mesma língua e aliados. Para obter mais informações sobre essas cerimônias, ver
Ritual (na seção Etnias do Rio Uaupés).
Podemos atribuir as mudanças que se processaram entre os vários povos da
região, em certa medida, à intervenção contundente dos missionários salesianos,
por exemplo na insistência dos padres no abandono da maloca. Entretanto, essa
interferência não se deu por igual. Nos povoados tuyuka localizados na
Colômbia, as malocas continuaram a ser construídas, uma vez que a presença de
salesianos era ínfima e a atuação dos missionários javerianos foi tardia e branda,
iniciada nadécada de 1970. Mas mesmo lá se verificou o advento do “povoado”,
isto é, a ruptura da maloca como moradia comum a todo o grupo de parentes
(patridescendentes) co-residentes e sua dispersão em casas familiares. 
As malocas foram e continuam sendo construídas por trabalho comunitário e
nelas se realizam os rituais e cerimônias do grupo local (caxiris, dabucuris etc.).
Entre os Tuyuka que vivem no Brasil, a ausência da maloca gerou dificuldades,
uma vez que as práticas rituais, que nela tinham seu espaço por excelência,
continuaram sendo realizadas. Foi preciso construir outros tipos de casa, que
preservassem algumas estruturas necessárias para a prática das danças rituais.
Passado o período mais intenso da atuação missionária, as malocas voltaram a
ser construídas, agora como centro de rituais e de convivência do grupo local,
com a realização de refeições comunitárias, reuniões e assembléias das
associações, encontros e hospedagem, além das festas tradicionais. 
Em 1995, foi feita uma maloca em Cachoeira Comprida, que passou a ser o
centro ritual dos Tuyuka por vários anos. Em São Pedro antigo, Pikõroaburo,
havia uma palhoça que depois foi adaptada para maloca. Uma outra foi
construída posteriormente, em Mõpoea ou São Pedro novo.
Hoje no Tiquié, em ambos os lados das fronteiras nacionais, os grupos locais são
formados por vilas de casas, com uma casa comunitária e algumas outras
benfeitorias, como prédio da escola, posto de saúde e capela. No alto Tiquié, as
malocas estão presentes em todos eles, sendo algumas habitadas no lado
colombiano, mas junto com outras casas.
Subgrupos e grupos locais
Os Tuyuka vivem hoje em quatro subgrupos/territórios. Separados por razões
histórico-sociais específicas, cada subgrupo ocupa hoje um território ou trecho
de rio diferente. Entre esses diferentes subgrupos não existem relações
permanentes ou estreitas, porque estão afastados geograficamente.
Internamente a cada um destes subgrupos prevalecem os parentes tuyuka, com
intercâmbios rituais e predomínio da própria língua.
1. Subgrupo do igarapé Inambu, rio Papuri
Nessa área localizam-se os sibs tuyuka de mais alto nível hierárquico (ver item
abaixo sibs tuyuka). Ao longo do processo migratório tuyuka, eles
permaneceram na região do alto rio Papuri, enquanto outros se deslocaram para
o rio Tiquié. (Ver narrativa mitohistorica) São oito povoados, sendo que seis
deles estão no Inambu (igarapé da margem direita do alto Papuri), um povoado
no rio Papuri propriamente dito, e o último no Tiquié (atual missão de Trinidad
na Colombia).
Nome regional Nome tuyuka Localização
Los Angeles Umuyapito Papuri (Colômbia)
Acima de Santa Rita ? Inambu (alto, Colômbia)
Abaixo de Santa Rita Yepupuna Inambu (alto, Colômbia)
Belém Apʉratʉdi Inambu (alto, Colômbia)
- Sʉperotʉdi Inambu (médio, Colômbia)
- Ñariñápito Inambu (médio, Colômbia)
- Numuña Inambu (médio, Colômbia)
Santa Cruz Ñokõatʉdi Inambu (baixo, Brasil)
Trinidad Miñoburo Alto Tiquié
2. Subgrupo do alto rio Tiquié, entre Caruru Cachoeira e o
igarapé Abiu
O subgrupo que hoje habita o curso principal do Tiquié se distribui nos
povoados entre a cachoeira de Caruru e o povoado de Pupunha, já em território
colombiano, e um povoado no igarapé Abiu, afluente da margem esquerda do
alto rio Tiquié. Todos esses grupos locais são liderados por homens de
segmentos do sib Opaya, o de mais alta hierarquia do Tiquié (à exceção do sib de
Trinidad) e o mais numeroso entre os sibs tuyuka. Distribuem-se em cinco
povoados.
Nome regional Nome
tuyuka
Localização População
(2006)
São Pedro Mopoea Rio Tiquié (Br) 115
Cachoeira
Comprida
Yoariwa Rio Tiquié (Br) 78
Fronteira Kairataro Rio Tiquié (Br) 22
Pupunha Ʉnekumuya Rio Tiquié (Col) 62
Bellavista Buepesariburo Igarapé Abiu
(Col)
149
Total 426
3. Subgrupo do Cabari
Fazem parte de um conjunto de quatro sibs, sendo um deles o líder ver item
complementaridade entre os sibs. Eles chegaram no rio Tiquié por outro
caminho. Enquanto os grupos locais do alto rio Tiquié vieram pelos igarapés
Inambu e Abiu liderados pelo sib tuyuka Opaya, o pessoal do Cabari veio
diretamente do Papuri, sem passar pelo igarapé Abiu. Vieram com seus afins
tukano do sib Bosoapora e habitaram primeiro o igarapé Umari-Norte. Mais
tarde desceram até a foz deste igarapé, ocupando localidades do próprio rio
Tiquié entre a foz deste afluente e a cachoeira Caruru. Justamente esse trecho,
que foi abandonado posteriormente pelo pessoal do Cabari, é hoje ocupado
pelos Opaya do subgrupo do alto Tiquié, especialmente pela comunidade de São
Pedro ou Mõpoea.
