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Psicologia Da Gravidez, Parto & Puerpério - Raquel Soifer

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psicologia 
• da ·g�avidez, parte 
159 -055. 2 
368 
!X• 
; . 
e puerper10 
J 
--· -
capítulo 1 
ansiedades específicas : 
da gravidez 
A observação clínica permite situar certos movimentos específicos de 
incremento da ansiedade durante a gravidez, os quais se podem agrupar da 
seguinte maneira: 
a) no começo da gestação; 
b) durante a formação da placenta (2? e 3? mês); 
c) ante a percepção dos movimentos fetais (3 meses e meio); 
d) pela instalação franca dos movimentos (5 meses); 
e) pela versã'o interna (de 6 meses e meio em diante); 
f) no início do 9? mês; 
g) nos últimos dias antes do parto. 
Cada um desses acessos de ansiedade, que podem durar dias ou semanas 
e chegar a produzir sintomatologia física própria, ou inclusive provocar abor­
to ou parto prematuro, caracteriza-se por fantasias bem determinadas e espe­
cíficas, cujo conhecimento possibilita ao profissional realizar a higiene mental 
adequada, a fim de prevenir um ulterior agravamento. 
Além disso, deve-se levar em conta o fato de ser a gravidez uma situação 
que envolve não apenas a mulher, mas também seu companheiro e o meio so­
cial imediato que, inevitavelmente, a acompanham em seu processo psicológi­
co de regressão . 
.,,,,..,...,,...,,,..,,.--..,:.• 
21 
isabe
Realce
-- · 
;:J) A SITUAÇÃO PSICOLÓGICA 
NO COMEÇO DA GESTAÇÃO 
Antes de tudo, devemos esclarecer que, no decorrer deste trabalho, nos 
ocuparemos da gravidez desejada e aceita pela mãe e/ou o meio que a rodeia. 
Dito isso, passaremos a explicar as vivências que aparecem comumente nos 
inícios de gestação. 
Em geral, a primeira suspeita de gravidez recai sobre um sintoma que 
produz certa inquietude: a sonolência. A mulher sente que necessita dormir 
muito mais que o habitual, que não lhe são suficientes as horas geralmente 
destinadas a esse fim e que "está com sono" o dia inteiro. 
O tratamento psicanalítico nesses casos revela que teve início a regres­
são, tal como descrita por Marie Langer. Do ponto de vista psicológico, a 
necessidade de dormir corresponde a essa regressão, que assume as caracterís­
ticas de uma identificação fantasiada com o feto. A regressão em si tem ori­
gem na percepção inconsciente das mudanças orgânicas e hormonais e na sen­
sação de incógnita. 
A percepção, consciente e inconsciente, não 'consegue definir a causa 
dessas mudanças e, diante do conflito suscitado, a mulher adota a solução de 
afastar os estímulos, tanto internos como externos, por via do repouso. Com 
bastante freqüência, aparecem nos sonhos elementos que traduzem o estado 
psicológico da gestante recente - também inconscientemente captado por seu 
companheiro :1 são imagens de interiores de casas ou objetos continentes (ma­
las, bolsas! ou de crianças ou animais pequenos, ou ainda de veículos grandes. 
Por exemplo: uma paciente sonhou que estacionava seu automóvel em fila, 
bem acomodado junto ao meio-fio, exatamente como os outros que ali já 
estavam. Este sonho representava a sensação de vir a ser como as demais 
mulheres, que podem ter filhos, e o abandono da atitude masculina, simbo­
lizado pela ação de dirigir o automóvel. 
Como dissemos anteriormente, também os maridos percebem a gravidez 
de modo inconsciente e trazem à análise sonhos típicos, nos quais se mistu· 
ram elementos persecutórios referentes ao futuro rival. Essa percepção baseia­
se no estado de retraimento da mulher. causado pela regressão. 
A essa altura, convém definir as manifestações externas da regressão e 
do retraimento. i; uma mudança quase imperceptível à observação superficial: 
1 - Em viste da prec6rie trenscriçio deite trecho, que se ache incompleto no original ar­
gentino utilizado pela tradutora, esta se viu obrigada I complet6-lo, Inferindo do 
contexto o sentido do fragmento: " ... traduzem o estado p1icol6gico da gestante 
recente - também inconscientemente ceptado por seu companheiro." (N. da T.) 
22 
a mulher torna-se ensimesmada, encontra-se como em um estado de torpor 
(além de realmente sentir sono) e, por conseguinte, um tanto afastada dos de­
mais. 1 sso acontece já a partir da segunda ou terceira semana e se une às ansie­
dades despertadas pela verificação da falta menstrual. Tal falta chama a aten­
ção desde o primeiro momento, dando lugar à pergunta ou à negaçã'o: "Estarei 
grávida?" ou "não, nã'o pode ser gravidez, certamente é um atraso". 
A situação se complica se a gestante já tem um filho ou vários. Em se 
tratando de crianças pequenas, estas imediatamente sentem o retraimento ma• 
terno e reagem com uma brusca mudança de conduta: terrores noturnos, ina­
petência, caprichos, alguma ligeira enfermidade (às vezes também grave), etc. 
Arminda Aberastury1 observou esta situação, facilmente perceptível na análise 
de criança�. O mesmo acontece quando a gestante é a criada ou ama, ou qual­
quer pessoa que conviva com a familia. O conteúdo da vivência terror/fica é a 
sensação de um rival oculto que despoja a criança de sua mãe. A contrapartida 
sá"o os ataques invejosos ao ventre materno. 
Como observa Marie µinger} o maior ou menor grau de aceitação da 
gravidez por parte do·ambiente social imediato reforça ou não a tendência da 
mulher para a maternidade. Essa autNa afirma que toda gravidez produz uma 
situaçã'o de maior ou menor conflito ent{e uma tendência maternal e outra de 
rejeição (desejo e contradesejo). A rejeição baseia-se em evidências persecutó· 
rias que se devem à elaboraçio do conflito edipiano. O mecanismo de defesa 
mais útil para resolver o conflito é a negação. Em uma investigação em anda­
mento, com a equipe do Sanatório Metropolitano, dirigida pelo doutor Ga­
vensky, confirmamos a observação desse mecanismo como um componente 
útil e, portanto, normal na gravidez. 
O sintoma da sonollncia, favorecendo a negação dos est lmulos, revela• 
se proveitoso, além de constituir uma defesa biológica adequada, que propor­
ciona ao organismo uma quota maior de repouso, necessária para o trabalho 
que inicia. Em conseqJéncia, convém animar a gestante incipiente a aceitar 
a necessidade de dormir mais durante os dois primeiros meses, já que com isso 
resolve várias situações ao mesmo tempo. Por outro lado, a insônia deve ser 
considerada como a expressá"o de uma si!l!.ª�º ex_t�rna de ansiedade frente 
à gravi®z. -
Desde o segundo mês costumam aparecer as náuseas e os vômitos, em 
geral pela manhã", depois do despertar. Comprovamos clinicamente a coinci-
2 - ABERASTURY, A. - "Fobia a los globos en una nll'la de 11 mesas". R,v. � Psi• 
coanJ/i1i1. Vol. VII, 4, 1960, p. 641. OHcreve um caso de percepçlo precoce da gra­
videz meterna. 
23 
1 • 
( dência desses sintomas com a a�;ieçade d�terminada-pela · ioçerteza• da exis­
tência ou não da gravidez. Com bastante freqüência, uma vez estabelecido o 
diagnóstico preciso, remitem espontaneamente. Outràs vezes persistem em 
forma branda até a aparição evidente das modificações corporais ou a percep• 
ção dos movimentos fetais. As náuseas e vômitos servem, portanto, para evi• 
denciar a gestação - a mulher que desmaia nos filmes para comunicar ao 
marido que está grávida -, ao mesmo tempo que dão vazão à ansiedade causa• 
da pela incerteza. 
Esta ansiedade pela incerteza exprime o conflito de ambivalência, devi­
do à intensificação das vivências persecutórias que existem por si mesmas 
frente à maternidade: são o produto de sentimentos de culpa infantil, tanto 
pelos ataques fantasiados à própria ma'e como pelos desejos de ocupar seu 
lugar. A vivência persecutória consiste em que alguém possa arrebatar o filho 
sonhado e demonstrar que se trata de uma fantasia e não de uma gravidez 
real; ou ainda que a gravidez tão desejada implique a perda da própria mãe, 
por se haver concretizado a fantasia infantil invejosa: ter o filho pela destrui• 
ção da mãe. Uma paciente de psicanálise sentia grande incerteza de estar grávi­
da, apesar da confirmação médica nesse sentido. Sofreu uma pequena perda 
de sangue que muito a assustou. Dias depois oomeçou a sentir náuseas e a ver 
mitar.Ficou bastante satisfeita porque agora, sim, podia convencer-se. 
Assim, quando de fato existiram situações em que a mulher viu prejudi­
cada sua mãe, ou sua relação oom ela esteve seriamente perturbada, ou a per• 
deu, as náuseas e vômitos adquirem maior intensidade e persistência. A reve­
lação desse estado permite a indicação precisa da psicoterapia individual, a 
fim de evitar o agravamento do sintoma e sua conseqüência, o vômito incoer· 
cível da gravidez. Ou seja, o reconhecimento precoce do problema e sua solu• 
ção psicoterapêutica constituem a profilaxia desse quadro. 
Por psicoterapia individual entendemos um tratamento de objetivos li• 
mitados, destinado essencialmente a resolver a situaçã'o oonflitiva diante da 
maternidade; com isso não descartamos os casos que pedem e necessitam um 
tratamento de maior envergadura, tal como o psicanalítico. �sicoter!Jll! de 
objetivos limitados pode durar dois ou três meses, ou prolongar-se, se necessá· 
rio, até o puerpério. Sua freqüência ótima é de uma vez por semana, sendo 
factível a realização quinzenal ou mensal, conforme o caso. 
