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Literatura Brasileira II - Conteúdo Online

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LITERATURA BRASILEIRA II 
AULA 1 – O ROMANCE DE JOSÉ DE ALENCAR 
Quando pensamos o Romantismo no Brasil, a figura de Alencar e a importância de suas obras 
sobressaem. O autor publicou vinte e um romances, classificados, por assunto, em indianistas, 
históricos, regionais e urbanos. 
Alfredo Bosi, em sua História concisa da literatura brasileira, observa que muito importava a 
―Alencar cobrir com a sua obra narrativa passado e presente, cidade e campo, litoral e sertão, 
e compor uma espécie de suma romanesca do Brasil‖ (BOSI, A História concisa da literatura 
brasileira, p. 137) 
A versatilidade de sua pena tanto contemplava os mitos colonizadores, como se observa em 
suas narrativas históricas e indianistas, quanto nos romances de viés urbano, onde os valores 
da sociedade do século XIX são analisados e criticados. 
O Guarani, publicado em 1857, é um romance de natureza histórica, exemplar para a 
compreensão da presença do índio na literatura romântica. 
O Guarani 
Em uma breve síntese, Peri, protagonista da narrativa, encanta-se por Ceci e devota a ela e a 
seu pai, Dom Antônio de Mariz, lealdade típica de um cavaleiro medieval. 
As peripécias que conduzem a narrativa folhetinesca1 dão a conhecer um mundo de conflito 
entre índios aimorés e brancos, assim como entre brancos de boa índole e os mercenários, 
comandados por Loredano. 
1 Folhetim é o nome dado à publicação em capítulos de romances nos periódicos da época. 
Boa parte dos romances de José de Alencar e Machado de Assis foi publicada primeiro como 
folhetim. 
Analisando a obra, Alfredo Bosi, em Dialética da colonização chama a atenção para a inserção 
do elemento indígena em um regime feudal, conjugada à representação da sociedade colonial 
dos séculos XVI e XVII de maneira mítica e idealizada: ―o mito é uma instância mediadora (...) 
o mito alencariano reúne, sob a imagem comum do herói, o colonizador, tido como generoso 
feudatário, e o colonizado, visto, ao mesmo tempo, como súdito fiel e bom selvagem.‖ 
É importante observar que Peri concilia duas características importantes do Romantismo: a cor 
local, representada pela descrição da natureza brasileira e pelo indígena, e a noção de 
bondade natural do homem, intocado pela sociedade. 
A articulação desses aspectos elimina, de certa forma, o compromisso com a verossimilhança 
do texto, uma vez que a rebeldia do nativo desaparece, assim como a crueldade do 
colonizador. Nesse sentido, por não representar as verdadeiras relações entre colonizador e 
colonizado, por redimensioná-las no tempo passado, Alencar escapa da polemização 
resultante do movimento de lusofobia, decorrente da Independência recente. 
O indígena ganha também o protagonismo da cena na obra Iracema (Lenda do Ceará), 
publicada em 1865. Obra definida como primitiva por Alencar1. (apud. Bosi, A. História concisa 
da literatura brasileira. 41 ed. São Paulo: Cultrix, 2003.p. 136) 
1 ―(...) primitiva, que se pode chamar de aborígine, são as lendas e mitos da terra selvagem e 
conquistada; são as tradições que embalaram a infância do povo, ele escutava como o filho a 
quem a mãe acalenta no berço com as canções da pátria, que abandonou. 
Iracema pertence a essa literatura primitiva, cheia de santidade e enlevo, para aqueles que 
venceram na terra da pátria a mãe fecunda – alma mater, e não enxergam nela apenas o 
chão onde pisam.‖ 
O romance também é exemplar da impressionante capacidade criadora de Alencar, 
só ultrapassada pelo papel pioneiro no que se refere à pesquisa da linguagem, no sentido de 
fazer acompanhar o texto com os termos próprios àquela realidade e região. 
No prólogo da obra Iracema, o autor recomenda o estudo da língua indígena para a 
construção da nacionalidade da literatura, como lemos no trecho que segue: 
―O conhecimento da língua indígena é o melhor critério para a nacionalidade da literatura. Ele 
nos dá não só o verdadeiro estilo, como as imagens poéticas do selvagem, os modos de seu 
pensamento, as tendências de seu espírito, e até as menores particularidades de sua vida. 
E nessa fonte que deve beber o poeta brasileiro, é dela que há de sair o verdadeiro poema 
nacional, tal como eu o imagino.‖ 
Em Iracema, por exemplo, o léxico condiciona a musicalidade e a poesia do texto, como 
podemos ler nesse belíssimo trecho em que a índia Iracema é apresentada ao leitor e quando 
conhece o amor de sua vida, o branco Martim. Desse encontro nascerá a trama. 
―Além, muito além daquela serra, que ainda azula no horizonte, nasceu Iracema. 
Iracema, a virgem dos lábios de mel, que tinha os cabelos mais negros que a asa da graúna e 
mais longos que seu talhe de palmeira. 
O favo da jati não era doce como seu sorriso; nem a baunilha recendia no bosque como seu 
hálito perfumado. 
Mais rápida que a ema selvagem, a morena virgem corria o sertão e as matas do Ipu onde 
campeava sua guerreira tribo da grande nação tabajara, o pé grácil e nu, mal roçando alisava 
apenas a verde pelúcia que vestia a terra com as primeiras águas. 
Um dia, ao pino do sol, ela repousava em um claro da floresta. Banhava-lhe o corpo a sombra 
da oiticica, mais fresca do que o orvalho da noite. Os ramos da acácia silvestre esparziam 
flores sobre os úmidos cabelos. Escondidos na folhagem os pássaros ameigavam o canto. 
Iracema saiu do banho; o aljôfar d'água ainda a roreja, como à doce mangaba que corou em 
manhã de chuva. Enquanto repousa, empluma das penas do gará as flechas de seu arco, e 
concerta com o sabiá da mata, pousado no galho próximo, o canto agreste (...) 
Rumor suspeito quebra a doce harmonia da sesta. Ergue a virgem os olhos, que o sol não 
deslumbra; sua vista perturba-se. 
Diante dela e todo a contemplá-la, está um guerreiro estranho, se é guerreiro e não algum 
mau espírito da floresta. Tem nas faces o branco das areias que bordam o mar; nos olhos o 
azul triste das águas profundas. Ignotas armas e tecidos ignotos cobrem-lhe o corpo. 
Foi rápido, como o olhar, o gesto de Iracema. A flecha embebida no arco partiu. Gotas de 
sangue borbulham na face do desconhecido.‖ 
Romance Urbano 
Dos romances urbanos de Alencar, Senhora e Lucíola merecem atenção pela crítica aos 
costumes da sociedade burguesa da época, bem como pela riqueza da descrição de cenários e 
personagens. É nos salões cariocas que o enredo se desenvolve: Aurélia Camargo, 
protagonista de Senhora, denuncia o casamento por interesse, movido pelo dote, e não pelo 
sentimento. 
Ao iniciar o romance, a personagem é uma moça pobre, rejeitada por Fernando Seixas, que se 
compromete com outra por um dote maior. No entanto, Aurélia enriquece e engendra uma 
vingança contra ele. 
A narrativa, de estrutura folhetinesca, é marcada por embates verbais entre os personagens, 
criando o suspense pelo final feliz, já que a tensão entre o amor e a ambição, ou entre o 
perdão e o rancor, move o andamento da trama. 
Lucíola, personagem central que dá nome ao romance, narra a vida de uma cortesã, figura 
comum nos salões do século XIX. A delicadeza da trama do amor impossível é tecida com 
força dramática e energia lírica, percebida nas descrições das cenas mais fortes para a época. 
Leia, no trechinho a seguir, o momento em que Paulo, o narrador, faz reflexões sobre a 
personagem Lúcia, ou Lucíola: 
―Tal é a força mística do pudor, que o homem o mais ousado, desde que tem no coração o 
instinto da delicadeza, não se anima a amarrotar bruscamente esse véu sutil que resguarda a 
fraqueza da mulher. Se a resistência irrita-lhe o desejo, o enleio casto, a leve rubescência que 
veste a beleza como de um santo esplendor, influem mágico respeito. 
Isto, quando se ama; quando a atração irresistível da alma emudece os escrúpulos e as 
suscetibilidades. O que não será pois quando apenas um desejo ou um capricho passageiro 
nos excita? Então, ousar é mais do que uma ofensa; é um insulto cruel‖. 
―Se eu amasse essa mulher, que via pela terceira ou quarta vez, teria certamentea coragem 
de falar-lhe do que sentia; se quisesse fingir um amor degradante, acharia força para mentir; 
mas tinha apenas sede de prazer; fazia dessa moça uma idéia talvez falsa; e receava 
seriamente que uma frase minha lhe doesse tanto mais, quanto ela não tinha nem o direito de 
indignar-se, nem o consolo que deve dar a consciência de uma virtude rígida.‖ 
No trecho, o narrador dá a conhecer o código moral e, simultaneamente, já expõe as 
contradições de seus sentimentos para com a dama. É interessante comentar que, apesar de 
denunciar a hipocrisia das relações, no romance a personagem não escapa de um julgamento 
rigoroso, o que pode ser interpretado de duas maneiras: 
Primeiro, ao se propor a demonstrar que a literatura brasileira se encontrava ao nível da 
européia, Alencar importa o tema da libertina redimida – A dama das camélias, de Alexandre 
Dumas – e adapta-o ao contexto brasileiro. 
Segundo, o autor já havia sofrido a censura de sua peça As asas de um anjo (a peça foi 
censurada três dias depois da estreia), e Lucíola retoma o mesmo tema, temperado com a 
sutileza da argúcia. 
Assim, os romances urbanos de Alencar constituem um documento relevante para 
compreendermos as relações sociais e econômicas de meados do século XIX. Sobretudo, por 
tomarem a descrição dos papéis atribuídos às mulheres e a sua participação na sociedade 
como temática principal. 
AULA 2 – A POESIA ROMÂNTICA. A GERAÇÃO INDIANISTA OU 
NACIONALISTA: GONÇALVES DIAS 
O Romantismo foi um período estético que teve uma grande duração, em torno de meio 
século, e por essa razão é possível divisar três gerações de poetas, cujas obras desenvolvem 
temáticas e técnicas semelhantes 
A primeira delas nasceu com a intensidade do desejo de valorizar o Brasil, primando pela 
idealização da paisagem exuberante, bem como pela presença mítica do indígena. Recebeu o 
nome de Nacionalista e/ou Indianista. 
Na segunda geração, a subjetividade peculiar do movimento romântico será levada ao 
extremo. Isso explica a denominação de Egótica ou Ultrarromântica para classificar o grupo de 
poetas que preferia como temática o amor, a morte, o escapismo, o tédio e a melancolia. 
O terceiro momento da poesia romântica é marcado pela abordagem de temas sociais, como a 
escravidão. Embora tenha sido esta uma geração bastante heterogênea quanto à temática, o 
gosto pelas imagens grandiosas, que representam amplidão e infinitude, foi bastante 
recorrente entre os poetas. Recebeu o nome de Geração Condoreira, por fazer referência à 
ave andina, o Condor. 
O surgimento do Romantismo no Brasil é balizado pela publicação da obra Suspiros poéticos e 
saudades, de Gonçalves de Magalhães, em 1836. O autor foi também responsável pela 
fundação em Paris, no mesmo ano, da Niterói, revista brasiliense. 
Domingos José Gonçalves de Magalhães estudou na Europa, e, quando retornou ao Brasil, 
caiu nas graças do Imperador D. Pedro II, conquistando cargos políticos e diplomáticos. 
Vamos ler um trecho do poema Saudação à pátria à vista do Rio de Janeiro no meu regresso 
da Europa – em 14 de maio de 1837. 
―(...) 
Terras da minha pátria, eu vos saúdo, 
Depois de longa ausência! 
Eu te saúdo, oh sol da minha infância! 
Inda brilhar te vejo nestes climas, 
Da Providência esmero, 
Onde se apraz a amiga liberdade 
Tão grata aos corações americanos! 
 
