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Sabrina Feitosa de Sousa Psicopatologia 2|UDF Os estados de sofrimento no lactente devem ser compreendidos como dependentes do somático e do relacional ao mesmo tempo. Os tipos de sinais do sofrimento psíquico precoce acontecem no primeiro ano de vida (até em torno de 15 meses) e são de dois tipos: 1. positivos: mostram que “os processos psíquicos subjacentes estão funcionando como o previsto”. 2. precoce: se subdividem em duas outras séries: 2.1 – Série barulhenta: são sinais que sempre alertam os mais próximos (médicos sempre serão consultados) sobre o sofrimento psíquico. 2.2 - Série silenciosa: são os sinais que tendem a passar despercebidos, de modo que os pais não busquem ajuda médica por não perceberem os sinais. É possível até mesmo que esses sinais sejam confundidos com sinais positivos do desenvolvimento, quando isso acontece, há maior perigo para a saúde do bebê. Sinais Positivos e de Sofrimento Precoce É na relação do bebê com seus cuidadores que podemos identificar os sinais positivos do desenvolvimento, bem como os de sofrimento precoce. Os sinais positivos aparecem quando as funções materna e paterna estão em equilíbrio. Já os sinais de sofrimento aparecem no momento em que há o desequilíbrio. Assim, os sinais da série barulhenta têm o papel de alertar ao próximo que a mãe está sendo intrusiva demais, enquanto o pai está sendo ausente demais. Nesse sentido, parece que o bebê tenta impor o limite que deveria ser feito pela função paterna. Já os sinais da série silenciosa demonstram que o bebê deixou de lutar contra a onipotência da função materna. Ele se entrega à passividade, o que pode tornar o cuidado muito mais fácil para os cuidadores. Assim, os cuidadores acabam deixando esses sinais passar despercebidos por os perceberem de modo positivo. Entretanto, esses sinais demonstram a falha da função paterna. Primeiro Registro Pulsional: a Oralidade • Freud denominou como experiência primordial de satisfação o prazer que o bebê sente em se inundar, não apenas de leite, mas da presença do outro nutridor. Dá-se destaque também à capacidade do bebê em evocar o seio, mesmo quando o outro nutridor está ausente. À essa representação mental, Lacan denomina como incorporação das coordenadas de prazer que, para o bebê, organizará sua relação com o outro. Assim, a necessidade de encher seu estômago de leite, parece ser relegada à segundo plano porque a presença do outro trás satisfação. Lacan propõe o terceiro tempo do circuito pulsional como aquele em que a verdadeira satisfação pulsional é obtida com a experiência de ser o objeto de Sofrimento Psíquico (precoce) Sabrina Feitosa de Sousa Psicopatologia 2|UDF satisfação para o outro. Assim, a mãe olha para o bebê que suga seu seio, enquanto o bebê também a olha. Apenas quando esse tempo já está inscrito no psíquico é que o segundo tempo da pulsão autoerótica se torna verdadeiramente autoerótico: o bebê suga o dedo para se acalmar e esperar pelo outro. Para que essas trocas compartilhadas de prazer se inscrevam no terceiro tempo, é preciso que o outro esteja disponível a investir na relação com o bebê, coisa que cuidadores sobrecarregados, ausentes, intrusivos não conseguem fazer. Percebe-se que Lacan se refere à dupla vertente maternal-paternal, ou seja, às atribuições para as funções materna e paterna, cada uma exercendo uma regulação recíproca, garantindo, então, um espaço onde o sujeito poderá surgir. Sinais de Sofrimento • A satisfação pulsional (psicoafetiva) é tão importante quanto à satisfação física. O bebê pode se manifestar recusando ser alimentado, podendo colocar sua sobrevivência em risco, demonstrando do início que a existência enquanto sujeito é muito mais importante que apenas a sobrevivência física. Os problemas de saúde do bebê para alimentação, como refluxos, vômitos e distúrbios ligados à imaturidade do trato digestivo chamam a atenção quando resistem ao tratamento, podendo, então, ser considerados como recusas mascaradas. As recusas alimentares preocupam