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_Lit_3serie_Vol2_2019

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37
PARTE IV:
ESTILOS DE ÉPOCA
UNIDADE 02:
BARROCO
BARROCO
Muito se discute sobre qual seria a origem da palavra
"barroco". A explicação mais aceita é a de que o termo
provém da palavra espanhola barrueco, que designa um
tipo de pérola de formato irregular e com manchas. Assim,
o estilo de época teria sido nomeado em alusão à sua
irregularidade ou aspecto "defeituoso", na visão dos
clássicos.
A estética do Barroco, de fato, é acidentada e irregular
em relação ao estilo clássico, que o antecedeu. Evidenciam-
se os conflitos, as oposições, a dramaticidade intensa, há
tendência à engenhosidade e ao artifício nas obras de todas
as linguagens artísticas.
1. CONTEXTO HISTÓRICO
O movimento artístico do Barroco surge em um
contexto histórico, político e cultural caracterizado, na
Europa, pelo conflito entre as ideias racionalistas e a
tentativa de resgate da fé cristã mediante o enfraquecimento
da Igreja Católica. O Barroco tem como seu antecessor o
Renascimento, movimento artístico que retoma os padrões
da Antiguidade Clássica, valorizando a razão e considerando
o homem o centro do universo.
Além disso, importantes acontecimentos como o fim
das grandes navegações, a Reforma Protestante e a
Contrarreforma Católica ocasionaram um momento de crise
existencial do homem europeu, que se via dividido entre a
fé e a razão, o teocentrismo e o antropocentrismo, o
espiritualismo e o materialismo.
2. ARTE BARROCA
O estilo barroco, também chamado de seiscentista
(em referência aos anos 1600), encontra manifestações nas
diversas linguagens artísticas, como a pintura, a música, a
arquitetura e a literatura. A arte barroca, em todas as
vertentes, tem como característica central a expressão da
dualidade, do conflito e da contradição entre os valores
espirituais e a razão materialista. Ligada ao movimento
católico da Contrarreforma, a arte barroca tem, muitas vezes,
o papel de reforçar a fé cristã, conquistando o fiel por meio
de obras imponentes e majestosas.
Na pintura, normalmente, são representadas cenas
de grande dramaticidade - muitas vezes episódios bíblicos
ou mitológicos -, emprega-se um estilo grandioso, e,
principalmente, utilizam-se fortes contrastes claro-escuro.
Moça com
brinco de pérola,
Johannes Vermeer
 (1665-1666)
 A Lição de Anatomia do Dr. Tulp,
Rembrandt (1632)
 Deposição de
Cristo, Caravaggio
(1602-1603)
Na escultura, igualmente, são representadas cenas
de alta dramaticidade, com destaque para a expressão facial
e corporal das figuras humanas, roupas e cabelos
esvoaçantes. Uma das esculturas barrocas mais conhecidas
é o Êxtase de Santa Teresa, de Bernini, realizada para a
capela do Cardeal Frederico Cornaro, Igreja de Santa Maria
della Vittoria, em Roma. A obra representa a experiência
mística de Santa Teresa de Ávila trespassada por uma seta
de amor divino por um anjo.
38
Via um anjo perto de mim […] sob forma corporal, o
que não costumo ver senão muito raramente.[…] nesta
visão o Senhor quis que assim o visse: não era grande,
senão pequeno, formosíssimo, o rosto tão incendido, que
deveria ser dos anjos que servem muito próximos de
Deus, que parecem abrasar-se todos. […] Via-lhe nas
mãos um comprido dardo de ouro. Na ponta de ferro
julguei haver um pouco de fogo. Parecia algumas vezes
metê-lo pelo meu coração a dentro, de modo que
chegava às entranhas. Ao tirá-lo tinha eu a impressão
de que as levava consigo, deixando-me toda abrasada
em grande amor de Deus. Era tão intensa a dor, que me
fazia dar os gemidos de que falei. Essa dor imensa produz
tão excessiva suavidade que não se deseja o seu fim,
nem a alma se contenta com menos do que com Deus.
Não é dor corporal senão espiritual, ainda que o corpo
não deixe de ter sua parte, e até bem grande. É um trato
de amor tão suave entre a alma e Deus, que suplico à
sua Bondade o dê a provar a quem pensar que minto.
(Relato de Teresa de Ávila sobre sua experiência mítica)
O Êxtase de Santa Teresa,
Gian Lorenzo Bernini (1647-1652)
Cristo carregando a cruz,
Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho (1800-1805)
Na arquitetura, o barroco se caracteriza pela
ornamentação excessiva, preenchendo todos os espaços.
As igrejas, principais obras representantes desse estilo,
chegam mesmo a usar ouro no revestimento das paredes,
causando uma forte impressão em quem entra. A arte
barroca, nesse sentido, foi de grande valia para a Igreja
Católica, gerando encantamento nos fiéis que frequentavam
essas construções grandiosas.
Na música, houve o desenvolvimento de novas
técnicas e surgimento de novos instrumentos, a
ornamentação musical passou a ser mais elaborada e
passaram a utilizar-se várias modulações dentro de uma
mesma peça teatral - antes, as composições eram
homogêneas. Um dos nomes mais conhecidos desse
período é o do italiano Antonio Vivaldi, que compôs a série
de concertos As Quatro Estações.
3. LITERATURA BARROCA
Como já se viu, o movimento artístico do Barroco se
dá em um período de grande turbulência política, social e
religiosa,quando o homem europeu encontrava-se cheio de
dúvidas e incertezas. Tudo isso se reflete, na literatura, em
uma série de características, temáticas e formais, que
podem ser identificadas nos textos desse período:
••••• Dualismo: muitas vezes expresso na forma de
antíteses ou paradoxos, o dualismo é um dos
principais elementos da literatura desse estilo,
estabelecendo o contraste e, ao mesmo tempo, a
integração dos dois lados em conflito do homem
barroco. Opõem-se conceitos como razão e fé;
corpo e alma; mente e espírito, homem e Deus.
••••• Fugacidade: o artista barroco tem a visão de que
tudo na existência humana é transitório, mutável,
efêmero.
••••• Feísmo: tendência a explorar a miséria humana,
retratar cenas trágicas ou grotescas com riqueza
de detalhes.
••••• Cultismo: exploração dos efeitos sensoriais do
texto a partir da utilização de linguagem rebuscada
e culta, muitos jogos de palavras e inversões
sintáticas, emprego de muitos recursos estilísticos,
em especial das figuras de linguagem como
hipérboles, metáforas, antíteses e paradoxos.
••••• Conceptismo: linguagem marcada pela
argumentação, emprego de complexos artifícios
retóricos, recursos formais como analogias e
metáforas engenhosas. As ideias e conceitos são
desenvolvidos por meio do raciocínio, conduzindo
o leitor a constatações paradoxais, típicas do
dualismo barroco.
Interior do Mosteiro de São Bento,
Rio de Janeiro (1671)
39
4. BARROCO BRASILEIRO
O Barroco é o estilo de época que marca a
inauguração da literatura no Brasil. Vale lembrar que, ao
fazer tal afirmação, partimos de um conceito de literatura
como arte da palavra escrita, excluindo, portanto, as
narrativas e poesia da tradição oral que já existiam no
território mesmo antes da chegada dos portugueses.
A formação de uma literatura propriamente dita, no
país, começa por volta do século XVII, ainda numa fase
que se chama de "literatura colonial", isto é, fortemente
ligada à literatura portuguesa. Antes disso já havia algumas
manifestações literárias no país, como as crônicas de
viagem e colonização e outros textos de teor informativo
classificados genericamente como quinhentistas. No
entanto, de acordo com estudiosos da literatura, como o
Prof. Antonio Candido, esses textos não consistem em
"literatura propriamente dita", uma vez que ainda não havia
um sistema literário formado no país, com elementos
produtores (autor, editoras), receptores (público leitor) e
circulação das obras.
O início do Barroco brasileiro é marcado pela
publicação do poema épico Prosopopeia, de Bento Teixeira,
em 1601. A obra tem seu valor artístico questionado, mas é
uma importante referência histórica por ser o marco
inaugural da literatura brasileira.
Gregório de Matos Guerra foi advogado e poeta,
considerado um dos maiores nomes da literatura barroca
em língua portuguesa. Nasceu em Salvador em 23 de
dezembro de 1636, estudou Direito em Coimbra (Portugal)
e morreu em Recife em 26 de novembro de 1696. A alcunha
de "Boca do Inferno" ou "Boca de Brasa" lhe foi dada por
conta do humor ácido que destilavaem seus poemas
satíricos, nos quais fazia críticas aos problemas sociais ou
a pessoas diversas. Além da poesia satírica, Gregório de
Matos também se dedicou à poesia lírica e erótica. No fim
de sua vida, o poeta passou a se dedicar também à poesia
religiosa, demonstrando culpa e arrependimento em relação
à Igreja. Não publicou nada em vida; sua obra foi compilada
e publicada posteriormente, por pesquisadores. Assim,
ainda hoje restam dúvidas sobre a autoria de alguns textos
que se atribuem a ele.
GREGÓRIO DE MATOS, O BOCA DO INFERNO
POEMAS DE GREGÓRIO DE MATOS
DESCREVE QUE ERA REALMENTE NAQUELE
TEMPO A CIDADE DA BAHIA
A cada canto um grande conselheiro,
Que nos quer governar cabana, e vinha,
Não sabem governar sua cozinha,
E podem governar o mundo inteiro.
Em cada porta um freqüentado olheiro,
Que a vida do vizinho, e da vizinha
Pesquisa, escuta, espreita, e esquadrinha,
Para a levar à Praça, e ao Terreiro.
Muitos Mulatos desavergonhados,
Trazidos pelos pés os homens nobres,
Posta nas palmas toda a picardia.
Estupendas usuras nos mercados,
odos, os que não furtam, muito pobres,
E eis aqui a cidade da Bahia.
MATOS, Gregório de. In: ____.
Seleção de Obras Poéticas. Obra de domínio público.
Disponível em: <http://www.dominiopublico.gov.br
/download/texto/bv000119.pdf>
BUSCANDO A CRISTO
A vós correndo vou, braços sagrados,
Nessa cruz sacrossanta descobertos
Que, para receber-me, estais abertos,
E, por não castigar-me, estais cravados.
A vós, divinos olhos, eclipsados
De tanto sangue e lágrimas abertos,
Pois, para perdoar-me, estais despertos,
E, por não condenar-me, estais fechados.
A vós, pregados pés, por não deixar-me,
A vós, sangue vertido, para ungir-me,
A vós, cabeça baixa, p'ra chamar-me
A vós, lado patente, quero unir-me,
A vós, cravos preciosos, quero atar-me,
Para ficar unido, atado e firme.
MATOS, Gregório de, In: RAMOS, Péricles E. da Silva (Org.).
Poesia barroca. São Paulo: Melhoramentos, 1967.
PICA-FLOR
A uma freira que satirizando a delgada
fisionomia do poeta lhe chamou "Pica-Flor".