Outro aspecto importante na psicopatologia das náuseas e vômitos CO· 
muns é o temor da incapacidade de dar à luz e nutrir uma criança. 3 Esse te-
3 - Angel Garma (comunicação pessoall explica· "Na gênese dos vômitos de gravidez 
costuma ser muito importante o influxo de fantasias inconscientes da mulher -
existentes também no marido - de que seu embrião ou feto carece de algum mem• 
24 
\ 
.,, 
mor, de quo nos ocuparemos adiante mais po,menorizadamente, além de en• 
raizar-se num componente geral da personalidade, que pode ter maior ou me­
nor importância, baseia-se, por um lado, no temor ao filho em geral, esse des­
conhecido que logo se revelará ao findar a gravidez, e, de modo especial, no 
desenraizamento cultural em relação aos conhecimentos sobre lactação. 
Outro fator dentro dessa ansiedade é o temor derivado da situação eco-
J / r 
�•:�- ,r" nômica, quando esta é realmente precária, ou quando aparece como pura fan-
�,.;.}-.,-1>-" 
tasia, por deslocamento das ansiedades inconscientes . 
., ;,"" Em conseqüência, a preparação psicoprofiljtica válida deveria iniciar-se 
\ . 
pelo esclarecimento psicológico do casal primogenitor, desde o início, prati· 
camente desde a confirmação diagnóstica da gravidez. Tal esclarecimento, pre· 
ferivelmente grupal, como o exporemos na segunda parte deste livro, pode ser 
realizado pelo próprio obstetra ou por profissionais especializados (psicólo­
gos, psicoterapeutas, assistentes sociais) e deveria incluir uma orientação sobre 
problemas econômicos e de trabalho. 
b) ANSIEDADES DO 2� e 3� MÊS: 
FORMAÇÃO DA PLACENTA 
O tratamento psicanalítico de pacientes grávidas permitiu descobrir, 
através de seus sonhos, a percepção da instalação da placenta e as ansiedades 
concomitantes. 
Como se sabe, ao estabelecer-se a circulação através das vilosidades, 
muda o sistema nutritivo do embrião, realizando-se este processo por meio da 
placenta. Em si mesma, a n!S1�ç�o é um ato agressivo à mucosa uterina por 
parte do ovo fecundado. Ambos os processos, nidação e absorção de_ substân­
cias alimentícias na corrente circulatória materna, com as mudanças psicológi­
cas que determinam, são percebidos conforme acabamos de dizer e vividos 
de forma persecutória pelo inconsciente da mulher. 
bro e é, de algum outro modo, incompleto ou monstruoso. Tais fentasias se origi­
nam da proieçio no embrião do complexo de castração da mulher. Ela, Inconscien­
temente, considera que sua genitalidade é ao mesmo tempo Incompleta I parcial­
mente perversa, e seu superego • classlficaré de monstruo1a. Parece-lhe, portanto, 
uma genitalidade asqueroaa. o que também contribui a provocar a reação de vômi­
tos. A mulher teme que essas conteúdos repudiáveis de genitalidade se tornem mani­
festos ante 01 demais, ao nascer o feto supostamente disforme, que é como ela ln• 
conscientemente se considera a si me1ma." 
25 
Nessa etapa, que se instala desde o começo do segundo mês, a gestante 
tem sonhos que se revelam típicos, segundo pudemos comprovar. São sonhos 
em que aparecem ePementos de sangue, seja em forma direta, como no sonho 
descrito por Marie Langer/ seja simbólica. Por exemplo: uma paciente, no 
segundo mês de gravidez, sonhou que haviam colocado em sua casa um jogo 
de estantes embutidas na parede, forradas com um tecido de quadrados gran­
des, com riscas vermelhas. 
O jogo de estantes representava claramente as vilosidades placentárias, e 
0 tecido de quadrados, os vasos em formação. As associações do sonho ti­
nham um conteúdo persecutório, pois a levavam a pensar em suas queixas 
contra os pais, por não lhe haverem dado o bastante (as toalhas de mesa que 
não lhe haviam comprado e que deveriam cobrir as estantes) e nas discussões 
com o marido sobre a dificuldade de se aceitar como dona de casa. Ambas as 
vivências relacionavam-se, por um lado, com seu rancor edipiano contra o pai, 
por preferir a mãe, e por outro, ao ressentimento contra a mie, dona de casa 
muito experiente, cuja intensidade impedia a filha de se identificar bem 
com ela. Esses sentimentos de ódio tornavam-se ameaçadores nas atuais cir­
cunstâncias e levavam essa mulher a confundir o filho com um roubo. As es­
tantes vazias representavam o roubo, ao mesmo tempo que simbolizavam sua 
vivência de vacuidade mental, ao sentir-se incapaz de resolver os problemas do 
lar. Ou seja. o conteúdo profundo do sonho exprimia o terror de estar sendo 
dilacerada e esvaziada. Desse modo, ela dava vazão a seus terrores inconscien­
tes através da imagem onírica; e pela realização fantástica de desejos (toalhas­
filho) adquiria a capacidade de tolerar a ansiedade e de prosseguir na gravidez. 
Esse período, do segundo ao terceiro mês, é conhecido como a �e 
perigo de abor_to. _O sonho já mencionado do livro de M. Langer, em que a 
paciente vê sua irmã dilacerando-se num aborto e perdendo os órgios inter­
nos, mostra a relação entre a vivência persecutória da placentaçio e o aborto. 
O conteúdo dessa vivência é a sensaçio terrorífica de ser devorada e esvaziada 
por um monstro (o aborto), que simboliza o filho. Esses terrores se aS$ociam, 
portanto, a uma percepção orgânica, a do processo de placentaç6o: 
{ 
percepção 
{ 
reatlvaçlo du f1nt11las 
Placentação lncon1cienta persecutórias da roubo e 
do proceuo esvaziamento. 
4 _ LANGE R, M. - Maternidad y Saxo Bueno, Aires, Ed. Paidós, 2a. ed., 1974, p, 184. 
26 
l 
1 
1 
1 
Julgamos que se nesse momento tal processo é explicado à gestante, sua 
ansiedade decresce a níveis toleráveis, constituindo-se numa higiene mental do 
aborto. A experiência assim o tem demonstrado. Para isso, é preciso levar em 
conta que os mecanismos para evitar a concepção são múltiplos (vaginismo, 
vagina "expulsa", inflamações vaginais e uterinas, aumento do ph, espasmo e 
inflamação tubária, patologia ovariana, etc.) e que nesses mecanismos orgãni• 
cos participa de modo preponderante o psiquismo inconsciente. Por isso, 
quando uma mulher engravida, é por.9.�e sua ten?ênc!_a à maternid�de superou 
amplam!nte o te!ror aos filhos. Esse terror continuará ex istindo nela, sem dú· 
vida, mas com características at�nuadas pelo desejo de ser mãe. Assim, a mu· 
lher que se encontra no in feio da gravidez merece e deve receber todo o apoio 
necessário para prosseguir seu caminho. 
Nessa fase, ; sintomatologia das náuseas e vômitos, que em alguns casos 
de incremento das vivências persecutórias costumam intensificar-se, acrescen­
ta-se a dl�rréia ou a constipação. Ambas as disfunções assustam bastante, pois 
a gestante se habitua a associá-las conscientemente ao perigo de aborto. 
Devemos ter em mente o fato de que, embora esses sintomas sejam a 
expressão do sentimento de rejeição pelo filho, essa rejeição envolve tão so· 
mente um aspecto da personalidade, de importância menor que o outro, liga• 
do ao desejo de ser mãe. Por outras palavras, se uma gestante recente vomita 
ou sofre diarréiaou se constipa, é porque se assusta ao perceber sua rejeição 
e busca dar vazão a esta através da sintomatologia, segundo postulava Freud. 
Portanto, vomita ou defeca excessivamente como maneira de dissociar e dis­
criminar o bom e o mau dentro de si, expulsando o mau para ficar com o 
bom, o filho. 
Por outra parte, como foi definitivamente exposto por diversos autores, 
a rejeição obedece a vivências terroríficas, tanto no que diz respeito ao filho 
em Tm�mo, representante da própria hostilidade dirigida aos pais, como em 
relação aos próprios pais, que aparecem carregados de ameaças e censuras pela 
atividade sexual da paciente. 
Em tal sentido, as investigações que realizamos, seja em primíparas ado­
lescentes, seja em idosas, 5 demonstram que a possibilidade de pôr à prova es­
sas fantasias, o mais cedo possível, favorece não somente a concepção em si, 
mas também o andamento da gravidez e o parto, observando-se uma percen• 
tagem maior de gestações e partos normais na mulher jovem. 
5 - Prof. Ricardo Gavensky, Dr. A. Schteingart, Lic. H. Schupak e M. Slapak: Con11d.­
racion11s acerc• de los aspectos psicol6gicos de las prim/p,ras ra_rd/11, apresentado 
na Sociedade Argentina dt P1icoprofila1<i1 Ob1t6tric1, em 25-8-71. 
27 
Com base nesses conceitos, desejamos insistir na nec essidade do apoio 
social, tanto por parte do obstetra como do ambiente, no sentido de se supe• 
rarem as profundas ansiedades determinadas pelo início da gravidez. Para tan­
to, os grupos de d1sÊussão que incluem os casais são, em nossa opinião, o mé• 
todo mais adequado, e devem iniciar-se já a partir do segundo mês. Além dis­
so, esses grupos vão criando uma consciência social mais ampla, através das fa. 
mílias implicadas, sobre a situação de gravidez e a necessidade da procriação. 