Minha terra saudosa, 
Terra de minha mãe, como és tão bela. 
Se em ti não venho achar da Europa o fausto, 
Pelo suor dos século regado, 
Também não acharei suas misérias, 
Maiores que o seu brilho, 
Verdes montanhas que cercais meu berço, 
Como sublimes sois, como sois grande.‖ 
Observe como o eu-lírico compara a terra natal, o Brasil, à Europa, apontando aspectos 
superiores na primeira em relação à segunda. Essa idéia de grandeza associada ao Brasil é 
uma constante nos poemas dessa geração e explica-se por querer representar uma afirmação 
de nossa independência, não apenas política e econômica, mas também artística. 
Embora o esforço em marcar a separação entre a arte européia, ou da metrópole, e a arte 
brasileira tenha sido freqüente na maioria das composições da época, as influências 
estrangeiras são inegáveis. 
A temática nativista encontra expressão em outro poema muito famoso, chamado Canção do 
Exílio, escrito em 1843, por Gonçalves Dias. 
Antônio Gonçalves Dias nasceu em Caxias, no Maranhão, em 1823 e faleceu, no litoral do 
mesmo estado, em um naufrágio, em 1864. Formou-se em Leis, em Coimbra. Ao retornar ao 
Brasil, exerceu a profissão de professor de Latim e História do Brasil no Colégio Pedro II. Sua 
obra inaugural, Primeiros Cantos, foi publicada em 1846; seguida de Segundos Cantos e 
Sextilhas de Frei Antão, em 1848, e Últimos Cantos, em 1851. Deixou inacabado o poema 
épico Os timbiras. 
Canção do Exílio 
Minha terra tem palmeiras, 
Onde canta o Sabiá; 
As aves, que aqui gorjeiam, 
Não gorjeiam como lá. 
Nosso céu tem mais estrelas, 
Nossas várzeas têm mais flores, 
Nossos bosques têm mais vida, 
Nossa vida mais amores. 
Em cismar, sozinho, à noite, 
Mais prazer eu encontro lá; 
Minha terra tem palmeiras, 
Onde canta o Sabiá. 
Minha terra tem primores, 
Que tais não encontro eu cá; 
Em cismar - sozinho, à noite - 
Mais prazer eu encontro lá; 
Minha terra tem palmeiras, 
Onde canta o Sabiá. 
Não permita Deus que eu morra, 
Sem que eu volte para lá; 
Sem que disfrute os primores 
Que não encontro por cá; 
Sem qu'inda aviste as palmeiras, 
Onde canta o Sabiá. 
Coimbra – 1843, De Primeiros cantos (1847) 
No poema, observamos que o eu-lírico se lamenta pela saudade que sente de sua terra – ―lá‖ 
–, o Brasil. Interessante notar que esse sentimento contrapõe os dois espaços: a terra natal 
(lá) e a terra do exílio, Portugal (cá). 
Sabe-se que, à época, o poeta Antônio Gonçalves Dias estava em terras lusas, fazendo o 
curso superior, como muitos outros filhos de famílias abastadas. Assim, o exílio, a que se 
refere o eu-lírico, não é político; trata-se de um período de afastamento por opção. 
A saudade, no entanto, faz com que traga à lembrança, de forma emocionada e subjetiva, 
elementos que representam a sua terra: o sabiá, as palmeiras, as aves e as flores. Elementos 
que sempre são apresentados em situação de superioridade em relação à terra portuguesa. 
O poema tem inspirado os nossos artistas até os dias de hoje, seja como crítica, paródia ou 
imitação. Também a nossa música faz menção ao poema Canção do Exílio. 
A genialidade da poesia gonçalvina ficou vincada em sua vertente indianista pelo domínio da 
técnica e pelo vigor das imagens dos primeiros habitantes de nossas terras. 
Não se espera, contudo, desse período uma crítica aguda ao processo de colonização, haja 
vista que o indígena é representado de forma idealizada, e a colonização era descrita como 
uma comunhão de interesses. 
Em alguns poemas, como Deprecação1 e O canto de piaga, nota-se a presença de farpas em 
direção à dominação violenta européia; no entanto, trata-se de uma possível referência ao 
genocídio perpetrado pela invasão espanhola, que dizimou nações pré-colombianas com 
extrema crueldade. 
1 DEPRECAÇÃO 
Tupã, ó Deus grande! cobriste o teu rosto 
Com denso velâmen de penas gentis; 
E jazem teus filhos clamando vingança 
Dos bens que lhes deste da perda infeliz! 
 
Tupã, ó Deus grande! teu rosto descobre: 
Bastante sofremos com tua vingança! 
Já lágrimas tristes choraram teus filhos 
Teus filhos que choram tão grande mudança. 
 
Anhangá impiedoso nos trouxe de longe 
Os homens que o raio manejam cruentos, 
Que vivem sem pátria, que vagam sem tino 
Trás do ouro correndo, vorazes, sedentos. 
 
E a terra em que pisam, e os campos e os rios 
Que assaltam, são nossos; tu és nosso Deus: 
Por que lhes concedes tão alta pujança, 
Se os raios de morte, que vibram, são teus? 
COMENTÁRIO: 
O título do poema ―deprecação‖ quer dizer ―pedir perdão‖. A composiçãoretrata uma súplica 
do eu-lírico a Tupã, uma entidade superior, por misericórdia. Alega o eu-lírico que Tupã teria 
coberto os seus olhos e fingido não ver as crueldades impingidas aos índios por homens que 
―Anhanga‖, o demônio, teria ―trazido de longe‖. Esses homens que invadem as terras 
indígenas – ―E a terra em que pisam, e os campos e os rios/Que assaltam, são nossos‖ – 
manejam os ―raios da morte‖, ou seja, as armas de fogo. Observe o tom de súplica indignada 
do eu-lírico. 
Tupã, ó Deus grande! cobriste o teu rosto 
Com denso velâmen de penas gentis; 
E jazem teus filhos clamando vingança 
Dos bens que lhes deste da perda infeliz....‖ 
Como observou Alfredo Bosi, em Dialética da Colonização: 
―Nos Primeiros cantos do maranhense lateja a consciência do destino atroz que aguardava as 
tribos tupis quando se pôs em marcha a conquista europeia. O conflito das civilizações é 
trabalhado pelo poeta na sua dimensão de tragédia. Poemas fortes como O canto do piaga e 
Deprecação são agouros do massacre que dizimaria o selvagem mal descessem os brancos de 
suas caravelas. 
(...) 
O jovem Gonçalves Dias ainda estava próximo, no tempo e no espaço, do nativismo exaltado 
latino-americano. Talvez a familiaridade do maranhense com a luta entre brasileiros e 
marinheiros que marcou nas províncias do Norte os anos da Independência explique a aura 
violenta e aterrada que rodeia aqueles versos de primeira mocidade‖ (BOSI, A. Dialética da 
colonização. 3.ed. São Paulo: Companhia das letras, 1992. p. 184-184) 
A verve poética indianista registra-se com genialidade no uso dos ritmos para simular a batida 
do tambor, como no poema Canção do tamoio: 
Observe as sílabas marcadas, leia em voz alta e perceba a simulação de um tambor ritmado. 
Canção do tamoio 
(Natalícia) 
I 
Não chores, meu filho; 
Não chores, que a vida, 
É luta renhida: 
Viver é lutar. 
A vida é combate, Que os fracos abate, 
Que os fortes, os bravos 
Só pode exaltar. 
Esse efeito sonoro é obtido graças à combinação de versos curtos, redondilhas menores, cuja 
tonicidade recai sobre a 2ª e a 5ª sílabas de forma constante. Note também que o poema é 
distribuído em oitavas, isto é, estrofes compostas de oito versos, em que predominam rimas 
emparelhadas. 
A explicação, entre parênteses, ―Natalícia‖ dá a conhecer ao leitor as circunstâncias do canto 
vigoroso: o pai descreve ao pequeno nascituro as glórias de ser um indígena. 
A valorização do índio se apresenta mediante um movimento de aproximação ao cavaleiro 
medieval – o ―brasão‖ é o bem a ser conquistado pelo futuro guerreiro. Trata-se de uma 
influência clara do Romantismo europeu, que tomava o mito do ―bom selvagem‖, de 
Rousseau, como referência ética e estética. 
O valor da obra de Gonçalves Dias se consolida na perenidade dos temas e das imagens que 
permanecem inspirando a literatura brasileira. Nesta aula, você conheceu a poesia romântica 
da Primeira Geração, focalizada na obra de Gonçalves Dias. 
AULA 3 – A SEGUNDA GERAÇÃO ROMÂNTICA: A POESIA EGÓTICA DE 
ÁLVARES DE AZEVEDO 
A peça ―O fantasma da ópera‖ foi inspirada no romance francês de Gaston Leroux, publicado 
em 1911. 
O enredo se desenvolve no teatro Ópera, de Paris, no século XIX. A protagonista Christine, 
uma jovem bailarina e cantora, é amada por um homem que vive escondido nos subterrâneos 
do teatro, Erik. Por ter o rosto oculto por uma máscara devido a uma deformidade, os atores 
e empregados do teatro acreditam que Erik é um fantasma. Toda a peça transcorre em um 
ambiente de mistério e terror, nele o romance impossível é o tema soturno da peça. 
Na história da humanidade, ciclicamente, a sensação de melancolia, depressão e fuga da 
realidade se expressam na arte por meio de manifestações com características muito 
semelhantes. A extrema subjetividade, o gosto pela noite, a morte e a depressão tornam-se 
temas recorrentes. 
A segunda geração do Romantismo, conhecida como ultrarromântica, egótica ou byroniana1, 
representa na nossa literatura a matriz desse tipo de sentimento, muito comum na 
adolescência: o tédio. E é a partir dele que se desenvolve uma série de outros que lhe são 
complementares. 
1 George Gordon Noel Byron nasceu em 22 de janeiro de 1788 em Londres. Lord Byron teve 
uma vida pessoal bastante conturbada (...). Em meio a toda agitação existencial, tornou-se o 
paradigma do homem romântico que busca a liberdade. Byron escreveu uma obra riquíssima, 
em que não faltam elementos autobiográficos, e depois revelou uma faceta satírica e satânica 
que apresenta em poemas como Don Juan (...). O cinismo e o pessimismo de sua obra 
haveriam de criar, juntamente com sua mirabolante vida, uma legião de jovens poetas 
―byronianos‖ por todo o mundo, chegando até o Brasil na obra de grandes escritores, como 
Álvares de Azevedo. 
Também é comum denominar essa como a ―Geração Mal do século‖. Alguns 
estudiosos associavam a expressão ―mal do século‖ à tuberculose que acometia muitos jovens 
nessa época, doença para a qual não havia remédio. Entretanto, pesquisas mais recentes 
percebem que o ―mal do século‖ se refere a uma sensação de descontentamento, de 
desajuste entre as expectativas grandiosas e a realidade insatisfatória. 
Em nossa literatura, Manoel Antônio Álvares de Azevedo é o poeta que melhor representa 
essa geração, seja por trazer o tema muito bem desenvolvido em obra variada, seja pela 
erudição precoce. Afinal, nosso jovem poeta faleceu aos 21 anos e deixou uma obra que 
assombra pelo volume e variedade, já que também escreveu contos e uma peça de teatro. 
Leia uma crítica de Machado de Assis à obra de Lira dos Vinte Anos, de Álvares de Azevedo: 
―Álvares de Azevedo era realmente um grande talento: só lhe faltou o tempo, como disse um 
dos seus necrólogos. Aquela imaginação vivaz, ambiciosa, inquieta, receberia com o tempo as 
modificações necessárias; discernindo no seu fundo intelectual, aquilo que era próprio de si, e 
aquilo que era apenas reflexo alheio, impressão da juventude, Álvares de Azevedo, acabaria 
por afirmar a sua individualidade poética. Era daqueles que o berço vota à imortalidade. 
Compare-se a idade com que morreu aos trabalhos que deixou, e ver-se-á que seiva poderosa 
não existia, naquela organização rara. Tinha os defeitos, as incertezas, os desvios, próprios de 
um talento novo, que não podia conter-se, nem buscava definir-se.‖ 
Se eu morresse amanhã 
Se eu morresse amanhã, viria ao menos 
Fechar meus olhos minha triste irmã; 
Minha mãe de saudades morreria 
Se eu morresse amanhã! 
 