Se Pica-Flor me chamais,
Pica-Flor aceito ser,
Mas resta agora saber,
Se no nome que me dais,
Meteis a flor que guardais
No passarinho melhor!
Se me dais este favor,
Sendo só de mim o Pica,
E o mais vosso, claro fica,
Que fico então Pica-Flor.
MATOS, Gregório de.
In: Seleção de Obras Poéticas. Obra de domínio público.
Disponível em: <http://www.dominiopublico.gov.br/
download/texto/bv000119.pdf>
40
Antônio Vieira é conhecido por sua oratória conceptista,
empregando largamente recursos como analogias e
metáforas a fim, principalmente, de elucidar questões
bíblicas ou da doutrina católica mais obscuras. A
dualidade barroca fica marcada em seus textos pela
alternância de um estilo grandiloquente com um estilo
mais descontraído.
Assim como Gregório de Matos, é um dos principais
nomes da literatura barroca em língua portuguesa. Por
ser de nacionalidade portuguesa mas ter escrito a maior
parte de sua obra no Brasil, a obra do padre é incluída
nas antologias literárias de ambos os países, sendo ele
considerado um autor importante tanto do barroco
brasileiro quanto do português. O excerto abaixo é do
Sermão de Santo Antônio aos peixes, um dos textos mais
conhecidos do padre. O sermão foi proferido em São
Luís do Maranhão em 13 de junho de 1654, dia de Santo
Antônio, e trata da questão dos vícios e virtudes do
homem - e, mais especificamente, da exploração humana
- por meio da alegoria dos peixes.
PADRE ANTÔNIO VIEIRA
 Nascido em Lisboa em 6 de fevereiro de 1608 e
falecido em Salvador em 18 de julho de 1697, aos 89
anos de idade, o Padre Antônio Vieira (ou António Vieira,
na grafia portuguesa) foi um missionário da Companhia
de Jesus no Brasil, sendo uma figura política muito
influente de sua época. Nascido em Portugal, Antônio
Vieira veio para o Brasil ainda criança, onde realizou seus
estudos no Colégio dos Jesuítas de Salvador e,
posteriormente, se ordenou padre. Em sua vida adulta,
viveu períodos em Portugal e outros no Brasil, contando
ainda com uma temporada de seis anos em Roma.
Como missionário, teve importante papel de
evangelizador dos povos indígenas, sendo chamado
pelos nativos de "Paiaçu" (em tupi, "grande pai").
Defendia arduamente os direitos desses povos,
combatendo sua exploração e escravização. Além disso,
Antônio Vieira criticou a Inquisição e a postura de alguns
religiosos de seu tempo, defendeu o fim da abolição da
diferenciação que havia entre cristãos-novos (judeus
convertidos) e cristãos-velhos (católicos tradicionais) e
a abolição da escravatura.
A obra do Padre Antônio Vieira consiste
principalmente em sermões, motivo pelo qual muitos o
classificam como um orador, e não como um escritor.
SONETO VII
Ardor em coração firme nascido!
Pranto por belos olhos derramado!
Incêndio em mares de água disfarçado!
Rio de neve em fogo convertido!
Tu, que um peito abrasas escondido,
Tu, que em um rosto corres desatado,
Quando fogo em cristais aprisionado,
Quando cristal em chamas derretido.
Se és fogo como passas brandamente?
Se és neve, como queimas com porfia?
Mas ai! que andou Amor em ti prudente.
Pois para temperar a tirania,
Como quis, que aqui fosse a neve ardente,
Permitiu, parecesse a chama fria.
MATOS, Gregório de, In: RAMOS, Péricles E. da Silva (Org.).
Poesia barroca. São Paulo: Melhoramentos, 1967.
SERMÃO DE SANTO ANTÔNIO AOS PEIXES
(EXCERTO)
Olhai, peixes, lá do mar para a terra. Não, não: não
é isso o que vos digo. Vós virais os olhos para os matos
e para o sertão? Para cá, para cá; para a cidade é que
haveis de olhar. Cuidais que só os Tapuias se comem
uns aos outros? Muito maior açougue é o de cá, muito
mais se comem os Brancos. Vedes vós todo aquele bulir,
vedes todo aquele andar, vedes aquele concorrer às
praças e cruzar as ruas; vedes aquele subir e descer as
calçadas, vedes aquele entrar e sair sem quietação nem
sossego? Pois tudo aquilo é andarem buscando os
homens como hão-de comer e como se hão-de comer.
Morreu algum deles, vereis logo tantos sobre o miserável
a despedaçá-lo e comê-lo. Comem-no os herdeiros,
comem-no os testamenteiros, comem-no os legatários,
comem-no os acredores; comem-no os oficiais dos órfãos
e os dos defuntos e ausentes; come-o o médico, que o
curou ou ajudou a morrer; come-o o sangrador que lhe
tirou o sangue; come-a a mesma mulher, que de má
vontade lhe dá para a mortalha o lençol mais velho da
casa; come-o o que lhe abre a cova, o que lhe tange os
sinos, e os que, cantando, o levam a enterrar; enfim,
ainda o pobre defunto o não comeu a terra, e já o tem
comido toda a terra.
Já se os homens se comeram somente depois de
mortos, parece que era menos horror e menos matéria
de sentimento. Mas para que conheçais a que chega a
vossa crueldade, considerai, peixes, que também os
homens se comem vivos assim como vós. Vivo estava
Job, quando dizia: Quare persequimini me, et carnibus
meis saturamini? "Porque me perseguis tão
desumanamente, vós, que me estais comendo vivo e
fartando-vos da minha carne?" Quereis ver um Job
destes?
41
01 Contextualize historicamente o movimento estético do
Barroco.
02 "Ao entrar em uma igreja barroca, o fiel sente-se como
se estivesse, de fato, adentrando o Reino dos Céus."
Com base na estética da arquitetura barroca, explique
essa afirmativa.
03 Assinale as características que correspondem à
estética barroca:
( ) Formas sóbrias, austeras
( ) Contraste claro-escuro
( ) Formas rebuscadas
( ) Linguagem objetiva e direta
( ) Figuras de linguagem em abundância
( ) Culto à razão
( ) Antropocentrismo
( ) Conflito entre mente e espírito
04 Diferencie cultismo e conceptismo.
05 Justifique a seguinte afirmativa: "a antítese é a figura
de linguagem que melhor caracteriza o estilo barroco".
06 Qual contraste se destaca nas pinturas barrocas?
07 Por que chamamos o estilo barroco também de
seiscentista?
08 Qual temática costuma prevalecer na escultura
barroca?
09 Por que o principal expoente do barroco brasileiro,
Gregório de Matos, carregava o apelido "Boca do
Inferno"?
10 Como se pode catalogara produção poética de
Gregório de Matos?
01 (VUNESP)
Ardor em firme coração nascido;
pranto por belos olhos derramado;
incêndio em mares de água disfarçado;
rio de neve em fogo convertido:
tu, que em um peito abrasas escondido;
tu, que em um rosto corres desatado;
quando fogo, em cristais aprisionado;
quando crista, em chamas derretido.
Se és fogo, como passas brandamente,
se és fogo, como queimas com porfia?
Mas ai, que andou Amor em ti prudente!
Pois para temperar a tirania,
como quis que aqui fosse a neve ardente,
permitiu parecesse a chama fria.
O texto pertencente a Gregório de Matos apresenta
todas as seguintes características:
(A) Trocadilhos, predomínio de metonímias e de
símiles, a dualidade temática da sensualidade
e do refreamento, antíteses claras dispostas em
ordem direta.
(B) Sintaxe segundo a ordem lógica do Classicismo,
a qual o autor buscava imitar, predomínio das
metáforas e das antíteses, temática da
fugacidade do tempo e da vida.
(C) Dualidade temática da sensualidade e do refre-
amento, construção sintática simétrica por sime-
trias sucessivas, predomínio figurativo das me-
táforas e pares antitéticos que tendem para o
paradoxo.
(D) Técnica naturalista, assimetria total de constru-
ção, ordem direta inversa, imagens que prenun-
ciam o Romantismo.
(E) Verificação clássica, temática neoclássica, sin-
taxe preciosista evidente no uso das antíteses,
dos anacolutos e das alegorias, construção
assimétrica.
02 (ENEM)
Quando Deus redimiu da tirania
Da mão do Faraó endurecido
O Povo Hebreu amado, e esclarecido,
Páscoa ficou da redenção o dia.
Páscoa de flores, dia de alegria
Àquele povo foi tão afligido
O dia, em que por Deus foi redimido;
Ergo sois vós, Senhor, Deus da Bahia.
Pois mandado pela Alta Majestade
Nos remiu de tão triste cativeiro,
Nos livrou de tão vil calamidade.
Quem pode ser senão um verdadeiro
Deus, que veio estirpar desta cidade
o Faraó do povo brasileiro.
 (DAMASCENO, D. Melhores poemas:
Gregório de Matos. São Paulo: 2006)
Vede um homem desses que andam perseguidos
de pleitos ou acusados de crimes, e olhai quantos o estão
comendo. Come-o o meirinho, come-o o carcereiro,
come-o o escrivão, come-o o solicitador, come-o o
advogado, come-o o inquiridor, come-o a testemunha,
come-o o julgador, e ainda não está sentenciado, já está
comido. São piores os homens que os corvos. O triste
que foi à forca, não o comem os corvos senão depois de
executado e morto; e o que anda em juízo, ainda não
está executado nem sentenciado, e já está comido.
VIEIRA, Pe. António. Sermão de Santo Antonio.
Disponível em: <http://www.dominiopublico.gov.br/
download/texto/bv000033.pdf> .
42
Com uma elaboração de linguagem e uma visão
de mundo que apresentam princípios barrocos, o
soneto de Gregório de Matos apresenta temática
expressa por
(A) visão cética sobre as relações sociais.
(B) preocupação com a identidade brasileira.
(C) crítica velada à forma de governo vigente.
(D) reflexão sobre dogmas do Cristianismo.
(E) questionamento das práticas pagãs na Bahia.
BARDI, P. M. Em torno da escultura no Brasil. São Paulo:
Banco Sudameris Brasil, 1989. (Foto: Reprodução/Enem)
Com contornos assimétricos, riqueza de detalhes nas
vestes e nas feições, a escultura barroca no Brasil
tem forte influência do rococó europeu e está
representada aqui por um dos profetas do pátio do
Santuário do Bom Jesus de Matosinho, em
Congonhas (MG), esculpido em pedra-sabão por
Aleijadinho. Profundamente religiosa, sua obra revela
(A) liberdade, representando a vida de mineiros à
procura da salvação.
(B) credibilidade, atendendo a encomendas dos no-
bres de Minas Gerais.
(C) simplicidade, demonstrando compromisso com
a contemplação do divino.
(D) personalidade, modelando uma imagem sacra
com feições populares.
(E) singularidade, esculpindo personalidades do rei-
nado nas obras divinas.
04 (ENEM PPL)
Quantos há que os telhados têm vidrosos
E deixam de atirar sua pedrada,
De sua mesma telha receiosos.