4. Subgrupo da área entre o Onça, o alto Castanha e o
Komeya
Todos os Tuyuka que habitam os igarapés Onça, Castanha e Cunuri (afluente do
Komeya, ou igarapé Machado) e a foz do próprio Komeya, são do sib tuyuka
Dasia, da mais baixa hierarquia e o mais disperso geograficamente.
Nome regional Nome
tuyuka
Localização População
(2006)
Assunção Yaiñiriya Onça 55
Guadalupe Watĩyʉde Castanha 25
Morro de Acutivaia,
Maloca de Domingos
Bosoburo Cunuri 22
Maloca de Hugo Cunuri 12
San Luis Komeyapito Pirá-paraná 40
Total 154
Para além dessas áreas, existem grupos locais tuyuka em outras regiões: no
baixo Tiquié (especialmente na comunidade de Vila Nova); em outros povoados
não tuyuka; ou que migraram para centros urbanos regionais, como São Gabriel
da Cachoeira, Santa Isabel do Rio Negro e Manaus, no Brasil, ou Mitú e San Jose
de Guaviare, na Colômbia.
Atividades produtivas e a divisão do trabalho
A mandioca brava é o principal cultivo, ocupando entre 80 e 90% da área das
roças. Nas roças feitas em mata virgem tem mais espaço o plantio de frutas e
palmeiras, como cucura, pupunha, umari, banana, pimentas, abiu e vários outros
tipos de tubérculos e batatas, inclusive mandioca macaxera. Nos roçados de
capoeira, a mandioca engorda mais rápido e as frutas não crescem tão bem, por
isso são menos cultivadas. 
Cada família tem entre três e cinco roças, algumas de capoeira e outras de mata
virgem, abertas e plantadas em anos subseqüentes, conforme as diferentes fases
de crescimento e manejo. Por isso, no trabalho diário, a mulher pode planejar
extrair mandioca de uma das roças, preparar mudas em outra, e colher abacaxi
ou outra fruta madura em uma terceira. Isso é possível quando as roças estão
próximas umas das outras, ou ocupam uma mesma área, caminho ou rota pelo
rio. Áreas que já foram muito usadas são deixadas para descansar por mais
tempo.
A indústria da mandioca é muito desenvolvida entre os povos Tukano, sendo a
base de uma dieta muito calórica e que se mantém regular durante todo o ano, já
que o tubérculo tem produção contínua e fica armazenado no próprio solo. A
venda de farinha é comum na região, sobretudo para o povoado-missão de Pari-
Cachoeira, comerciantes que aí chegam e, cada vez mais, levada até a cidade de
São Gabriel da Cachoeira, onde tem encontrado preços ascendentes nos últimos
anos. 
A farinha utilizada é feita com mandioca-puba (deixada amolecer dentro d’água
por um período de três a cinco dias). Em geral, uma grande produção de farinha
só é possível quando há cooperação entre as mulheres do grupo doméstico.
Coloca-se para pubar uma grande quantidade de mandioca (entre 50 e 100
quilos), que é carregada com ajuda do marido e, se possível, das filhas jovens.
Depois de a mandioca ser ralada e espremida no tipiti, adicionam uma parte de
massa de mandioca espremida no cumatá [instrumento circular trançado de
arumã fechado para lavar a massa de mandioca] e torram no forno. Hoje são
comuns os fornos de ferro, com diâmetro de aproximadamente 120 centímetros,
mas antigamente usavam-se os de argila, ainda bastante comuns na Colômbia. O
mesmo forno é usado para fazer beiju e torrar folhas de coca para o ipadu (um
pó feito da mistura das folhas queimadas da coca e da embaúba). 
A produção de tapioca em grande quantidade é quase diária, pois garante a
produção do beiju de tapioca (sidariro) todos os dias. Esse trabalho é das
mulheres e toma boa parte de seu tempo, uma vez que também demandair
buscar água e lenha, esta usada tanto para assar o beiju no forno quanto para o
preparo da manicuera, bebida adocicada que resulta do longo cozimento do
tucupi. O longo tempo reservado ao processamento da mandioca, para a
produção de tapioca, ingrediente principal do beiju e da manicuera, é o
diferencial da indústria da mandioca na região do alto rio Negro.
As mulheres também são responsáveis por produzir caxiri, trabalho bastante
dispendioso. Há batatas cultivadas com a finalidade principal de servir de
tempero ao caxiri, que é feito com beiju queimado e dissolvido com manicuera.
Ao caxiri, acrescentam a batata mastigada e deixam o caldo fermentar dentro de
um cocho de madeira escavada ou camoti (pote de cerâmica para fermetação de
caxiri), que é tampado com folhas de bananeira ou com um pedaço de plástico
ou lona. Na véspera do consumo, durante a madrugada, as mulheres coam o
caldo. Quando se deseja um teor alcoólico mais elevado, adiciona-se caldo de
cana ou, mais recentemente, de açúcar. Os homens ajudam a carregar e rachar a
lenha e a espremer a cana.
Como diz Rezende (2007), “os Tuyuka dão muita atenção para a especificação
de atividades do homem e da mulher”, havendo uma clara divisão do trabalho.
Os homens muito raramente, só por necessidade, sabem desempenhar as
atividades femininas. A grande maioria não sabe fazer mingau ou beiju, por
exemplo, tampouco todas as etapas prévias de produção desses alimentos. 