Quanta glória pressinto em meu futuro! 
Que aurora de porvir e que manhã! 
Eu perdera chorando essas coroas 
Se eu morresse amanhã! 
 
Que sol! Que céu azul que doce n'alva 
Acorda a natureza mais louçã! 
Não me batera tanto amor no peito 
Se eu morresse amanhã! 
 
Mas essa dor da vida que devora 
A ânsia de glória, o dolorido afã... 
A dor no peito emudecera ao menos 
Se eu morresse amanhã! 
O egotismo dessa geração, marcado pela predominância de uma visão subjetiva do mundo, 
pode ser verificado mediante a presença recorrente da figura do eu-lírico próximo do fim, 
fragilizado por sua condição doentia. 
Observe que todos os quartetos são fechados com o verso ―Se eu morresse amanhã‖, a 
repetição indica que o eu-lírico imagina a morte prematura, que cansará grande dor a sua 
mãe e a sua irmã. As duas figuras femininas são constantes nas poesias do jovem poeta 
Álvares de Azevedo. 
O contraditório sentimento provocado pelo desejo de morrer para dar fim às dores existenciais 
e, por outro lado, o lamento pela perda de um futuro promissor constituem o mote principal 
não apenas desse poema, mas de muitos outros dessa geração. 
Lembrança de morrer 
Quando em meu peito rebentar-se a fibra, 
Que o espírito enlaça à dor vivente, 
Não derramem por mim nenhuma lágrima 
Em pálpebra demente. 
 
E nem desfolhem na matéria impura 
A flor do vale que adormece ao vento:Não quero que uma nota de alegria 
Se cale por meu triste passamento. 
 
Eu deixo a vida como deixa o tédio 
Do deserto, o poento caminheiro, 
– Como as horas de um longo pesadelo 
Que se desfaz ao dobre de um sineiro; 
 
Como o desterro de minh‘alma errante, 
Onde fogo insensato a consumia: 
Só levo uma saudade – é desses tempos 
Que amorosa ilusão embelecia. 
 
Só levo uma saudade – é dessas sombras 
Que eu sentia velar nas noites minhas… 
De ti, ó minha mãe, pobre coitada, 
Que por minha tristeza te definhas! 
De meu pai… de meus únicos amigos, 
Pouco - bem poucos – e que não zombavam 
Quando, em noites de febre endoudecido, 
Minhas pálidas crenças duvidavam. 
 
Se uma lágrima as pálpebras me inunda, 
Se um suspiro nos seios treme ainda, 
É pela virgem que sonhei… que nunca 
Aos lábios me encostou a face linda! 
 
Só tu à mocidade sonhadora 
Do pálido poeta deste flores… 
Se viveu, foi por ti! e de esperança 
De na vida gozar de teus amores. 
 
Beijarei a verdade santa e nua, 
Verei cristalizar-se o sonho amigo… 
Ó minha virgem dos errantes sonhos, 
Filha do céu, eu vou amar contigo! 
 
Descansem o meu leito solitário 
Na floresta dos homens esquecida, 
À sombra de uma cruz, e escrevam nela: 
Foi poeta - sonhou - e amou na vida. 
 
Sombras do vale, noites da montanha 
Que minha alma cantou e amava tanto, 
Protegei o meu corpo abandonado, 
E no silêncio derramai-lhe canto! 
 
Mas quando preludia ave d‘aurora 
E quando à meia-noite o céu repousa, 
Arvoredos do bosque, abri os ramos… 
Deixai a lua pratear-me a lousa! 
Também nesse poema, Álvares de Azevedo reúne uma série de temáticas contempladas em 
sua obra, mas a que sobressai é a morte. A antecipação da morte, a reação dos familiares ao 
passamento do eu-lírico, bem como os desejos póstumos confirmam o seu protagonismo na 
cena. 
Assim, a morte não é rejeitada pelo eu-lírico, pelo contrário, ela é aguardada com grande 
expectativa, pois representa o término de angústias, de desejos insatisfeitos, de ilusões vãs da 
―alma errante‖, consumida pelo fogo insensato das paixões da juventude e da vida mundana. 
É interessante notar que o egotismo romântico encontra expressão diferenciada na última 
estrofe; nela, o apelo do eu-lírico se volta à natureza, para que permita que a luz da lua 
focalize a sua lápide, como o refletor em uma cena, e para que também ela chore pelo seu 
fim. 
O ambiente sombrio também serviu de cenário à obra Noites da Taverna. Embora em prosa, 
seus contos macabros, de temática satânica, constituem material significatico a compor o 
perfil do poeta, juntamente com a peça Macário. 
Apesar de não ser uma vertente muito divulgada na obra de Álvares de Azevedo, e embora 
possa parecer paradoxal, o humor também encontra lugar em sua poética, principalmente na 
segunda parte da Lira dos vinte anos. 
Namoro a cavalo 
Eu moro em Catumbi. Mas a desgraça 
Que rege minha vida malfadada 
Pôs lá no fim da rua do Catete 
A minha Dulcineia1 namorada. 
1 Dulcineia é o nome da amada de Dom Quixote, personagem que dá nome à obra de Miguel 
de Cervantes. 
Alugo (três mil-réis) por uma tarde 
Um cavalo de trote (que esparrela!) 
Só para erguer meus olhos suspirando 
A minha namorada na janela... 
 
Todo o meu ordenado vai-se em flores 
E em lindas folhas de papel bordado 
Onde eu escrevo trêmulo, amoroso, 
Algum verso bonito... mas furtado. 
 
Morro pela menina, junto dela 
Nem ouso suspirar de acanhamento... 
Se ela quisesse eu acabava a história 
Como toda a Comédia – em casamento. 
 
Ontem tinha chovido... que desgraça! 
Eu ia a trote inglês ardendo em chama, 
Mas lá vai senão quando uma carroça 
Minhas roupas tafuis encheu de lama... 
 
Eu não desanimei. Se Dom Quixote 
No Rocinante1 erguendo a larga espada 
Nunca voltou de medo, eu, mais valente, 
Fui mesmo sujo ver a namorada... 
1 É o nome do cavalo de Dom Quixote 
Mas eis que no passar pelo sobrado 
Onde habita nas lojas minha bela 
Por ver-me tão lodoso ela irritada 
Bateu-me sobre as ventas a janela... 
 
O cavalo ignorante de namoros 
Entre dentes tomou a bofetada, 
Arripia-se, pula, e dá-me um tombo 
Com pernas para o ar, sobre a calçada... 
Dei ao diabo os namoros. Escovado 
Meu chápeu que sofrera no pagode 
Dei de pernas corrido e cabisbaixo 
E berrando de raiva como um bode. 
 
Circunstância agravante. A calça inglesa 
Rasgou-se no cair de meio a meio, 
O sangue pelas ventas me corria 
Em paga do amoroso devaneio!... 
O Dom Quixote brasileiro e romântico, como é descrito o eu-lírico desse poema, é 
protagonista de uma ação que se desenvolve por meio da paródia à obra de Cervantes. 
No breve enredo, o eu-lírico está enamorado de uma jovem, por quem faz grandes despesas, 
como alugar cavalo, comprar flores e papéis de carta. Humilde e sonhador, como Dom 
Quixote, não se intimida nem mesmo quando fica todo enlameado por uma carroça. 
Obstinado em encontrar a jovem, passa pela casa da moça, mas ela fica irritada e bate com a 
janela em seu rosto, assustando o cavalo, que o joga no chão e rasga a sua roupa. 
A ironia e o humor estão presentes e revelam a gaiatice e a leveza do jovem culto, 
complementando uma imagem não apenas feita de tristeza. 
As características que marcaram a Segunda Geração do Romantismo encontram ecos nos dias 
de hoje, seja por meio de atitudes que cultivam a melancolia e a introversão, seja mediante 
posturas mais radicais, como os grupos góticos. 
Se você quer conhecer um pouco mais, pesquise também sobre os poetas Junqueira Freire e o 
popular Casimiro de Abreu. 
AULA 4 – A POESIA SOCIAL E CONDOREIRA DE CASTRO ALVES 
Nascido em um cenário de maior consciência política, o Condoreirismo exprime as angústias 
do poeta diante de um contexto social manchado pela escravidão, que sustentava a estrutura 
agrário-latifundiária de nosso Brasil monárquico. 
Assim, por seu caráter grandiloquente, representado pela visão panorâmica dos fatos, pela 
voz do eu-lírico que se levanta em nome de outros, resulta um enfoque menos individualista 
da realidade. No entanto, a emoção é radicalizada aos extremos e, representada por imagens 
hiperbólicas da natureza, exprime os sentimentos comprometidos com o real, justificando-se a 
sua inserção no período romântico literário. 
Um poema representativo da fusão entre a consciência social e a subjetividade e emotividade 
próprias do Romantismo é ―Mater dolorosa‖. 
Mater dolorosa 
Deixa-me murmurar à tua ali 
adeus eterno, em vez de lá chorar 
sangue, chorar o sangue! meu 
coração sobre meu filho; tu deves 
morrer, meu filho, tu deves morrer. 
Nathaniel Lee 
 
Meu Filho, dorme, dorme o sono eterno 
No berço imenso, que se chama - o céu. 
Pede às estrelas um olhar materno, 
Um seio quente, como o seio meu. 
 
