Buscar

Macuxi - Povos Indígenas no Brasil

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 20 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 20 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 9, do total de 20 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

Macuxi - Povos Indígenas no Brasil
Habitantes de uma região de fronteira, os Macuxi vêm enfrentando desde pelo
menos o século XVIII situações adversas em razão da ocupação não-indígena na
região, marcadas primeiramente por aldeamentos e migrações forçadas, depois
pelo avanço de frentes extrativistas e pecuaristas e, mais recentemente, a
incidência de garimpeiros e a proliferação de grileiros em suas
terras. Protagonizaram nas ultimas décadas, juntamente com outros povos da
região, uma luta incessante pela homologação da TI Raposa Serra do Sol,
ocorrida em 2005, e posteriormente pela desintrusão dos ocupantes não-indios,
finalmente resolvida com o julgamento pelo Supremo Tribunal Federal em
2009, que confirmou a homologação e a retirada dos ocupantes não-índios.
Identificação e localização
Maloca Perdiz. Foto: Mario Giovannoni, 1983.
Os Macuxi, povo de filiação lingüística Karíb, habitam a região das Guianas,
entre as cabeceiras dos rios Branco e Rupununi, território atualmente partilhado
entre o Brasil e a Guiana. A designação macuxi contrasta com as dos povos
vizinhos – os Taurepang, os Arekuna e os Kamarakoto – também falantes de
língua pertencente à família Karíb e muito próximos, social e culturalmente, dos
Macuxi. Tomados em conjunto, formam uma unidade étnica mais abrangente, os
Pemon, termo que, por sua vez, se contrapõe a Kapon, designação que engloba
https://terrasindigenas.org.br/pt-br/terras-indigenas/3835
https://terrasindigenas.org.br/pt-br/terras-indigenas/3835
http://img.socioambiental.org/d/225376-1/macuxi_2.jpg
http://img.socioambiental.org/d/225376-1/macuxi_2.jpg
https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Taurepang
https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Taurepang
os Arakaio – conhecidos em área brasileira pela designação Ingarikó – e os
Patamona, seus vizinhos ao norte e nordeste, respectivamente. O conjunto
dessas designações étnicas e os diversos níveis contrastivos formam um sistema
de identidades que, entre os povos guianenses, singulariza esses grupos da área
circum-Roraima.
Em 2004, a população macuxi no Brasil era estimada em torno de 19 mil
pessoas e cerca de metade dessa cifra era encontrada na vizinha Guiana,
ocupando áreas de campo e de serras no extremo norte do estado de Roraima e
o norte do distrito guianense de Rupununi.
O território macuxi estende-se por duas áreas ecologicamente distintas: ao sul,
os campos; ao norte, uma área onde predominam serras em que se adensa a
floresta, prestando-se assim a uma exploração ligeiramente diferenciada
daquela feita pelos índios da planície. A dimensão desse território pode ser
estimada em torno de 30 mil a 40 mil km2.
A distribuição espacial da população macuxi faz-se em várias aldeias e pequenas
habitações isoladas. Estima-se que existam 140 aldeias macuxi no Brasil, mas
não há dados precisos sobre o seu número. Para a área guianense, a estimativa é
de cerca de 50 aldeias no interflúvio Maú(Ireng)-Rupununi [dados de 2004].
Maloca do Contão. Foto: Comissão Rondon, s/d.
Apresentando notável constância, essa distribuição espacial dos Macuxi tem
permanecido inalterada ao longo de uma extensão contínua de terras desde pelo
menos os primeiros registros historiográficos disponíveis para a região do vale
do Rio Branco, no século XVIII.
O território macuxi em área brasileira hoje está recortado em três grandes
https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Ingarik%C3%B3
https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Ingarik%C3%B3
https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Patamona
https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Patamona
http://img.socioambiental.org/d/225380-1/macuxi_3.jpg
http://img.socioambiental.org/d/225380-1/macuxi_3.jpg
blocos territoriais: a TI Raposa Serra do Sol, a TI São Marcos, ambas
concentrando a grande maioria da população, e pequenas áreas que
circunscrevem aldeias isoladas no extremo noroeste do território macuxi, nos
vales dos rios Uraricoera, Amajari e Cauamé.
A mais populosa é a TI Raposa Serra do Sol, na porção central e mais extensa de
seu território. Essa área é habitada por uma população global estimada em 10
mil habitantes distribuídos em 85 aldeias cuja grande maioria é Pemon [dados
de 2004].
As fronteiras étnicas na região são bastante tênues, em função de arranjos
residenciais entre parentelas cognáticas integradas por homens de diferentes
procedências, sobretudo em aldeias nas zonas de intersecção entre as etnias, em
que há agrupamentos compostos por famílias extensas mistas entre Macuxi e
Ingaricó; ou entre Macuxi e Patamona: os Macuxi e os Wapichana, entre outros.
A TI São Marcos estende-se contígua à TI Raposa/Serra do Sol. Trata-se de uma
área onde estão localizadas 24 aldeias macuxi, com uma população total
estimada em 1.934 pessoas (Funai, 1996), que é em sua grande maioria Macuxi.
Histórico do contato
Aldeamentos
https://terrasindigenas.org.br/pt-br/terras-indigenas/3799
https://terrasindigenas.org.br/pt-br/terras-indigenas/3799
https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Wapichana
https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Wapichana
Chefe Makuxi na Maloca Limão. Foto: Arquivo dos Beneditinos,
1923.
A ocupação colonial portuguesa do vale do rio Branco data de meados do século
XVIII. Foi uma ocupação marcadamente estratégico-militar. Nessa região,
limítrofe às possessões espanhola e holandesa nas Guianas, os portugueses
procuraram impedir possíveis tentativas de invasão a seus domínios no vale
http://img.socioambiental.org/d/225385-3/makuxi_4.jpg
http://img.socioambiental.org/d/225385-3/makuxi_4.jpg
amazônico, construindo, em 1775, o forte São Joaquim, na confluência dos rios
Uraricoera e Tacutu, formadores do Branco, via de acesso às bacias dos rios
Orinoco e Essequibo.