Vamos ocupar-nos agora do problema que nesse período se apresenta à 
gestante que jã tem filhos. Como já assinalamos, as crianças aceitam muito 
precocemente a gravidez da mãe, pelo estado de retraimento em que se encon• 
tra, às vezes antes que ela mesma o faça. No segundo mês, acentua-se a sono­
lência, como dissemos, e por conseguin te, o ens1mesmamento. Ascrfãnças, 
cômãs quais em geral não se comenta o estado de gravidez, começam a de­
monstrar terrores noturnos: despertam, contam que têm pesadelos, vêm para 
a cama dos pais, resistem a voltar ao seu quarto, etc. Nessas crianças, a per• 
cepção do irmão que virá causa vivências terroríficas de ataque por parte des· 
te e de perda da proteção dos pais. Como se compreende, a situação torna-se 
bastante complicada para a gestante: de um lado, há seus terrores e ansieda• 
des, e de outro, os do filho ou filhos. A higiene mental neste quadro consiste 
na capacitação do casal para explicar o processo de gestação aos filhos, dentro 
das possibi:idades de compreensão destes, em concordância com sua idade. A 
experiência demonstra que tal conduta, realizada com serenidade e carinho, 
cria um clima favorável às relações familiares, já que existe um tema comum 
- essa futura vinda - que une a todos e pode ser comentado, ao contrário do 
feto, que não é visível. 
e) A PE RCEPÇÃO DOS MOVIMENTOS F ETAIS 
(TRÊS MESES E MEIO) 
A percepção dos movimentos teta is torna-se possível a partir do quarto 
mês, ou mesmo antes, aos três meses e meio de gestação. Na evolução fetal, 
essa época corresponde à aparição da motilidade. Mas não é em todos os casos 
que a consc1ênc1a registra essa situação: com bastante freqüência, os movi· 
mantos podem começar a ser sentidos no quinto mês; em percentagem menor, 
se advertem no sexto, e às vezes podem ocorrer quando já avançado o sétimo 
mês. Deve•se atribuir tal embotamento da percepção à negação, cujo expoente 
de maior intensidade são os casos de mulheres que confundem a gestação com 
28 
.1 
amenorréia. Esse fato pode ser observado especialmente nas multíparas, 
havendo certa percentagem de gestações diagnosticadas como tumores. 
Para estudar o problema, é necessário relacioná-lo a outra manifestação 
psíquica que pode apresentar-se nesta época da gravidez: é a sensação da 
"criança que dá pontapés" - queixa que se ouve com grande freqüência -, 
que não deixa a gestante dormir, trabalhar ou caminhar, tão fortes são os 
"pontapés". Nesse caso, o mecanismo inconsciente é a projeção, à base da 
quàl se transfere para o feto uma imagem terrorífica, identificada com ele. A 
criança é sentida, assim, como um ser perigoso, cujos movimentos bruscos, 
agressivos e sádicos ameaçam causar um severo dano físico à mãe. 
O que se projeta em tal imagem são os impulsos hostis em relação à pró· 
pria mãe grávida (fantasiada ou real). Contudo, é preciso recordar que existe 
um mito segundo o qual se espera que a mulher grávida fale dos pontapés do 
filho. Tal_�� �r_cl�i m� itas v�z_es_ supostas lesões - hepáticas, renais, verte· 
brais - produzidas por essa atividade "desmedida" do feto. Sem dúvida, a len· 
da popular tem origem em fantasias inconscientes coletivas de ataque à gravi­
dez materna, ao mesmo tempo que veicula fantasias sociais sobre o dano que 
ocasionam os filhos aos pais. 
Tais distorções da percepção por negação ou projeção, com suas tanta• 
sias correlativas, exprimem um profundo estado de ansiedade comum a todas 
as gestantes. Em primeiro lugar, como o defendem diversos autores, a investi· 
gaçio dessa ansiedade localiza o temor ao filho em si, o qual, com justa razão, 
surge como um desconhecido, urn"��fo-sexo, forma, características, etc., 
são uma in�ógni�. Junto a esse temor, acha-se o medo à responsabilidade as­
sumida, responsabilidade que agora, ante o ventre já desenvolvido, adquire 
caracter( sticas de fato concreto. 
Tal sentimento de responsabilidade se une à noção de dar vida, o que, se 
levarmos em conta o processo genético, significa haver cedido parte da pró­
pria vida. 
Assim, aparece manifestamente no parto, e talvez pela primeira vez, o 
conceito da própria morte, ou seja, da vida com limites precisos. Essa ansie­
dade de estar cedendo a própria vida se condensa com o medo de morrer no 
parto. Outra lenda popular, "o rei morreu, viva o rei", une a idéia do nasci• 
mento da criança à morte do pai. Nessa mesma linha, é clássica a história do 
médico que pergunta ao pai se prefere que salve a mãe ou o filho, e que foi, 
outrora, uma emergência real. 
Além da negação e da projeção, a gestante recorre normalmente aos me· 
canismos man íacos. O devaneio, as fantasias de um filho bonito e bom que a 
cumulará de felicidade, são o refúgio habitual que permite o prosseguimento 
da gravidez, e se baseiam no instinto material, que em psicanálise adjudicamos 
29 
-
às tendências reparatórias da imagem materna e à necessidade de recriá-la me­
.. f diante a identificação. 
Os mecanismos maníacos podem ser exagerados, e neste caso encontra· 
remos a mulher que, ':!pesar de grávida, desenvolve intensa atividade e declara 
que "não se dá conta de seu estado, nem pensa nele", ou sua contraparti da, 
também man íaca, na gestante cheia de caprichos, que necessita manter pen• 
dente deles toda a família. Ambas apresentam transtornos somáticos: hiper­
tensão ou hipotensão, estase venosa pronunciada, varizes dolorosas, insônia, 
bulimia, excessivo aumento de peso, etc. Um caso bastante freqüente nesse 
sentido é a "gordinha feliz", com seus 20 quilos a mais, que quase não pode 
mover-se, mas se mostra muito alegre, embora se acalore e enjoe constante­
mente e sofra constipação, câimbras, etc. Neste caso, os padecimentos físicos 
produzem, através do masoquismo e das fantasias de expiação, o alívio procu­
rado ante as intensas vivências terroríficas. 
Os mecanismos man íacos exagerados e a expiação masoquista consti­
tuem uma defesa frente ã intensificação de um temor natural, que surge de 
uma factibilidade real: a criança disforme. Como se sabe, a má-formação 
fetal, ainda que com baixa incidência em condições normais (descartando-se 
as intoxicações por uso indevido de drogas ou específicos), é uma possibili­
dade. Entretanto, não existecorrelação entre a baixa incidência e a intensi­
dade dessa ansiedade e sua aparição consciente em todos os casos. A Investi­
gação psicológica nos permite compreender que, além da possibilidade real, 
essa fantasia monstruosa e tl'rrorífica tem a ver, por um lado, com o temor 
da incapacidade de criar e educar bem o filho, cuja conseqüência seria uma 
criatura pérfida e malvada, dessas que são o "pesadelo materno" - tal como 
alguma vez se sentiu a própria paciente, quando menina. As idéias populares 
sobre filhos que fazem encanecer prematuramente os pais, ou q\Je se compor­
tam, em relação a estes, como a serpente da fábula, conjugam duas situações 
psicológicas; por um lado, a noção do decurso do tempo e a maior proximida­
de da idade adulta e da velhice, em comparação com a nova vida, e por outro, 
os conflitos de inveje, ciúmes e ódio emergentes da elaboração edipiana (a 
maldade). Finalmente, o monstruoso em si mesmo, traduzido na fantasia po­
pular de que uma gestante não deve olhar para coisas feias, constitui uma ma­
nifestação do h:!.J[JJLAQ inJ;!!ItO, representando-se no monstro a v ivência sinis­
tra desse impulso edipiano, e, portanto, a J�i!i.çã.9 �xu_al. 
Chegamos assim à ansiedade dominante de toda a gravidez, que irrompe 
de modo intenso ante a percepção dos movimentos fetais. � a ansiedade cul­
posa por se experimentar uma união tão íntima e pessoal, tão a dois, tão ex­
clusiva, em que ninguém mais pode interferir. É_ an�iedade e é culpa porque 
reativa no inconsciente as fantasias incestuosas e masturbatórias infantis. 
30 
Por isso, a primeira vez que se sentem os movimentos, a impressão é de 
sobressalto e temor, de algo completamente estranho, inclusive na multípara. 
O reconhecimento desse algo insólito e atemorizador e a posterior discrimina• 
ção dos movimentos da criança são processos mentais que se realizam de for· 
ma lenta e gradual. 
Desse modo, é sumamente importante esclarecê-los no momento corres· 
pondente, para prevenir as negações, projeções ou manias extremas e sua con­
trapartida somática ou ulteriores conseqüências f ísicas ou mentais. Além dis· 
so, devemos levar em conta que no princípio, isto é, aos três meses e meio, os 
movimentos são sentidos de maneira suave: como uma tênue carícia interior, 
ou como borbulhas, ou um movimento de asas, ou um peixinho que desliza. 
Todas essas imagens, transcrição das referências feitas pelas pacientes, têm 
contornos bastante indefinidos e nada humanos. Coincidem com o modo in­
definido da percepção, mas, além disso, se as anal isarmos, refletem conteúdos 
�onhecidos psican& liticamente como vivências edipianas incestuosas e mastur· 
batórias. Correspondem às fantasias fantasmagóricas de interrupção e conta• 
to fugaz, que representam o retorno do que foi reprimido. 
Essas considerações nos permitem compreender que a percepção dos 
primeiros movimentos determina a emergência de fortes ansiedades e depen· 
derá de cada personalidade a maior ou menor capacidade de toleré-las. Por is· 
so também é tão freqüente que se negue essa percepção. O extremo patológi­
co a que pode levar tal ansiedade é o aborto do quarto ou quinto mês. 
Resumiremos agora como se manifesta a enorme ansiedade ante a per­
cepção dos movimentos, que ocorre no promédio dos quatro meses de gravi­
dez (à entrada do quinto mês, em geral) . 
Nesse momento o estado de gravidez é evidente: o ventre se arredon­
dou, os seios estão devidamente entumescidos, as mudanças corporais são v i­
síveis. A ansiedade aparece conscientemente de várias maneiras: como temor 
ao fi lho disforme, como medo de morrer no parto ou como angústia do pró· 
prio corp� disforme e med� de permanecer.assim. Este é outro aspecto impor­
tante, o sentimento de fealdade, base de muitas depressões e fantasias ciumen­
tas a respeito do marido e de seu possível afastamento numa relação extracon­
jugal. 1: também o momento em que diminui a libido sexual, dando ensejo a 
tais fantasias. O sentimento de fealdade encobre o desvio das vivências culpo­
sas derivadas do horror ao incesto (como a idéia do filho disforme). vivências 
que se exprimem mediante o mecanismo de apaziguamento do perseguidor: 
"sou feia, ele não me quer, quer a outra." 