Ai! borboleta, na gentil crisálida, 
As asas de ouro vais além abrir. 
Ai! rosa branca no matiz tão pálida, 
Longe, tão longe vais de mim florir. 
 
Meu filho, dorme como ruge o norte 
Nas folhas secas do sombrio chão! 
Folha dest'alma como dar-te à sorte? 
É tredo, horrível o feral tufão! 
 
Não me maldigas... Num amor sem termo 
Bebi a força de matar-te a mim 
Viva eu cativa a soluçar num ermo 
Filho, sê livre... Sou feliz assim... 
 
- Ave - te espera da lufada o açoite, 
- Estrela - guia-te uma luz falaz. 
- Aurora minha - só te aguarda a noite, 
- Pobre inocente - já maldito estás. 
Perdão, meu filho... se matar-te é crime 
Deus me perdoa... me perdoa já. 
A fera enchente quebraria o vime... 
Velem-te os anjos e te cuidem lá. 
 
Meu filho dorme... dorme o sono eterno 
No berço imenso, que se chama o céu. 
Pede às estrelas um olhar materno, 
Um seio quente, como o seio meu. 
Ao apresentarmos o poema para a sua leitura, contextualizamos com a visita à Basílica de São 
Pedro, no Vaticano, onde está a imagem ―Pietá‖, de Michelangelo. 
Observe a ilustração. Trata-se da representaçãodo momento em que Maria sustenta, em seu 
colo, o filho Jesus, após ter sido retirado da cruz. A expressão de dor é flagrante no olhar 
voltado para o corpo morto. 
Ao mesmo tempo, podemos perceber uma semelhança entre essa posição e a que as mães 
utilizam para embalar os seus filhos. O nome do tipo de canção que se usa entoar para ninar 
se chama ―acalanto‖. 
 
 
 
 
 
Nele há uma referência inequívoca ao ato materno de embalar o bebê, no entanto esse bebê 
está morte. Sua mãe, por temer que ele venha a passar por todos os sofrimentos da 
escravidão, retira-lhe a vida e pede-lhe perdão. O eu-lírico, consternado pela atitude, que sabe 
ser contrária aos desígnios de Deus, emprega em sua defesa uma passagem bíblica, em: 
―Deus me perdoa... me perdoa já. 
A fera enchente quebraria o vime...‖ 
Fazendo referência ao destino dado a Moisés, a mãe refuta a possibilidade de entregar o filho 
ao rio, em um cesto, pois a força das águas quebraria o vime. 
A ousadia do poeta se consubstancia na aproximação que faz entre Maria, mediante ao título 
―Mater dolorosa‖ – como se denomina o momento em que a mãe de Jesus o recolhe da cruz– 
e a escrava que mata o filho para que possa se salvar do destino de escravidão. Ambas mães 
entregam o corpo do filho morto aos céus, como se o tivessem embalando, ninando para o 
sono eterno. 
Uma leitura contextualizada do poema, escrito em 1865, indica também a postura combativa 
de Castro Alves, uma vez que a Lei do Ventre Livre foi promulgada, apenas, em 1871. Esta lei 
previa que, a partir dessa data, os filhos de escravas seriam considerados livres. 
No caso da obra de Castro Alves, segundo Luciana Stegagno-Picchio, 
―Toda a obra [...] pode ser lida em chave social e política: porque até mesmo os versos mais 
autobiográfica e intimistamente amorosos estão penetrados daquela consciência de pertencer 
a uma humanidade dolorosamente coral que no lamento de um companheiro pode ouvir 
refletida a sua própria dor individual‖ (STEGAGNO- PICCHIO, L. História da Literatura 
Brasileira. 2.ed.e rev.Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2004. p.217) 
A intensidade dos sentimentos e das emoções recebem, na lírica amorosa, um matiz novo: o 
da realização física. De grande apelo e bastante ousados são os poemas cuja temática 
amorosa predomina. 
Se na primeira e na segunda geração, o amor não pode ser realizado – seja devido aos 
obstáculos interpostos pela relação desigual entre o eu-lírico e a mulher amada, alçada a um 
plano superior; seja pela impossibilidade física, pois o eu-lírico está à morte, ou dormindo, 
sonhando com um amor físico inatingível –, na terceira geração, o amor ultrapassa os umbrais 
da culpa e do pecado. 
Adormecida 
Uma noite, eu me lembro... Ela dormia 
Numa rede enstada molemente... 
Quase aberto o roupão... solto o cabelo 
E o pé descalço do tapete rente. 
 
‘Stava aberta a janela. Um cheiro agreste 
Exalavam as silvas da campina... 
E ao longe, num pedaço do horizonte, 
Via-se a noite plácida e divina. 
 
De um jasmineiro os galhos encurvados, 
Indiscretos entravam pela sala, 
E de leve oscilando ao tom das auras, 
Iam na face trêmulos – beijá-la. 
 
Era um quadro celeste!... A cada afago 
Mesmo em sonhos a moça estremecia... 
Quando ela serenava... a flor beijava-a... 
Quando ela ia beijar-lhe... a flor fugia... 
 
Dir-se-ia que naquele doce instante 
Brincavam duas cândidas crianças... 
A brisa, que agitava as folhas verdes, 
Fazia-lhe ondear as negras tranças! 
 
E o ramo ora chegava ora afastava-se... 
Mas quando a via despeitada a meio, 
P‘ra não zangá-la... sacudia alegre 
Uma chuva de pétalas no seio... 
 