A estratégia utilizada pelos portugueses para assegurar a posse do vale baseou-
se no aldeamento dos índios efetuado pelo destacamento do forte. Para tanto, os
militares portugueses distinguiam dentre a população indígena os Principaes e
suas Nações, buscando convencê-los, por meio de armas e presentes, das
vantagens e desvantagens de trazerem as gentes de suas respectivas Nações para
formar os aldeamentos.
As informações disponíveis sobre o contato com os Macuxi nesse período são
raras e fragmentárias. Surpreendentemente, das diversas etnias então aldeadas,
os Macuxi comparecem em pequeno número: temos notícia de apenas dois
Principaes Macuxi: Ananahy em 1784 e Paraujamari em 1788, que chegaram a
aldear-se, trazendo pequenos grupos consigo. No entanto, não permaneceriam
por muito tempo nos aldeamentos. Logo após estas notícias, em 1790,
Parauijamari seria acusado de liderar uma grande rebelião, quando a maior
parte dos índios aldeados fugiu e os remanescentes foram espalhados por outros
aldeamentos portugueses no rio Negro.
Tal revolta poria fim à política oficial de aldeamento e não seriam empreendidas
novas tentativas de colonização naquela área ainda no século XVIII. Porém, são
muitas as evidências de que as expedições de recrutamento forçado da
população indígena permaneceram atuantes, motivadas por outros interesses
que se estabeleceriam na região, causando grande impacto sobre a demografia e
a territorialidade dos Macuxi.
Uma nova fase do contato, que viria afetar mais drasticamente o conjunto da
população Macuxi, teria início no século XIX, com a expansão da exploração da
borracha na Amazônia e, em especial, com a extração do caucho e da balata na
matas do baixo rio Branco. A arregimentação dos índios destinava-se,
principalmente, à área do rio Negro, mas também houve “descimentos” para o
próprio vale do rio Branco, onde eram engajados como força de trabalho no
extrativismo.
Tais empreendimentos de caráter privado imprimiram a tônica das relações
interétnicas no período. Embora o governo imperial demonstrasse uma
constante preocupação quanto à implementação de uma política indigenista
oficial nessa zona de fronteira, os registros administrativos disponíveis revelam
a sua grande debilidade nesse campo. Já nas últimas décadas do século XIX, em
particular após a República, que veio a conferir maior autonomia à
administraçãolocal, ao aproximar-se o auge do ciclo da borracha os regionais
passavam a ser considerados colaboradores necessários para a colonização
regional: detentores do comércio e dos meios de comunicação com o interior, os
regatões [aqueles que trocavam produtos manufaturados pelos de extração
diretamente junto à população indígena e regional] ali reinavam.
Pecuária
Parece haver uma estreita conexão entre o extrativismo no baixo rio Branco e a
pecuária que viria a se consolidar no curso alto desse rio: o capital extrativista
viria a financiar a pecuária. Em contrapartida, a pecuária incipiente estabelecida
nos campos do alto rio Branco favorecia o recrutamento da força de trabalho dos
índios na região, a qual não se limitava à extração, mas compreendia todas as
atividades correlatas, em particular a navegação do rio. Havia ampla margem de
liberdade para os regatões e quaisquer outros empresários atuantes na área para
penalizar os índios e forçá-los ao trabalho. Não havia instância que os
penalizasse pela escravidão a que, na prática, submetiam os índios.
Correlata ao trabalho forçado, a migração igualmente forçada singulariza esse
momento histórico, uma vez que as migrações entre a população indígena no
alto rio Branco decorriam muito mais da expulsão da terra pelo avanço da
pecuária do que pelo deslocamento compulsório da mão-de-obra.
Na virada para o século XX, a engrenagem de recrutamento de mão-de-obra
indígena montada nas décadas anteriores persistia, apesar de decadente. Aldeias
abandonadas e movimentos de fuga provocados pela chegada dos brancos não
foram somente registrados pelos cronistas do rio Branco, mas foram igualmente
objeto de registro por parte dos Macuxi e permanecem ainda hoje em sua
memória, marcados por um momento dramático nas diversas narrativas que
versam sobre sua história política.
Organizações indígenas
Assembléia de tuxauas macuxi na maloca Boca da Mata. Foto: Eliane
Motta, 1984.
A liderança política tradicional entre os Macuxi, uma posição apenas
proeminente, assumida por um indivíduo na articulação de um grupo local,
diante da violência abrupta da intensificação do contato com os regionais nos
primeiros anos do século XX converteu-se em instância catalisadora das
demandas de regionais e de agentes indigenistas (missionários ou funcionários
públicos) à população indígena, dispersa em pequenos grupos locais.
Nos anos 1970, período marcado pela forte intensificação e ampliação do
contato, algumas lideranças políticas de grupos locais macuxi passaram a se
destacar, ao exercerem funções privilegiadas de intermediação no
estabelecimento das relações entre a população indígena habitante nas aldeias e
os agentes da sociedade nacional.
https://img.socioambiental.org/d/225461-11/makuxi_5.jpg
https://img.socioambiental.org/d/225461-11/makuxi_5.jpg
Intermediadas por esses chefes locais, as agências indigenistas converteram-se
em fontes de bens industrializados para os índios alternativas aos fazendeiros e
garimpeiros. Em razão da posição diferencial dos agentes indigenistas oficiais e
dos missionários católicos diante dos regionais – situados em pólos antagônicos
na disputa pelo reconhecimento dos direitos territoriais indígenas – a estratégia
utilizada pelos religiosos, e em seguida pela Funai, para ampliar sua influência
sobre os índios foi a de minar os vínculos clientelistas que os ligavam aos
regionais. Até então, os artigos industrializados eventualmente fornecidos pelos
regionais para os índios eram contabilizados pelos primeiros numa listagem de
débitos a serem cobrados quando se fizesse necessária a força de trabalho
indígena. A fim de minar o sistema, os missionários trataram de suprir, em
parte, os artigos industrializados demandados pelos índios, pressionando-os
para que quitassem as dívidas contraídas com seus respectivos “patrões”.