Adeus, praia, adeus, ribeira,
De regatões tabaquista,
Que vende gato por lebre
Querendo enganar a vista.
Nenhum modo de desculpa
Tendes, que valer-vos possa:
Que se o cão entra na igreja,
É porque acha aberta a porta.
GUERRA, G. M. In: LIMA, R. T. Abecê de folclore.
São Paulo: Martins Fontes, 2003 (fragmento).
03 (ENEM)
Ao organizar as informações, no processo de
construção do texto, o autor estabelece sua intenção
comunicativa. Nesse poema, Gregório de Matos
explora os ditados populares com o objetivo de
(A) enumerar atitudes.
(B) descrever costumes.
(C) demonstrar sabedoria.
(D) recomendar precaução.
(E) criticar comportamentos.
05 (ENEM PPL)
SERMÃO DA SEXAGÉSIMA
Nunca na Igreja de Deus houve tantas pregações, nem
tantos pregadores como hoje. Pois se tanto se semeia
a palavra de Deus, como é tão pouco o fruto? Não há
um homem que em um sermão entre em si e se
resolva, não há um moço que se arrependa, não há
um velho que se desengane. Que é isto? Assim como
Deus não é hoje menos onipotente, assim a sua
palavra não é hoje menos poderosa do que dantes
era. Pois se a palavra de Deus é tão poderosa; se a
palavra de Deus tem hoje tantos pregadores, por que
não vemos hoje nenhum fruto da palavra de Deus?
Esta, tão grande e tão importante dúvida, será a
matéria do sermão. Quero começar pregando-me a
mim. A mim será, e também a vós; a mim, para
aprender a pregar; a vós, que aprendais a ouvir.
VIEIRA, A. Sermões Escolhidos, v. 2.
São Paulo: Edameris, 1965.
No Sermão da sexagésima, padre Antônio Vieira
questiona a eficácia das pregações. Para tanto,
apresenta como estratégia discursiva sucessivas
interrogações, as quais têm por objetivo principal
(A) provocar a necessidade e o interesse dos fiéis
sobre o conteúdo que será abordado no sermão.
(B) conduzir o interlocutor à sua própria reflexão so-
bre os temas abordados nas pregações.
(C) apresentar questionamentos para os quais a
Igreja não possui respostas.
(D) inserir argumentos à tese defendida pelo pre-
gador sobre a eficácia das pregações.
(E) questionar a importância das pregações feitas
pela Igreja durante os sermões.
06 (ESPCEX-AMAN) "Se gostas de afetação e pompa
de palavras e do estilo que chamam culto, não me
leias. Quando esse estilo florescia, nasceram as
primeiras verduras do meu; mas valeu-me tanto
sempre a clareza, que só porque me entendiam
comecei a ser ouvido. (...) Esse desventurado estilo
que hoje se usa, os que querem honrar chamam-lhe
culto, os que o condenam chamam-lhe escuro, mas
ainda lhe fazem muita honra. O estilo culto não é
escuro, é negro (...) e muito cerrado. É possível que
somos portugueses e havemos de ouvir um pregador
em português e não havemos de entender o que diz?!"
43
Padre Antônio Vieira, nesse trecho, faz uma crítica ao
estilo barroco conhecido como
(A) conceptismo, por ser marcado pelo jogo de
ideias, de conceitos, seguindo um raciocínio ló-
gico.
(B) quevedismo, por utilizar-se de uma retórica apri-
morada, a exemplo de seu principal cultor:
Quevedo.
(C) antropocentrismo, caracterizado por mostrar o
homem, culto e inteligente, como centro do uni-
verso.
(D) gongorismo, ao caracterizar-se por uma lingua-
gem rebuscada, culta e extravagante.
(E) teocentrismo, caracterizado por padres escrito-
res que dominaram a literatura seiscentista.
TEXTO PARA AS PRÓXIMAS 3 QUESTÕES:
À CIDADE DA BAHIA
Triste Bahia! Ó quão dessemelhante
Estás e estou do nosso antigo estado!
Pobre te vejo a ti, tu a mi empenhado,
Rica te vi eu já, tu a mi abundante.
A ti trocou-te a máquina mercante,
Que em tua larga barra tem entrado,
A mim foi-me trocando e tem trocado
Tanto negócio e tanto negociante.
Deste em dar tanto açúcar excelente
Pelas drogas inúteis, que abelhuda
Simples aceitas do sagaz Brichote.
Oh quisera Deus que de repente
Um dia amanheceras tão sisuda
Que fora de algodão o teu capote!
Matos, Gregório de. Poemas escolhidos.
São Paulo: Companhia das Letras, 2010.
07 (UFJF) O poema de Gregório de Matos é uma crítica
ao:
(A) renascimento cultural.
(B) mercantilismo.
(C) medievalismo.(D) preconceito racial.
(E) aumento dos preços.
08 (UFJF) Nos versos "Triste Bahia! Ó quão
dessemelhante / Estás e estou do nosso antigo
estado", o eu lírico manifesta um descontentamento
em relação:
(A) à idade média.
(B) ao estilo barroco.
(C) ao sistema colonial.
(D) ao rito jurídico.
(E) ao humanismo renascentista.
09 (UFJF) Em relação ao estilo barroco, qual figura de
linguagem predomina no poema de Gregório de
Matos:
(A) personificação.
(B) silepse.
(C) eufemismo.
(D) sinestesia.
(E) barbarismo.
LEIA O EXCERTO DO "SERMÃO DE SANTO ANTÔNIO
AOS PEIXES" DE ANTÔNIO VIEIRA (1608-1697) PARA
RESPONDER ÀS QUESTÕES.
A primeira cousa que me desedifica, peixes, de vós, é
que vos comeis uns aos outros. Grande escândalo é este,
mas a circunstância o faz ainda maior. Não só vos comeis
uns aos outros, senão que os grandes comem os pequenos.
[...] Santo Agostinho, que pregava aos homens, para
encarecer a fealdade deste escândalo mostrou-lho nos
peixes; e eu, que prego aos peixes, para que vejais quão
feio e abominável é, quero que o vejais nos homens. Olhai,
peixes, lá do mar para a terra. Não, não: não é isso o que
vos digo. Vós virais os olhos para os matos e para o sertão?
Para cá, para cá; para a cidade é que haveis de olhar.
Cuidais que só os tapuias se comem uns aos outros, muito
maior açougue é o de cá, muito mais se comem os brancos.
Vedes vós todo aquele bulir, vedes todo aquele andar, vedes
aquele concorrer às praças e cruzar as ruas: vedes aquele
subir e descer as calçadas, vedes aquele entrar e sair sem
quietação nem sossego? Pois tudo aquilo é andarem
buscando os homens como hão de comer, e como se hão
de comer.
[...]
Diz Deus que comem os homens não só o seu povo,
senão declaradamente a sua plebe: Plebem meam, porque
a plebe e os plebeus, que são os mais pequenos, os que
menos podem, e os que menos avultam na república, estes
são os comidos. E não só diz que os comem de qualquer
modo, senão que os engolem e os devoram: Qui devorant.
Porque os grandes que têm o mando das cidades e das
províncias, não se contenta a sua fome de comer os
pequenos um por um, poucos a poucos, senão que devoram
e engolem os povos inteiros: Qui devorant plebem meam.
E de que modo se devoram e comem? Ut cibum panis: não
como os outros comeres, senão como pão. A diferença que
há entre o pão e os outros comeres é que, para a carne, há
dias de carne, e para o peixe, dias de peixe, e para as frutas,
diferentes meses no ano; porém o pão é comer de todos os
dias, que sempre e continuadamente se come: e isto é o
que padecem os pequenos. São o pão cotidiano dos
grandes: e assim como pão se come com tudo, assim com
tudo, e em tudo são comidos os miseráveis pequenos, não
tendo, nem fazendo ofício em que os não carreguem, em
que os não multem, em que os não defraudem, em que os
não comam, traguem e devorem: Qui devorant plebem
meam, ut cibum panis. Parece-vos bem isto, peixes?
(Antônio Vieira. Essencial, 2011.)
10 (UNIFESP) Em "Cuidais que só os tapuias se comem
uns aos outros, muito maior açougue é o de cá, muito
mais se comem os brancos." (1º parágrafo), os termos
em destaque foram empregados, respectivamente, em
sentido
(A) literal, figurado e figurado.
(B) figurado, figurado e literal.
(C) literal, literal e figurado.
(D) figurado, literal e figurado.
(E) literal, figurado e literal.
44
11 (UNIFESP) O primeiro parágrafo permite identificar o
lugar em que o pregador profere seu sermão, a saber,
(A) o mar.
(B) o sertão.
(C) a floresta.
(D) a aldeia.
(E) a cidade.
12 (UNIFESP) No sermão, Vieira critica
(A) a preguiça desmesurada dos miseráveis.
(B) a falta de ambição dos miseráveis.
(C) a ganância excessiva dos poderosos.
(D) o excesso de humildade dos miseráveis.
(E) o excesso de vaidade dos poderosos.
13 (UNIFESP) Condizente com o teor do sermão está o
conteúdo do seguinte provérbio:
(A) "A tolerância é a virtude do fraco."
(B) "O homem é o lobo do homem."
(C) "Ao homem ousado, a fortuna lhe dá a mão."
(D) "A fome é a companheira do homem ocioso."
(E) "Quem tem ofício, não morre de fome."
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO:
AO MESMO ASSUNTO E NA MESMA OCASIÃO
Corrente, que do peito destilada
Sois por dois belos olhos despedida;
E por carmim correndo dividida
Deixais o ser, levais a cor mudada
Não sei quando caís precipitada,
Às flores que regais tão parecida,
Se sois neve por rosa derretida,
Ou se rosa por neve desfolhada.
Essa enchente gentil de prata fina,
Que de rubi por conchas se dilata,
Faz troca tão diversa e peregrina,
Que no objeto, que mostra, ou que retrata,
Mesclando a cor purpúrea, à cristalina,
Não sei quando é rubi, ou quando é prata.
(Gregório de Matos)
14 (ESPM) Os versos acima relatam um acontecimento
emocional (traduzido pelas lágrimas) que remete a
uma decepção ou perda amorosa. Assinale a
alternativa NÃO condizente.
(A) há uma oposição cromática que metaforicamen-
te contrapõe o quente e o frio.
(B) é possível associar os termos "rosa", "rubi",
"carmim", "cor purpúrea" ao amor carnal.
(C) é possível associar os termos "corrente", "neve",
"prata", "enchente", "cristal" ao amor espiritual.
(D) pelo jogo de palavras, pelas metáforas e pelos
aspectos sensoriais, afirma-se que pre-domina
o estilo conceptista do Barroco.
(E) o poeta conclui que não há dissociação entre
amor carnal e espiritual, pois ambos estão uni-
dos.
15 (PUCC-SP)
"Que falta nesta cidade? Verdade.
Que mais por sua desonra? Honra.
Falta mais que se lhe ponha? Vergonha.