Eu, fitando esta cena, repetia 
Naquela noite lânguida e sentida: 
―Ó flor – tu és a virgem das campinas! 
Virgem – tu és a flor de minha vida!‖ 
Note a sutileza das metáforas empregadas pelo poeta, pois mediante a sua integração com a 
natureza, torna possível a realização amorosa. Aqui também, vale acrescentar, a vivacidade da 
cena é conquistada pela genialidade descritiva de Castro Alves, proporcionando ao leitor a 
experiência de tornar-se um observador, tocado pela pureza e ―inocência‖ da cena. 
Dificilmente podemos afirmar que os poetas, apresentados como representantes do 
Romantismo brasileiro, tenham participado de apenas uma geração; e por isso torna-se 
igualmente improvável demarcar, cronologicamente e com rigor, os três momentos. 
O que importa saber, de fato, é que o Romantismo é um período riquíssimo, em quantidade e 
variedade de obras, e a produção poética desse período encontrará repercussão até os nossos 
dias. 
AULA 5 – O REALISMO: CONTEXTO E ABRANGÊNCIA 
A obra Memórias póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis, foi o romance inaugural do 
Realismo no Brasil. 
Há um narrador, mais velho, contando um episódio de sua mocidade: o envolvimento do 
protagonista Brás Cubas com Marcela. Nesta obra, o narrador já está morto e conta a sua vida 
a partir do túmulo e, por isso, as ―memórias‖ são ―póstumas‖. 
Em diversos momentos da narrativa, o narrador dá a entender que o relacionamento era 
motivado pela atração de Brás cubas e pelo interesse material de Marcela - ―... Marcela amou-
se durante quinze meses e onze contos de réis; nada menos‖. – expondo com crueza as 
fraquezas da natureza humana. 
Esse viés crítico da realidade exigiu do escritor um certo distanciamento, de modo a permitir a 
observação das relações sociais de forma isenta e objetiva. 
Esse aspecto denota uma postura muito diferente daquela assumida pelo autor romântico, 
cuja lente subjetiva tingia de sensações os acontecimentos. 
A diferença principal que se pode delinear entre Romantismo e Realismo é a focalização da 
realidade, uma vez que a arte passa a ter uma missão: ser um instrumento de mudança 
social. Essa modificação na perspectiva decorre das transformações e descobertas que o 
século XIX passou a conhecer. 
Como bem observou: 
―Ao invés do subjetivismo, propunham a objetividade, amparados na ideia positiva do fato 
real; em lugar da imaginação, a realidade contingente; assim, ao ‗eu‘, que os românticos 
erigiram como espaço ideal para suas pervagações fantasistas e imaginárias, os realistas 
opunham o ‗não-eu‘; (...). 
E a verdade localizava-se, a seu ver, na realidade concebida como o mundo dos fenômenos 
físicos, suscetíveis de captação dos sentidos. 
Para tanto, abandonaram as preocupações teológicas e metafísicas identificadas com o 
universo romântico, e aderiram à visão do mundo sugerida pelas ciências. (...) Buscam, enfim, 
comportar-se perante a arte como autênticos cientistas.‖ (MOISÉS, Massaud. História da 
literatura brasileira. vol. II. 4. ed.São Paulo: Pensamento/Cultrix, 2001. p.15.) 
As Ideias, Um Contexto 
A partir de meados do século XIX, na Europa, os feitos científicos ganharam grande destaque. 
Inventos, descobertas, pesquisas e teorias transformaram o mundo e abalaram certezas até 
então incontestáveis, como a origem do homem, por exemplo. E, para entendermos a arte 
desse período, é fundamental conhecer um pouco dessas ideias. 
 Charles Darwin 
Charles Darwin publica, em 1859, sua obra ―A origem das espécies‖, na qual defendia a tese 
de que os seres evoluíram a partir de um ancestral comum, e essa evolução decorreu de uma 
seleção natural. 
Até hoje essa tese é objeto de contendas. Nos Estados Unidos, por exemplo, a tese 
criacionista – Deus foi o criador do universo – é priorizada em detrimento da teoria 
evolucionista de Darwin. 
 Karl Marx 
O primeiro tomo de ―O Capital – conjunto de obras do intelectual alemão Karl Marx– foi 
publicado em 1867. A obra criticou os princípios do capitalismo e lançou as bases para o 
socialismo. 
 Augusto Comte 
Pensador francês, exerceu grande influência no pensamento brasileiro. O pensamento 
positivista prega que o conhecimento verdadeiro só se pode alcançar mediante o 
conhecimento científico. Assim, todas as outras formas de conhecimento sãorejeitadas, por 
serem consideradas como métodos aceitáveis. Sua obra é extensa, mas vale citar Discurso 
sobre o espírito positivo, publicada em 1848. 
 Hippolyte Taine 
Historiador, crítico e filósofo francês, aplicou a metodologia científica à análise artística e 
histórica; por meio de um método determinístico defendia que três leis orientavam a 
produção estética: a herança, o ambiente e o momento. 
Uma Breve Análise do Panorama Histórico 
A segunda metade do século XIX, como vimos, foi cenário da efervescência de ideias que 
orientariam grandes revoluções do século XX. E no Brasil encontraram solo fértil para a sua 
divulgação, motivando as mudanças políticas e econômicas que se deram neste período, como 
bem observou Alfredo Bosi: 
―De fato, a partir da extinção do tráfico, em 1850, acelerara-se a decadência da economia 
açucareira; o deslocar-se do eixo de prestígio para o Sul e os anseios das classes médias 
urbanas compunham um quadro novo para a nação, propício ao fermento de ideias liberais, 
abolicionistas e republicanas. De 1870 a 1890 serão essas as teses esposadas pela inteligência 
nacional, cada vez mais permeável ao pensamento europeu que na época se constelava em 
torno da filosofia positiva e do evolucionismo.‖ (BOSI, P. 163). 
A Abolição conquistada em 1888, mediante a assinatura da Lei Áurea, e a Proclamação da 
República, em 1889, alteraram a estrutura política e econômica brasileira de forma bastante 
radical, e não de forma pacífica. 
As revoltas subsequentes, principalmente originadas pelo desacordo com os ideais 
republicanos, foram silenciadas com crueldade e violência na República Velha, tais como a 
Revolta da Armada e a Revolução Federalista, em 1893. 
Nesse panorama das revoltas, devem-se incluir as constantes imigrações de trabalhadores 
europeus, mormente, italianos que chegam ao Brasil, dedicando-se à lavoura de café. O 
produto encontrará grande valorização no mercado, gerando grande especulação financeira e 
lucro. 
O nosso país conquista, pouco a pouco, a maturidade econômica e política e as ideias 
acompanham o ritmo das transformações. 
Nesse campo, é importante registrar o nascimento da ―Escola do Recife‖, grupo formado por 
intelectuais oriundos da Escola de Direito, formado por Tobias Barreto, Graça Aranha e Sílvio 
Romero, personagens que marcaram profundamente a história brasileira. 
―Nas regiões do pensamento teórico, (...) o atraso era horroroso. Um bando de ideias novas 
esvoaçou sobre nós de todos os pontos do horizonte(...): Positivismo, evolucionismo, 
darwinismo, crítica religiosa, naturalismo, cientificismo na poesia e no romance, folclore, 
novos processos de crítica e de história literária, transformação da intuição do Direito e da 
política, tudo então se agitou e o brado de alarma partiu da Escola de Recife.‖ (ROMERO, S. 
Explicitações indispensáveis. Apud BOSI, A. História concisa da literatura brasileira. 2003. p. 
166.) 
Realismo, Por Quê? 
O termo ―Realismo‖ denomina com pertinência o período estético e suas características. 
Mas quem deu esse nome ou de onde ele surgiu? 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
O quadro de Gustave Courbet chama-se ―Os quebradores de pedra‖. Observe a aridez do 
cenário em primeiro plano, as pedras e a terra compõem a base das figuras humanas, cujas 
faces estão ocultas. Maltrapilhos, os trabalhadores estão empenhados em sua tarefa árdua de 
quebrar as pedras, não importando para aquele que os representa dar a eles a individualidade 
de um rosto. Sua tarefa é o objeto da arte, e não suas emoções e sentimentos. 
A cena do cotidiano humilde reporta ao observador o motivo mais relevante ao artista desse 
período, pois, desprovida de idealização, a realidade é apresentada em uma versão que 
procura ser seu retrato fiel. 
Atribui-se a Courbet, autor do quadro, o nome do período ―Realismo‖. Na verdade, o nome 
surgiu como uma provocação. 
Vamos conhecer a história? 
Em 1855, a Exposição Universal, realizada em Paris, tinha por objetivo trazer as mais recentes 
descobertas na indústria, na agricultura e também nas artes. 
No entanto, por terem sido considerados ofensivos à moral, devido à temática chocante de 
suas telas, os quadros de Courbet são recusados. 
Em resposta, o pintor organiza sua própria exposição nas proximidades do evento, e dá a ela 
o título ―Le Réalisme‖. Assim, a exposição de Courbet dá nome ao período estético estudado 
nesta aula. 
Na literatura, Charles Baudelaire publicava, em 1857, As flores do mal, e Gustave Flaubert, no 
mesmo ano, Madame Bovary. 
As duas obras foram consideradas divisores de águas na história da literatura mundial, pois 
transformaram o pensamento e o estilo de seus contemporâneos e sucessores. 
No Brasil, o marco inicial do movimento se registra com a publicação de Memórias póstumas 
de Brás Cubas, em 1881, de Machado de Assis. 
―Machado de Assis (Joaquim Maria M. de A.), jornalista, contista, cronista, romancista, poeta e 
teatrólogo, nasceu no Rio de Janeiro, RJ, em 21 de junho de 1839, e faleceu também no Rio 
de Janeiro, em 29 de setembro de 1908. É o fundador da Cadeira nº. 23 da Academia 
Brasileira de Letras. 
Velho amigo e admirador de José de Alencar, que morrera cerca de vinte anos antes da 
fundação da ABL, era natural que Machado escolhesse o nome do autor de O Guarani para 
seu patrono. Ocupou por mais de dez anos a presidência da Academia, que passou a ser 
chamada também de Casa de Machado de Assis.‖ 
No mesmo ano, foi publicado O mulato, de Aluísio Azevedo. 
―Aluísio Azevedo (A. Tancredo Gonçalves de A.), caricaturista, jornalista, romancista e 
diplomata, nasceu em São Luís, MA, em 14 de abril de 1857, e faleceu em Buenos Aires, 
Argentina, em 21 de janeiro de 1913.‖ 
A produção literária brasileira alcança, nos últimos anos do século XIX, a sua maturidade, seja 
pela produção de maior volume, seja pela maior densidade artística de nossas obras. São 
contos, romances, ensaios, crônicas, poesias, peças teatrais, enfim, os gêneros se 
diversificam, tornando possível vislumbrar os caracteres formadores de sua identidade. 
A crítica à degradação da sociedade constitui tema do Romance de Tese. 
Trata-se do romance cujo objetivo é o de defender a tese de que as relações sociais não 
evoluíram como a ciência. 
A temática realista é bastante variada, mas se observam com alguma constância os temas 
relativos ao casamento ou à família. Nesse sentido, o adultério é tema recorrente, como índice 
da desestruturação da família burguesa e sinal mais crítico e agudo da denúncia da hipocrisia 
das relações sociais. 
É importante chamar a atenção para outro ponto muito importante quando estudamos este 
período estético: a abrangência do termo Realismo. Em outras palavras, podemos observar 
que, sob a nomenclatura, convivem três tendências: o Realismo, propriamente dito; o 
Naturalismo e o Parnasianismo. 
Nos termos de Bosi, ―O Realismo se tingirá de naturalismo, no romance e no conto, sempre 
que fizer personagens e enredos submeterem-se ao destino cego das ‗leis naturais‘ que a 
ciência da época julgava ter codificado; ou se dirá parnasiano, na poesia, à medida que se 
esgotar no lavor do verso tecnicamente perfeito.‖ (BOSI, A. 2003. p. 168) 
Assim, esse movimento deve ser visto como um movimento amplo, que engloba e define uma 
maneira peculiar de ver o mundo e representá-lo, principalmente com objetividade e 
fidelidade à descrição dos detalhes. 
AULA 6 – O REALISMO EXACERBADO: A PROSA DE ALUÍSIO AZEVEDO 
A obra de Émile Zola, O Germinal, é considerada a obra-prima do Naturalismo, publicada em 
1885. Para escrevê-la, Zola passou dois meses em uma mina de carvão, trabalhando e 
vivendo como um mineiro. 
A narrativa procura demonstrar os efeitos do meio sobre as relações sociais, no entanto a 
força da descrição das imagens e a violência com que os personagens se movimentam nesse 
universo de exploração tornaram a obra um tratado social de alcance atual. 
Vamosidentificar as diferenças entre Realismo e Naturalismo? 
De fato, o Naturalismo é o nome que damos ao estilo que enfatiza as características 
científicas, como os dados pertinentes às ideias deterministas de Taine – a tríade: herança, 
meio e momento. 
Já o Realismo focaliza com mais intensidade as questões psicológicas, consubstanciadas na 
descrição pormenorizada dos conflitos íntimos por que passam os personagens. 