A maneira como tal “substituição” de dívidas foi operada deu-se através da
promoção de reuniões anuais com as lideranças indígenas locais, as assim
chamadas “assembléias de tuxauas”, patrocinadas pela Diocese de Roraima a
partir de 1975, em que se discutiam as condições e os “méritos” de cada
comunidade para acessar os bens disponíveis pelos missionários. Cabe notar
ainda que as lideranças políticas presentes às assembléias provinham das aldeias
onde os missionários concentravam sua atuação, isto é, na região das serras:
recorte concebido em oposição ao lavrado e, portanto, mais distante das sedes
das “fazendas” e dos povoados.
Foram desenvolvidos projetos ligados à pecuária e à distribuição de alimentos,
os quais não foram bem sucedidos e suscitaram uma série de conflitos, disputas
e acusações de favorecimento indevido entre as diversas lideranças indígenas,
dando ensejo ao surgimento de um novo tipo de organização indígena,
concebida também inicialmente pelos missionários, que consistia na formação
de “conselhos regionais”, isto é, instâncias supra- aldeãs, descoladas das
comunidades locais, articulando lideranças Macuxi, Ingaricó, Taurepang,
Wapixana e Yanomami.
Durante a assembléia dos tuxauas ocorrida em janeiro de 1984, foram criados
sete conselhos nas seguintes regiões: Serras, Surumu, Amajari, Serra da Lua,
Raposa, Taiano e Catrimani. Sua incumbência era gerir as relações externas às
comunidades indígenas, tanto no plano das relações com a sociedade regional,
como na formulação e direcionamento dos projetos patrocinados por diferentes
agências. O mais atuante foi sem dúvida o conselho da região das serras, que
funcionou junto aos locais onde ocorreram conflitos agudos com os regionais,
encaminhando denuncias às autoridades governamentais.
Como resultado dos conselhos regionais, formou-se uma coordenação geral,
sediada em Boa Vista, momento em que se pode falar precisamente do
surgimento do Conselho Indígena de Roraima (CIR). Os membros dessa
coordenação são eleitos pelo voto aberto dos conselheiros regionais,
respeitando-se um esquema de rodízio de lideranças.
Ao longo desse processo, outras organizações vêm sendo criadas nessa região,
reunindo segmentos indígenas favoráveis à homologação da TI Raposa/Serra do
Sol em área contínua [a esse respeito, ver seção O caso da Raposa], como é o
caso do próprio CIR (Cujo atual coordenador é Macuxi), da APIR (Associação
dos Povos Indígenas de Roraima), da OPIR (Organização dos Professores
Indígenas de Roraima) e da OMIR (Organização das Mulheres Indígenas de
Roraima). Outras organizações são manifestamente contrárias à demarcação em
área contínua, tais como a SODIUR (Sociedade de Defesa dos Índios Unidos do
Norte de Roraima), a ARIKON (Associação Regional Indígena dos Rios Kinô,
https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Yanomami
https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Yanomami
Cotingo e Monte Roraima), ALIDICIR (Aliança para o Desenvolvimento das
Comunidades Indígenas de Roraima) e AMIGB (Associação Municipal Indígena
Guàkrî de Boa Vista).
O caso da Raposa
Imagem extraída do folheto de divulgação do evento Makunaima
Vive na Raposa Serra do Sol, ocorrido em Brasília em novembro de
2004. Foto: acervo Conselho Indígena de Roraima.
A TI Raposa Serra do Sol, identificada pelo órgão indigenista em 1993 em área
contínua, foi homologada pelo presidente da República em abril de 2005 com
1.747.460 ha. Atualmente, o principal mote de reivindicações dos Macuxi (e
outros povos que a habitam) é a desintrusão da área e a retirada das fazendas de
não-índios que permanecem em seu interior.
No início do século XX, a área hoje denominada Raposa Serra do Sol, no
nordeste de Roraima, esteve envolvida em disputas fronteiriças entre o Brasil e
a Grã-Bretanha. A região entre os Rios Cotingo (que corta Raposa–Serra do Sol)
e Rupununi (no território da Guiana) constituía o chamado Contestado. Em “O
Direito do Brasil”, Joaquim Nabuco, nosso representante nas difíceis
negociações fronteiriças, ressalta que a lealdade dos Tuxáua da região ao País,
apesar da frágil presença colonial à época, foi fundamental para assegurar as
nossas atuais fronteiras nos Rios Maú e Tacutú. No mesmo sentido, o Marechal
http://img.socioambiental.org/d/225473-2/macuxi_6.jpghttp://img.socioambiental.org/d/225473-2/macuxi_6.jpg
Rondon já dizia que os índios são as “muralhas dos sertões”, e que a
implementação pelo governo de políticas positivas frente às suas demandas,
inclusive a demarcação das suas terras, é a melhor receita para a tranqüilidade
das fronteiras.
Também é bom ressaltar, como as referências históricas bem o indicam, que a
ocupação indígena em Raposa Serra do Sol precede em séculos à colonização.
Os primeiros colonos se imbricaram entre as malocas, mas os índios foram
sendo crescentemente pressionados por novas ondas migratórias estimuladas
por políticas oficiais do então Território Federal e do atual estado de Roraima.
Depois de anos de espera por parte dos índios e de vários estudos, em que
vicejaram, inclusive, propostas para retalhá-la, a identificação oficial da TI
Raposa Serra do Sol foi concluída em 1993, com a publicação no Diário Oficial
da União das coordenadas geográficas da área proposta para demarcação. Trata-
se da também denominada “área contínua”, que se estende das fronteiras com a
Guiana e a Venezuela (leste e norte) aos limites com a TI São Marcos (oeste) e o
Rio Tacutú (sul). Desta área contínua a identificação excluiu o entorno da Vila
de Normandia, anteriormente convertida em município, formando um enclave
junto à fronteira com a Guiana.