As atividades rotineiras dos homens são pesca, caça, coleta de frutos na floresta,
fabricação de utensílios domésticos (com exceção da cerâmica) e ferramentas de
trabalho, construção e manutenção das edificações, além de preparar (roçar e
derrubar) novas áreas para roça. Alguns vão quase todos os dias às roças com
sua mulher, ajudando no manejo e no transporte de mandioca e lenha para casa.
Outros são mais dedicados às pescarias e caçadas, saindo com frequência à noite
ou em viagens mais longas, de alguns dias, em direção a lugares menos
frequentados, como o alto curso dos igarapés maiores ou os bebedouros de anta.
Nessas ocasiões, levam os filhos maiores ou vão em dupla com outro homem. 
Uma forma de caçar paca muito praticada na região é fachear à beira do rio, à
noite, com lanterna a pilha; quando focalizada, a paca fica estática, e é alvejada
com espingarda de cartucho. Esse tipo de caçada só dá resultado com o rio mais
baixo e a paca precisa chegar a ele para beber água. Usam lanterna também para
fachear peixes, fisgados com zagaia. A pesca requer um bom conhecimento do
rio, dos hábitos dos peixes e das técnicas de pescaria. No alto Tiquié, onde é
maior a escassez de pescado, é fundamental um bom domínio desses
conhecimentos e técnicas, caso contrário pouca coisa se consegue. Há muitos
instrumentos de pesca disponíveis, empregados de acordo com o horário do dia
ou o nível do rio (Cabalzar (org.), 2005). 
Para obter outras informações sobre os modos de vida dos povos do alto rio
Negro, ver Cotidiano dos índios do rio, na seção Noroeste Amazônico.
Calendário anual
http://pib.socioambiental.org/pt/povo/etnias-do-rio-negro/1534
http://pib.socioambiental.org/pt/povo/etnias-do-rio-negro/1534
Calendário anual tuyuka
O calendário tuyuka é baseado na observação astronômica, da passagem das
diversas constelações, como descritas e nomeadas pelos tuyuka. A este ciclo
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anual está associado o regime de chuvas e estiagens e a variação do nível das
águas dos rios. As alternâncias neste regime são denominadas de acordo com a
posição das constelações. Os Tuyuka assinalam a existência de treze enchentes e
oito estiagens. A designação da maior parte delas combina o nome e a palavra
“verão” (k¡ma) ou “inverno” (pue). A duração de cada uma delas é variável,
sendo que uma ou outra pode mesmo deixar de ocorrer em determinado ano,
conforme o verão seja mais forte ou as chuvas mais prolongadas. 
Atualmente os Tuyuka usam tanto o seu calendário astronômico quanto o
ocidental e católico para organizar suas atividades anuais, buscando
correspondências. No final de junho, por exemplo, foi adotado o “verão de São
João”, chamado em tuyuka sã ñu k¡ma. 
Na narrativa do ciclo anual feita pelos conhecedores indígenas, os eventos e as
atividades de subsistência destacados são os períodos de floração e frutificação
das palmeiras e outras árvores frutíferas; os períodos de revoadas de diferentes
espécies de formigas e cupins; o período das piracemas de aracu, jandiá e piabas
e de desova de traíra, do aparecimento das rãs grandes e das pequenas; as
melhores épocas para derrubar a mata e a capoeira e para fazer a queima e
plantar. 
A região que os Tuyuka habitam no alto Tiquié está situada a montante de
algumas cachoeiras grande, que impedem a subida das espécies maiores de
peixe. Nessa altura o rio já é de menor porte e, portanto, mais restrito em
pescados. Seu nível varia mais com as chuvas e estiagens.
O ano é definido pelo ciclo da constelação Ñokõatero (Plêides). Quando ela
aponta no nascente pela madrugada é sinal de novo ano. Neste período é
comum as madrugadas aparecerem com um nevoeiro frio (¡s¡aré), é quando
faziam a iniciação masculina (coincide aproximadamente com os meses de maio
e junho, tempo da iniciação).
Quando Ñokõatero aparece ao anoitecer, mais no centro do céu, é tempo para
fazer roçado. Neste tempo fazem festa para y¡k¡ masa (“gente das árvores” ou
“espírito das árvores”), para amansá-los e não causarem doenças (diarige
upioro b¡reko, “dia de proteção contra doenças”). Coincide aproximadamente
aos meses entre dezembro e fevereiro.
Os verões mais fortes ocorrem quando, ao anoitecer, Ñokõatero está na posição
da três horas da tarde (do sol) no céu. Quando, ao anoitecer, aparece em posição
das quatro horas (do sol), já começa a chover mais. 
Fazem uma festa para queimar bem e cantam Yuabasá; neste ritual lembram-se
dos karayaíwa, um sib tuyuka já extinto há muito, servo de todos os outros, mas
que tinha os pajés mais fortes. Eles começaram a confeccionar os adornos de
cabeça (mapoari) e precisavam secá-los bem, por isso pediram verão forte nesta
época. Foi assim que também fez Yarigebo (o personagem mítico que dá origem
às roças e cultivos) quando foi queimar a roça para suas duas esposas, filhas de
Wariro. Ele se enfeitou bem para queimar tudo, por isso falou com as mulheres
para não irem lá enquanto queimava. No passado, os rezadores, para queimar
bem, incorporavam todos os ornamentos na roça a ser queimada; hoje não
fazem mais porque as mulheres não poderiam ir menstruadas na roça, prática
proibida antigamente.