As fantasias inconscientes determinantes da crise de ansiedade do quin· 
to mês relacionam-se, pois, C0!71 o conflito edipiano, os impulsos incestuosos 
e masturbatórios infantis e o temor à morte. Os mecanismos de defesa são a 
31 
negação, a projeção, a idealização e a mania, a que se sornam o masoquismo e 
a h ipocondria. 
A si,nt.9rnatol�gia orgânica vai das náuseas às dores musculares, às câirn· 
bras, às perdas ocasionais (urna pequena mancha que provoca susto), às enxa­
quecas, à constipação ou à diarréia, à hipertensão ou à hipotensão e às lipoti· --:· 
mias transitórias e ocasionais. • 
Tal sintomatologia torna aconselhável que se iniciem aulas de exercício 
muscular (respiração e relaxamento) nessa fase da gravidez. As C.,irnbras, por 
exemplo, se produzem pela compressão exercida pelo útero em expansão so• 
bre os vasos abdominais e pela mudança de postura, a que se acrescenta a con­
tratura muscular, determinada pelo conflito psíquico e as ansiedades terrorí• 
ficas que o acompanham. Representam a luta contra o perseguidor, isto é, 
contra a imagem vingadora das fantasias incestuosas e de roubo. Do mesmo 
modo, as náuseas e as lipotirnias se originam da perda de tono muscular pro· 
duzida pelo conflito. As aulas, além de seu benefício intrínseco, permitem à 
gestante apoiar-se no grupo de colegas e sentir-se mais protegida em suas an­
siedades. 
Na análise de mulheres grávidas, surgem neste período os sonhos do 
próprio parto. � o clássico sonho de que já se realizou o parto, não se sabe co· 
mo, e têm o filho ao lado e é tão lindo . . . Outro sonho bastante típico é que 
já tiveram o filho, ma� tr-ªta·se de um bebê crescido, de uns seis meses, e com 
urna característica assustadora: é um bebê que fala como um garoto de quatro 
ou cinco mos. Tal sonho indica claramente a vivência incestuosa e a ansiedade 
terror (fia concomitante. 
A vis�o . .2e _1:1m_bebê_ que fala é monstruosa, e, além disso, a criança de 
seis meses, segundo o consenso popular, é o boneco tão desejado que já se 
senta, sorri, come, faz graças, etc., ou seja, constitui a imagem idealizada de 
um ser infinitamente bom, cheio de amor para com a mamãe. Por outro lado, 
se tem alguma idade, não apenas veio ao mundo de maneira feliz, mas tam• 
bém sua criação foi fácil e coroada de êxito; já está "do outro lado" e sua so• 
brevivência acha-se assegurada. O fato de falar indica a culminância do confli­
to edipiano e sua coincidência com a aquisição total da linguagem, isto é, en­
cobre fantasias terroríficas dos quatro ou cinco anos de idade, relacionadas 
com severa s imagens do superego, que proíbem a masturbação, instalam a 
repressão e determinam a passagem à latência. 
De outro ponto de vista, esses sonhos do filho já nascido correspondem 
à necessidade de imaginar a criança, cujos movimentos já se percebem, e de 
vê-la. i; freqüente que um pouco mais tarde, no quinto e no sexto mês, a ges• 
tante exprima seu desejo de ver o filho, como através de um vidro, no interior 
32 
do ventre. Também costuma acontecer que a futura mãe mantenha "diálo· 
gos" imaginários com a criança. 
As aulas de exercitação e informação, além dos grupos de discussão, são 
o método adequado para diminuir essas crises de ansiedade e, se não forem 
suficientes, deve-se recorrer com urgência à terapia individual, sempre que se 
perceber perigo de aborto ou derivações da hipo ou hipertensão ou do excesso 
de peso. 
O estado de ansiedade pode ser passageiro ou prolongar-se, às vezes, sob 
a forma de fobias agudas, h ipocondrias ou depressões. Quando é passageiro, 
ao remitir dá lugar a um per lodo de euforia e tendência à atividade, que em 
geral vem acompanhado pelo reconhecimento e aceitação dos movimentos. 
Como já dissemos anteriormente, vamos ocupar-nos agora dos aconte­cimentos que envolvem o marido. A comun icação dos movimentos por parte 
da esposa e a evidêhcia do estado de gravidez criam também no homem um 
clima de ansiedade, que pode assumir diversas expressões conscientes: a sensa­
ção de fealdade da esposa e a conseqüente rejeição; um sentimento exagerado 
de necessidade de proteção com fantasias intensas de temor ao dano que a 
mulher possa sofrer; a tendência a submeter-se a ela, apaziguá-la, satisfazê-la 
em tudo, ou conviver com seu despotismo e tirania. 
As fantasias inconscientes que correspondem a tais sensações relacio­
nam-se com o conflito edipiano, de modo especial com o ressentimento em 
relação à gravidez, real ou fantasiada, da própria mãe, com as sensações de 
exclusão e, basicamente, com a inveja daquilo que a mulher tem e ele não. 
A� �rido �m re�ç�o.Lgravidez da esposa é um sentimento 
�_!!�ra merece�-e_q_�ca_ a1e_nção_ na literatu ra. psicanalítica, embora 
tenha sido amplamente exposto nas obras de arte, por todas as culturas. O 
trabalho psicoterapêutico com casais permite investigar o tema a fundo. A 
inveja pode aparecer de modo consciente, e neste caso adquire as caracterís­
ticas elaborativas de antecipação do filho. O homem é quem pede à sua mu­
lher que lhe explique como são os movimentos, e se empenha em percebê-los 
através do ventre, etc. Sobre essa base vai-se instalando e formando o amor 
paternal, que não é inato e sim adquirido, primeiro por identificação com o 
próprio pai e depois na relação conjugal. 
Quando não consciente, a i_i:,�a se exprimutrav�J!a ho!!ilidade fi].n· 
ca, da indiferença, da rej�[Cão sexual, das aventuras extraconjugais, ou, ainda, 
de diversos sintomas psicossomáticos: gripe, asma, úlcera, reumatismo, etc. A 
patologia psicossomática, que alguns 'autores descrevem como couvade, 6 
exprime também o conflito edipiano de exclusão. 
6 - N da T .. Em francês no original 
i ' 
33 
\ 
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J 
Evidentemente, a gravidez da companheira reativa no homem a proble­
mática inconsciente relacionada com a figura feminina, e nos casos em que o 
conflito não foi �dequadamente resolvido, pode reatualizar velhas situações 
infantis e da adolescência, como a dissociação mãe-seio e mãe-genital, pela 
qual a companheira é idealizada como pura e e papel sexual é procurado em 
outra mulher, Tambéfll_ Se rev�vem aJ fantasias terroríficas da mulher castra­
dora, ou mãe "Moloch" (que engole os filhos). 
E ssas imagens ou as resultantes da rivalidade com o pai são projetadas 
muitas vezes no filho, det�l'!lina!!,dO 2 t1:_mor, tão comum, às relações sexuais, 
sob a idéia consciente de preoc4paç_ão pelo dano ao filho, Tal idéia encobre a 
ansiedade de castração, Portanto, nesse momento da gravidez, o marido mere­
ce e requer tanta atenção por parte do profissional quanto a própria mulher, 
máxime se levarmos em conta que nessa fase toma forma o que logo será sua 
atitude paternal. Mas, além disso, o conflito conjugal resultante da má elabo­
ração dessas situações pode levar à separação do casal em tempo mais ou me­
nos breve , 
Quanto aos filhos, ao observar o ventre crescido da mãe, já não têm 
mais dúvidas sobre o que está acontecendo, por menores que sejam, e o de­
monstram em comportamentos conscientes, como seja o ataque físico direto, 
os pontapés ou socos no ventre materno. Está claro que tudo isso depende de 
que os pais tenham assumido ou não uma atitude sincera. Outra conduta 
característica é atirar objetos pela janela. Tais ações exprimem ciúmes e dese­
jo de morte do rival oculto e sinistro. Nessa época, são bastante freqüentes os 
transtornos psicossomáticos, assim como as temidas doenças infecciosas da 
infância. A análise de crianças e as entrevistas com os pais demonstram fide­
dignamente até que ponto os pequenos são conscientes da gravidez materna, 
tal como postula Freud (ver Teorias Sexuales lnfantiles, 1908, O. C. 13 e Aná­
lisis de la Fobia de un Nino de Cinco Anos, 1909, 0.C. 1 5). 
Portanto, nos casos de ocultamento ou mentira, costuma-se observar a 
intensificação dos transtornos com a emergência de certa patologia psíquica : 
terrores noturnos, fobias agudas, convulsões, etc. 
Em contraste, se a princípio o ambiente social imediato ao casal mani­
festou hostilidade, nesse momento apresenta uma modificação, mostrando-se 
solícito e terno. Em outras ocasiões, tal solicitude não aparece, sobretudo nos 
meios menos próximos e, neste caso, surgem com bastante freqüência situa­
ções de extrema crueldade (despedida de trabalho, pleitos, embargos, etc.). 
34 
d ) ANS I EDADES DEV IDAS A I NSTALAÇÃO F RANCA 
DOS MOV IMENTOS (CI NCO MESES EM DIANTE) 
A instalação franca dos movimentos, a partir do sexto mês ( cinco meses 
completos), vem acompanhada de uma percepção maior das contrações uteri­
nas fisiológicas da gravidez. As mulheres comentam que seu ventre endurece 
por momentos e em seguida se afrouxa. Ambas as situações produzem sempre 
um novo acesso de ansiedade, em que se renovam as fantasias acima descritas. 
Por outro lado, entre os mecanismos de defesa, acentua-se o retraimento nar­
cisista, se bem que possa permanecer o estado de euforia. Sem dúvida, depen­
de da elaboração dessa crise a intensificação ou não das diversas reações pato­
lógicas que descre1.1emos nas páginas anteriores. 