Com a posse do presidente Fernando Henrique, o ministro Jobim paralisou as
demarcações por mais de um ano, enquanto se discutia o Decreto 1775 e
decorria o prazo que ele instituiu para a audiência a terceiros durante o
processo administrativo de demarcação. Com a edição do decreto, houve mais
de uma centena de contestações aos limites propostos para Raposa Serra do Sol
e, ao final do referido prazo, o ministro da Justiça expediu, em 20/12/96, um
“despacho” em que rechaçou as contestações havidas e reconheceu a
constitucionalidade do laudo antropológico que embasou a proposta de
demarcação. Mas, em vez de declará-la como Terra Indígena, alegou “situações
de fato”, configuradas por núcleos de ocupação urbana e rural que julgou
estarem “já consolidados”, que deveriam determinar “ajustes” nos limites
propostos.
Os “núcleos urbanos e rurais consolidados” referidos no despacho ministerial
consistem ou implicam no seguinte: a criação do Município de Uiramutã,
ocorrida após a identificação oficial da Terra Indígena; a presença de outras
quatro vilas no centro-norte da área proposta; a validade de alguns títulos de
propriedade incidentes sobre a sua parte sul, além da presença de rizicultores,
pecuaristas e garimpeiros que invadiram a área nos últimos anos; o livre trânsito
de não índios pelas estradas que dão acesso a estas localidades; a incidência do
Parque Nacional do Monte Roraima – uma Unidade de Conservação federal –
sobre a área demarcada.
O Estado de Roraima preferiu desconsiderar o caráter indígena dessas terras,
mesmo após a sua identificação oficial, e promoveu a criação do(s) Município(s)
de Uiramutã (e de Pacaraima, na TI São Marcos) no contexto de um
enfrentamento deliberado às propostas de demarcação. A sua iniciativa
confrontou a identificação da área feita pela Funai e ignorou a via da negociação,
com o Estado defendendo a demarcação em “ilhas”, que reconheceria direitos
aos índios apenas sobre as imediações de cada maloca, inviabilizaria a sua
reprodução física e cultural garantida pela Constituição e instituiria um regime
de conflito permanente.
O ministro não implementou o seu despacho na forma de uma portaria com os
limites da área “ajustados”, deixando a pendência para os seus sucessores. No
âmbito da Funai, a materialização das indicações do ministro em um novo
memorial descritivo se revelou impossível, pois implicaria na exclusão de várias
aldeias da área a ser demarcada. Com o passar do tempo, a atividade garimpeira
declinou, os tais “núcleos consolidados” foram se esvaziando e parte dos
“fazendeiros” fez acordos com comunidades específicas e se retirou da área.
Constatando que ocupações anteriores, tidas como “consolidadas”, se
esvaziavam, e que novas ocupações ilegais, já que posteriores à identificação,
passaram a ameaçar a integridade da Terra Indígena, a Funai re-encaminhou ao
ministro da Justiça, Renan Calheiros, a proposta de “área contínua”. Ele assinou
a portaria declaratória (nº 820, de 11/12/98), ressalvando que o governo federal
daria em seguida soluções apropriadas para as “situações de fato” apontadas por
seu antecessor, mas deixou o cargo sem providenciá-las.
A portaria ministerial foi contestada pelo estado de Roraima junto ao Superior
Tribunal de Justiça, que, inicialmente, expediu uma liminar obstando a
homologação da área, mas não a sua demarcação. No período de vigência da
liminar, a Funai realizou trabalhos de demarcação física e de digitalização dos
limites, facilitados pelas fronteiras naturais e internacionais privilegiados na
proposta de “área contínua”, instruindo o processo para a homologação
presidencial. Afinal, o STJ não acolheu o mandado de segurança impetrado pelo
Estado, superando o último óbice formal à homologação. Esta decisão alcançou,
ainda, o mandato do Presidente Fernando Henrique, que, no entanto, preferiu
não editar o decreto homologatório, deixando a pendência para o governo Lula.
Veja abaixo a Cronologia do reconhecimento oficial da TI Raposa/
Serra do Sol, incluindo os dois anos de gestão do governo Lula.
1917– Governo do Amazonas edita a Lei Estadual nº 941, destinando as terras
compreendidas entre os rios Surumu e Cotingo para a ocupação e usufruto dos
índios Macuxi e Jaricuna.
1919– Serviço de Proteção ao Índio (SPI) inicia a demarcação física da área, que
estava sendo invadida por fazendeiros. O trabalho, entretanto, não é finalizado.
1977– Presidência da Fundação Nacional do Índio (Funai) institui um Grupo de
Trabalho Interministerial (GTI) para identificar os limites da Terra Indígena,
que não apresenta relatório conclusivo de seus trabalhos.
1979– Novo GTI é formado. Sem estudos antropológicos e historiográficos,
propõe uma demarcação provisória de 1,34 milhão ha.
1984– Mais um Grupo de Trabalho Interministerial é instituído para
identificação e levantamento fundiário da área. Cinco áreas contíguas,
Xununuetamu, Surumu, Raposa, Maturuca e Serra do Sol, são identificadas,
totalizando 1,57 milhão ha.
1988– Outro GT Interministerial realiza levantamento fundiário e cartorial sem
chegar a qualquer conclusão sobre o conjunto da área.
1992/1993– Funai decide reestudar a área, formando pela última vez novos
Grupos de Trabalho Interministerial.
1993– Parecer dos GTs, em caráter conclusivo, é publicado no Diário Oficial da
União no dia 21 de maio, propondo ao Ministério da Justiça o reconhecimento
da extensão contínua de 1,67 milhão ha.
1996– O presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, assina em
janeiro o Decreto 1.775, que introduz o princípio do contraditório no processo de
reconhecimento de TIs, permitindo a contestação por parte dos atingidos. São
apresentadas 46 contestações administrativas contra a TI Raposa/ Serra do Sol
por ocupantes não-índios e pelo governo de Roraima. O então ministro da
Justiça, Nelson Jobim, assina o Despacho 80, rejeitando os pedidos de
contestação apresentados à Funai, mas propondo uma redução de cerca de 300
mil ha da área, com a exclusão de vilarejos que serviram como antigas bases de
apoio à garimpagem, estradas e fazendas tituladas pelo Incra, que representa a
divisão da área em cinco partes.