O demo a viver se exponha,
Por mais que a fama a exalta,
Numa cidade onde falta
Verdade, honra, vergonha."
Pode-se reconhecer nos versos acima, de Gregório
de Matos:
(A) caráter de jogo verbal próprio do estilo barroco,
a serviço de uma crítica, em tom de sátira, do
perfil moral da cidade da Bahia.
(B) caráter de jogo verbal próprio da poesia religio-
sa do século XVI, sustentando piedosa
lamentação pela falta de fé do gentio.
(C) estilo pedagógico da poesia neoclássica, por
meio da qual o poeta se investe das funções de
um autêntico moralizador.
(D) caráter de jogo verbal próprio do estilo barroco,
a serviço da expressão lírica do arrependimen-
to do poeta pecador.
(E) estilo pedagógico da poesia neoclássica, sus-
tentando em tom lírico as reflexões do poeta
sobre o perfil moral da cidade da Bahia.
01 (UNICAMP) O trecho abaixo corresponde à parte final
do primeiro Sermão de Quarta-Feira de Cinzas,
pregado em 1672 pelo Padre Antonio Vieira.
"Em que cuidamos, e em que não cuidamos? Homens
mortais, homens imortais, se todos os dias podemos
morrer, se cada dia nos imos chegando mais à morte,
e ela a nós; não se acabe com este dia a memória da
morte. Resolução, resolução uma vez, que sem
resolução nada se faz. E para que esta resolução dure,
e não seja como outras, tomemos cada dia uma hora
em que cuidemos bem naquela hora. De vinte e quatro
horas que tem o dia, por que se não dará uma hora à
triste alma? Esta é a melhor devoção e mais útil
penitência, e mais agradável a Deus, que podeis fazer
nesta Quaresma. (...) Torno a dizer para que vos fique
na memória: Quanto tenho vivido? Como vivi? Quanto
posso viver? Como é bem que viva? Memento homo."
(Antonio Vieira, Sermões de Quarta-Feira de Cinza.
Campinas, SP: Editora da Unicamp, 2016, p.102.)
a) Levando em conta o trecho acima e o propósito
argumentativo do Sermão, explique por que,
segundo Vieira, se deve preservar "a memória
da morte".
b) Considere as perguntas presentes no trecho aci-
ma e explique sua função para a mensagem fi-
nal do Sermão.
45
TEXTO PARA AS PRÓXIMAS 2 QUESTÕES:
AO VALIMENTO*
QUE TEM O MENTIR
Mau ofício é mentir, mas proveitoso...
Tanta mentira, tanta utilidade
Traz consigo o mentir nesta cidade
Como o diz o mais triste mentiroso.
Eu, como um ignorante e um baboso,
Me pus a verdadeiro, por vaidade;
Todo o meu cabedal* meti em verdade
E saí do negócio perdidoso*.
Perdi o principal, que eram verdades,
Perdi os interesses de estimar-me,
Perdi-me a mim em tanta soledade*;
Deram os meus amigos em deixar-me,
Cobrei* ódios e inimizades...
Eu me meto a mentir e a aproveitar-me.GREGÓRIO DE MATOS
PIRES, M. L. G. (org.). Poetas do período barroco.
 Lisboa: Comunicação, 1985.
*valimento – validade
*cabedal – conhecimento
*perdidoso – prejudicado
*soledade – solidão
*cobrar – receber
02 (UERJ) O barroco apresenta duas vertentes: o
cultismo, caracterizado pela linguagem rebuscada e
extravagante, pelos jogos de palavras; e o
conceptismo, marcado pelo jogo de ideias, de
conceitos, seguindo um raciocínio lógico.
O poema de Gregório de Matos, exemplo da estética
barroca, insere-se em uma dessas vertentes.
Identifique-a e justifique sua resposta.
03 (UERJ) A primeira estrofe do poema apresenta
inversões da ordem direta das orações. Esse recurso
expressivo, chamado hipérbato, é frequente na
estética barroca.
Reescreva os versos 2 e 3 da primeira estrofe na
ordem direta, desfazendo o hipérbato.
Em seguida, explique o efeito do hipérbato para a
camada sonora dessa estrofe.
.............................................................................................
.............................................................................................
.............................................................................................
.............................................................................................
.............................................................................................
PARTE IV:
ESTILOS DE ÉPOCA
UNIDADE 03:
ARCADISMO
A ARCÁDIA
O movimento estético conhecido como Arcadismo tem
seu nome originário do grego (Arkadía), que era
uma província da Grécia Antiga. A topografia acidentada
dessa província e o modo de vida pastoril daqueles que ali
habitavam fez com que, mais tarde, a palavra "Arcádia"
passasse a designar um país imaginário, mitológico, onde
reina a mais perfeita paz e harmonia do homem do campo
com a natureza. Muitos artistas e poetas descreveram, em
suas obras, a Arcádia, caracterizada como um ambiente
idílico e tranquilo, o cenário ideal para uma vida simples e
feliz.
O Arcadismo, portanto, como o nome sugere, consiste
em um estilo de época que valoriza o bucolismo, isto é, o
modo de vida campestre, pastoril, caracterizado pela
comunhão com a natureza e um estado de espírito plácido.
O período também é conhecido como Setecentismo (em
referência aos anos 1700) ou Neoclassicismo, uma vez que
resgata valores da estética clássica, opondo-se à opulência
do Barroco.
1. CONTEXTO HISTÓRICO
O Arcadismo desenvolve-se no século XVIII, a que
comumente se chama "Século das Luzes", em função do
surgimento e expansão da corrente de pensamento
iluminista, que teve como alguns de seus principais
representantes pensadores como Voltaire, Diderot,
D'Alembert, Montesquieu, Rousseau, entre outros. Um dos
nomes que mais influenciou o pensamento iluminista foi
Isaac Newton, físico que buscou descrever o cosmos a partir
de leis universais, interpretando-o de forma precisa e
mecânica.
O pensamento iluminista, portanto, valorizava a
racionalidade e o progresso das ciências, enxergando
Natureza como um ideal, manifestação máxima da
racionalidade e da beleza. O Iluminismo culmina na
publicação da Enciclopédia, uma grande obra de referência,
composta de 35 volumes e publicada entre 1750 e 1772,
que versa sobre diversos assuntos.
Além disso, o mundo passava, naquele momento, por
profundas transformações sociopolíticas. Na Europa, a
classe burguesa ganha força, passando a dominar
economicamente o Estado, fato que culminou na Revolução
Francesa, no final do século. A nobreza e o clero perdem
força, e as questões teológicas estão em descrédito. No
Novo Mundo, ocorre a independência dos Estados Unidos,
em 1776, além de vários outros movimentos de
independência por toda a América, como os movimentos
revolucionários que ocorreram no Brasil, como a
Inconfidência Mineira.
46
Esse pensamento racionalista foi que motivou um
grupo de escritores italianos, ainda no final do século XVII,
a criar a Arcádia, uma academia literária que prezava pela
simplicidade e igualdade, com valores estéticos opostos
aos do Barroco. Esses artistas de inspiração clássica
realizavam saraus e reuniões ao ar livre, em bosques e
jardins, onde buscavam desenvolver esse novo estilo
artístico, que mais tarde se expandiu para outros países.
2. NEOCLASSICISMO NAS ARTES PLÁSTICAS
A banhista de Valpinçon,
 de Jean-Auguste Dominique Ingres (1808)
O nome Arcadismo remete, mais especificamente, à
literatura, por fazer referência à Arcádia italiana, isto é, a
academia literária que recebia esse nome. No que se refere
a outras linguagens artísticas, o movimento estético que se
desenvolve simultaneamente ao Arcadismo é o
Neoclassicismo, cujas características temáticas e formais
remetem à Antiguidade Clássica.
Outono pastoral,
de François Boucher (1748)
 Portão de Brandemburgo, Berlim, projeto de
Carl Gotthard Langhans (construído entre 1788 e 1791,
restaurado entre 2000 e 2002)
Um dos principais representantes da arte neoclássica
na pintura foi o francês Jacques-Louis David (1748-1825),
pintor oficial da corte napoleônica e engajado na Revolução
Francesa. Muitas de suas obras têm temática política e
remetem aos valores revolucionários burgueses.
O Juramento dos Horácios,
de Jacques-Louis David (1784)
A LITERATURA ÁRCADE
Inspirados pelos ideais iluministas de racionalidade e
exaltação da perfeição da natureza, os autores árcades
opunham-se totalmente à estética barroca, de intensa
dramaticidade e emotividade. Algumas das principais
características da literatura árcade são as seguintes:
••••• inspiração nos modelos clássicos greco-latinos e
renascentistas;
••••• presença de elementos mitológicos;
••••• valorização da vida simples e pastoril - remete à
ideia do bom selvagem, de Rousseau;
••••• desprezo pela ostentação, típica da aristocracia em
franca decadência;
No período neoclássico, assim como nos períodos
clássico e renascentista, há forte tendência ao formalismo
e racionalismo. Os artistas valorizam o academicismo e o
apuro da técnica; as formas em geral são precisas, bem
definidas e harmoniosas. Na escultura e arquitetura,
utilizam-se materiais nobres, como o mármore branco; nas
artes plásticas, há sobriedade nas cores e ornamentação.
As cenas mitológicas são uma temática recorrente no
período neoclássico.
47
••••• bucolismo: valorização da natureza idílica e da vida
em comunhão com a natureza;
••••• condenação ao cultismo e conceptismo barrocos;
••••• estética racionalista, que preza pelas proporções
e equilíbrio;
••••• eliminação de excessos, prezando por formas mais
sucintas;
••••• difusão de valores morais pela obra literária.
O estilo árcade, como já vimos, também é conhecido
como neoclássico. Os autores dessa escola literária
retomam a estética da Antiguidade Clássica em vários
aspectos, e empregam, inclusive, expressões latinas para
fazer referência a alguns temas e conceitos a ela
relacionados. É o caso de fugere urbem ("fugir da cidade",
expressão que remete à ideia de evasão para o campo),
aurea mediocritas ("o equilíbrio do ouro", designação que
reflete a ideia de uma vida simples como a ideal), locus
amoenus ("local ameno", o lugar bucólico e tranquilo, ideal
na visão árcade) e inutilia truncat ("cortar o inútil", isto é,
eliminar os excessos, aspecto marcante na forma da
literatura árcade).
1. O ARCADISMO PORTUGUÊS
Assim como o restante da Europa, Portugal também
vivia, no século XVIII, importantes renovações políticas. O
país era liderado politicamente pelo Marquês de Pombal,
primeiro-ministro do rei D. José I, homem fortemente
influenciado pelas ideias iluministas e que procurava elevar
Portugal à condição das demais nações europeias. Entre
suas principais realizações, está a laicização do ensino.
Em 1756, um grupo de jovens poetas funda, em
Lisboa, a Arcádia Lusitana, também conhecida como Arcádia
Olissiponense, à semelhança do que ocorrera na Itália. A
instituição não durou mais do que uma década, mas foi
importante para a consolidação da estética árcade em
Portugal. Renasce mais tarde, em 1790, com o nome de
NovaArcádia, da qual fazem parte importantes nomes da
poesia portuguesa, como Manuel Maria Barbosa du Bocage.