O inverno, período das chuvas, é genericamente chamado puriro. Começa com
outra festa, para pedir aos wai masa (literalmente “gente peixe”, mas que
designa um conjunto mais amplo de seres “espirituais”, mal traduzindo) para
dar mais fartura na piracema (waitunire). Wai masãre sañunire añuro tuniarõ
(que façam boa piracema). Neste ritual eles preparam os coxos deles, limpam a
casa, oferecem caxiri, ipadu, para que os peixes façam um bom dabucuri.
Dançam wai basa. Corresponde ao período de final de março, começo de abril.
A reza é como se fosse um dabucuri de wai masa: e no rito eles preparam
caxiri, caapi, etc para as próprias famílias. (texto produzido a partir de
conhecimentos de Guilherme e Higino Tenório)
Especialistas religiosos
O benzedor e o mestre-de-cerimônias
Alguns homens desempenham atividades especializadas, como a de benzedor
(kumu) e mestre-de-cerimônias (baya). Os primeiros são homens mais velhos,
procurados para fazer os benzimentos que acompanham o ciclo de vida de uma
pessoa (nascimento, primeira menstruação etc.) ou que atuam em casos de
doenças. Os bayaroa [plural de baya] são aqueles que cantam e dançam nos
grande rituais, vestidos com os ornamentos cerimoniais. 
Hoje, as grandes cerimônias do ciclo anual são menos frequentes, sobretudo
aquelas com participação intercomunitária. Os Tuyuka vivem em posição
intermediária,entre os Tukano, rio abaixo, que abandonaram as práticas rituais
tradicionais, e os Bará do alto Tiquié e os grupos do Pirá-paraná, entre os quais
esses ciclos ainda se realizam. Os bayaroa tuyuka estão mais concentrados no
lado colombiano, algumas vezes são convidados para dançar nos povoados
tuyuka do lado brasileiro. 
Especialistas religiosos nas etnias do Rio Uaupés
por Stephen Hugh-Jones, King´s College - Universidade de Cambridge.
2003.
Entre os Tukano, a religião não é concebida como um domínio discreto, mas sim
como uma dimensão de todo conhecimento, experiência e prática. Isso também
se explica porque a vida numa paisagem impregnada de poderes ancestrais e
onde a vida cotidiana tem uma dimensão extraordinária e metafísica é
potencialmente perigosa. Para sobreviver e prosperar, bem como assegurar o
bem-estar de si e de sua família, todos os adultos precisam de alguma habilidade
para manejar e controlar as forças de criação e destruição que os cercam. Os
conhecimentos técnicos e metafísicos não possuem fronteiras precisas. Os
homens adultos devem conhecer tanto os recursos naturais do território quanto
suas propriedades espirituais, combinando afazeres rotineiros com
procedimentos rituais, com competência tanto para caçar e pescar quanto para
fazer encantações para que a carne e o peixe possam ser comidos com
segurança. De modo semelhante, as mulheres, "mães da alimentação" cujos
tubérculos de mandioca são "filhos", devem controlar a esfera material e
espiritual de produção e reprodução de suas roças, cozinhas e corpos, como uma
totalidade integrada.
Índios Tukano. Foto: Renato Aguirre, 1988.
Na Amazônia, freqüentemente se referem aos especialistas rituais com poderes
especiais e acesso a conhecimentos esotéricos como "xamãs", rótulo que pode
tanto confundir como revelar. Como indicado, para agir com êxito todos os
homens adultos devem ser em alguma medida xamãs. Aqueles que são
reconhecidos publicamente como tal têm maior conhecimento ritual e uma
habilidade especial para "ler" o que está por trás das narrativas sagradas,
optando por desenvolver habilidades e conhecimento em favor dos outros,
sendo reconhecidos como especialistas. Assim, os "xamãs" são aqueles que se
destacam dos demais - mas sempre há outros esperando nos bastidores.
Um segundo aspecto está relacionado ao gênero. Com raras exceções, os
especialistas rituais são homens - mas a capacidade das mulheres de menstruar
e gerar filhos é considerada como o equivalente feminino ao poder dos homens
sobre os ornamentos de penas e os Yurupari. Assim, é possível dizer que se os
homens adquiram as suas habilidades xamânicas através da cultura, as mulheres
já são "xamãs" por natureza. Não é de se admirar então que, na mitologia
tukano, o Povo do Universo, os heróis ancestrais que abrem o caminho para a
criação da humanidade, sejam gerados por uma divindade feminina que os
Barasana chamam de Romi Kumu ou "Mulher Xamã"; conhecida como "A Velha
da Terra" (Ye'pa Büküo, Yeba Büro) em Tukano e Desana.
Finalmente, o rótulo "xamã" nubla uma distinção importante entre dois
especialistas rituais, os yai e os kumu. Os yai correspondem ao xamã típico da
Amazônia ou o pajé. Suas principais tarefas envolvem lidar com as pessoas e o
mundo dos animais e da floresta. Ele desempenha um papel importante na caça
por soltar os espíritos dos animais das suas casas nas serras, atividade
potencialmente perigosa, que pode demandar compensações no mundo humano
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https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Barasana
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https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Desana
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como a conversão da vida em morte. O pajé é um especialista na cura de
moléstias causadas pela feitiçaria de criaturas vingativas e seres humanos
ciumentos, doenças que tipicamente se manifestam como espinhos, cabelo, e
outros objetos alojados no corpo. A cura se dá jogando água sobre o corpo do
paciente ou soprando-lhe fumaça de tabaco e depois manipulando-o com as
mãos, mas sempre envolvendo a sucção de objetos ou substâncias do corpo do
paciente.