O cenário preferido dos realistas é a vida das cidades, da classe média, dos pequenos 
proprietários e suas veleidades. Já os naturalistas focalizam as classes mais baixas, os 
escravos, os trabalhadores braçais e imigrantes. 
Você verá agora dois trechos. Cada um deles foi retirado da obra considerada marco inicial do 
período estético que estudamos. Do Realismo, temos o capítulo 49 de Memórias póstumas de 
Brás Cubas, de Machado de Assis, que você verá agora, e do Naturalismo, o primeiro capítulo 
do livro O Mulato, de Aluísio Azevedo, que você verá mais à frente. 
MACHADO DE ASSIS 
―CAPÍTULO 49 
A ponta do nariz 
Nariz, consciência sem remorsos, tu me valeste muito na vida... Já meditaste alguma vez no 
destino do nariz, amado leitor? A explicação do Doutor Pangloss é que o nariz foi criado para 
uso dos óculos, — e tal explicação confesso que até certo tempo me pareceu definitiva; mas 
veio um dia, em que, estando a ruminar esse e outros pontos obscuros de filosofia, atinei com 
a única, verdadeira e definitiva explicação. 
Com efeito, bastou-me atentar no costume do faquir. Sabe o leitor que o faquir gasta longas 
horas a olhar para a ponta do nariz, com o fim único de ver a luz celeste. 
Quando ele finca os olhos na ponta do nariz, perde o sentimento das coisas externas, 
embeleza-se no invisível, apreende o impalpável, desvincula-se da terra, dissolve-se, eteriza-
se. 
Essa sublimação do ser pela ponta do nariz é o fenômeno mais excelso do espírito e a 
faculdade de a obter não pertence ao faquir somente: é universal. Cada homem tem 
necessidade e poder de contemplar o seu próprio nariz para o fim de ver a luz celeste, e tal 
contemplação, cujo efeito é a subordinação do universo a um nariz somente, constitui o 
equilíbrio das sociedades. 
A genialidade de Machado de Assis, reconhecida mundialmente, vai receber a nossa atenção 
especial em uma aula dedicada apenas à sua obra. 
Você acabou de ver um pequeno trecho em que a típica ironia machadiana incide sobre uma 
reflexão do narrador Brás Cubas cuja condição de autor morto lhe permite todo o 
distanciamento necessário para analisar aspectos do comportamento humano de maneira fria 
e distanciada. 
A obra, segundo o narrador e protagonista Brás Cubas, surge depois de sua morte, tendo 
como autor, ele mesmo, o defunto. Assim o defunto-autor. 
No trecho, o narrador avalia a importância do nariz e chega à conclusão de que seu mérito 
decorre da serventia que oferece às reflexões. Assim, o nariz é o foco da visão quando 
não estamos efetivamente olhando para nada, mas apenas para o nosso próprio interior, 
procurando o equilíbrio. Por isso, ao lado do amor, o nariz é uma força capital, capaz de 
subordinar a espécie humana ao indivíduo. 
Observe a perscrutação psicológica, objeto do capítulo, bem como o distanciamento que 
possibilita a divagação abalizada do morto. Ironia fina, esgrima de palavras: essas são 
características de Machado. 
Veja agora o trecho do Naturalismo, o primeiro capítulo do livro O mulato, de Aluísio Azevedo. 
ALUISIO AZEVEDO 
Capítulo 1 
Era um dia abafadiço e aborrecido. A pobre cidade de São Luís do Maranhão parecia 
entorpecida pelo calor. Quase que se não podia sair à rua: as pedras escaldavam; as vidraças 
e os lampiões faiscavam ao sol como enormes diamantes, as paredes tinham reverberações 
de prata polida; as folhas das árvores nem se mexiam; as carroças d‘água passavam 
ruidosamente a todo o instante, abalando os prédios; e os aguadeiros, em mangas de camisa 
e pernas arregaçadas, invadiam sem cerimônia as casas para encher as banheiras e os potes. 
Em certos pontos, não se encontrava viva alma na rua; tudo estava concentrado, adormecido; 
só os pretos faziam as compras para o jantar ou andavam no ganho. 
A Praça da Alegria apresentava um ar fúnebre. De um casebre miserável, de porta e janela, 
ouviam-se gemer os armadores enferrujados de uma rede e uma voz tísica e aflautada, de 
mulher, cantar em falsete a ―gentil Carolina era bela‖; do outro lado da praça, uma preta 
velha, vergada por imenso tabuleiro de madeira, sujo, seboso, cheio de sangue e coberto por 
uma nuvem de moscas, apregoava em tom muito arrastado e melancólico: ―Fígado, rins e 
coração!‘‘ 
Era uma vendedeira de fatos de boi. 
O trecho apresenta uma descrição tão vigorosa e intensa que o leitor tem a impressão de ter 
sido inserido no quadro: as ruas quentes de São Luís do Maranhão. Aliás, esse é um traço 
peculiar a Aluísio Azevedo, a sua destreza com a descrição de ambientes, paisagens e 
personagens. 
O veio naturalista se nota na inversão da descrição, pois os cães apresentam características 
humanas 
"Os cães (...) tinham uivos que pareciam gemidos humanos‖ –, enquanto os humanos são 
assemelhados a animais – ―as perninhas tortas pelo costume de cavalgar as ilhargas 
maternas‖, ―guinchavam‖, ―as peixeiras (...), as tetas opulentas.‖ 
A observação de viés científico resvala para a fixação com o abjeto, seja pela descrição dos 
suores, seja pela repulsa provocada pela imagem da vendedora de miúdos bovinos ou do 
quitandeiro acariciando o pé. Assim, o narrador conduz o leitor pelo cenário quente, sujo e 
pobre. 
Ressalta-se que o meio age como fator determinante para o comportamento dos indivíduos, 
estabelecendo, dessa forma, uma relação de causa e efeito. Não se encontra, muito menos, 
referência a alguma reflexão ou conflito interior dos personagens que povoam a cena, pois 
todos são representados em seus aspectos mais animalescos. 
A obra ―O mulato‖ faz parte de uma trilogia, composta por O Cortiço e Casa de Pensão. Como 
observa Massaud Moisés, a tríade consagrou Aluísio Azevedo: 
―Como adepto do Naturalismo, partiu de bases científicas para analisar uma sociedade 
considerada decadente, a sociedade burguesa, romântica, brasileira, da segunda metade do 
século XIX, composta de doentes dos sentidos, sujeitos a imperativos do sangue e do 
contexto social e a convenções hipócritas. (...) Do quadro social, o romancista escolheu, entre 
pessimista e revoltado, três chagas e lancetou-as, como um clínico impassível, o problema do 
mulato, o cortiço e a casa de pensão, situações que lhe permitem evidenciar a mestria em 
compor flagrantes sociais e tratá-los como personagens.‖ (MOISÉS, M. História da literatura 
brasileira. p. 34) 
Das três obras, O Cortiço é reconhecidamente o romance em que Azevedo atingiu o ápice do 
determinismo aplicado à sociedade brasileira, em sua observação dos pobres, dos mestiços e 
dos imigrantes. A narrativa conta com a descrição pormenorizada de personagens que 
ganham vida pela plasticidade de seu relevo na obra. 
Alçado à posição de protagonista, o cortiço, ambiente onde se desenvolve a trama, é o palco 
dos embates entre os sentimentos, os desejos e as ambições. Seu dono, João Romão, 
imigrante português determinado a ascender socialmente, sacrifica tudo e todos a fim de 
atingir seus objetivos. 
Vamos ler a apresentação do personagem na abertura da obra? 
―João Romão foi, dos treze aos vinte e cinco anos, empregado de um vendeiro que enriqueceu 
entre as quatro paredes de uma suja e obscura taverna nos refolhos do bairro do Botafogo; e 
tanto economizou do pouco que ganhara nessa dúzia de anos que, ao retirar-se o patrão para 
a terra, lhe deixou, em pagamento de ordenados vencidos, nem só a venda com o que estava 
dentro, como ainda um conto e quinhentos em dinheiro. 
Proprietário e estabelecido por sua conta, o rapaz atirou-se à labutação ainda com mais ardor, 
possuindo-se de taldelírio de enriquecer que afrontava resignado as mais duras privações. 
Dormia sobre o balcão da própria venda, em cima de uma esteira, fazendo travesseiro de um 
saco de estopa cheio de palha. A comida arranjava-lhe, mediante quatrocentos réis por dia, 
uma quitandeira sua vizinha, a Bertoleza, crioula trintona, escrava de um velho cego residente 
em Juiz de Fora e amigada com um português que tinha uma carroça de mão e fazia fretes na 
cidade. 
Bertoleza também trabalhava forte; a sua quitanda era a mais bem afreguesada do bairro. De 
manhã vendia angu, e à noite peixe frito e iscas de fígado; pagava de jornal a seu dono vinte 
mil réis por mês, e, apesar disso, tinha de parte quase que o necessário para a alforria. Um 
dia, porém, o seu homem, depois de correr meia légua, puxando uma carga superior às suas 
forças, caiu morto na rua, ao lado da carroça, estrompado como uma besta.‖ 
Logo de imediato, o narrador dá a conhecer ao leitor a fatia social que contemplará em seu 
texto: o mundo dos pobres, dos explorados e dos escravos no cenário urbano. No entanto, 
não se pode esperar uma visada piegas, muito pelo contrário, a força das figuras e as tramas 
que fazem evoluir os seus destinos fazem parte de um projeto determinista: a comprovação 
da força impiedosa do meio, do momento e do peso da linhagem. 
O embate entre ricos e pobres não se configura apenas na relação de exploração imposta por 
João Romão aos inquilinos – até porque o proprietário está muito distante de ser tomado 
como alguém bem-sucedido socialmente –, mas principalmente pela relação desigual 
representada pelo sobrado de Miranda, vizinho do cortiço. 
―E durante dois anos o cortiço prosperou de dia para dia, ganhando forças, socando-se de 
gente. E, ao lado, o Miranda assustava-se, inquieto com aquela exuberância brutal de vida, 
aterrado defronte daquela floresta implacável que lhe crescia junto da casa, por debaixo das 
janelas, e cujas raízes, piores e mais grossas do que serpentes, minavam por toda a parte, 
ameaçando rebentar o chão em torno dela, rachando o solo e abalando tudo. 
Posto que lá na Rua do Hospício os seus negócios não corressem mal, custava-lhe a sofrer a 
escandalosa fortuna do vendeiro ―aquele tipo! um miserável, um sujo, que não pusera nunca 
um paletó, e que vivia de cama e mesa com uma negra!‖ 
À noite e aos domingos, ainda mais recrudescia o seu azedume, quando ele, recolhendo-se 
fatigado do serviço, deixava-se ficar estendido numa preguiçosa, junto à mesa da sala de 
jantar, e ouvia, a contragosto, o grosseiro rumor que vinha da estalagem numa exalação forte 
de animais cansados. Não podia chegar à janela sem receber no rosto aquele bafo, quente e 
sensual, que o embebedava com o seu fartum de bestas no coito‖. 
Aluísio Azevedo escreveu também textos de viés romântico, em concomitância com as obras 
de natureza naturalista. Trata-se de folhetins que garantiam ao autor a sobrevivência 
econômica, tendo em vista o gosto da época pelas narrativas românticas. 
Embora a estrutura fragmentária do texto publicado capítulo a capítulo nos jornais não 
pudesse contar com enredos mais elaborados e intrigas mais longas, dois de seus folhetins 
devem ser lembrados: Filomena Borges e A Mortalha de Alzira. 
O primeiro se destaca pela vivacidade do enredo que se desenvolve a partir da sátira dos 
romances românticos; o segundo, passado na França de Luís XV, retrata o conflito vivenciado 
por Ângelo, um padre. 
Em síntese, a superioridade da obra de Aluísio Azevedo se destaca no período pela mestria na 
descrição dos ambientes urbanos e no desenho hipertrofiado de seus personagens 
caricaturais. Nas palavras de Alfredo Bosi: 
(...) o abuso não invalida o uso: em face de certa vaguidade romântica no trato das 
personagens, foi salutar o deslocamento do eixo para o homem comum, desfigurado, mais do 
que se acreditava, pelos revezes da herança biológica, da vida familiar, da profissão. Se a 
ótica naturalista capta de preferência a mediocridade da rotina, os sestros e mesmo as taras 
do indivíduo, ela não será por isso menos verossímil que a opção contrária dos românticos; e, 
o que mais importa, é tão significativa quanto ela, pois uma e outra são sintomas dos 
impasses criados no espírito do ficcionista quando se abeira da condição humana enleada na 
vida social.‖ (BOSI, Alfredo. História concisa da literatura brasileira. 41.ed. São Paulo: Cultrix, 
2003.p.189) 
O Parnasianismo foi a vertente poética contemporânea ao Realismo. 
AULA 7 – O PARNASIANISMO: A OURIVESARIA DAS PALAVRAS 
Admiramos a leveza com que a frágil bailarina dança a coreografia. Os saltos, os passos são 
tão precisamente executados que não nos ocorre, como espectadores, qualquer dificuldade. 
No entanto, para conseguir essa impressão de facilidade e fluidez, as bailarinas treinam 
muitas horas, sofrem dores atrozes, hipertrofiam partes do seu corpo pelo excessivo de 
trabalho físico. 
Leia abaixo o poema ―A um poeta‖, de Olavo Bilac. 
A um poeta 
Longe do estéril turbilhão da rua, 
Beneditino escreve! No aconchego 
Do claustro, na paciência e no sossego, 
Trabalha e teima, e lima, e sofre, e sua! 
 