seus cuidadores, em especial à mãe. Na perspectiva dupla vertente, a recusa pode ser entendida como um lembrete à mãe de que o bebê é outro sujeito, resistindo, assim, à onipotência da mãe na relação. Os cuidadores, preocupados com a saúde de seu bebê, procuram ajuda médica. O médico pode orientar a mãe a não insistir, pois o bebê irá se alimentar quando estiver com fome. Nessa perspectiva, o médico, sem saber, sustenta a função paterna. Na maioria dos casos, o bebê volta a comer. Por outro lado, o médico pode ser também “engolido” pelas angústias maternas e começa, então, a tentar métodos para que o bebê coma. Nessa atitude, a dimensão simbólica do desejo do bebê é deixada de lado. É comum que isso não funcione ou o bebê pode até a voltar a comer, mas o sintoma se manifesta de outra forma. Nesse sentido, se não houver risco de vida, o tratamento pode ser ajudar a mãe a suportar as recusas alimentares de seu bebê. Em berçários ou em modalidade de guarda, é possível ajudar o bebê oferecendo-lhe outro alimento. Essa atitude não é intrusiva, mas tem um valor simbólico subjetivamente. O adulto não deve ser intrusivo, mas também não deve deixar de investir na relação com o bebê, não deve restringir seu contato com o bebê à alimentação. “Apenas o investimento do adulto transformará o alimento em objeto oral, e a recusa ativa do bebê, se é tolerada, poderá então operar como um ato descompletante do Outro, de sua onipotência original”. Se essa troca é feita, mantendo o investimento dos pais no bebê, essa troca pode refletir beneficamente na relação do bebê com seus pais, modificando o laço primordial. • Figura 1 Sabrina Feitosa de Sousa Psicopatologia 2|UDF O preenchimento passivo se refere ao comportamento do bebê se deixar ser preenchido por qualquer pessoa, sem investimento relacional, sem apetite, nem prazer. Esse comportamento demonstra a indiferença em se relacionar com o Outro. Essa passividade pode ter origem desde o início ou secundariamente, quando o bebê entende que por mais que “chame”, ninguém irá atendê-lo. Como é o caso de bebês que choram por horas sem ninguém os atender, eles entendem que o outro não irá vir e passam apenas a aceitar o que vem. Assim, bebês passivos parecem ser bem comportados, fazendo os cuidadores os acharem mais fáceis de cuidar. Entretanto, esta calma aparente não tem base na confiança da relação com o outro que cuida e sim no abandono, é uma calma vazia, de falta de escolha. Segundo Registro Pulsional: a Especularidade • A especularidade ou registro da pulsão escópica se refere à clínica do olhar. O sinal positivo de desenvolvimento do registro especular é o direcionamento do olhar. O olhar tem uma função psíquica que é a relação com o outro. Assim, o olhar é um indicador de presença. Sinais de Sofrimento • Evitamento seletivo do olhar: significa uma recusa em olhar. Geralmente, essa recusa é direcionada à mãe e está baseada na recusa a enfrentar algo difícil que ele percebe no olhar ou até mesmo a ausência de olhar da mãe. Se esse estado de sofrimento permanece, o bebê se recusa a olhar o rosto como um todo. Pode-se tentar confrontar o bebê com um outro investimento parental, de modo que ele se depare com um olhar que o vê. Em geral, essa tentativa de ter uma relação com o bebê é benéfica para ele. É importante ressaltar que, em bebês saudáveis, o olhar se instala nas primeiras horas de vida. Assim, acreditar que o olhar se instalará sozinho é quase inútil, pois há pouca probabilidade de isso acontecer, se não houver intervenção. • A não-fixação do olhar é o principal sinal de sofrimento silencioso. Esse sinal sempre alerta, porém, é classificado como silencioso porque, após as investigações médicas que indicam que a visão do bebê está saudável, não se busca entenderporque o olhar do bebê não se fixa até que sintomas positivos do desenvolvimento autísticos comecem a aparecer. Outro sinal silencioso é a persistência em manter o olhar, até mesmo a fixação antes da maturação biológica, como o estrabismo fisiológico e o nistagmo. Figura 2 – Estrabismo Fisiológico Figura 3 - Nistagmo Terceiro Registro: a Pulsão Invocante • O registro da invocação se refere ao que Lacan chama de clínica do sonoro. No momento do nascimento, o bebê chora e a mãe entende o choro como um chamado. Quando o bebê faz barulhos, é a mãe quem atribui significações ao que ele emite, por exemplo: mam mam mam logo será interpretado como mamãe até que o bebê aprenda a falar mamãe. Assim, a mãe dar significado para a voz de seu filho. Sabrina Feitosa de Sousa Psicopatologia 2|UDF O mesmo acontece com o choro, logo a mãe diferencia o choro de fome do choro de raiva ou de dor, etc. Acontece também a libidinização da voz: a voz se torna objeto de pulsão quando o bebê balbucia sozinho em estado de vigília. Em contraste com bebês institucionalizados, os bebês saudáveis aprendem rápido a utilizar a voz como linguagem, fazendo a mãe aparecer com o som da voz. Sinais de Sofrimento • A presença de gritos sem significados, após o período neonatal, e a inconsolabilidade são os principais sintomas dessa série. Esses sinais são apelos para ser escutado, entretanto, dificilmente conseguem porque a resposta que recebe dos adultos é para fazê-los calar a boca. • O principal sintoma é o mutismo, o bebê abandona a vocalização. Assim, ele desiste de se fazer ser escutado. Quando o bebê se torna silencioso, isso pode ser apreciado por cuidadores sobrecarregados. Referências ___Sinais de Sofrimento Precoce. In: A clínica Precoce: o nascimento do humano. p. 47 – 75. Figura 1: https://pixabay.com/images/id- 2730855/. Acesso em 29 set. 2021. Figura 2 – Estrabismo Fisiológico: https://www.google.com/url?sa=i&url=htt ps%3A%2F%2Fwww.visaonainfancia.com %2Ftag%2Festrabismo- fisiologico%2F&psig=AOvVaw2QpFn7xNek fkPc6f_AHYG7&ust=1633356380578000& source=images&cd=vfe&ved=0CAkQjRxqF woTCJiNm-60rvMCFQAAAAAdAAAAABAD. Acesso em 03 out. 2021. Figura 3 – Nistagmo: https://provisaomacapa.com.br/wp- content/uploads/2020/01/O-que- %C3%A9-Nistagmo-macapa.jpg. Acesso em 03 out. 2021. Veja Também: Resumo de Psicanálise https://pixabay.com/images/id-2730855/ https://pixabay.com/images/id-2730855/ https://www.google.com/url?sa=i&url=https%3A%2F%2Fwww.visaonainfancia.com%2Ftag%2Festrabismo-fisiologico%2F&psig=AOvVaw2QpFn7xNekfkPc6f_AHYG7&ust=1633356380578000&source=images&cd=vfe&ved=0CAkQjRxqFwoTCJiNm-60rvMCFQAAAAAdAAAAABAD https://www.google.com/url?sa=i&url=https%3A%2F%2Fwww.visaonainfancia.com%2Ftag%2Festrabismo-fisiologico%2F&psig=AOvVaw2QpFn7xNekfkPc6f_AHYG7&ust=1633356380578000&source=images&cd=vfe&ved=0CAkQjRxqFwoTCJiNm-60rvMCFQAAAAAdAAAAABAD https://www.google.com/url?sa=i&url=https%3A%2F%2Fwww.visaonainfancia.com%2Ftag%2Festrabismo-fisiologico%2F&psig=AOvVaw2QpFn7xNekfkPc6f_AHYG7&ust=1633356380578000&source=images&cd=vfe&ved=0CAkQjRxqFwoTCJiNm-60rvMCFQAAAAAdAAAAABAD https://www.google.com/url?sa=i&url=https%3A%2F%2Fwww.visaonainfancia.com%2Ftag%2Festrabismo-fisiologico%2F&psig=AOvVaw2QpFn7xNekfkPc6f_AHYG7&ust=1633356380578000&source=images&cd=vfe&ved=0CAkQjRxqFwoTCJiNm-60rvMCFQAAAAAdAAAAABAD https://www.google.com/url?sa=i&url=https%3A%2F%2Fwww.visaonainfancia.com%2Ftag%2Festrabismo-fisiologico%2F&psig=AOvVaw2QpFn7xNekfkPc6f_AHYG7&ust=1633356380578000&source=images&cd=vfe&ved=0CAkQjRxqFwoTCJiNm-60rvMCFQAAAAAdAAAAABAD https://www.google.com/url?sa=i&url=https%3A%2F%2Fwww.visaonainfancia.com%2Ftag%2Festrabismo-fisiologico%2F&psig=AOvVaw2QpFn7xNekfkPc6f_AHYG7&ust=1633356380578000&source=images&cd=vfe&ved=0CAkQjRxqFwoTCJiNm-60rvMCFQAAAAAdAAAAABAD https://www.google.com/url?sa=i&url=https%3A%2F%2Fwww.visaonainfancia.com%2Ftag%2Festrabismo-fisiologico%2F&psig=AOvVaw2QpFn7xNekfkPc6f_AHYG7&ust=1633356380578000&source=images&cd=vfe&ved=0CAkQjRxqFwoTCJiNm-60rvMCFQAAAAAdAAAAABAD https://provisaomacapa.com.br/wp-content/uploads/2020/01/O-que-%C3%A9-Nistagmo-macapa.jpg https://provisaomacapa.com.br/wp-content/uploads/2020/01/O-que-%C3%A9-Nistagmo-macapa.jpg https://provisaomacapa.com.br/wp-content/uploads/2020/01/O-que-%C3%A9-Nistagmo-macapa.jpg
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