BOCAGE
Manuel Maria Barbosa do Bocage (1765-1805) foi o
mais renomado poeta árcade português. Apresentava-
se sob o pseudônimo de Elmano Sadino, sendo Elmano
um anagrama de Manoel, e Sadino uma referência ao
rio Sado, que banha a cidade natal do poeta, Setúbal.
Os suaves eflúvios, que respira
A flor de Vênus, a melhor das flores,
Exalas dos teus lábios tentadores,
Ó doce, ó bela, ó desejada Elmira.
A que nasceu das ondas, se te vira,
A seu pesar cantara teus louvores;
Ditoso quem por ti morre de amores!
Ditoso quem por ti, meu bem, suspira.
E mil vezes ditoso o que merece
Um teu furtivo olhar, um teu sorriso,
Por quem da mãe formosa Amor se esquece!
O sacrílego ateu, sem lei, sem siso,
Contemple-te uma vez, que então conhece
Que é força haver um Deus, e um paraíso.
BOCAGE, Manuel Maria Barbosa du. in: Soneto e outros
poemas. São Paulo: FTD, 1994. (Grandes Leituras).
Disponível em: <http://www.dominiopublico.gov.br/download/
texto/bv000059.pdf>
Mais tarde, Bocage deixa os clichês árcades e passa
a produzir uma poesia mais carregada de subjetividade,
anunciando a estética do Romantismo. Os temas dessa fase
pré-romântica giram em torno do amor, da morte e do
destino, e o locus amoenus dá lugar ao locus horrendus,
com a natureza espelhando o estado de espírito sofrido do
eu lírico.
Ó retrato da morte, ó noite amiga
Por cuja escuridão suspiro há tanto!
Calada testemunha do meu pranto,
De meus desgostos secretária antiga!
Pois manda Amor, que a ti somente os diga,
Dá-lhes pio agasalho no teu manto;
Ouve-os, como costumas, ouve, enquanto
Dorme a cruel, que a delirar me obriga:
E vós, ó cortesãos da escuridade,
Fantasmas vagos, mochos piadores,
Inimigos, como eu, da claridade!
Em bandos acudi aos meus clamores;
Quero a vossa medonha sociedade,
Quero fartar meu coração de horrores.
BOCAGE, Manuel Maria Barbosa du. in: Soneto e outros
poemas. São Paulo: FTD, 1994. (Grandes Leituras).
Disponível em: <http://www.dominiopublico.gov.br/
download/texto/bv000059.pdf>
CLÁUDIO MANUEL DA COSTA
2. O ARCADISMO BRASILEIRO
No século XVIII, os movimentos libertários nos
Estados Unidos e Europa já encontravam eco no Brasil,
que ainda era colônia portuguesa. Os ideais que inspiraram
movimentos revolucionários como o da Inconfidência
Mineira são os mesmos que estão na base do movimento
estético chamado de Arcadismo. Os principais poetas desse
período foram Cláudio Manuel da Costa e Tomás Antônio
Gonzaga, ambos engajados no movimento de inconfidência.
48
Cláudio Manuel da Costa (1729-1789) nasceu na Vila
do Ribeirão do Carmo (atualmente, parte da cidade de
Mariana), em Minas Gerais, e morreu em Vila Rica (atual
Ouro Preto), no mesmo estado. Sua morte é tema
controverso: a versão oficial conta que ele suicidou-se na
prisão, onde estava por conta de sua participação no
movimento da Inconfidência Mineira; mas as circunstâncias
foram suspeitas, e especula-se que o poeta possa ter sido
assassinado. Além de poeta, foi advogado e fazendeiro,
gozando de muito prestígio social. Também foi amigo
pessoal do escultor Aleijadinho e de outros nomes
importantes da época.
Sua obra conserva ainda características do Barroco,
especialmente em seus escritos de juventude, como o
próprio autor declarou no prólogo de suas Obras. Engaja-
se, no entanto, no movimento literário árcade, revelando
ainda a intenção de retratar uma realidade brasileira (o
"pátrio Rio").
Leia a posteridade, ó patrio Rio,
Em meus versos teu nome celebrado,
Porque vejas uma hora despertado
O somno vil do esquecimento frio:
Não vês nas tuas margens o sombrio,
Fresco assento de um álamo copado;
Não vês Ninfa cantar, pastar o gado
Na tarde clara do calmoso estio.
Turvo banhando as pallidas arêas
Nas porções do riquissimo thezouro
O vasto campo da ambição recrêas.
Que de seus raios o Planeta louro,
Enriquecendo o influxo em tuas vêas,
Quanto em chamas fecunda, brota em ouro.
COSTA, Cláudio Manuel da.
In: _____. Poemas escolhidos. Obra de domínio público.
Disponível em: <http://www.dominiopublico.gov.br/
download/texto/bn000038.pdf>
A poesia árcade, no entanto, ainda apresenta um
formato muito similar àquele preconizado pelos
protagonistas do movimento na Europa -- em especial, os
portugueses como Bocage. Uma das temáticas preferidas
do Arcadismo, e que se observa no soneto a seguir, de
Cláudio Manuel da Costa, é a da oposição entre a vida
urbana e a pastoril, com a valorização do idílico.
Ali respira amor sinceridade;
Aqui sempre a traição seu rosto encobre;
Um só trata a mentira, outro a verdade.
Ali não há fortuna, que soçobre;
Aqui quanto se observa, é variedade:
Oh ventura do rico! Oh bem do pobre!
COSTA, Cláudio Manuel da.
 In: Poemas escolhidos. Obra de domínio público.
Disponível em: <http://www.dominiopublico.gov.br/download/
texto/bn000038.pdf>
Quem deixa o trato pastoril, amado
Pela ingrata, civil correspondência,
Ou desconhece o rosto da violência,
Ou do retiro a paz não tem provado.
Que bem é ver nos campos transladado
No gênio do pastor, o da inocência!
E que mal é no trato, e na aparência
Ver sempre o cortesão dissimulado!
TOMÁS ANTÔNIO GONZAGA
 Tomás Antônio Gonzaga (1744-1810) nasceu no
Porto, em Portugal, e morreu em Moçambique, para onde
havia sido deportado em função de seu envolvimento na
Inconfidência. É considerado o mais importante poeta
árcade brasileiro. Assim como vários dos poetas desse
movimento estético, escrevia sob o pseudônimo de Dirceu,
especialmente os poemas de amor reunidos no livro Marília
de Dirceu.
Gonzaga foi também um homem influente em seu
tempo, tendo inclusive ocupado o cargo de juiz. Em Vila
Rica, conheceu e apaixonou-se por uma jovem de dezesseis
anos chamada Maria Doroteia Joaquina de Seixas Brandão,
que chegou a ser sua noiva. Em 1789, no entanto, o poeta
foi preso na Ilha das Cobras (RJ), e três anos mais tarde
enviado à África, tendo sido separado de sua amada.
Acredita-se que a lírica amorosa de sua obra Marília de
Dirceu - cuja segunda parte foi escrita na prisão - tenha
sido inspirada pela paixão do poeta por Maria Doroteia,
tratada ali pelo pseudônimo de Marília. Em seus poemas,
ficam nítidas as características do estilo árcade, com forte
valorização do estilo de vida bucólico e pastoril.
Outra obra importante desse autor foram as Cartas
chilenas, obra satírica em verso em que critica o governo
da capitania de Minas. Os textos, assinados pelo
pseudônimo Critilo, eram de autoria desconhecida até
recentemente, quando estudos os atribuíram a Tomás
Antônio Gonzaga.
49
LIRA XIV
Minha bela Marília, tudo passa;
A sorte deste mundo é mal segura;
Se vem depois dos males a ventura,
Vem depois dos prazeres a desgraça.
Estão os mesmos Deuses
Sujeitos ao poder impio Fado:
Apolo já fugiu do Céu brilhante,
Já foi Pastor de gado.
A devorante mão da negra Morte
Acaba de roubar o bem, que temos;
Até na triste campa não podemos
Zombar do braço da inconstante sorte.
Qual fica no sepulcro,
Que seus avós ergueram, descansado;
Qual no campo, e lhe arranca os brancos ossos
Ferro do torto arado.
Ah! enquanto os Destinos impiedosos
Não voltam contra nós a face irada,
Façamos, sim façamos, doce amada,
Os nossos breves dias mais ditosos.
Um coração, que frouxo
A grata posse de seu bem difere,
A si, Marília, a si próprio rouba,
E a si próprio fere.
Ornemos nossas testas com as flores.
E façamos de feno um brando leito,
Prendamo-nos, Marília, em laço estreito,
Gozemos do prazer de sãos Amores.
Sobre as nossas cabeças,
Sem que o possam deter, o tempo corre;
E para nós o tempo, que se passa,
Também, Marília, morre.
Com os anos, Marília, o gosto falta,
E se entorpece o corpo já cansado;
triste o velho cordeiro está deitado,
e o leve filho sempre alegre salta.
A mesma formosura
É dote, que só goza a mocidade:
Rugam-se as faces, o cabelo alveja,
Mal chega a longa idade.
Que havemos de esperar, Marília bela?
Que vão passando os florescentes dias?
As glórias, que vêm tarde, já vêm frias;
E pode enfimmudar-se a nossa estrela.
Ah! Não, minha Marília,
Aproveite-se o tempo, antes que faça
O estrago de roubar ao corpo as forças
E ao semblante a graça.
GONZAGA, Tomás Antônio.
 In: ____. Marília de Dirceu. Obra de domínio público.
Disponível em: <http://www.dominiopublico.gov.br/download/
texto/bn000036.pdf>
A POESIA ÉPICA DE BASÍLIO DA GAMA
 E SANTA RITA DURÃO
Além de Cláudio Manuel da Costa e Tomás Antônio
Gonzaga, conhecidos principalmente pelas liras; houve, no
Brasil, poetas árcades dedicados à poesia épica. Um deles
foi José Basílio da Gama (1741-1795), também mineiro, que
escreveu sob o pseudônimo de Termindo Sipílio. Sua obra
mais conhecida é O Uruguai, poema épico escrito em versos
brancos. A narrativa gira em torno da luta entre os índios na
região dos Sete Povos (Uruguai) e o exército luso-espanhol
encarregado de efetuar a divisão territorial determinada pelo
Tratado de Madri.
Outro poeta que dedicou-se a esse estilo foi o Frei
José de Santa Rita Durão (1722-1784), pertencente à
mesma escola mineira, e que escreveu Caramuru. Esse
poema épico conta a história do descobrimento da Bahia
pelo português Diogo Álvares Correia, e apresenta fortes
traços nativistas, descrevendo as paisagens e os costumes
indígenas.
 Filme: Caramuru: a invenção
do Brasil, de Guel Arraes (2009)
01 Por que alguns utilizam o termo Neoclassicismo para
se referir ao movimento do Arcadismo?