Um quadro anômalo freqüente é a exageração do tono muscular uterino 
que, por sua vez, provoca mais movimentos fetais, num �yjçiQtQ.�movi­
me.nto�- conti:_�tu!a. -movimentos mais bruscos. O trabalho clínico tem-nos 
demonstrado que as crianças nascidas desse tipo de gravidez apresentam carac­
terísticas hipercinéticas. 
A respiração e o relaxamento são técnicas valiosas para aliviar essas si­
tuações, que, na hipótese de se intensificarem demasiadamente, podem colo­
car em perigo a vida do feto. 
e) ANS IEDADES PRODUZ IDAS P E LA VERSÃO I NTERNA 
Da metade do sétimo mês em diante pode produzir-se a versão interna, 
que leva a criança a colocar-se de cabeça para baixo, à entrada do canal do 
parto. A percepção desses movimentos uterinos e fetais provoca uma inten­
sa crise de ansiedade, totalmente inconsciente, que se traduz em diversas ma• 
nifestações psíquicas e somáticas. 
O trabalho direto com gestantes e a observação clínica demonstraram 
que a grande maioria das versões patológicas (apresentação de nádegas, lateral, 
de ombro, etc.) se devem à contratura dos músculos pélvicos que se opõem 
dessa maneira à versão. Tal contratura é produto da intensa crise de ansieda­
de, que corresponde a fantasias de esvaziamento. A comunicação fluente en­
tra o obstetra e sua equipe permite determinar, no oitavo mês, se já se com­
pletou ou não a versão, e enfatizar as Instruções sobre relaxamento necessária& 
para favorecer o processo. Sem dúvida, a psicoterapia concomitante contribui 
para a resolução do caso. 
35 
Nessa crise de ansiedade, a sensação consciente mais clara é de que algo 
estranho, que assusta e desconcerta, está acontecendo: as gestantes costumam 
descrevê-la como �ma sensação semelhante à que se experimenta num eleva­
dor em marcha rápida, ou como uma revolução dentro do abdômen, ou uma 
dor intensa no baixo ventre, ou uma impressão de que alguma coisa lhes está 
empurrando o f (gado, etc. 
Às vezes tais sensações conscientes não existem, e nesse caso houve ne• 
gação da percepção, este mecanismo tão útil à gestante; ou ainda, diante da 
percepção, a crise de ansiedade determii:1a certos processos somáticos: crises 
de hipertensão, lipotimia, gripes agudas, hiperemeses, diarréias, constipação 
pertinaz, aparição franca de edemas, brusco e excessivo aumento de peso, in­
tensificação extremamente dolorosa das cãimbras, etc. A emergência mais gra­
ve é o parto prematuro, entendendo-se como tal o que se produz entre os seis 
e os oito meses completos. 
O parto prematuro: Em todos os casos de parto prematuro que tivemos 
a oportunidade de observar havia uma estreita relação entre a percepção da 
versão e a crise de ansiedade. 
A análise da situação revelou sempre o incremento dacrise de ansiedade 
a n/veis insustentáveis. Em um desses casos, mesmo tratando-se da terceira 
gravidez de uma mulher com excelente disposição f ísica, o aguçamento de 
problemas econômicos que reativavam nela velhos temores e rancores infantis 
desencadeou o parto aos seis meses e meio, imediatamente depois de ela haver 
percebido e descrito o processo de versão interna. 
Tratava-se de uma gravidez concebida "por acidente", como se costuma 
dizer, que representava uma necessidade inconsciente de ampliar e consolidar 
a família, em vista de ocorrências infelizes em ambas as famílias de origem, e 
também uma defesa frente às necessidades derivadas de precária condição eco­
nômica, que se tornava angustiante pelas maiores demandas correspondentes 
ao crescimento e educação dos filhos. 
Efetuava-se o tratamento conjunto do casal, cujo objetivo consistia em 
ajudar os dois a encontrar as bases inconscientes de sua união e das dificulda• 
des no casamento. Correspondia ao segundo ano de terapia, com uma sessão 
quinzenal. Na sessão anterior ao parto prematuro, comunicaram que nesse dia 
haviam ido pela primeira vez ao médico, o mesmo profissional que atendera 
os dois partos anteriores, usando o método psicoprofilático com ótimos resul· 
tados. Chamou-nos a atenção que só o fizessem nesse momento, aos seis 
meses e meio de gravidez, uma vez que esta fora percebida três semanas ape­
nas depois da concepção. A mulher comunicou ter sentido movimentos estra• 
nhos na noite precedente, e o médico lhe informara que a criança "já havia 
36 
r virado". Acrescentaram que não tinham recorrido antes à ajuda profissional 
por causa de suas "confusões" econômicas, e a mulher se queixou da falta de 
proporções de tudo quanto o marido fazia; por exemplo, o marco de uma 
porta que ela não entendia como lhe sa íra tão descentrado. Esclarecemos-lhes 
a relação entre o descentramento, os movimentos bruscos da versão e o temor 
à loucura, já que tanto na família dele como na dela havia pessoas gravemente 
doentes (de esquizofrenia crônica). Também comentaram que se tinham agra­
vado as preocupações econômicas, pela escassez de trabalho, mas sentiam que 
existia neles um estado de inércia diante das dificuldades. No transcurso dessa 
semana comunicaram que no dia seguinte se produzira o parto. 
Posteriormente foi-nos possível elaborar tudo isso e verificamos como 
a criança prematura, que requereu grandes cuidados e cuja hospitalização lhes 
ocasionou momentos de extrema inquietação, havia promovido neles, espe· 
cialmente na mulher, a capacidade de luta, a tal ponto que quase não se reco­
nheciam ao se verem tão ativos e resolutos, além de que agora se sentiam mui­
to unidos. Assim, as crises de ansiedade expressavam o conflito de ambos 
di
0
ante da temida loucura, da qual se defendiam com a inércia; por um lado, 
buscando meios para que tudo permanecesse na mesma, e, por outro, realizan­
do tremendos esforços para modificar as coisas e criar para si um lar saudável 
e normal. Na mulher, a percepção da versão uterina havia reativado o medo 
ao incontrolável, determinando uma ansiedade tal que a levou a desencadear 
o parto como transação: pôde assim dar forma ao seu terror, estruturando o 
mecanismo defensivo que é a evacuação (projeção), pelo qual conseguiu assu­
mir conscientemente as características ativas de sua personalidade. Agora 
sabia-se capaz de enfrentar por si mesma as dificuldades e nessa atuação con· 
tava com um aliado valioso, o marido, em contraste com a experiência infan­
til de um pai demente que sempre lhe travara e cerceara as potencialidades. 
O comentário deste CélSO tem por objetivo ilustrar o modo como se pro­
duz a dinâmica psíquica que desencadeia os partos prematuros e o interjogo 
das ansiedades da mulher com as de seu esposo, relacionadas, por sua vez, 
com as famílias de origem e com o meio sócio-econômico. 
Em outros casos, as situações não aparecem tão claramente vinculadas 
à problemática econômica e o acento recai antes no terror ao filho, Identifi­
cado com o sinistro e a loucura. Compreende-se que uma mulher gue tolerou 
até esse momento as ansiedades dos primeiros meses de gestação, que conse­
guiu adaptar-se à percepção dos movimentos fetais e superar a culpa através 
das vivências Incestuosas e narcisistas de união exclusiva, além de aceitar e 
elaborar os ataques de ciúmes e inveja do melo, experimente terror ao perce• 
ber subitamente a aparição de movimentos estranhos. 
37 
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1 
Em geral esses movimentos desµertam a sensação de µt1rda e a tan1Hs1a 
do parto prematuro a nível consciente. E: bastante frequente que as gestantes 
comentem esse temor a partir do sexto mês. Por outro lado, a lenda popular, 
neste caso desprQporc1onada em relação ao número real de partos prematuros, 
insiste no problema, sendo sua expressão mais corrente que, a partir dessa 
época, a mulher "deve estar pronta para a realização do parto a qualquer mo• 
mento e ter já concluído o enxoval", etc. 
Assim, a higiene mental do parto prematuro deve abranger não apenas a 
mulher e seus conflitos inconscientes, que certamente pesam muito, mas tam­
bém investigar a relação conjugal, familiar e sócio-econômica, procurando 
proporcionar o apoio e a ajuda necessários. Do mesmo modo, uma vez produ· 
zido o nascimento precoce, a família deve ser adequadamente amparada, pois 
o fato em si mostra que se acha em crise e que se trata dP. uma crise entre uma 
tendência produtiva e outra que leva à inércia como única defesa. A proteção 
deve incluir a poss1b1lidade de ambos os pais permanec.erem realmente ligados 
ao fi lho, de modo direto e não somente através de um vidro, para que esse 
filho possa de verdade ser o fruto concreto e a tradução da tendência ativa 
vitoriosa. O conceito médico é em geral terminante no que se refere ao isola­
mento do µrematuro, com base na segurança da antissepsia. Desejaríamos 
questionar essa premissa, cuja correção científica é parcial, considerando que 
o filho não pode nem deve ser afastado dos pais, nem por ele mesmo nem por 
eles; em última instância, estes, por mais ignorantes que sejam, sempre terão 
a capacidade de assimilar os métodos de assepsia e converter-se em eficazes 
colaboradores dos especialistas. Uma ação contrária pode desencadear situa­
ções realmente prejudiciais, podendo-se chegar à dissolução do casamento e 
da família. 
Vamos retomar o tema da percepção da versão e das ansiedades que 
produz para em seguida analisar a sintomatologia emergente. Começaremos 
pela análise de um sonho típico correspondente a um tratamento psicanalíti­
co. A paciente, no sétimo mês de sua primeira gestação, declara ter sonhado 
que já tinha o filho; não se sabia bem como, mas estava bastante crescido, 
parecia ter cerca de um ano de idade, e o marido brincava com ele, jogando-o 
para o alto e recebendo-o nos braços. Ela sentia medo e ciúmes. Medo de que 
o menino caísse, e ciúmes, porque o marido e a criança formavam um par 
numa atividade prazenteira. Mas em seguida se dava conta de que tudo aquilo 
era lindo e a sensação do sonho passava a ser agradável. 