Mas que na forma se disfarce o emprego 
Do esforço: e trama viva se construa 
De tal modo, que a imagem fique nua 
Rica mas sóbria, como um templo grego 
 
Não se mostre na fábrica o suplicio 
Do mestre. E natural, o efeito agrade 
Sem lembrar os andaimes do edifício: 
 
Porque a Beleza, gêmea da Verdade 
Arte pura, inimiga do artifício, 
É a força e a graça na simplicidade. 
A semelhança entre o trabalho da bailarina e o do poeta fica evidente, pois ―que na forma se 
disfarce o emprego/Do esforço‖. Em outras palavras, a arte deve ser o produto de uma 
atividade intensa, que jamais deve deixar transparecer o sacrifício empregado para realizá-la. 
Outro ponto importante realçado pelo eu lírico, em sua advertência, é a condição de 
distanciamento das questões mundanas para que o poeta, como um monge beneditino, atinja 
a perfeição estética – ―Trabalha e teima, e lima, e sofre, e sua!‖ O conselho de Bilac introduz 
o período que estudaremos nesta aula: o Parnasianismo. 
A vertente poética do Realismo se consolida com o Parnasianismo. Sua importância deve ser 
medida não apenas pelas obras ou pelo valor de seus poetas, mas também pela resistência 
em se manter como paradigma estético, galvanizado no gosto erudito. 
Afinal, além dos poetas que professaram sua adesão contemporânea à efervescência dos 
últimos anos do século XIX, como é o caso da tríade parnasiana – Alberto de Oliveira, 
Raimundo Correia e Olavo Bilac − o movimento contou com nomes expressivos da literatura 
do século XX, como Mario de Andrade e Manuel Bandeira, de forma que é irrefutável o valor 
substancial do Parnasianismo na história da literatura brasileira. 
As Origens 
A manifestação mais remota do movimento parnasiano nasceu da pena de Théophile Gautier, 
em 1832, na França, mas foi definitivamente com a publicação dos três números da antologia 
‖Le Parnase Contemporaine‖, em 1866, 1869 e 1876. 
No Brasil, o aparecimento das obras Sinfonias (1883), de Raimundo Correia, Meridionais 
(1884) e Sonetos e Poemas (1885), de Alberto de Oliveira e Poesias (1888), de Olavo Bilac 
sinaliza os novos parâmetros em nossas letras. 
Sobre o nome ―Parnasianismo‖, trata-se de referência ao Monte Parnaso, na Grécia, indicando 
a restauração dos ideais clássicos de beleza, como se observa nesse trecho do poema de 
Alberto de Oliveira, Vaso Grego: 
―Esta de áureos relevos, trabalhada 
De divas mãos, brilhante copa, um dia, 
Já de aos deuses servir como cansada, 
Vinda do Olimpo, a um novo deus servia‖ 
Em aulas anteriores, mencionamos que o período denominado Realismo comportava três 
vertentes em seu interior: o Realismo, o Naturalismo e o Parnasianismo. Compreender a 
inserção do movimento parnasiano no período realista significa perceber que a criação 
artística decorre da observaçãoe representação objetiva, ou seja, o artista valoriza o 
distanciamento como forma de garantir a expressão estética mais verdadeira ou mais perfeita. 
Embora já seja questionável a efetiva objetividade, mesmo em prosa, em poesia o esforço 
empreendido pelo autor para sustentar a impassibilidade e a frieza, a não demonstração de 
sentimentos e emoções, torna-se o mote da própria produção. Em outras palavras, para falar 
da beleza estética da arte e para obtê-la, o autor recorre à própria descrição do fazer estético 
como tema de seus poemas. Daí surge o princípio perseguido pelos poetas desse período: ―a 
arte pela arte‖. 
O que quer dizer esse princípio? 
Para o poeta parnasiano, a poesia deveria estar desprovida de qualquer intenção política ou 
didática. Como também tornava-se inadmissível tratá-la como a confissão amorosa ou 
sentimental, muito menos instrumento de divulgação patriótica. Assim, a arte parnasiana deve 
ter por objetivo a ―autonomia da arte‖, como propunha Théophile Gautier. 
Nesse sentido, é de se esperar que daí surja um apego desmesurado à forma, representado 
pela valorização da versificação metrificada, dos ritmos, das rimas raras, bem como da 
inserção de estruturas retóricas mais elaboradas e o uso de linguagem rebuscada, ou mesmo 
erudita. Em síntese, a estética romântica foi rechaçada em nome da recuperação dos ideais 
clássicos. E a poesia, longe de ser a válvula de escape do lirismo subjetivo do poeta, tornava-
se produto do trabalho artístico; fruto do empenho intelectual, só assemelhado ao do escultor 
ou do ourives. 
Na poesia brasileira, três poetas merecem nossa atenção: Alberto de Oliveira, Raimundo 
Correia e Olavo Bilac. Seus estilos e características serão abordados a seguir. 
 Alberto de Oliveira, o príncipe dos poetas 
O título ―Príncipe dos poetas‖, concedido em 1924 ao escritor fluminense, declara a aclamação 
da crítica e aceitação do poeta. No entanto, análises menos envolvidas com o calor do 
movimento apontam a fragilidade de sua poética, por perceber nela a ausência de verve lírica, 
donde resultaram poemas extremamente descritivos e desprovidos de emoção. Clique no 
botão abaixo para ler um dos seus poemas. 
Alberto de Oliveira (Antônio Mariano A. de O.), farmacêutico, professor e poeta, nasceu em 
Palmital de Saquarema, RJ, em 28 de abril de 1857, e faleceu em Niterói, RJ, em 19 de janeiro 
de 1937. 
O ÍDOLO 
Sobre um trono de mármore sombrio, 
Em templo escuro, há muito abandonado, 
Em seu grande silêncio, austero e frio 
Um ídolo de gesso está sentado. 
 
E como à estranha mão, a paz silente 
Quebrando em torno às funerárias urnas, 
Ressoa um órgão compassadamente 
Pelas amplas abóbadas soturnas. 
 
Cai fora a noite - mar que se retrata 
Em outro mar - dois pélagos azuis; 
Num as ondas - alcíones de prata, 
No outro os astros - alcíones de luz. 
 
E de seu negro mármore no trono 
O ídolo de gesso está sentado. 
Assim um coração repousa em sono... 
Assim meu coração vive fechado. 
Observemos os aspectos formais primeiramente. O poema é composto de 4 quadras, 
formadas por versos decassílabos, com rimas alternadas. 
Na primeira estrofe, o eu lírico nos apresenta aquele que dá nome ao poema, o ídolo. A 
descrição do ambiente onde ele se encontra remete à idéia de mausoléu, reforçada pela 
referência às ―funerárias urnas‖, o ―trono de mármore‖ – pedra comum em cemitérios e 
sepulcros – ao som do órgão. 
O ambiente interno é soturno, mas o externo não deixa nada a dever, pois a noite que cai 
reflete a escuridão sobre o mar. E as únicas luzes são as ondas e os reflexos dos astros. 
Observe que não há referência a nenhuma pessoa ou sentimento, nem mesmo emoção. 
A escuridão permanece nos dois primeiros versos da última quadra, no entanto, uma 
revelação é feita: o coração, o sentimento é o ídolo. Assim, todo o entorno protege e isola o 
coração do poeta, que está dormindo, afastado de qualquer movimento externo. 
 Raimundo Correia: A Ambivalência Parnasiana 
Embora tenha sido considerado um dos maiores poetas parnasianos, a sua adesão ao 
movimento foi, nos últimos anos de sua vida, renegada. Entretanto, a recusa encobre um 
paradoxal bem-sucedido acordo entre o lirismo romântico de seus primeiros poemas e o rigor 
da forma parnasiana. 
Raimundo Correia (R. da Mota de Azevedo C.), magistrado, professor, diplomata e poeta, 
nasceu em 13 de maio de 1859, a bordo do navio brasileiro São Luís, ancorado na baía de 
Mogúncia, MA, e faleceu em Paris, França, em 13 de setembro de 1911. 
A CAVALGADA 
A lua banha a solitária estrada... 
Silêncio!... mas além, confuso e brando, 
O som longínquo vem se aproximando 
Do galopar de estranha cavalgada. 
 
São fidalgos que voltam da caçada; 
Vêm alegres, vêm rindo, vêm cantando, 
E as trompas a soar vão agitando 
O remanso da noite embalsamada... 
 
E o bosque estala, move-se, estremece... 
Da cavalgada o estrépito que aumenta 
Perde-se após no centro da montanha... 
 
E o silêncio outra vez soturno desce, 
E límpida, sem mácula, alvacenta 
A lua a estrada solitária banha... 
Os versos decassílabos, finalizados por rimas interpoladas, mimetizam, pelo ritmo, a 
percepção do som da cavalgada que interrompe o silêncio da noite, trazendo a alegria e 
algazarra dos cavaleiros, indiferentes ao ambiente mortiço – ―noite embalsamada‖. 
Note que a descrição da natureza retorna à condição anterior à cavalgada barulhenta: uma 
paisagem lúgubre banhada pela luz da lua, que imperturbável ilumina a estrada silenciosa. 
Tanto que o verso inicial, ―A lua banha a solitária estrada...‖, é retomado no último verso, 
ligeiramente alterado, ―A lua a estrada solitária banha‖. A anástrofe, ou seja, a inversão dos 
elementos propicia a dupla interpretação: o ato de iluminar é realizado pela ―lua‖ ou pela 
―estrada‖? 
Tal impassibilidade é compatível com o sentimento parnasiano e recorrente na obra de 
Raimundo Correia, que retrata a natureza como se esta representasse o interior melancólico 
do eu lírico. 
 Olavo Bilac: Joalheiro das Palavras 
No início de nossa aula, fomos apresentados à poética de Bilac. Você se lembra que fizemos 
uma analogia entre o árduo exercício das bailarinas e o esforço do poeta para obter a fluência 
e a beleza? 
O poeta parnasiano, para Bilac, deve criar o poema como um artífice, cuja matéria-prima 
preciosa é a língua. É famoso o seu poema Língua Portuguesa, vamos ler? 
Olavo Bilac (O. Braz Martins dos Guimarães B.), jornalista, poeta, inspetor de ensino, nasceu 
no Rio de Janeiro, RJ, em 16 de dezembro de 1865, e faleceu, na mesma cidade, em 28 de 
dezembro de 1918. Um dos fundadores da Academia Brasileira de Letras, criou a Cadeira nº. 
15, que tem como patrono Gonçalves Dias. 
LÍNGUA PORTUGUESA 
Última flor do Lácio, inculta e bela, 
És, a um tempo, esplendor e sepultura: 
Ouro nativo, que na ganga impura 
A bruta mina entre os cascalhos vela... 
 