Yai significa "jaguar", termo que dá alguma indicação do status do pajé na
sociedade tukano. O Jaguar é um animal poderoso e potencialmente perigoso,
assim como aqueles que têm poder e conhecimento para agir contra a feitiçaria
podem também praticá-la. Um pajé é considerado "bom" ou "mal" dependendo
se ele é um parente ou vizinho de confiança. O termo yai também tem conotação
de selvageria e descontrole, que alude à posição marginal de muitos pajés e ao
caráter individual e idiossincrático de seus poderes, freqüentemente associados
ao uso de alucinógenos.
Embora tanto o yai como o kumu sejam especialistas, o kumu é mais um sábio e
sacerdote do que propriamente um xamã. Seus poderes e autoridade são
baseados no conhecimento exaustivo da mitologia e dos procedimentos rituais,
resultado de anos de treinamento e prática. Conseqüentemente, aqueles que são
reconhecidos como kumu geralmente são homens mais velhos, cujos pais ou tios
paternos muitas vezes tinham o mesmo status.
Como homem experiente e sábio, o kumu comumente é também um líder
político de sua comunidade e com autoridade considerável sobre uma área mais
ampla. Comparados ao yai, figura por vezes moralmente ambígua, o kumu goza
de um status mais alto e um maior grau de confiança, fundamentada em seu
papel ritual proeminente.
O kumu desempenha um papel importante na prevenção de doenças e
infortúnio. Ele é um especialista na arte de soprar encantações sobre a carne de
peixe e animais para converter a sua substância em uma forma similar ao
vegetal. Tem papel proeminente nos ritos de passagem, realiza as principais
cerimônias por ocasião do nascimento, iniciação e morte, transições que
asseguram a socialização do indivíduo e a passagem das gerações, assim como
ordena as relações entre os ancestrais e seus descendentes vivos. É o kumu que
nomeia os bebês recém-nascidos e é ele que conduz os ritos de iniciação,
públicos e coletivos, para os jovens e os ritos mais individuais e privados
realizados quando moças atingem a idade de puberdade. Tais transições
envolvem um contato necessário e potencialmente benéfico entre os vivos, os
espíritos e os mortos. Esse contato pode ser perigoso e é o kumu que assume a
responsabilidade de proteger as pessoas. Para aqueles que gozaram da proteção
de um kumu durante o seu nascimento ou iniciação, ele é seu guu ou
"tartaruga", em alusão à carapaça dura e protetora desse animal.
A outra importante função do kumu é presidir as festas de dança, as festas de
caxiri e intercâmbios cerimoniais, e de conduzir e supervisionar os rituais em
que se tocam os instrumentos de Yurupari, rituais que envolvem um contato
direto com os ancestrais mortos. Aqueles que participam desses rituais colocam
as suas vidas nas mãos do kumu e é somente os mais sabidos e respeitados que
são encarregados desse papel. Do mesmo modo, patrocinar tais rituais significa
reivindicar reconhecimento como kumu.
Como "gente" e parte integrante de um cosmo vivo, os seres humanos, os
animais, as plantas e os peixes participam de um mesmo sistema, que é engajado
e revitalizado durante os rituais de Yurupari. Esses rituais fomentam a
reprodução das plantas e dos animais, asseguram o ordenamento normal das
estações e a fertilidade contínua da natureza. Ao supervisionar e promover esses
rituais, os kumus mais importantes chegam a incorporar os poderes e
identidades de Yeba Hakü, o "Pai do Universo", de Romi Kumu, "Kumu Mulher"
e de Yurupari, fonte e espírito da vida vegetal. Como mestres do ritual, eles
mesmos se tornam criadores.
Ciclo ritual
O ciclo anual é pontuado por uma série de festas coletivas, cada uma com seus
cantos, danças e instrumentos musicais apropriados, que marcam eventos
importantes do mundo humano e natural - nascimentos, iniciações, casamentos
e mortes, a derrubada e o plantio de roçase a construção de casas, as migrações
dos peixes e pássaros, e a disponibilidade de frutas silvestres e outros alimentos
colhidos. Essas assembléias rituais são denominadas "casas", termo que significa
ao mesmo tempo um evento ritual, um grupo de pessoas e um mundo simbólico.
Índios Tukano. Foto: Curt Nimuendaju, década de 1930.
As festas assumem três formas básicas: caxiris (festas de cerveja), dabukuris ou
intercâmbio cerimonial, e os ritos de Yurupari envolvendo flautas e trombetes
sagrados. Os caxiris são fundamentalmente ocasiões sociais quando uma
comunidade convida os seus vizinhos a dançar e beber caxiri, às vezes como um
agradecimento pela sua ajuda na abertura de uma roça ou na construção de uma
casa nova, às vezes para marcar a nomeação de uma criança, o casamento de
uma mulher, ou a etapa final de iniciação dos meninos, e às vezes somente por
divertimento e reforço dos laços sociais. Os convidados são os principais
dançarinos, e em troca de suas danças, os anfitriões lhes oferecem grandes
quantidades de caxiri preparado pelas suas mulheres.