02 De onde vem o nome Arcadismo?
03 Explique o que é o ideal de “locus amoenus”, comum
entre os poetas árcades.
04 Explique como os poetas árcades implementam, em
seus textos, a máxima "inutilia truncat".
05 “Dirceu" é o pseudônimo de qual poeta árcade
brasileiro, e que grande obra foi por ele escrita?
50
06 Os poetas do Arcadismo brasileiro, junto a outros
intelectuais de seu tempo, foram figuras importantes
de um conhecido movimento do período colonial. Que
movimento foi esse?
07 Cláudio Manuel da Costa, que inaugura o Arcadismo
no Brasil, era ainda, porém, muito preso ao estilo
literário cronologicamente anterior. Qual seria?
08 Conforme já estudamos anteriormente, a poesia pode
assumir um caráter épico ou lírico. Entre esses, qual
gênero predomina na poesia árcade brasileira?
09 Cite pelo menos uma epopeia árcade brasileira.
10 Além da poesia lírica e da poesia épica, houve, no
Arcadismo nacional, outra forma de produção poética.
Cite e dê o exemplo de uma obra desse tipo.
01 (ENEM)
Torno a ver-vos, ó montes; o destino
Aqui me torna a pôr nestes outeiros,
Onde um tempo os gabões deixei grosseiros
Pelo traje da Corte, rico e fino.
 Aqui estou entre Almendro, entre Corino,
Os meus fiéis, meus doces companheiros,
Vendo correr os míseros vaqueiros
Atrás de seu cansado desatino.
 Se o bem desta choupana pode tanto,
Que chega a ter mais preço, e mais valia
Que, da Cidade, o lisonjeiro encanto,
 Aqui descanse a louca fantasia,
E o que até agora se tornava em pranto
Se converta em afetos de alegria.
Cláudio Manoel da Costa.
 In: Domício Proença Filho.
A poesia dos inconfidentes. Rio de Janeiro:
Nova Aguilar, 2002, p. 78-9.
Assinale a opção que apresenta um verso do soneto
de Cláudio Manoel da Costa em que o poeta se dirige
ao seu interlocutor.
(A) "Torno a ver-vos, ó montes; o destino" (v.1)
(B) "Aqui estou entre Almendro, entre Corino," (v.5)
(C) "Os meus fiéis, meus doces companheiros," (v.6)
(D) "Vendo correr os míseros vaqueiros" (v.7)
(E) "Que, da Cidade, o lisonjeiro encanto," (v.11)
02 (ENEM) Considerando o soneto de Cláudio Manoel
da Costa e os elementos constitutivos do Arcadismo
brasileiro, assinale a opção correta acerca da relação
entre o poema e o momento histórico de sua produção.
(A) Os "montes" e "outeiros", mencionados na pri-
meira estrofe, são imagens relacionadas à Me-
trópole, ou seja, ao lugar onde o poeta se vestiu
com traje "rico e fino".
(B) A oposição entre a Colônia e a Metrópole, como
núcleo do poema, revela uma contradição
vivenciada pelo poeta, dividido entre a civilida-
de do mundo urbano da Metrópole e a rusticida-
de da terra da Colônia.
(C) O bucolismo presente nas imagens do poema é
elemento estético do Arcadismo que evidencia
a preocupação do poeta árcade em realizar uma
representação literária realista da vida nacional.
(D) A relação de vantagem da "choupana" sobre a
"Cidade", na terceira estrofe, é formulação lite-
rária que reproduz a condição histórica parado-
xalmente vantajosa da Colônia sobre a Metró-
pole.
(E) A realidade de atraso social, político e econômi-
co do Brasil Colônia está representada esteti-
camente no poema pela referência, na última
estrofe, à transformação do pranto em alegria.
03 (ENEM)
SONETO VII
Onde estou? Este sítio desconheço:
Quem fez tão diferente aquele prado?
Tudo outra natureza tem tomado;
E em contemplá-lo tímido esmoreço.
Uma fonte aqui houve; eu não me esqueço
De estar a ela um dia reclinado:
Ali em vale um monte está mudado:
Quanto pode dos anos o progresso!
Árvores aqui vi tão florescentes,
Que faziam perpétua a primavera:
Nem troncos vejo agora decadentes.
Eu me engano: a região esta não era;
Mas que venho a estranhar, se estão presentes
Meus males, com que tudo degenera!
COSTA, C. M. Poemas. Disponível em:
www.dominiopublico.gov.br. Acesso em: 7 jul. 2012.
No soneto de Cláudio Manuel da Costa, a
contemplação da paisagem permite ao eu lírico uma
reflexão em que transparece uma
(A) angústia provocada pela sensação de solidão.
(B) resignação diante das mudanças do meio am-
biente.
(C) dúvida existencial em face do espaço desconhe-
cido.
(D) intenção de recriar o passado por meio da pai-
sagem.
(E) empatia entre os sofrimentos do eu e a agonia
da terra.
51
04 Qual a alternativa que apresenta uma associação
errada?
(A) Arcadismo / Iluminismo
(B) Arcadismo / Racionalismo
(C) Arcadismo / Classicismo
(D) Barroco / Contra-Reforma
(E) Arcadismo / Revolução Industrial
05 Assinale o que não se refere ao Arcadismo:
(A) Volta aos princípios clássicos greco-romanos e
renascentistas (o belo, o bem, a verdade, a per-
feição, a imitação da natureza).
(B) Época do Iluminismo (século XVIII) -
Racionalismo, clareza, simplicidade.
(C) Apoia-se em temas clássicos e tem como lema:
inutilia truncat ("corta o que é inútil").
(D) Ornamentação estilística, predomínio da ordem
inversa, excesso de figuras.
(E) Pastoralismo, bucolismo, suaves idílios campes-
tres.
06 (PUCC-SP)
"Acaso são estes
os sítios formosos,
aonde passava
os anos gostosos?
São estes os prados,
aonde brincava,
enquanto pastava,
o manso rebanho
que Alceu me deixou?"
Os versos acima, de Tomás Antônio Gonzaga, são
expressão de um momento estético em que o poeta:
(A) buscava expressão para o sentimento religioso
associado à natureza, revestindo frequentemen-
te o poema do tom solene da meditação.
(B) tentava exprimir a insatisfação do mundo con-
temporâneo, dava grande ênfase à vida senti-
mental, tornando o coração a medida mais exa-
ta de sua existência.
(C) buscava a "naturalidade". O que havia de mais
simples, mais "natural", que a vida dos pastores
e a contemplação direta da natureza;
(D) tinha predileção pelo soneto, exercitando a pre-
cisão descritiva e dissertativa, o jogo intelectu-
al, a famosa "chave de ouro";
(E) acentuava a busca da elegância e do requinte
formal, perdendo-se na minúcia descritiva dos
objetos raros: vasos, taças, leques.
07 (PUC-CAMPINAS) Podemos dizer que as principais
características do movimento arcádico são:
(A) a busca do claro, do racional, do verossímil e o
desenvolvimento de temas pastoris.
(B) o sentimento religioso, inspirado na
Contrarreforma.
(C) presença do tema da morte e de temas pasto-
ris.
(D) apologia dos contrastes, onde cada palavra de-
veria ser símbolo conotativo de seu oposto.
(E) n. d. a.
08 (PUC-CAMPINAS) Podemos entender a figura de
Marília dentro das Liras de Tomás Antônio Gonzaga
como:
(A) uma personagem que vale pelas suas ações em
busca de um ideal de libertação feminina dentro
do que poderia permitir a sociedade do século
XVIII.
(B) um elemento bastante contraditório, uma vez
queora parece amar o poeta, ora parece
desprezá-lo sem motivo aparente.
(C) representando apenas "ocasiões" para o
surgimento da paisagem bucólica, do mito gre-
go e muitas vezes do ego do poeta.
(D) tema central da obra, em que aparece num cres-
cendo emotivo que desemboca na representa-
ção do extremo desespero do poeta por não ver
o seu amor realizado.
(E) n. d. a.
TEXTO PARA AS PRÓXIMAS 3 QUESTÕES:
O texto abaixo é uma das liras que integram Marília de Dir-
ceu, de Tomás Antônio Gonzaga.
1. Em uma frondosa
Roseira se abria
Um negro botão!
Marília adorada
O pé lhe torcia
Com a branca mão.
2. Nas folhas viçosas
A abelha enraivada
O corpo escondeu.
Tocou-lhe Marília,
Na mão descuidada
A fera mordeu.
3. Apenas lhe morde,
Marília, gritando,
Co dedo fugiu.
Amor, que no bosque
Estava brincando,
Aos ais acudiu.
4. Mal viu a rotura,
E o sangue espargido,
Que a Deusa mostrou,
Risonho beijando
O dedo ofendido,
Assim lhe falou:
5. Se tu por tão pouco
O pranto desatas,
Ah! dá-me atenção:
E como daquele,
Que feres e matas,
Não tens compaixão?
(GONZAGA, Tomás Antônio.
Marília de Dirceu & Cartas Chilenas. 10.
 ed. São Paulo: Ática, 2011.)
52
09 (ITA) Neste poema,
I. há o relato de um episódio vivido por Marília:
após ser ferida por uma abelha, ela é socorrida
pelo Amor.
II. o Amor é personificado em uma deidade que
dirige a Marília uma pequena censura amorosa.
III. a censura que o Amor faz a Marília é um artificio
por meio do qual o sujeito lírico, indiretamente,
dirige a ela uma queixa amorosa.
IV. o propósito maior do poema surge, no final, no
lamento que o sujeito lírico dirige à amada, que
parece fazê-lo sofrer.
Estão corretas:
(A) I, II e III apenas.
(B) I, II e IV apenas.
(C) I e III apenas.
(D) II, III e IV apenas.
(E) todas.
10 (ITA) O poema abaixo dialoga com as liras de Marília
de Dirceu.
Haicai tirado de uma falsa lira de Gonzaga
Quis gravar "Amor"
No tronco de um velho freixo:
"Marília" escrevi.
(BANDEIRA, Manuel. Estrela da vida inteira.
 20 ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1993.)
Dentre as marcas mais visíveis de intertextualidade,
encontram-se as seguintes, EXCETO
(A) o título do poema menciona o autor de Marília
de Dirceu.
(B) ambos os textos pertencem à mesma forma po-
ética.
(C) no poema, Marília é, assim como em Gonzaga,
o objeto amoroso.
(D) tal como nos textos árcades, no de Bandeira, a
natureza é o cenário do amor.
(E) este poema de Bandeira possui, como os de
Gonzaga, teor sentimental.
11 (ITA) O poema abaixo retoma imagens presentes nas
liras de Marília de Dirceu e no haicai de Manuel
Bandeira, apresentados acima.
Passeio no bosque
o canivete na mão não deixa
marcas no tronco da goiabeira
cicatrizes não se transferem
(CACASO. Beijo na boca. Rio de Janeiro: 7 Letras, 2000.)