1998– O ministro da Justiça, Renan Calheiros, assina o Despacho 050/98, que
revogou o Despacho 080/96, e a Portaria 820/98, que declara a TI Raposa/
Serra do Sol posse permanente dos povos indígenas.
1999– Governo de Roraima impetra mandado de segurança no Superior
Tribunal de Justiça (STJ), com pedido de anulação da Portaria 820/98.
Concedida liminar parcial ao mandado de segurança do governo de Roraima.
2002– STJ nega pedido do Mandado de Segurança 6210/99, impetrado pelo
governador de Roraima e que solicitava a anulação da Portaria 820/98.
2003– O ministro da Justiça, MárcioThomaz Bastos, anuncia, em diversos
momentos ao longo do ano, que a homologação da TI é iminente.
2004– Em março, juiz da 1ª Vara Federal de Roraima suspende os efeitos da
demarcação nos núcleos urbanos e rurais consolidados. Em maio,
Desembargadora federal determina a exclusão da faixa de fronteira (150 Km), o
que elimina toda a Terra Indígena. Em agosto, tanto o Superior Tribunal de
Justiça (STJ) quanto o Supremo Tribunal Federal (STF) negam pedidos do
Ministério Público Federal e da Advocacia Geral da União (AGU) para derrubar
a decisão do Tribunal Regional Federal (TRF) que prejudica a homologação da
TI Raposa/Serra do Sol.
2005– No dia 13 de Abril, o ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, assina a
Portaria n° 534, revogando a Portaria ° 820/98, que havia estabelecido a
demarcação da TI e estava sendo questionada por liminares. O novo ato
normativo exclui da área a sede do município de Uiramutã, equipamentos
públicos (como escolas e linhas de transmissão de energia elétrica), o 6° Pelotão
Especial de Fronteira do Exército e o leito das estradas estaduais e federais
localizadas na área.
2006– O ano é marcado por uma série de ações na Justiça, por meio das quais
alguns fazendeiros buscam permanecer no interior da Terra Indígena, atrasando
judicialmente o processo de pagamento de bem feitorias e a desintrusão da área.
Em abril, o STF nega o pedido de suspensão da demarcação da Raposa Serra do
Sol.
2007– Em maio, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Carlos Britto,
mandou sobrestar, até julgamento do mérito, a desocupação da área ocupada
por Itikawa Indústria e Comércio, Ivalcir Centenaro, Luiz Afonso Faccio, Nelson
Massami Itikawa e Paulo César Quartiero, em decorrência de mandado de
segurança interposto pela Indústria Itikawa e outros. Em junho, o STF indefere
por unanimidade o Mandado de Segurança 25.483-1, possibilitando a retomada
dos trabalhos de desintrusão.
Mulheres macuxi na Maloca Gavião. Foto: Vincent Carelli, 1986.
As aldeias na floresta caracterizam-se por casas comunais em que convivem
distintos grupos domésticos, compostos por famílias extensas ligadas entre si
por laços de parentesco. Já na savana geralmente encontram-se casas dispersas
que abrigam grupos domésticos cuja composição é análoga àquela acima
descrita; nesse sentido, a aldeia na savana configuraria um desdobramento da
casa comunal típica da floresta.
Embora as fontes do século XIX se refiram à existência de aldeias Macuxi
configuradas em casas comunais que apresentam baixa densidade demográfica,
isto é, cerca de trinta a sessenta pessoas (R. Schomburgk, 1922-23; R.H.
Schomburgk, 1903), verifica-se atualmente a disseminação de aldeias compostas
de pequenas casas que abrigam famílias extensas, reunindo uma população mais
numerosa, estimada entre cem e duzentos habitantes.
O desenho da aldeia macuxi não demonstra de imediato ao observador sua
morfologia social. As casas parecem distribuir-se aleatoriamente, porém um
olhar mais atento percebe que, via de regra, elas se dispõem em conjuntos que
correspondem a parentelas. Estas formam unidades políticas cuja interação
perfaz a vida social e política da aldeia.
A aldeia macuxi consiste assim basicamente em uma ou várias parentelas
interligadas por casamentos. Dada a tendência uxorilocal [após o casamento, o
casal vai morar com a família da moça] que se verifica nas sociedades dessa
região, residência e parentesco são instâncias associadas que, articuladas, dão
origem à chefia. Nesse sentido, o grupo local organiza-se em torno da figura de
um líder-sogro de cuja habilidade política na manipulação dos laços de
parentesco depende sua existência. Com o declínio do prestígio do líder-sogro
ou sua morte, o grupo local tende a tomar outras formas ou desfazer-se. Mesmo
neste último caso, porém, a aldeia persiste como referência histórico-geográfica.
A política matrimonial macuxi tende a favorecer reuniões endogâmicas, ou seja,
https://img.socioambiental.org/d/225478-11/makuxi_7.jpg
https://img.socioambiental.org/d/225478-11/makuxi_7.jpg
procura-se casar dentro das parentelas que compõem a aldeia. Entretanto,
pode-se verificar uma alta incidência de casamentos entre aldeias que estreitam
suas relações, configurando conjuntos regionais.
Como ocorre entre os outros grupos Pemon, para os Macuxi a relação entre
cunhados – yakó – é marcada por grande liberdade e igualitarismo, enquanto,
inversamente, a relação sogro-genro – pái-to – pressupõe evitação,
subordinação e consideráveis obrigações materiais do genro para com o sogro.
Na aldeia, a liderança política emerge assim do jogo das parentelas em que
prevalecem as relações acumuladas de afinidade, isto é, o líder é aquele que
detém uma rede mais ampla de afins e, portanto, aliados políticos. Hoje, há que
se considerar ainda o fator decisivo que representa a atuação de agências
indígenas e indigenistas, pelas quais um líder angaria prestígio e apoio material
que lhe podem conferir maior estabilidade.