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Ciclo ritual tuyuka
Com cocares de penas e outros ornamentos, os dançarinos dançam a noite
inteira em volta do recipiente (cuja forma é semelhante a uma canoa) de caxiri,
que constitui o foco central da celebração; é uma questão de honra que todo o
caxiri seja consumido antes dos visitantes partirem pela manhã. Há dois tipos de
danças, ou relativamente lentas, no caso de danças formais em que os homens se
dispõem em uma linha entrecruzada por mulheres, ou danças mais rápidas e
menos formais em que cada dançarino dança sozinho, tocando um conjunto de
flautas de pã como parte de um coro, e competindo com os outros para atrair a
parceira de sua escolha. Entre essas sessões de dança, os anfitriões e convidados
se sentam frente a frente e trocam presentes como coca e charutos, enquanto
recitam as suas genealogias em cânticos coletivos conduzidos por um
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especialista. O kumu se senta à parte, soprando encantações sobre cuias de coca,
tabaco e ayahuasca; então as oferece aos participantes para protegê-los e
permitir aos dançarinos que vejam e experimentem em suas danças as viagens
dos primeiros ancestrais e os eventos míticos que os seus cantos e cântico
relatam.
Dabukuri entre os tukano. Foto: Renato Aguirre, 1988.
Os caxiris podem envolver comunidades de irmãos e cunhados, já os dabukuris
são, sobretudo, ocasiões que celebram e reforçam os laços de matrimônio e
afinidade. As dádivas são dadas em nome de um homem para seu cunhado ou
sogro: no mito barasana da origem do dabukuri, cujos personagens são Yeba
Yamira (ver item "Aspectos cosmológicos"), a dádiva era do Yeba para seu sogro
Anaconda Peixe. O ritual começa com a chegada dos convidados ao anoitecer.
Tratados como estranhos e inimigos potenciais pelos seus anfitriões, eles não
entram na maloca, dançando e cantando por iniciativa própria do lado de fora.
De manhã, eles desfilam dentro da maloca vestidos com elegância e soprando
trombetes de cerâmica ou embaúba. Apresentam suas dádivas aos seus
anfitriões e então iniciam uma dança que continuará o dia inteiro e a noite
também. Os anfitriões se mantém distantes, continuam lhes servindo caxiri, mas
enquanto o dia vai se passando, eles se misturam cada vez mais com os
convidados, dançando e cantando junto com eles, quebrando assim as barreiras
que foram estabelecidas, de forma dramática, no começo do ritual. Pela manhã,
quando a dança termina, convidados e anfitriões comem em uma enorme
refeição comunal, como se fossem uma comunidade única e integrada.
Esses intercâmbios têm uma dupla lógica e movimento: a curto prazo, os
convidados dançam e oferecem peixe ou carne em troca do caxiri fornecido
pelos anfitriões; a longo prazo, as comunidades trocam um tipo de produto por
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outro - peixe por carne ou carne por peixe - e alternam os papéis de anfitrião e
convidado. Ambos os casos estão relacionados a matrimônio, o primeiro
refletindo a troca de carne ou peixe por produtos de mandioca (o beiju e o
caxiri) entre marido e mulher; o segundo refletindo a troca de diferentes tipos
de mulheres entre os grupos ligados por inter-casamentos. Em termos
cosmológicos, essas trocas estão intimamente ligadas aos ciclos de procriação e à
disponibilidade sazonal de espécies de peixes e animais. As danças remetem não
apenas às dramatizações e movimentos relativos a peixes e pássaros migrantes,
como garantem a fertilidade continuada da natureza e a disponibilidade de
espécies das quais dependem.
Dabukuri entre os tukano. Foto: Renato Aguirre, 1988.
Os rituais envolvendo os instrumentos musicais sagrados de Yurupari são a
expressão mais plena da vida religiosa dos índios, pois englobam e sintetizam
vários temas-chave: ancestralidade, descendência e identidade grupal, sexo e
reprodução, relações entre homens e mulheres, crescimento e amadurecimento,
morte, regeneração e integração do ciclo de vida humano com o tempo cósmico.
Em relação de complementariedade com os dabukuris, esses rituais são
concernentes à identidade masculina e às relações intra-grupais em oposição ao
casamento e às relações inter-grupais; do mesmo modo, dizem respeito à
fertilidade das árvores e plantas em oposição aos ciclos de vida dos animais.
As flautas e os trombetes de tronco de palmeira pertencentes a cada grupo são
uma entidade ao mesmo tempo única e múltipla: o ancestral do grupo e seus
ossos aos pares, que são também seus filhos; e os ancestrais dos clãs
componentes do grupo. Quando os instrumentos estão juntos e são tocados, o
ancestral volta à vida, de modo que aqueles que os tocam assumem as
identidades dos ancestrais clânicos e entram em contato direto com seus
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respectivos pais (originários). Esse processo anula a separação vigente entre
passado e presente, mortos e vivos, ancestrais e descendentes, restabelecendo a
ordem primordial dos mitos de origem. Os ritos normalmente envolvem um clã
ou o segmento de um clã, que age como um grupo isolado e assim pode
estabelecer a sua identidade enquanto unidade coletiva indiferenciada em
contraposição ao mundo de fora, mas segmentada internamente por uma
hierarquia ordenada.
Os instrumentos Yurupari somente podem ser vistos e manuseados pelos
homens adultos. De acordo com os mitos, originalmente eram as mulheres quem
possuíram as flautas enquanto os homens se encarregavam do processamento da
mandioca e outras tarefas femininas. Os mitos acrescentam outro detalhe
importante: quando as mulheres tinham a posse das flautas, os homens
menstruavam e, quando tiraram as flautas delas, fizeram com que as mulheres
menstruassem. Esses mitos, e os rituais que os dramatizam, podem ser
entendidos como um discurso complexo e ambíguo sobre os respectivos poderes
e capacidades de homens e mulheres, tal como aquele que se refere aos poderes
xamânicos femininos, já mencionados. Isso implica que os órgãos reprodutivos e
as capacidades reprodutivas complementares de homens e mulheres, isto é: as
suas "flautas", são simultaneamente idênticas e opostas, iguais e desiguais,
invertidas e equivalentes.