Algumas pessoas, ao gravarem nomes, datas etc., nos
troncos das árvores, buscam externar afetos ou
sentimentos. Esse texto, contudo, registra uma
experiência particular de alguém que, fazendo isso,
(A) se liberta das dores amorosas, pois as exterioriza
de alguma forma.
(B) percebe que provocará danos irreversíveis à in-
tegridade da árvore.
(C) busca refúgio na solidão do espaço natural.
(D) se dá conta de que é impossível livrar-se dos
sentimentos que o afligem.
(E) encontra dificuldade em gravar o tronco com um
simples canivete.
TEXTO PARA AS PRÓXIMAS 3 QUESTÕES:
Já rompe, Nise, a matutina Aurora
O negro manto, com que a noite escura,
Sufocando do Sol a face pura,
Tinha escondido a chama brilhadora.
Que alegre, que suave, que sonora
Aquela fontezinha aqui murmura!
E nestes campos cheios de verdura
Que avultado o prazer tanto melhora!
Só minha alma em fatal melancolia,
Por te não poder ver, Nise adorada,
Não sabe inda que coisa é alegria;
E a suavidade do prazer trocada
Tanto mais aborrece a luz do dia,
Quanto a sombra da noite mais lhe agrada.
(Cláudio Manuel da Costa. Obras, 2002.)
12 (UEFS) Um verso que remete à convenção arcádica
do "locus amoenus" ("lugar aprazível") é:
(A) "O negro manto, com que a noite escura,"
(1ª estrofe)
(B) "Aquela fontezinha aqui murmura!" (2ª estrofe)
(C) "Só minha alma em fatal melancolia," (3ª estro-
fe)
(D) "Não sabe inda que coisa é alegria;" (3ª estrofe)
(E) "Quanto a sombra da noite mais lhe agrada."
(4ª estrofe)
13 (UEFS) Uma característica típica do Arcadismo
encontrada nesse soneto é
(A) o subjetivismo exacerbado.
(B) a obsessão pela noite e pela morte.
(C) o ideal da impessoalidade.
(D) a preocupação com o social.
(E) a evocação da cultura greco-latina.
14 (UEFS) O termo que melhor descreve o estado de
espírito do eu lírico é
(A) entediado.
(B) assustado.
(C) indignado.
(D) triste.
(E) otimista.
15 (UPE) No Arcadismo brasileiro, encontram-se textos
épicos, líricos e satíricos. Com base nessa afirmação,
leia os textos a seguir:
TEXTO 1
Pastores, que levais ao monte o gado,
Vede lá como andais por essa serra;
Que para dar contágio a toda a terra,
Basta ver-se o meu rosto magoado:
Eu ando (vós me vedes) tão pesado;
E a pastora infiel, que me faz guerra,
É a mesma, que em seu semblante encerra
A causa de um martírio tão cansado.
Se a quereis conhecer, vinde comigo,
Vereis a formosura, que eu adoro;
53
Mas não; tanto não sou vosso inimigo:
Deixai, não a vejais; eu vo-lo imploro;
Que se seguir quiserdes, o que eu sigo,
Chorareis, ó pastores, o que eu choro.
Cláudio Manuel da Costa
TEXTO 2
[...]
Enquanto pasta alegre o manso gado,
minha bela Marília, nos sentemos
à sombra deste cedro levantado.
Um pouco meditemos
na regular beleza,
que em tudo quanto vive nos descobre
a sábia Natureza.
[...]
Tomás Antônio Gonzaga
TEXTO 3
[...]
Amigo Doroteu, não sou tão néscio,
Que os avisos de Jove não conheça.
Pois não me deu a veia de poeta,
Nem me trouxe, por mares empolados,
A Chile, para que, gostoso e mole,
Descanse o corpo na franjada rede.
Nasceu o sábio Homero entre os antigos,
Para o nome cantar, do grego Aquiles;
Para cantar, também, ao pio Enéias,
Teve o povo romano o seu Vergílio:
Assim, para escrever os grandes feitos
Que o nosso Fanfarrão obrou em Chile,
Entendo, Doroteu, que a Providência
Lançou, na culta Espanha, o teu Critilo.
[...]
Tomás Antônio Gonzaga - Cartas Chilenas
Sobre eles, analise os itens seguintes:
I. Os três poemas são árcades e nada têm que
possamos considerá-los pertencentes a outro
estilo de época, uma vez que seus autores só
produziram poemas líricos e com característi-
cas totalmente arcádicas. Além disso, todos eles
trazem referências à mitologia clássica median-
te o uso de termos tais como "monte", "Nature-
za" e "Jove", respectivamente, nos textos 1, 2 e
3.
II. Tomás Antônio Gonzaga e Cláudio Manuel da
Costa são poetas árcades, embora o primeiro
tenha se iniciado como barroco, daí os trechos
dos dois poemas de sua autoria revelarem tra-
ços desse momento da Literatura. De outro
modo, Cláudio Manuel da Costa, no poema de
número 1, se apresenta pré-romântico, razão
pela qual sua produção se encontra dividida em
dois momentos literários.
III. A referência a Critilo, autor textual do oitavo po-
ema, sendo espanhol, é um dado falso que tem
por finalidade ocultar a nacionalidade do autor
mineiro e, ao mesmo tempo, corroborar a ca-
muflagem da autoria, em decorrência do tom
satírico e agressivo da epístola em versos. Con-
tudo, o desejo de ocultação não foi alcançado,
porque Tomás Antônio Gonzaga foi preso e de-
portado, por ter sido atribuída a ele a autoria
das referidas Cartas.
IV. O tema do amor se faz presente nos poemas 1
e 2. Ambos apresentam bucolismo, característi-
ca do Arcadismo, contudo existe algo que os
diferencia: o pessimismo do eu poético no texto
1 e a reciprocidade do sentimento amoroso no
2.
V. O texto 3, apesar de satírico, nega, pelos as-
pectos temáticos e formais, qualquer caracte-
rística do Arcadismo, pois o poeta se preocupa,
de modo especial, com os acontecimentos his-
tóricos e se exime de preocupação estética, re-
velando desconhecimento da produção épica de
poetas gregos e latinos.
Está(ão) CORRETO(S) , apenas, o(s) item(ns)
(A) I, II e III.
(B) Ie IV.
(C) II, IV e V.
(D) IV.
(E) I.
TEXTO I
PARTE I, LIRA XIV
Minha bela Marília, tudo passa;
a sorte deste mundo é mal segura;
se vem depois dos males a ventura,
vem depois dos prazeres a desgraça.
....................................................................
Que havemos de esperar, Marília bela?
que vão passando os florescentes dias?
As glórias, que vêm tarde, já vêm frias;
e pode enfim mudar-se a nossa estrela.
Ah! não, minha Marília,
Aproveite-se o tempo, antes que faça
o estrago de roubar ao corpo as forças
e ao semblante a graça.
(TOMÁS ANTÔNIO GONZAGA,
"Marília de Dirceu")
TEXTO II
Goza, goza da flor da mocidade,
que o tempo trata a toda ligeireza
e imprime em toda flor a sua pisada.
Ó não aguardes, que a madura idade
te converta essa flor, essa beleza,
em terra, em cinza, em pó, em sombra, em nada.
(GREGÓRIO DE MATOS, ''Poema selecionados'')
TEXTO III
"Uma fonte aqui houve; eu não me esqueço
De estar a ela um dia reclinado:
Ali em vale um monte está mudado:
Quanto pode dos anos o progresso!
Árvores aqui vi tão florescentes,
Que faziam perpétua a primavera:
Nem troncos vejo agora decadentes."
(CLÁUDIO MANUEL DA COSTA, Sonetos -VII.)
54
01 Embora pertençam a períodos distintos, os textos I e
II ligam-se por meio da exploração de um mesmo tema
literário. Comente.
02 O texto III, parte de um poema de Cláudio Manuel da
Costa, apresenta um discurso crítico, coerente com a
ideologia dos escritores árcades. Explique.
03 Identifique no fragmento de "Marília de Dirceu" duas
características do Arcadismo e justifique sua resposta
com fragmentos do texto.
Irás a divertir-te na floresta,
Sustentada Marília, no meu braço;
Aqui descansarei a quente sexta,
Dormindo um leve sono em teu regaço;
Enquanto a luta jogam os pastores
E emparelhados correm nas campinas
Toucarei teus cabelos de boninas,
Nos troncos gravarei os teus louvores.
Graças, Marília bela,
Graça à minha estrela!
(TOMÁS ANTÔNIO GONZAGA, "Marília de Dirceu")
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O Romantismo consistiu em um grande movimento
artístico e cultural que marcou um momento de revolução
política. Surgiu na Inglaterra e na Alemanha, no final do
século XVIII, espalhando-se posteriormente por toda a
Europa e chegando ao Brasil na década de 1830, onde
adquiriu características particulares desse país. Embora hoje
o termo "romântico" esteja fortemente associado, no senso
comum, com a ideia de amor passional e idealizado, o
movimento estético que recebe esse nome tem
características mais amplas. Em particular, destaca-se a
questão do individualismo, isto é, a valorização do indivíduo,
de seus méritos e qualidades de caráter próprias, típico do
pensamento burguês, que se estabelecia.
O Romantismo desenvolveu-se, no Brasil, no século
XIX, tardiamente em relação ao movimento europeu. Com
a vinda da família real portuguesa para o Brasil em 1808, já
se desencadeavam importantes transformações sociais no
país, com o aumento das transações comerciais e
intercâmbio cultural. Foram criados espaços de promoção
de cultura erudita como museus, bibliotecas e escolas, criou-
se a Imprensa Régia e iniciou-se a circulação de jornais.
Tudo isso colaborou para que surgisse um movimento
artístico e literário que, embora se inspirasse nos
precursores europeus, tinha características próprias do
Brasil - o Romantismo. O fato histórico que teve maior
influência sobre o seu surgimento foi, sem dúvida, a
independência do país, em 1822.
No bojo da independência nacional, surgem, portanto,
as primeiras manifestações de uma literatura propriamente
brasileira. Considera-se como marco inicial do Romantismo
a publicação do livro Suspiros poéticos de saudades, de
Gonçalves de Magalhães, em 1836. Além disso, nesse
mesmo ano iniciou-se a publicação da revista Niterói, que
tratava de temas literários.
LITERATURA DO ROMANTISMO: CARACTERIZAÇÃO
GERAL
A visão de mundo burguesa - individualista, libertária
e igualitária - leva ao surgimento do "culto ao eu", ou
egocentrismo, característica marcante das obras
românticas. O sujeito é o centro das atenções românticas.
Decorrem daí as características secundárias do
Romantismo, listadas a seguir:
••••• Sentimentalismo: Valorização exacerbada dos
sentimentos do sujeito. No nível da enunciação (isto
é, da forma literária), o sentimentalismo é percebido
por meio de marcas linguísticas e estilísticas como
a pontuação enfática ou expressiva (exclamações,
reticências e interrogação retórica), o uso recorrente
de interjeições, o emprego de muitos adjetivos
subjetivos ou avaliativos, além do uso de muitas
metáforas e hipérboles. Já no nível do enunciado
(o conteúdo, as ideias do texto), evidencia-se a
temática relacionada a questões emocionais, dos
diversos estados de espírito como o amor, a
saudade, a tristeza, a nostalgia, etc.