Cosmologia e xamanismo
Dança Parixara entre os Macuxi de Perdiz/Cotingo. Foto: Mário
Giovannoni, 1983.
https://img.socioambiental.org/d/225486-12/makuxi_8.jpg
https://img.socioambiental.org/d/225486-12/makuxi_8.jpg
O universo macuxi é composto, basicamente, de três planos sobrepostos no
espaço que se encontram na linha do horizonte. A superfície terrestre, onde
vivemos, é o plano intermediário; abaixo da superfície há um plano subterrâneo,
habitado pelos Wanabaricon, seres semelhantes aos humanos, porém de
pequena estatura, que plantam roças, caçam, pescam e constroem aldeias.
O céu que enxergamos da superfície terrestre é a base do plano superior,
Kapragon, povoado por diversos tipos de seres, incluindo os corpos celestes e os
animais alados, entre outros, que também vivem, à semelhança dos humanos, da
agricultura, da caça e da pesca. Os Macuxi não têm qualquer relação com os
seres habitantes desses outros planos do universo, que tampouco interferem em
seus destinos.
O plano intermediário, por sua vez, não é o domínio exclusivo de humanos e
animais, mas habitam-no ainda duas classes de seres, Omá:kon e Makoi. A
distinção entre essas duas classes parece ter como critério básico o lugar
habitado por cada uma delas. Assim, a categoria Omá:kon habita
preferencialmente as serras, em particular as áreas rochosas e mais áridas da
cordilheira, bem como as matas. Sua aparência, embora muito diversa, é
marcadamente selvagem ou anti-social: têm unhas e cabelos longos e fala
inarticulada. Manifestam-se mais comumente sob a aparência de animais de
caça, embora sejam eles os caçadores de homens.
Já os seres Makoi são predominantemente aquáticos, habitando as cachoeiras e
poços profundos. Via de regra, manifestam-se sob uma gama variada de cobras
aquáticas. São considerados os seres mais nefastos aos homens, atraindo-os para
o seu domínio e devorando-os.
Quando os Omá:kon e Makoi aprisionam uma alma humana (Stekaton), a
vítima adoece e acaba morrendo. Somente os xamãs (Piatzán) podem fazer face
à predação exercida pelo Omá:kon e Makoi, pois possuem a faculdade de vê-los
e dispõem de armas sobrenaturais para neutralizá-los. Com efeito, a ação
terapêutica de um xamã – já que as doenças são evidência de agressões à alma
causadas por essas duas classes de seres – consiste basicamente no resgate da
alma aprisionada, impedida de retornar ao corpo e que, em uma sessão
xamanística, os cantos descrevem à medida que essa ação se desenrola.
Cosmogonia
Os Kapon se dizem todos Tomba – ou Domba, parentes -, da mesma forma que
os Pemon se reconhecem todos Yomba, parentes, semelhantes. Os dois grupos
consideram-se aparentados, descendentes comuns de heróis míticos: os irmãos
Macunaíma e Enxikirang. Os irmãos míticos, filhos do sol – Wei –, forjaram
num tempo antigo – Piatai Datai – a atual configuração do mundo, conforme
revela uma tradição oral compartilhada por esses grupos.
Em diversas versões narrativas – Pandon –, contam esses povos que
Macunaíma percebeu entre os dentes de uma cotia, adormecida de boca aberta,
grãos de milhoe vestígios de frutas que apenas ela conhecia; saiu, então, a
perseguir o pequeno animal e deparou com a árvore Wazacá – a árvore da vida
–, em cujos galhos cresciam todos os tipos de plantas cultivadas e silvestres de
que os índios se alimentam. Macunaíma resolveu, então, cortar o tronco – Piai
– da árvore Wazacá, que pendeu para a direção nordeste. Nessa direção,
portanto, teriam caído todas as plantas comestíveis que se encontram até hoje,
significativamente nas áreas cobertas de mata.
Do tronco da árvore Wazacá jorrou uma torrente de água que causou grande
inundação naquele tempo primordial. Segundo o mito, esse tronco permanece: é
o Monte Roraima, de onde fluem os cursos d´água que banham o território
tradicional desses povos. O mito fala, assim, da origem do cultivo, que marca a
humanidade, bem como de sua diferenciação étnica, expressa também na
localização geográfica.
Atividades produtivas
Maloca do Contão. Foto: Comissão Rondon, s/d.
O clima na região habitada pelos Macuxi é marcado por um rigoroso regime de
chuvas e duas estações bem definidas: inverno, com chuvas concentradas de
maio a setembro, e verão, alternado de seca, com estiagem prolongada de
novembro a março. Há assim alterações sazonais bastante significativas na fauna
e na flora.
Durante os meses de inverno, as águas das chuvas torrenciais engrossam os
leitos dos rios e igarapés, chegando mesmo a alagar em grande parte os campos,
com exceção de alguns pontos mais salientes nas planícies, que formam
pequenas ilhas acima da superfície.
Esses tesos, assim como as vertentes das serras, são para os Macuxi locais
preferenciais de cultivo de mandioca e de milho.
A população, que estava reunida nas aldeias ao longo do período de estiagem, se
dispersa em pequenos grupos durante a estação chuvosa e passa a viver
isoladamente com os alimentos produzidos nas roças familiares e coletados nas
matas que cobrem as serras.
http://img.socioambiental.org/d/225380-1/macuxi_3.jpg
http://img.socioambiental.org/d/225380-1/macuxi_3.jpg
Macuxi confeccionando cestaria na Maloca do Congresso. Foto:
Vincent Carelli, 1986.
Durante um breve período de transição entre as estações, a vegetação até então
submersa nos campos viceja, e os animais deixam os refúgios nos tesos das
planícies e isolados na serras para percorrer seu habitat mais extenso. Os índios,
que se mantinham dispersos em pequenos grupos domésticos, voltam a se
reunir, aglutinando as parentelas extensas nas aldeias, compondo expedições de
caça e de pesca, entre várias outras atividades de exploração econômica
empreendidas no tempo de estiagem.