Este sonho exprimia o conflito conjugal, centrado na rivalidade exis­
tente entre o casal e aguçada pela gravidez. Mas, além disso, indicava a percep­
ção da versão, que havia sido negada conscientemente e que dias depois foi 
confirmada pelo obstetra. A negação se devia ao profundo ciúme que a pa-
38 
ciente experimentara na infélncia em relação aos seus dois irmãos homens (era 
a única mulher e a filha intermediária). pela maior liberdade de que eles go­
zavam no ambiente provinciano em que haviam sido criados, e pela relação 
mais estreita que mantinham com o pai e os outros homens da família. Asso­
ciada ao sonho, surgiu a lembrança de um tio jovem, solteiro, que morara 
algum tempo em sua casa, e a cujo quarto ela costumava ir à noite, porque 
ele, sim, a mimava, enquanto o pai se mostrava distante. A percepção da ver­
são havia reativado suas primitivas vivências edipianas, a defesa erigidanaque­
la época contra a exclusão, ou seja, a relação narcisista e incestuosa com o tio. 
Sentir os movimentos era como assustar-se de noite e correr para junto do tio. 
Por isso não deveria senti-los: despertavam-lhe culpa a ponto de levá-la a so­
nhar que a relação de exclusividade com o filho pertencia ao marido e não a 
ela. 
O sonho procurava antecipar e elaborar, ainda, a próxima separação, no 
parto, esse momento em que ela ia ter de ceder a criança, que não era apenas 
sua, aos demais. Configurava igualmente seus temores de não poder tolerar a 
situação. Dois meses depois ocorreu o parto, após uma árdua elaboração des­
sas situações bastante conflitivas. Foi um parto espontâneo, levado a termo, 
normal, mas a paciente passou por um período de descontrole a meio tempo 
da dilatação, que foi perfeitamente conduzido e superado com a ajuda do obs­
tetra. 
Consideramos que se trata de um sonho típico da percepção da versão 
uterina, porque sua configuração é muito semelhante à dos sonhos apresenta• 
dos por outras pacientes. 
Para melhor explicar as características desses sonhos, diremos que sem• 
pre se relacionam com o parto, como vimos que sucede ante a primeira percep· 
ção dos movimentos. Mas agora o temor é de que a criança caia, seja porque 
alguém a carrega mal, seja porque se encontra em uma situação precária, etc. 
A queda em si representa o temor ao aniquilamento ou desintegração, pela 
irrupção maciça da ansiedade. Frente à separação e ao temor concomitante, a 
ansiedade equivale a assustar-se de tal modo que a reaçifo é a expulsão brusca 
e antecipada. 
O con,iecimento dessas ansiedades e de sua tradução onírica permite ao 
profissional prestar a colaboração necessária e ajudar a elaborar os terrores, 
contribuindo desse modo à continuidade da gravidez e a um bom parto. 
Passaremos agora a analisar os diferentes sintomas psicossomáticos que 
freqüentemente surgem nesse período. 
Hiperten:.ão: De acordo com nossa experiência, pensamos que deve ser 
considerada como uma reação defensiva frente à diminuição fisiológica da 
pressão sangüínea, própria do estado. Pudemos comprovar que tal reação cor• 
39 
responde a uma fantasia inconsciente de morte, em que a criança, identificada 
com arcaicas figuras terroríficas persecutórias, no sentido kleiniano do termo, 
aparece como o exterminador (ver cessão da própria vida e ansiedade de mor­
rer, p. 29). A hipertensão configura, assim, a tendência maternal .em pugna 
contra essa fantasia, ou seja, é um sintoma transacional, se bem que, em esta­
dos mais paranóides, possa chegar a apresentar características graves. 
Upotimias: Sua base orgânica reside na hipotensão; do ponto de vista 
psíquico, originam-se em fantasias de esvaziamento e aniquilamento. i; como 
se a versão interna significasse que alguém se introduziu dentro da mulher pa­
ra despojá-la do filho, de todo o seu interior e da própria vida. Corre sponde 
à confusão entre versão interna e parto. Sua aparição costuma ser mais fre­
qüente nas personalidades esquizóides com vínculos simbióticos inconscientes 
muito intensos. 
Hipermemese: Seu conteúdo psíquico é similar ao da hipertensão, e o 
mecanismo psíquico é a expulsão do perseguidor. 
Oiarr�ias: Possuem o mesmo significado inconsciente da hiperemese e o 
mecanismo escolhe neste caso a vida intestinal. Ambas tendem a desaparecer 
no momento em que o corpo da mulher se tenha adaptado à mutação (postu­
ral e nos órgãos internos). 
Constipação pertinaz: i; a defesa contra a sensação de esvaziamento: o 
método utilizado, a contratura, atua neste caso sobre a porção terminal do 
intestino; sua finalidade inconsciente é a fantasia de retenção do feto. 
Edemas e aumento excessivo de peso: Em geral, aparecem associados e 
podem combinar-se com a constipação. Trata-se de outra defesa, neste caso 
incorporativa e retentiva, contra a ansiedade de esvaziamento. Comprovamos 
que aparece preferentemente em personalidades com forte estrutura narcisis­
ta, de tipo infantil imaturo e intensa fixação e dependência em relação à pró­
pria mãe. Amiúde são pessoas que passaram por dramas reais na infância e em 
muitos casos perderam precocemente a mãe. 
Ciimbras: Costumam insta lar-se nesta fase de forma muito dolorosa. Aos 
mecanismos fisiológicos conhecidos - hipóxia e estase venosa - devemos 
acrescentar as mudanças de postura obrigadas pela modificação na posição do 
ventre que, de arredondado e curvo, passa a ponteagudo. No aspecto psíqui­
co, traduzem fantasias inconscientes terror (ficas de sofrer agressão física. Re­
presentam tanto o temor ao filho em si como ao parto doloroso ou traumáti· 
co (com fórceps ou por cesariana). Sua aparição é comum nos ambientes em 
que se tende a negar os temores e onde praticamente se proíbe falar deles. A 
experiência indica que nos cursos psicoprofihlticos sua incidência é muito me­
nor que entre as mulheres não preparadas. Nas anál ises, as pacientes habitual-
40 
mente comentam haver despertado com cãimbras, no momento em que ti• 
nham um pesadelo. 
Em última instância, todos esses sintomas, dos quais constituem os me­
lhores expoentes as câimbras e a lipotimia, por serem os mais dramãticos e sú· 
bitos, traduzem basicamente, além do conflito, um pedido de ajuda e prote­
ção, pela incapacidade de tolerar e elaborar a crise de ansiedade. Assim, de­
pende também do ambiente e do grau de receptividade ou ansiedade deste a 
melhora ou o agravamento de tais sintomas. 
As ansiedades e fantasias que descrevemos como determinantes da crise 
de ansiedade pela percepção da versão interna são reativadas pela situação in­
tr lnseca que é a futura maternidade. 
O temor da incapacidade de criar bem o filho, de que já falamos, se vê 
bastante incrementado quando existe a noção do desconhecimento desse 
tema. 
1 
Em nossa época, em geral, as mulheres têm escassa ou nenhuma oportu· 
nidade de aprender a tarefa maternal de forma direta, através do ambiente. Já 
não ocorre como em outros tempos, quando as fam/lias numerosas ofereciam 
continuamente essa experiência através dos irmãozinhos menores, priminhos, 
sobrinhos, etc., que se criavam junto à menina ou à adolescente, ou a quem 
ela mesma criava. As bonecas atuais, por perfeitas que sejam, embora sirvam 
de estímulo ao instinto maternal, não permitem essa experimentação real nem 
muito menos o aprendizado das virtudes adquiridas por outras mulheres com 
a maternidade. Encontramo-nos, pois, ante uma séria situação deficitária, que 
deve ser urgentemente resolvida. t a razão pela qual os cursos psicoprofilâti­
cos incluem geralmente o ensino prático da puericultura. Entretanto, pensa­
mos que tal ensino deveria ser mais amplo e extenso, promovendo a real habi­
litação da gestante e reduzindo sua ansiedade que, sob esse aspecto, tem um 
fundamento absolutamente real. 
f) ANS IE DADES DO I N l
°
CIO DO 99 Ml:S 
À chegada do nono mês surgem várias modificações fisiológicas: o feto 
tende a desenvolver-se mais rapidamente, ganhando peso e volume; as contra­
ções fisiológicas acentuam-se; novamente o corpo deve mudar seus mecanis­
mos de postura para manter a estabilidade. A tudo isso acrescenta-se a proibi­
ção das atividades sexuais, que lamentavelmente ainda subsiste. 
4 1 
Tais modificações intensificam as ansiedades que, ademais, se vão exa­
cerbando pela noção da proximidade do parto. A incerteza quanto à data re­
sume e sintetiza todes as outras incertezas e se transforma em um dos obriga­
tórios "leitmotivs". Através de "quando será o parto" se expressam as incóg­
nitas de como será o parto, como será o bebê, qual será seu sexo, como se fará 
sua criação, etc. O temor à morte no parto adquire características intensas, 
em geral inconscientes. Ao buscar esclarecê-lo, devemos também levar em 
conta que se trata de um temor ancestral, apoiado numa realidade que se mo­
dificou há apenas trinta anos, com o advento dos antibióticos. Isto é, as partu­
rientes de agora constituem apenas a terceira geração que se vê livre do perigo 
cuja permanênciase reduz aos casos de falta dos devidos cuidados ou a ra­
zões puramente psíquicas (choque). 
Nessa ansiedade derivada da incerteza, desempenha um papel preponde­
rante o narcisismo infantil, que é a defesa habitual contra tais estados. O nar­
cisismo infantil dispõe do pensamento mágico e da onipotência das idéias. 
Mas nenhum dos dois consegue desempenhar totalmente seu papel, já que, 
apesar de tudo, a gravidez continua transcorrendo. 1 sso gera mais ansiedade, 
porquanto se assiste ao fracasso da defesa. Às vezes, a defesa vem a ser vitorio­
sa em certo sentido, e responsável pelo parto antecipado (aos oito meses com­
pletos). como maneira de eliminar o estado de espera e incerteza e resolvê-lo. 
o mecanismo para o qual apela é a evacuação, transferida para o processo 
do parto. 