Índios Bara no Alto Papuri. Foto: Jean Jackson, 1969.
Há dois tipos de ritual de Yurupari, um evento anual mais sacralizado e
elaborado que marca o começo do ano, e o outro realizado periodicamente
durante o ano para marcar a maturação de diferentes espécies de frutos de
árvores. No segundo, os homens de uma comunidade presenteiam os de uma
outra - geralmente os seus irmãos - com grandes quantidades de frutos
silvestres, trazendo-os para o interior da casa acompanhados dos sons berrantes
dos trombetes enquanto asmulheres e crianças permanecem atrás de telas nos
fundos. Ao anoitecer, as telas são removidas e as mulheres voltam a se juntar aos
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homens. Eles dançam a noite inteira até amanhecer e então distribuem os frutos
entre os presentes.Os mais grandiosos ritos de Yurupari, quando instrumentos
diferentes e mais sacralizados são tocados, estão vinculados aos movimentos do
sol e da constelação de Plêiades, realizando-se no final do verão e começo da
estação chuvosa, que é a época em que abundam os frutos do mato. Eles
elaboram ainda mais os temas de crescimento, maturação e periodicidade, bem
como a integração entre os ciclos temporais humanos e cósmicos, mas aqui o
enfoque imediato está no crescimento e amadurecimento de jovens que passam
por um processo de iniciação que os conduz a sua integração como adultos no
grupo.
No começo do ritual, os meninos são apartados de suas mães e trazidos para a
extremidade masculina da casa, longe da vista das suas mães, que são confinadas
na parte traseira. Sob o cuidado de guardiões rituais e um kumu oficiante,
recebem ayahuasca para beber e são-lhes mostrados os instrumentos Yurupari
pela primeira vez, enquanto eles ficam sentados imóveis e agachados como fetos
no chão. À medida que os instrumentos são tocados sobre as suas cabeças,
corpos e genitais, os rapazes são chicoteados pelos kumu nos seus corpos e
pernas, ações que transmitem a vitalidade e as forças espirituais dos ancestrais e
fazem com que os meninos cresçam resistentes, fortes e viris. Os homens dão
então um banho nos meninos junto com os instrumentos no rio, despejando
água das flautas sobre as cabeças dos iniciados. Essa ação alude ao ancestral
Anaconda vomitando as primeiras pessoas da sua boca - e também ao primeiro
banho dos bebês depois de nascer, como descrito anteriormente. Mas dessa vez
o nascimento é um renascimento orquestrado pelos homens mais velhos e, como
o ancestral Anaconda que entrou no mundo através da "porta da água" no Leste,
os iniciandos renascidos agora entram na casa pela porta dos homens. No final
do ritual, os iniciandos permanecem em reclusão por um mês em um
compartimento especial longe da vista das mulheres. Rigidamente
supervisionados pelo kumu, eles tomam banho todos os dias, observam uma
dieta rigorosa e aprendem a fazer cestos. A reclusão termina com uma grande
dança. Como sinal de que estão prontos para se tornarem maridos e pais, os
iniciandos presenteiam com os seus cestos as suas parceiras femininas, que
pintam os corpos deles com tinta vermelha em retribuição.
Como muitos ritos de iniciação, este é repleto de símbolos de morte,
renascimento e regeneração. No começo do ritual, os meninos são pintados de
preto e ritualmente "mortos" com doses de rapé de tabaco; após seu
renascimento no rio, são mantidos em reclusão como bebês recém-nascidos,
então emergem para serem pintados de vermelho. No mito associado ao ritual,
Yurupari, na forma de anaconda, engole os iniciandos, os digere dentro de sua
barriga (cujo equivalente no ritual é o período de reclusão), então os devolve a
seus pais, vomitando-os como ossos. Para puni-lo, os pais incendeiam Yurupari
para que ele morra. Mas ele não morre: sua alma sobe ao céu e de suas cinzas
nasce uma palmeira, protótipo das frutas da floresta e matéria-prima dos
instrumentos Yurupari.
Como na agricultura de coivara, na qual a fertilidade e a vida humana vêm da
queima anual da floresta, esse conjunto de mito e ritual significa que vida e
morte se sucedem como as estações, que os humanos mortais alcançam a
imortalidade através de seus filhos, que a periodicidade das mulheres é como a
das estações, que o crescimento dos homens e das árvores resultam de um único
processo, e que, no final das contas, a fertilidade dos seres humanos e do cosmos
estão interligadas em um grande sistema. Ao expandir a maloca a proporções
cósmicas, ao abolir as separações entre os seres humanos e o mundo dos
espíritos, e ao articular as capacidades reprodutivas de homens e mulheres, os
rituais de Yurupari englobam e colocam em movimento boa parte da
cosmologia acima esboçada.
A Escola Indígena Tuyuka-Utapinopona
Sob a atuação dos salesianos, que buscavam as crianças em seus povoados e as
levavam para as missões, os Tukano incorporaram a educação escolar. A partir
dos anos 1980, a educação básica (da 1ª à 4ª série) passou a ser oferecida pela
rede municipal de escolas rurais, espalhadas por um bom número de povoados. 
As freiras Filhas de Maria Auxiliadora, no entanto, continuaram, até os anos
1990, orientando os professores indígenas da região, que tinham em geral o
primeiro grau completo. Não havia nenhuma especificidade no material didático
e a ênfase no ensino religioso se mantinha. Ao concluir a 4ª série, a maioria das
crianças, especialmente os meninos, era encaminhada ao colégio mais próximo
(correspondendo aos antigos internatos dos missionários salesianos) para
continuar os estudos até a 8ª série. 