Nos meses de verão, a vegetação dos campos torna-se seca e esturricada, a
folhagem verde vai se restringindo às baixadas mais próximas às margens dos
rios e igarapés que, em sua maior parte, são intermitentes e secam
completamente no auge da estiagem. Os índios voltam-se para os poços nos
leitos secos e para os lagos que conservam água, procurando surpreender os
animais que buscam o bebedouro nos mesmos locais, dedicando-se também,
mais intensivamente, à pesca, que se torna atividade principal durante o
período.
Na estação seca, os índios dedicam-se também à construção e reparo das casas e,
https://img.socioambiental.org/d/225493-11/makuxi_9.jpg
https://img.socioambiental.org/d/225493-11/makuxi_9.jpg
atividades correlatas, à extração de madeira e argila empregadas na armação e
nas paredes laterais, à coleta de folhas de palmeiras, mais freqüentemente de
buriti, que utilizam nas coberturas. Dedicam-se ainda à coleta de uma grande
variedade de fibras vegetais usadas na confecção de artefatos.
Durante a estiagem, torna-se mais nítido o traçado de uma infinidade de
caminhos e trilhas nos campos e nas matas, ligando os locais de coleta, caça,
pesca, roças e as diversas aldeias. Tais trajetos passam então a ser intensamente
percorridos pelos índios, quando aproveitam para visitar os parentes,
estreitando as relações sociais e vínculos de aliança política entre as parentelas,
nas festas e celebrações rituais.
Os Macuxi praticam a agricultura de coivara, cultivando basicamente mandioca,
milho, cará, batata-doce, banana, melancia, ananás, entre outros gêneros em
menor proporção, que variam a cada aldeia. A derrubada da mata, a queima da
área e o plantio são tarefas realizadas pelos homens. A partir de então, cabe
sobretudo às mulheres manter a roça limpa e proceder à colheita, bem como
preparar os alimentos. Os homens se ocupam de trazer a caça, pesca e frutos
silvestres, empreendendo expedições de exploração econômica muito além dos
limites da aldeia.
Atualmente, as comunidades macuxi estabelecidas em cada aldeia possuem
coletivamente pequeno rebanho de gado bovino, obtido através de projetos
iniciados pela Diocese de Roraima, pela Funai e pelo governo do estado de
Roraima. A criação de bois, mantida em currais e retiros, bem como a de aves e
suínos empreendida por famílias individuais, é hoje considerada indispensável,
em vista do progressivo escasseamento de caça.
A posse coletiva do gado não chegou, ao que tudo indica, a afetar a organização
tradicional da produção por grupos domésticos. O rebanho é confiado a um
vaqueiro, que chama os membros da comunidade por ocasião de trabalhos de
maior envergadura, que se realizam regados a caxiri e pajuaru – bebidas
elaboradas a partir da fermentação da mandioca –, como nas outras situações de
ajuda mútua entre as parentelas.
Fontes de informação
• ALMEIDA, Tânia Mara Campos de. O levantamento e a vistoria das
ocupações de não índio: o caso da Terra Indígena Barata/Livramento
(RR). In: GRAMKOW, Márcia Maria (Org.). Demarcando terras indígenas
II : experiências e desafios de um projeto de parceria. Brasília :
Funai/PPTAL/GTZ, 2002. p.151-68.
• AMÓDIO, Emanuele. Murei : saber mítico y bancos chamánicos entre los
Makuxi de Brasil. In: AMÓDIO, Emanuele; JUNCOSA, José E (Comps.).
Los espiritus aliados : chamanismo y curación en los pueblos indios de
Sudamerica. Quito : Abya-Yala ; Roma : MLAL, 1991. p. 155-88. (Colección
500 Años, 31)
• ANDRELLO, Geraldo L. Relatório sobre a Terra Indígena São Marcos :
histórico e situação geral. São Paulo : Eletronorte, 1998. 120 p.
• CENTRO DE INFORMAÇÃO DIOCESE DE RORAIMA. Índios de
Roraima : Makuxi, Taurepang, Ingarikó, Wapixana. Boa Vista : Diocese de
Roraima, 1989. 106 p.
• CONSELHO INDÍGENA DE RORAIMA. Raposa Serra do Sol : os índios no
futuro de Roraima. Boa Vista : CIR, 1993. 40 p.
• --------; COMISSÃO PRÓ-ÍNDIO DE SÃO PAULO. Parecer sobre o
relatório de impacto ambiental da hidroelétrica de Cotingo. São Paulo :
CPI, 1994. 37 p.
• DINIZ, Edson Soares. Os índios Makuxi do Roraima : sua instalação na
sociedade nacional. Marília : FFCLM, 1972. 191 p. (Teses, 9)
• --------. O perfil de uma situação interétnica : os Makuxi e os regionais de
Roraima. Boletim do MPEG: Antropologia, n.31, 37 p., abr. 1966.
• ELETRONORTE. Interligação elétrica Venezuela-Brasil : processo de
negociação com as comunidades indígenas das TIs São Marcos e Ponta da
Serra. s.l. : Eletronorte, 1997. 69 p.
• FARAGE, Nádia. As muralhas dos sertões : os povos indígenas no Rio
Branco e a colonização. Campinas : Unicamp, 1986. 469 p. (Dissertação de
Mestrado)
• GOUVÊA, Ana Cristina de Souza Lima. O parâmetro da ergatividade e a
língua karibe macuxi. Rio de Janeiro : UFRJ, 1994. 175 p. (Dissertação de
Mestrado)
• GRUPIONI, Luis Donisete Benzi. O ponto de vista dos professores
indígenas : entrevistas com Joaquim Mana Kaxinawa, Fausto Mandulao
Macuxi e Francisca Novantino Pareci. Em Aberto, Brasília : Inep/MEC, v.
20, n. 76, p. 154-76, fev. 2003.
• KOMPF, J. et al. Linked loci in chromosome 1 (FXIIIB, HF, PEPC) and
their variability in Brazilian indians. American Journal of Human Biology,
New York : s.ed., v. 4, n. 5, p. 573-7, 1992.