O ambiente que cerca a gestante participa costumeiramente, de modo 
bastante generalizado, dessa ansiedade, numa identificação absoluta com ela. 
A preocupação e as "predições" vêm acrescentar angústia à já existente. 
Uma vez mais devemos ocupar-nos especialmente do marido, arrastado 
por sua própria ansiedade, pelos sentimentos de responsabilidade, pelo terror 
de que a esposa faleça no parto (expressão da fantasia invejosa inconsciente), 
pela ansiedade desta e do ambiente. Quando a ansiedade se torna intolerável, 
reaparecem os transtornos psicossomáticos ou, em seu lugar, a evasão na bus­
ca de relações extraconjugais ou na dedicação excessiva ao trabalho. 
Retomaremos agora o tema das relações sexuais. A observação cl ínica 
tem demonstrado que não apenas não ocasionam dano algum nesse momento 
da gravidez, mas também que, ao contrário, são altamente benéficas por mui­
tos motivos. Numerosos médicos especialistas e outros profissionais que parti­
cipam da preparação psicoprofilática têm comprovado essa experiência. São 
os seguintes os motivos pelos quais consideramos benéficas as relações duran­
te o nono mês (e ao longo de toda a gestação, já que não deveriam ser inter­
rompidas em nenhum momento, salvo em extremos perigosos, como ameaça 
de aborto ou placenta prévia): em primeiro lugar, mantêm a harmonia conju-
42 
gal, com a diminuição dos ciúmes de ambos - do marido em relação ao filho, 
da esposa em relação às possíveis relações i rregulares dele; conservam a capaci• 
dade sexual e orgástica da mulher, permitindo-lhe a momentânea tranqüiliza­
ção de suas ansiedades; finalmente, contribuem para a elasticidade e flexibili­
dade dos músculos do períneo, tão exigidos nesse momento e destinados a 
distender-se ao máximo no parto. 
A crise de ansiedade pode expressar-se: 1 . pelo parto antecipado (embo· 
ra quase já a termo); 2. por várias somatizações: gripes, anginas, cólicas, cãim· 
bras, lumbago, edemas, palpitações, insônia, hiperatlvidade, maior nervosismo 
(reação paranóide). As fantasias centram-se no temor à morte, à dor, ao esva• 
ziamento, à castração, etc. 
Superada esta crise que, em geral, não dura mais de uma semana, reapa• 
rece a sonolência ra maioria dos casos, proporcionando a possibilidade de re­
traimento e negação para tolerar as intensas ansiedades do momento. 
Antes de desenvolver o próximo item, devemos estudar outro problema 
que nessa fase adquire grande importância, tanto consciente como inconscien­
temente: é a incógnita referente ao sexo. 
A percepção do sexo da criança 
O serviço clínico tem-nos permitido observar que na mulher grávida 
existe um conhecimento bastante seguro, a nível inconsciente, que se traduz 
em muitos casos por sensações conscientes, indefinidas, referentes ao sexo 
provável da criança. Trata-se de uma descoberta que nos levou a aprofundar 
a investigação do tema. Realizamos o trabalho de pesquisa à base do Teste da 
Projeção Corporal, 7 que exporemos na segunda parte, e que foi verificado 
através de tratamento e supervisão psicanalítica de pacientes grávidas. 
Chegamos assim a compreender que a noção inconsciente do esquema 
corporal se amplia durante a gestação, incluindo o filho, e, juntamente com 
este, seu sexo. Nos últimos anos, alguns investigadores conseguiram isolar os 
hormônios fetais no sangue materno. Talvez seja essa di ferença hormonal o 
substrato orgânico que facilita a percepção. 
7 - Soifer, R. e Mendelbaum, E. : "EI test de Proyecci(>n Corpórea en Psicoprofilaxls", 
Rev. de Obstecrlcia y Ginecologia Lstinoamericana, Bueno, Aires, 1 e 2, pp. 78-84, 
1963. 
43 
l 
( . 
Do ponto de vista da investigação psicológica pura, os fatos são bastante 
concluden1es. Ao longo da gravidez, surge constantemente, no plano da cons• 
ciência, a fantasia Jo filho homem ou menina, às vezes com marcado predo­
mínio de uma das duas possibilidades, que em muitos casos chega a definir-se 
nestas palavras: "Não sei como, mas tenho a sensação de que é uma menina" 
(ou menino).ª No inconsciente isso se manifesta por fantasias e ansiedades 
espec fficas. 
Para o filho homem, pudemos comprovar que predominam as fantasias 
terror íficas e que há um incremento das fantasias persecutórias no decorrer de 
toda a gestação, se bem que as ansiedades depressivas também existam , As 
fantasias terroríficas. bastante intensas, centralizam-se em uma imagem muito 
hostil e agressiva, que ameaça de morte, geralmente a dentadas. Esta imagem 
pode estar projetada no filho, como no caso do sonho do marido que brinca 
com o bebê (ver p. 38) e que correspondeu, efetivamente, a um filho homem. 
Ou pode ser vista como a de uma mãe ameaçadora, que vem atacar a paciente 
por esta lhe haver roubado o filho-marido. 
Uma paciente sonhou que se encerrava no banheiro de uma pensão e 
que defecava no lavatório. Este sonho expressava uma ansiedade de castração, 
onde a imagem hostil aparecia como a mãe severa a ensinar o controle esfinc· 
teriano; a paciente deu à luz um filho homem. As fezes simbolizam o sexo 
masculino. Da fantasia fezes-pênis-bebês nos ocuparemos mais adiante 
(ver p. 56). 
Outras vezes a sensação de hostilidade é muito difusa e se projeta sobre 
o mundo, produzindo agorafobia. A versão consciente dessas fantasias inéons• 
cientes pode plasmar-se em sensações de hostilidade para com o marido, o pai 
ou a mãe e, mais freqüentemente, a sogra. Em tais casos, costumam ocorrer 
desavenças reais com esses familiares. 
Para a filha menina, as fantasias predominantes são, na maioria dos ca­
sos, de caráter depressivo, conquanto subsistam, comparativamente mais ate• 
nuadas, as fantasias persecutórias. As imagens correspondentes às fantasias de· 
pressivas têm como eixo a ansiedade de esvaziamento e de perda: a sensação de 
ficar vazia e perder o contato da proteção da própria mãe. Tal ansiedade ex• 
prime a vivência culposa de haver esvaziado e destru fdo a mãe, na fantasia ln• 
8 - Júlio A, Granel e colaboradore1, em seu trabalho de inveatlgação, E/ rebú d6/ sexo 
dei hljo durante /11 gt1st11clón, apresentado no 1lmp61lo do C.I.M.P., em 1969, de1en• 
volvem a hipótese de que, em n rvel manifesto e consciente, e gestante demonstre ter 
um conhecimento manos preciso 1obre o sexo de criança do que o tem em nível ln­
consciente e corporal. Defendem também a Idéia de que esse conhecimento consti• 
tui um tabu. 
44 
r 
fantil inconsciente. Um sonho que consideramos típico, correspondente a 
um nono mês de gestação, é o seguinte: a mãe está cozinhando e retira dois 
frangos do forno. A paciente observa-os e alguma coisa lhe chama a atenção 
nessa imagem, "com os pés assim dobrados". As associações referentes ao so· 
nho levaram-na a pensar, por um lado, na posição do puxo, semelhante à do 
frango, e por outro, no fato de que sua mãe sabia cozinhar, enquanto ela pró· 
pria julgava que ainda não havia aprendido a fazê-lo suficientemente bem. O 
sonho representava o momento do parto, que ocorreu quinze dias depois; ou 
seja, indicava, com a abertura do forno, o começo do processo de apagamento 
do colo. O processo levava-a a confundir-se: não podia saber se o "forno" a 
ser aberto era o dela ou o da mãe. A aparição da mãe e dela mesma como es· 
pectadoraconfigurava o conflito de inveja em relação ao ventre materno. A 
fantasia de esvaziamento expressava-se também no fato de sua mãe estar cozi• 
nhando, na nece�sidade da presença materna e na perda da capacidade de co· 
zinhar. O temor à perda da mãe produzia a defesa alucinatória de uma mamãe 
que a alimentava. A comida sólida indicava que subsistia a hostilidade caniba­
lística em relação ao seio materno, simbolizado no número 2 (dois frangos). 
Finalmente, a imagem do frango ao forno é a de uma ave cortada, vazia, deca• 
pitada; era a representação de fantasias de castração masculina e feminina. O 
parto foi abso lutamente normal, mas ocorreu uma retenção de placenta que 
levou à intervenção médica. A criança era uma menina. A paciente tinha leite, 
mas uma crise de ansiedade que lhe sobreveio dez dias depois determinou uma 
hipogalactia progressiva. Neste caso, a imagem onírica forneceu indícios segu­
ros, como se pode ver, do modo como os fatos iam desenvolver-se. Quanto à 
percepção do sexo feminino, os elementos típicos do sonho são: a substitui­
ção da paciente pela mãe, a abertura de alguma coisa, a sensação de esvazia­
mento e a necessidade da proteção materna. 
Entretanto, em alguns casos a situação difere. Em vez de predominar a 
ansiedade depressiva, há francas manifestações de ansiedade paranóide, mas 
de tendência homossexual, com imagens de ataques sigilosos por trás. Corres• 
ponde ao t'.!mor derivado dos aspectos narcisistas da personalidade, pelos 
quais a mulher vê na filha o reflexo de si mesma e, portanto, sente-a como um 
perigo, uma sombra que a ameaça com a morte e vem roubar-lhe o marido. 
Por exemplo, uma paciente sonhou que a lguém a atirava numa piscina e ela 
conseguia sair nadando. 