Amo-te assim, desconhecida e obscura, 
Tuba de alto clangor, lira singela, 
Que tens o trom e o silvo da procela, 
E o arrolo da saudade e da ternura! 
 
Amo o teu viço agreste e o teu aroma 
De virgens selvas e de oceano largo! 
Amo-te, ó rude e doloroso idioma, 
 
Em que da voz materna ouvi: ―meu filho!‖, 
E em que Camões chorou, no exílio amargo, 
O gênio sem ventura e o amor sem brilho! 
Nesse poema, Bilac menciona a história da língua portuguesa, com a metáfora, ―Última flor do 
Lácio, inculta e bela‖, fazendo referência à origem do idioma, o último a se originar do Latim 
vulgar. O Latim é originário da região do Lácio. 
Em todo o poema, o eu lírico ressalta aspectos que singularizam a língua portuguesa, 
associando-os à natureza brasileira. Ao final, o nome de Camões é lembrado, pois o grande 
poeta morreu sem conhecer a merecida glória. 
Olavo Bilac foi um poeta de grande influência e prestígio em seu tempo. Tornou-se ―Príncipe 
dos poetas brasileiros‖ em 1907, título envergado com orgulho devotadoà forma. No entanto, 
a sua obra aponta para a presença de dualismos que se consubstanciam na presença de 
temas líricos, emotivos, contidos pelo estilo rigoroso parnasiano, o que acaba por 
comprometer a força expressiva de seus poemas. 
De fato, o desgaste dos princípios parnasianos do culto à forma e da reverência ao ―não eu‖ já 
são sentidos na poética bilaquiana, como observa Massaud Moisés: 
―Tornado o ‗eu‘ homólogo da realidade, quando não coisa da realidade, sem transcendência 
(...), oprimido por uma concepção mecânica do mundo, a arte poética se compraz no culto de 
significantes vazios de sentido, ou do significante pelo significante. A teologia da forma, 
sacralizando o signo, expulsa os significados, como forma oca que se basta autotelicamente, 
alheia à realidade viva do mundo.‖ (MOISÉS, Massaud. História da Literatura Brasileira. v. 2.4. 
ed. São Paulo: Cultrix, 2006, p.176) 
Muitos de seus poemas dão corpo a delicadas perquirições, que permanecem no imaginário e 
sedimentam a nossa história. Como o belíssimo, ―Nel mezzo del camin‖: 
Nel mezzo del camin... (Olavo Bilac) 
Cheguei. Chegaste. Vinhas fatigada 
E triste, e triste e fatigado eu vinha. 
Tinhas a alma de sonhos povoada, 
E a alma de sonhos povoada eu tinha... 
 
E paramos de súbito na estrada 
Da vida: longos anos, presa à minha 
A tua mão, a vista deslumbrada 
Tive da luz que teu olhar continha. 
 
Hoje, segues de novo... Na partida 
Nem o pranto os teus olhos umedece, 
Nem te comove a dor da despedida. 
 
E eu, solitário, volto a face, e tremo, 
Vendo o teu vulto que desaparece 
Na extrema curva do caminho extremo 
AULA 8 – O SIMBOLISMO: A BUSCA DA EXPRESSÃO DO INDIZÍVEL 
As tendências cientificistas que ganharam muitos adeptos e desenvolveram-se ao longo da 
segunda metade do século XIX encontraram, nos dois últimos decênios, reações contrárias 
aos excessos pragmáticos do Realismo e ao artificialismo da arte parnasiana. Trata-se do 
movimento denominado Simbolismo. 
Penumbra, apagamento dos contornos, bem como a sugestão de névoa, neblina ou fumaça 
são muito comuns aos poemas desse período. 
Agora, observe a tela ―Recompensa de São Sebastião‖, do premiado pintor brasileiro Eliseu 
Visconti. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
O tema religioso é freqüente na arte simbolista. Note a ênfase na cor branca e na 
diafaneidade do anjo. De certa forma, o quadro nos remete às paisagens medievais, seja pela 
religiosidade, seja pelas vestes das demais figuras que compõem a cena. A recompensa de 
São Sebastião foi ter-se tornado santo devido ao seu flagelo, é o que indica o quadro: de 
olhos fechados, trazendo as mãos cruzadas, como defunto, o personagem central receberá a 
recompensa depois de morto. 
Não se observam, no quadro de Visconti, elementos do Parnasianismo: o rigor da forma, o 
objetivismo descritivo ou o paganismo greco-romano. Aqui, na tela analisada, a emoção, a 
religiosidade, o mágico parecem preponderar. Esses são traços do Simbolismo. 
Você poderia perguntar: mas o símbolo só existe nesse movimento? 
Como explicou Afrânio Coutinho, ―a poesia universal é toda ela na essência simbólica (...), os 
símbolos povoam a literatura desde sempre‖ (2001, p. 212). ―No entanto, como observou 
Bosi, o símbolo sempre estava preso a ―contextos religiosos‖ e vai adquirir, com o Simbolismo, 
a ―função-chave‖ de vincular as partes ao Todo universal‖ (1994, p. 263). 
Nas duas últimas décadas do século XIX, como dissemos, o conturbado panorama histórico e 
a ebulição das idéias científicas criaram o ambiente para o excessivo apego à descrição, por 
vezes científicas, da realidade. No entanto, o malogro do privilégio do excessivo apego à 
forma, em detrimento da emoção e da subjetividade, encontrou sua expressão em uma nova 
corrente, preocupada com o resgate da linguagem dos subterrâneos da inconsciente. 
Os postulados de Sigmund Freud sobre as camadas do inconsciente humano serviram de guia 
para viagem em busca de uma linguagem verdadeira: a linguagem do ―eu‖ mais profundo. 
Nesse procedimento, podemos enxergar a distinção entre o Romantismo e o Simbolismo1: ao 
se reentronizar o ―eu‖ como o centro das reflexões do artista, recuperou-se o subjetivismo 
romântico, por um lado; mas, de outro, os simbolistas rechaçaram a emotividade superficial e 
frívola dos românticos, e entenderam que a busca desse ―eu‖ merecia um mergulho2 mais 
radical e violento. 
1 ―O Simbolismo foi assim uma forma do espírito romântico, sob certos aspectos uma sua 
continuação, um Romantismo indireto e extremado, tanto quanto ele fugindo mundo exterior 
por acreditar que só é real aquilo que é refletido pela consciência individual. Destarte, para o 
simbolista o que importa são os estados de alma e destes somente os que podem ser 
conhecidos – os seus próprios. Daí a sua religião do eu, a forte nota individualista, oposta à 
filosofia social – e a religião das sensações em lugar da filosofia estética. E como decorrência 
natural desses dois princípios, as atitudes antirracionais e místicas, o tom idealista e religioso, 
a tendência ao isolamento, o respeito pela música, a teoria das correspondências sensoriais, a 
religião pela beleza. A poesia foi separada da vida social, confundida com a música, 
explorando o inconsciente à custa de símbolos e sugestões, preferindo o mundo do invisível 
do visível, querendo compreender a vida pela intuição e pelo irracional, explorando a realidade 
além do real e da razão.‖ (COUTINHO, Afrânio. Introdução à literatura brasileira. 17. Ed. Rio 
de Janeiro: Bertrand Brasil, 2001. p. 216-217). 
2 Como observou Massaud Moisés: ―Assim, cruzando a zona do consciente, imergiam nas 
esferas inconscientes, em busca do ‗eu profundo‘: invadiam os desvãos onde reinam vivências 
fluidas, pré-lógicas, inefáveis. Descobri-las ou surpreendê-las como a boiar sobre as águas 
dum lago recôndito, examiná-las ou ‗senti-las‖. (MOISÉS, Massaud. História da literatura 
brasileira. Vol. 2. 4. ed. São Paulo: Cultrix, 2001. p. 252). 
O problema é que era necessário criar uma nova linguagem que fosse capaz de expressar o 
inefável, ou seja, aquilo que não se pode exprimir com palavras. O esforços empreendidos no 
sentido de reproduzir o mais autêntico esbarravam na impossibilidade de dizê-lo ou de 
expressá-lo por meio da escrita. Assim, a linguagem simbolista se caracteriza pelos 
neologismos e pela musicalidade, como ensinou Afrânio Coutinho: 
―Posto não constituísse uma unidade de métodos, antes de idéias, o Simbolismo procurou 
instalar um credo estético baseado no subjetivo, no pessoal, na sugestão e no vago, no 
misterioso e ilógico, na expressão indireta e simbólica‖. (COUTINHO, Afrânio. Introdução à 
literatura brasileira. 17. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2001. p. 213) 
Os estudiosos da história da literatura são unânimes em apontar Charles Baudelaire como a 
influência maior desse período. Mas as participações de Rimbaud, Verlaine e Mallarmé são 
também consideradas como constituintes da formação do novo estilo. A princípio, esse 
movimento se denominava ―decadentismo‖. O nome surgiu a partir de um artigo de Paul 
Bourget, em 1881, ―Teoria da Decadência‖, que analisava o pessimismo de Baudelaire. Mais 
tarde, o nome se justificava pela constatação da decadência da sociedade, de suas instituições 
e princípios. Apenas a partir de 1885, o termo ―Simbolismo‖ se firma, consagrando-se como o 
nome da nova estética. 
No Brasil, a proeminência do catarinense João de Cruz e Souza, com a publicação de Broquéis 
(1893) e Missal (1893), declarou-se de forma efetiva. A genialidade de sua verve poética 
consagrou-se a um dos três maiores poetas simbolistas da história da literatura universal. 
Mas também é importante mencionar a obra de Alphonsus de Guimaraens e do controverso 
Augusto dos Anjos. 
 
 
Cruz e Sousa: Erudição e Gênio = Arte 
Cruz e Sousa é o poeta mais importante do movimento simbolista entre nós, brasileiros. Filho

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