• MARTINS, Leda Leitão. Dominando la malaria : un nuevo modelo de salud
para poblaciones indígenas en Brasil. Desarrollo de Base, Arlington :
Fundación Interamericana, v. 22, n. 1, p. 11-6, 1999.
• MELO, Maria Auxiliadora de Souza. Metamorfoses do saberMacuxi/Wapichana : memórias e identidade. Manaus : UFAM, 2000. 170
p. (Dissertação de Mestrado)
• MEYER, Alcuino. Pauxiána : pequeno ensaio sobre a tribo Pauxiána e sua
língua, comparada com a língua Macuxí. Rio de Janeiro : Arquivo
Nacional, 1956. 50 p.
• MONTANHA, Vilela. Os bravos de Oixi : índios em luta pela vida. Uma
estória baseada em fatos reais. Petrópolis : Vozes, 1994. 232 p.
• MYERS, Iris. The Makushi of the Guiana - Brazilian frontier in 1994 : a
study of culture contact. Antropológica, Caracas : Fundación La Salle, n.
80, 98 p., 1993.
• OLIVEIRA JÚNIOR, Geraldo Barbosa de. Os Macuxi : desenvolvimento e
políticas públicas em Roraima. Florianópolis : UFSC, 1998. 138 p.
(Dissertação de Mestrado)
• PENGLASE, Ben. Brazil : violence against the Macuxi and Wapixana
indians in Raposa Serra do Sol and Northern Roraima from 1988 to 1994.
New York : Human Rights Watch/Americas, 1994. 30 p.
• PIRA, Vicente; AMODIO, Emanuele. Makuxi Maimu : guias para a
aprendizagem e dicionário da língua Makuxi. Boa Vista : Centro de
Documentação de Culturas Indígenas de Roraima, 1983. 184 p.
• RAPOSO, Gabriel Viriato. Ritorno alla maloca : autobiografia di un indio
Makuxi. Parma : I.S.M.E. ; Milão : P.I.M.E. ; Torino : Missioni Consolata,
1972. 126 p.
• REPETTO, Maxim. Roteiro de uma etnografia colaborativa : as
organizações indígenas e a construção de uma educação diferenciada em
Roraima, Brasil. Brasília : UnB, 2002. 297 p. (Tese de Doutorado)
• SALDANHA, Paula; WERNECK, Roberto. Expedições, terras e povos do
Brasil : Yanomamis e outros povos indígenas da Amazônia. Rio de
Janeiro : Edições del Prado, 1999. 95 p.
• SANTILLI, Paulo José Brando. Fronteiras da República : história e política
entre os Macuxi no vale do rio Branco. São Paulo : USP-NHII ; Fapesp,
1994. 119 p.
• --------. Laudo assistencial-técnico pericial antropológico : Ação de
Interdito Proibitório 011/92 - AD - Processo nº 92.0001637-5. s.l. : s.ed.,
1995. 25 p. (AI: Cajueiro)
• --------. Laudo Pericial Antropológico atinente ao processo nº 92.1634-0
em tramite na Justiça Federal de 1ª Instância, Secção Judiciária de
Roraima. s.l. : s.ed., 1995. 44 p. (Fazenda Guanabara)
• --------. Laudo Pericial Antropológico originado da Carta Precatória nº
93.00096-9 componente do processo nº 91.13363-9. s.l. : s.ed., 1994. 118
p. (AI: Raposa-Serra do Sol)
• --------. Os Macuxi : historia e politica no século XX. Campinas : Unicamp,
1989. 162 p. (Dissertação de Mestrado)
• --------. Mito e história Makuxi. Terra Indígena, Araraquara : Centro de
Estudos Indígenas, v. 9, n. 63, p. 19-29, abr./jun. 1992.
• --------. Ocupação territorial Macuxi : aspectos históricos e políticos. In:
BARBOSA, Reinaldo Imbrozio; FERREIRA, Efrem Jorge Gondim;
CASTELLON, Eloy Guillermo (Eds.). Homem, ambiente e ecologia no
estado de Roraima. Manaus : Inpa, 1997. p. 49-64.
• --------. Pemongon Pata : território Macuxi, rotas de conflito. São Paulo :
Unesp, 2001. 226 p. (Originalmente Tese de Doutorado, USP 1997)
• --------. Trabalho escravo e brancos canibais : uma narrativa histórica
Macuxi. In: ALBERT, Bruce; RAMOS, Alcida Rita (Orgs.). Pacificando o
branco : cosmologias do contato no Norte-Amazônico. São Paulo : Unesp,
2002. p. 487-506.
• --------. Usos da terra, fusos da lei : o caso Makuxi. In: NOVAES, Regina
Reyes; LIMA, Roberto Kant de, orgs. Antropologia e direitos humanos.
Niterói : EdUFF, 2001. p. 81-136.
• SILVA, Orlando Sampaio. Notas sobre algunos pueblos indígenas de la
frontera amazónica de Brasil en otros paises de sudamerica. In: JORNA,
P.; MALAVER, L.; OOSTRA, M. (Coords.). Etnohistoria del Amazonas.
Quito : Abya-Yala ; Roma : MLAL, 1991. p. 117-32. (Colección 500 Años,
36)
• SIMONIAN, Lígia Terezinha Lopes. Direitos e controle territorial em áreas
indígenas amazônidas : São Marcos (RR), Urueu-Wau-Wau (RO) e Mãe
Maria (PA). In: KASBURG, Carola; GRAMKOW, Márcia Maria (Orgs.).
Demarcando terras indígenas : experiências e desafios de um projeto de
parceria. Brasília : Funai/PPTAL/GTZ, 1999. p.65-82.
• --------. Mulheres indígenas Roraimenses : organização política, impasses e
perspectivas. In: SIMONIAN, Lígia Terezinha Lopes. Mulheres da
Amazônia brasileira : entre o trabalho e a cultura. Belém : UFPA/Naea,
2001. p.151-204.
• Ou vai ou racha, 20 anos de luta. Dir.: Mari Correa; Vincent Carelli. Vídeo
Cor, 31 min., 1998. Prod.: CTI

Outros materiais