Importa compreender essa percepção a fim de esclarecer as necessidades 
que a perspectiva do filho de um ou outro sexo desperta em cada mulher, e 
proporcionar-lhe ajuda na elaboração de sua relação com ele. No caso do 
"frango ao forno", por exemplo, se não houvesse a mediação da elabordção 
45 
• l 
1 i 
1 
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psicanalítica, o parto não se resolveria tão facilmente e a dificuldade com a 
lactação produziria situações ainda mais penosas. 
Consideramoi, pois, que outro dos vetores fundamentais no preparo psi· 
coprofiláttco é ajudar a desentranhar e elaborar as fantasias da mãe referentes 
ao sexo do bebê e possibilitar-lhe melhor tomada de contato com sua própria 
maternidade, em ambos os casos, já que a atitude, em qualquer das duas even­
tualidades, é por necessidade diferente. A propósito, convém recordar que, 
para a mulher, a filha reativa as sensações da própria infância e desperta a 
vivência de um ser idêntico a ela, enquanto que o filho representa os aspectos 
masculinos que não pôde desenvolver psicologicamente. 
Em alguns casos de sintomas severos na gravidez, chegamos a observar 
que, dentro do conjunto de fantasias e ansiedades intensas, existiam fanta�ias 
persecutórias relativas ao sexo da criança, sentido como um� ameaça para a 
integridade da mãe. 
Assim, concedemos muito mais importância à elaboração das ansiedades 
que envolvem o sexo da criança, tal como é percebido, q1.,e ao valor de predi­
ção, no sentido popular do termo, dessa pesquisa. D11 qualquer maneira, uma 
vez que a transmissão de dados depende da capacidade da mãe de entrar em 
contato consigo mesma e da efetividade da re lação terapêutica (inclusive no 
caso de se fazer apenas o teste), e como a interpretação desses dados se limita 
à capacidade de entendê-los e codificá-los, consideramos que a margem de er­
ro, que em nossa tarefa chegou a 1 0%, é demasiado grande para que se possa 
outorgar caráter científico rigoroso à predição. 
Além disso, a elaboração do problema do sexo da criança, como se sabe, 
torna-se imperiosamente necessária quando existe uma exigência definida em 
tal sentido, como no caso em que a paciente já teve vários filhos homens e 
aguarda uma menina, ou vice-versa. 
A referida exigência reativc1 o aspecto infantil narcisista, isto é, a onipo­
tência e o pensamento mágico, e a decepção em caso de fracasso pode ser exa­
geradamente acentuada, levando às vezes à instalação de prolongados e seve­
ros estados depressivos no pós-parto, com sérias conse_qüências. Dar a necessi­
dade da investigação desses temas e de uma adequada higiene mental. 
g) ANS IEDADES DOS DIAS ANTE R I O R E S AO PARTO 
Em meio à incerteza, que constitui a ansiedade consciente dominante, 
reaparecem crises intensas, de duração variável, nas quais se expressa, em geral 
46 
conscientemente, o temor à morte no parto, à dor, ao parto traumático, por 
fórceps ou cesariana, ao filho disforme e à morte do filho. 
E m geral, essas crises vão marcando o progresso do processo de apaga­
mento ou preparação do colo e o avanço progressivo na instalação do reflexo 
de parto e na descida da cabeça da criança, em busca do primeiro plano. 
Com bastante freqüência, em meio à crise, a paciente experimenta a 
sensação de haver deixado de perceber os movimentos fetais durante um dia 
inteiro. Nesses casos a vivência é extremamente angustiante, pois a falta de 
percepção se associa com a morte eventual da criança. Do ponto de vista 
orgânico, tal estado pode ocorrer porque o feto se move menos nesse momen­
to da gravidez: seu crescimento ultrapassou a capacidade de distensão do úte• 
ro. Com isso seu espaço torna-se reduzido, além de que já existe certo grau 
de "encaixamento''· Do ponto de vista psíquico, a intensidade da ansiedade 
produz o embotamento da percepção, ao qual se acrescenta muitas vezes um 
estado de contcatura dos músculos do assoalho pélvico, que imobiliza a crian· 
ça. Se se analisar psicologicamente a situação, a gestante chegará a reconhecer 
as causas, às vezes externas, que reativaram sua ansiedade; com isso pode tran­
qüilizar -se e voltar a sentir os movimentos. 
Outras vezes a negação das ansiedades ou sua intensa repressão ocasio• 
nam severos sintomas, dos quais a gestose é o mais freqüente. Sua profilaxia 
deve ser realizada pela caracterização prévia do quadro, tanto física como psi· 
cológica. A compreensão de tais acessos de angústia permite ao obstetra en· 
tender que, quando uma mulher o chama, é porque já não tolera mais a ansie­
dade e, portanto, necessita e merece ser atendida. 
Outro modo de resolver uma dessas. crises é o chamado "falso alarma", 
quadro em que a gestante sente contrações que apenas traduzem a acentuação 
das contrações fisiológicas, mas que são percebidas como freqüentes e em par• 
te dolorosas. A freqüência e a dor devem-se ao estado de ansiedade e à contra· 
tura muscular. Em geral, o "falso alarma", a lém de permitir a liberação da 
ansiedade, constitui um ensaio, de que a mulher necessita, da maneira como 
deverá comportar-se no momento de ir para a clínica. Novamente dependerá 
da compreensão do obstetra conseguir a tranqüilização requerida e a aprendi­
zagem desejada. 
Até agora temo-nos referido unicamente à situação psicológica da gesta• 
ção normal. Desejaríamos fazer uma breve menção da 
47 
Gestação patológica 
Suas diversas•manifestações: placenta prévia, excesso de líquido am­
niótico, brevidade ou circular múltipla do cordão, más-formações fetais graves, 
morte real do feto dentro do útero, etc., são também percebidas pela mãe, 
que registra a respectiva noção de forma consciente, ou a reprime, ocorrendo 
neste caso uma subseqüente aparição de acessos de ansiedade ou diversos 
sintomas. Os profissionais habituados ao contato com gestantes sabem, por as­
sim dizer, quando uma paciente manifesta esses temores como parte de sua 
ansiedade normal e quando, pela intensidade da vivência e pela forma precisa 
em que descreve suas sensações, existe a possibilidade de que correspondam à 
realidade. No tratamento analítico, tudo isso aparece ligado a fantasias in­
conscientes bem defin idas, e os sonhos esclarecem tais fantasias. Do mesmo 
modo, nos grupos de discussão, nas psicoterapias breves, etc., é possível con­
firmar o grau de validadeque podem ter as fantasias inconscientes, mediante 
a observação da conduta, das vivências conscientes e dos sonhos. Ou seja, a ta­
refa psicológica nesses casos pode significar uma eficaz colaboração com o clí­
nico, no sentido de determinar a necessidade de investigação do problema 
orgânico. 
F ica assim em mãos do médico a decisão de comunicar ou não a emer­
gência à gestante. Consideramos que nessa circunstância o critério deveria 
resultar do in tercâmbio entre o clínico e o psicólogo, avaliando-se o estado 
anímico da paciente e sua capacidade para tolerar a espera e a incógnita. O 
caso de placenta prévia é um exemplo claro. Geralmente o método psicoprofi­
lâtico desenvolve uma capacidade e, juntamente com ela, um grau adequado 
de cooperação. 
Na hipótese de suspeita de má-formação fetal, que de imediato se verifi­
cará no parto, parece-nos útil, segundo nossa experiência, não desmentir total­
mente a vivência em tal sentido, exposta pela gestante, mas limitar-se a indicar 
que, no momento do nascimento, se saberá se é assim ou não; na oportunida­
de, pode-se proporcionar o esclarecimento adequado e ajudar a recolocar a si• 
tuação. O esclarecimento baseia-se na noção da limitação humana e na neces­
sidade de aceitar a má-formação como mais um componente do fenômeno 
vital. 
No que se refere à certeza de que o feto está morto, o cotejo entre as 
observações feitas pelo clinico e pelo psicólogo permitirá estabelecer se a pa­
ciente é capaz de suportar a informação ou se sua tendência predominante é a 
negação, que neste caso cumpre respeitar, mas reforçando as explicações ge­
rais acerca da possibilidade dessa contingência, e levando-a a encarar as vivên-
48 
i 
h 
1 
cias que podem sobrevir e suas eventuais soluções. Essa técnica permite ainda 
determinar com mais clareza a conduta terapêutica a seguir. 
Também a gravidez múltipla é percebida, na maioria dos casos, do sexto 
mês em diante, de maneira bastante consciente. As manifestações inconscien­
tes são claras: a fantasia é de envenenamento, de multiplicidade de estímulos 
e objetos, com vivências terroríficas de invasão. Trata-se de outra situação 
cujo esclarecimento deve integrar as aulas de um curso psicoprofilático, 
como uma das variáveis incluídas no acaso da gestação. Nessa oportunidade, 
convém ampliar a informação com comentários referentes aos conhecimentos 
atuais sobre a criação de gêmeos, trigêmeos, etc. Cumpre salientar também 
que muitas gestantes fantasiam conscientemente sobre a possibilidade de ter 
gêmeos, situação que se apresenta como bastante idealizada. Outras, ao con­
trário, por ter tido a experiência de modo direto através de familiares ou ami­
gos, experimentam �rror de que lhes possa acontecer o mesmo. Ambos os 
extremos devem ser analisados, com a preparação da mulher não apenas para 
a eventual concreção do fato em seu caso, mas também para que ela possa 
colaborar com outras pessoas que tenham de enfrentar igual situação. 
Na idealização existe a fantasia narcisista inconsciente de u m vínculo 
perfeito com outro ser idêntico à própria paciente. No que se refere ao terror, 
além da realidade de que a criação de gêmeos é difícil, a vivência reativada é a 
de ser perseguida por um inimigo oculto e sinistro (a própria sombra), que 
corresponde à vivência de cada gêmeo em relação ao outro. 9 
9 - Soifer, A. e Revuchlno, L.K. de: "Comentarlo da entrevistas realizadas • do, fami­
lias con niilos mellizos". Rev. Argentin• de P1iqui11trf• y Psicolog/11 de /11 lnf•ncie y 
de /a Ado/111cencie, Buenos Aires, 1, 2, Agosto, 1 970. 
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