Como consequência de tal rotina, sobrevinha certo esvaziamento dos povoados
durante o período letivo. Alguns grupos domésticos deslocavam-se inteiros para
o centro missionário, onde mantinham uma casa. Nem todos, porém,
constituíam roças aí, continuando a voltar ao povoado de origem para fazer
farinha e buscar outros alimentos. Em alguns casos, uma família cuidava de
meninos de diferentes famílias. A estada dos jovens nesses povoados/missões
prolongava-se além do período de estudo, já que preferiam ficar ali com os
companheiros da mesma faixa etária.
No Tiquié e no Pirá-paraná colombiano, o processo de escolarização em poucos
centros - também construídos por padres católicos, mas de outras congregações
- foi mais tardio, com início na década de 1970. Também nessa região há o
esquema de afastar as crianças cada vez mais de seus povoados, à medida que
avançam no estudo, até chegar a Mitú, capital do departamento de Vaupés. No
país vizinho, ainda hoje existem internatos, a maioria são laicos. No Brasil, o fim
do internato foi visto com insatisfação pelos índios, porque não haveria mais
uma instituição para cuidar da alimentação e de outras necessidades dos jovens.
A partir de 1998, um projeto de escola indígena deflagrou importantes
mudanças nas comunidades tuyuka do alto Tiquié, sobretudo no lado brasileiro.
O contexto era o da crise entre os missionários católicos gerada pelo impasse
quanto ao seu modelo de educação, à desestabilização socioeconômica
resultante da corrida ao ouro da serra do Traíra, ao rápido esgotamento desse
recurso e à emergência das organizações indígenas (em paralelo, à recente
demarcação das terras do alto e médio rio Negro). 
Em parceria com a FOIRN e com o ISA (Instituto Socioambiental), apoiados pela
Rainforest Foundation da Noruega (RFN), quatro comunidades tuyuka do Brasil
(São Pedro, Cachoeira Comprida, Igarapé Onça e Fronteira), com participação
de comunidades colombianas vizinhas, juntaram-se e assumiram a tarefa de
criar uma escola indígena autônoma e condizente com os projetos e decisões das
comunidades.
A Escola Utapinopona-Tuyuka adotou a própria língua na alfabetização, e como
língua de instrução nos diversos ciclos. A partir de 2001, estenderam o ensino
para além da 4ª série (até então o ensino fundamental completo só estava
disponível em Pari-Cachoeira). Em consequência do intenso movimento político
liderado liderado a partir da comunidade de São Pedro, quase todas as famílias
que mantinham os filhos em Pari-Cachoeira retornaram e aderiram à Escola
https://www.foirn.org.br/
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Tuyuka. 
Assim teve início um período de relações mais ativas e constantes entre os
povoados tuyuka, com frequentes encontros, reuniões, oficinas temáticas e
assembleias relacionadas com a escola, contatos diários através de radiofonias
recém-instaladas, maior facilidade de transporte com os motores e a gasolina do
projeto. Participaram ativamente os moradores do igarapé Onça, que até então
mantinhampoucos contatos com os Tuyuka de Caruru acima. Esse grupo
passava por um processo de tukanização lingüística (i. e. usam mais a língua
Tukano que a própria língua), já que, há três gerações, habitava uma área de
predomínio tukano próxima de Pari-Cachoeira e São Domingos. 
Em boa medida, a Escola Tuyuka inverteu os princípios da escola missionária.
Isso se deu a partir do momento em que fez uma série de escolhas: adotou a
língua indígena; para incentivar a transmissão das tradições, aproximou crianças
e jovens dos mais velhos, em contraposição ao afastamento, geográfico mesmo,
entre as diferentes gerações; e passou a tratar de assuntos e temas locais, de
interesse das diversas comunidades, em contraste com o currículo missionário
completamente exótico aos índios do Tiquié. 
Oito anos após o seu início, o movimento político dos Tuyuka vai além da escola.
Um dos efeitos da Escola foi conferir visibilidade aos Tuyuka no âmbito regional
(alto rio Negro). São Pedro, a principal comunidade tuyuka do lado brasileiro,
passou a sediar importantes encontros, com a participação de pessoas de regiões
como Içana, Pirá-paraná e São Gabriel. Os Tuyuka também começaram a viajar
mais e a participar de reuniões e encontros em outras localidades. Enfim,
vivenciaram uma abertura maior para o exterior.
Atualmente a Escola passa por novas mudanças, a região é agitadas por outros
movimentos, há maior mobilidade das famílias, outras transformações... 
Fontes de informação
• Cabalzar, Aloisio (2009) Filhos da Cobra de Pedra. Organização e
Trajetórias Tuyuka no Rio Tiquié. São Paulo: Editora da Unesp/ISA/Nutti.
• Dias Cabalzar, Flora (2011) Até Manaus, até Bogotá. Os Tuyuka vestem
seus nomes como ornamentos. São Paulo: Tese de doutorado,
PPGAS/USP.
• Dutra, Israel Fontes (2010) Xamanismo Utãpinõponã-Tuyuka. Princípios
dos rituais de pajelança e do ser pajé Tuyuka. São Paulo: Dissertação
Mestrado, PUC-SP.
• Rezende, Justino Sarmento (2005) Escola indígena municipal
Utãpinopona – Tuyuka e a construção da identidade tuyuka. Campo
Grande: Dissertação Mestrado, Universidade Católica Dom Bosco. 
• Rezende, Justino Sarmento (2010) Educação na visão de um Tuyuka.
Manaus: Faculdade Salesiana Dom Bosco.
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