PARTE IV:
ESTILOS DE ÉPOCA
UNIDADE 04:
ROMANTISMO
• POESIA
55
••••• Rebeldia: o sujeito romântico tem uma relação
tensa com o mundo que o cerca. Muitas vezes, é
caracterizado como um boêmio, que não se
submete às regras impostas pelo mundo, dado a
vícios como a bebida, o jogo e os amores marginais.
••••• Escapismo: a necessidade de um escape, isto é,
fuga da realidade, também é característica
marcante dos textos românticos, em que se cria
um espaço de evasão, ou seja, cria-se um espaço
fictício no poema ou narrativa em que tudo é
possível, diferentemente do que ocorre na
realidade. Esse "lugar ideal" não corresponde,
necessariamente, a um ponto geográfico. Pode ser
também uma outra dimensão ou outro momento
no tempo: entre os tipos mais comuns de
escapismo dos românticos estão o escapismo para
infância, para um passado histórico, para o sonho
e até mesmo para a morte.
••••• Idealização: a visão romântica é permeada de
subjetividade e idealização. O poeta romântico
caracteriza o objeto retratado (mulher amada, a
natureza, a pátria, etc.) de forma subjetiva, de
acordo com sua própria experiência.
A POESIA ROMÂNTICA BRASILEIRA
O período romântico foi bastante frutífero, com
inúmeros autores importantes mundo afora. Entre os nomes
mais conhecidos no âmbito da poesia, estão os ingleses
William Blake (1727-1827), Lord Byron (1788-1824), William
Wordsworth (1770-1850), S. T. Coleridge (1772-1834),
Percy Shelley (1792-1822) e John Keats (1795-1821); os
alemães Friedrich Schiller (1758-1805) e Friedrich Schlegel
(1772-1829); os franceses Victor Hugo (1802-1885) e Alfred
de Musset (1810-1857); o italiano Giacomo Leopardi (1798-
1837).
Apoesia romântica brasileira divide-se basicamente
em três gerações, que estudaremos a seguir: a geração
ufanista / nacionalista / indianista; a geração ultrarromântica
/ mal-do-século / byroniana e a geração condoreira.
1. NACIONALISMO UFANISTA
A primeira geração do romantismo brasileiro é
conhecida como a fase nacionalista ou ufanista, ou ainda
indianista. Com a independência do país e o
desenvolvimento de uma cultura escrita, é neste momento
que começa a se consolidar uma literatura, de fato, nacional.
Os autores, inspirados pelo ideal romântico europeu
de pátria e pelas figuras de heróis nacionais, buscam no
passado histórico do Brasil elementos definidores da
identidade e das origens nacionais. A literatura da primeira
geração romântica é considerada, por muitos, lusófoba, uma
vez que rejeita a tendência que havia anteriormente de
copiar os padrões europeus (em especial, de Portugal).
Na busca pela representação da identidade nacional,
os românticos da primeira geração recorrem às maravilhas
da natureza e à figura do índio como herói nacional.
Frequentemente são representados, nos textos, índios
vivendo em plena liberdade na natureza exuberante, de
forma muito idealizada. A figura do índio como herói puro e
incorruptível remete ao mito do "bom selvagem" proposto
pelo Iluminismo.
GONÇALVES DIAS
Antônio Gonçalves Dias (1823-1864) foi o maior
representante da poesia indianista brasileira. Nasceu no
Maranhão, tinha origem mestiça e orgulhava-se muito disso.
Abordou, em sua obra, fundamentalmente as temáticas da
natureza, da pátria e da religião, tendo sido imortalizado
por seu poema “Canção do Exílio”, provavelmente o mais
representativo dessa fase da literatura nacional. Dias o
escreveu quando estava em Coimbra, Portugal, cursando
a faculdade de Direito, e o eu lírico louva sua terra natal,
comparando-a com o local do exílio. O poeta morreu
tragicamente em um naufrágio quando retornava de
Portugal.
CANÇÃO DO EXÍLIO
(Gonçalves Dias)
Kennst du das Land, wo die Citronen blühn,
Im dunkeln Laub die Gold-Orangen glühn,
Kennst du es wohl?
Dahin, Dahin!
Möcht ich... ziehn!
(Goethe)*
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá;
As aves, que aqui gorjeiam,
Não gorjeiam como lá.
Nosso céu tem mais estrelas,
Nossas várzeas têm mais flores,
Nossos bosques têm mais vida,
Nossa vida mais amores.
Em cismar, sozinho, à noite,
Mais prazer encontro eu lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
Minha terra tem primores,
Que tais não encontro eu cá;
Em cismar - sozinho, à noite -
Mais prazer encontro eu lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
Não permita Deus que eu morra,
Sem que eu volte para lá;
Sem que desfrute os primores
Que não encontro por cá;
Sem qu'inda aviste as palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
(Em: DIAS, Gonçalves. Primeiros cantos.
Obra em domínio público. Disponível em:
http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/bn000100.pdf)
* Os versos de Goethe que servem de epígrafe ao poema
foram assim traduzidos por Manuel Bandeira: "Conheces
o país onde florescem as laranjeiras? Ardem na escura
fronde os frutos de ouro… Conhecê-lo? - Para lá quisera
eu ir!”
56
Esse célebre poema já recebeu versões, releituras e
paródias de vários autores, inclusive de importantes nomes
da literatura brasileira como Casimiro de Abreu, Oswald de
Andrade, Carlos Drummond de Andrade, Mario Quintana,
Murilo Mendes, Vinícius de Moraes, entre outros.
Outro texto muito conhecido de Gonçalves Dias é
I-Juca Pirama, longo poema dividido em dez partes que
conta a história de um guerreiro da tribo Tupi feito prisioneiro
pelos Timbiras. O título significa, em língua tupi, "o que há
de ser morto".
YouTube:
I-juca Pirama - Curta Metragem de animação basea-
do no poema homônimo de Gonçalves Dias.
Direção: Elvis K. e Italo Cajueiro
Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=ra2yyPLc2Z0
Na poesia desse momento, alguns eixos temáticos
são emblemáticos: a morte, vista como escapismo extremo,
resultado da vida entediante do sujeito poético; e o amor,
impossível, irrealizável e frustrante. A figura feminina
ultrarromântica é outra das grandes marcas desse momento:
pálida, virginal, frequentemente dormindo, alheia aos
amores do sujeito poético, enfim, idealizada e distante.
Os principais nomes da segunda geração romântica
são Álvares de Azevedo, Junqueira Freire, Casimiro de
Abreu e Fagundes Varela.
I-JUCA PIRAMA (EXCERTO)
(Gonçalves Dias)
IV
Meu canto de morte
Guerreiros, ouvi:
Sou filho das selvas,
Nas selvas cresci;
Guerreiros, descendo
Da tribo tupi
Da tribo pujante,
Que agora anda errante
Por fado inconstante,
Guerreiros, nasci:
Sou bravo, sou forte,
Sou filho do Norte;
Meu canto de morte,
Guerreiros, ouvi.
(Em: DIAS, Gonçalves. Últimos Cantos. 1851.
Obra em domínio público.
Disponível em: http://www.dominiopublico.gov.br/
download/texto/bv000113.pdf)
2. ULTRARROMANTISMO OU GERAÇÃO MAL-DO-SÉCULO
A segunda geração do Romantismo já não apresenta
de forma tão marcada a ideologia ufanista. Acirram-se as
características tipicamente românticas do culto ao eu
(egotismo) e do sentimentalismo, e as consequências
desses aspectos na relação do eu poético com o mundo
são a sensação de desajuste e tendência ao escapismo, o
tédio, a melancolia e o chamado "mal-do-século".
ÁLVARES DE AZEVEDO
 Nascido em São Paulo, Manuel Antônio Álvares de
Azevedo (1831-1852) teve uma vida breve, morrendo aos
20 anos de idade, quando era estudante de Direito no Rio
de Janeiro. A causa de sua morte é controversa, mas aceita-
se que ele tenha sido acometido por uma tuberculose
agravada por uma queda que sofreu de um cavalo.
Apesar da pouca idade, o poeta deixou um importante
legado, sendo um dos principais nomes do Romantismo
brasileiro. Entre suas obras mais conhecidas estão o livro
Noite na taverna (1855), que reúne narrativas de temática
sombria, de amor e morte; e sua Lira dos Vinte Anos,
antologia poética (1853). Ambas as obras foram publicadas
postumamente.
Se eu morresse amanhã, viria ao menos
Fechar os olhos minha triste irmã;
Minha mãe de saudades morreria
Se eu morresse amanhã!
Quanta glória pressinto em meu futuro!
Que aurora de porvir e que manhã!
Eu perdera chorando essas coroas
Se eu morresse amanhã!
Que sol! Que céu azul! Que doce n'alva
Acorda a natureza mais louçã!
Não me batera tanto amor no peito,
Se eu morresse amanhã!
Mas essa dor da vida que devora
A ânsia de glória, o dolorido afã...
A dor no peito emudecera ao menos,
Se eu morresse amanhã!
(Em: AZEVEDO,
Manuel Antônio Álvares de. Obras. 1862.
Obra em domínio público.)
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- Silêncio! moços!! acabai com essas cantilenas horríveis!
Não vedes que as mulheres dormem ébrias, macilentas
como defuntos? Não sentis que o sono da embriaguez
pesa negro naquelas pálpebras onde a beleza sigilou os
olhares da volúpia??"
(Em: AZEVEDO, Manuel Antônio Álvares de. Noite na
Taverna.3.ed. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1988.
Obra em domínio público. Disponível em:
http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/bv000023.pdf)
JUNQUEIRA FREIRE
Luís José Junqueira Freire (1832-1855) era baiano,
nasceu e morreu em Salvador, onde frequentou ainda o
monastério a fim de seguir a vida sacerdotal. Assim como
Álvares de Azevedo, teve uma vida muito breve, falecendo
aos 22 anos. Mesmo assim, sua obra foi de grande
importância, com especial destaque para o livro de poemas
Inspirações do Claustro, publicado em 1855.
MORTE (HORA DE DELÍRIO)
Junqueira Freire
Pensamento gentil de paz eterna,
Amiga morte, vem. Tu és o termo
De dois fantasmas que a existência formam,
– Dessa alma vã e desse corpo enfermo.
Pensamento gentil de paz eterna,
Amiga morte, vem. Tu és o nada,
Tu és a ausência das moções da vida,
Do prazer que nos custa a dor passada.
Pensamento gentil de paz eterna,
Amiga morte, vem. Tu és apenas
A visão mais real das que nos cercam,
Que nos extingues as visões terrenas.
(...)
Amei-te sempre: - e pertencer-te quero
Para sempre também, amiga morte.
Quero o chão, quero a terra - esse elemento;
Que não se sente dos vaivéns da sorte.
Para tua hecatombe

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