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Resumo do livro Marxismo e Filosofia da Linguagem Trad Michel Lahud e Yara Frateschi Vieira 12 ed São Paulo Hucitec, 2006

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BAKHTIN, Mikhail; VOLOCHÍNOV, Valentin N. Marxismo e Filosofia da Linguagem. Trad. Michel Lahud e Yara Frateschi Vieira. 12. ed. São Paulo: Hucitec, 2006.
Nadson Cardoso de Jesus
RESUMO
Antes de tudo, é importante salientar que a autoria seguida neste resumo se alinha com a autoria da versão de publicação do livro, a qual designa Bakhtin como autor. Entretanto, vale ressaltar que atualmente as contribuições são indicadas como de autoria de Volochínov.
CAPÍTULO 1: ESTUDO DAS IDEOLOGIAS E FILOSOFIA DA LINGUAGEM
Bakhtin compreende que nem tudo é ideológico, mas “tudo que é ideológico é um signo. Sem signos não existe ideologia” (Bakhtin, 2006, p. 29). Todavia, o que não é ideológico pode ser convertido em signo ideológico. Com isso, o objeto físico da realidade, com sentido em si, passa a ter ao mesmo tempo outro significado, um significado ideológico. Bakhtin também compreende que cada campo de criatividade ideológica possui características próprias. Entretanto, os fenômenos ideológicos são postos sob a mesma definição geral, graças a seu caráter semiótico, por a sua manifestação se dar através da socialização. Segundo ele, “cada signo ideológico é não apenas um reflexo, uma sombra da realidade, mas também um fragmento material dessa realidade” (Bakhtin, 2006, p. 31). E para compreender um signo é preciso “aproximar o signo apreendido de outros signos já conhecidos" (Bakhtin, 2006, p. 32).
Bakhtin compreende que “os signos são o alimento da consciência individual [...] e ela reflete sua lógica e suas leis”. Porém, “a lógica da consciência é a lógica da comunicação ideológica, da interação semiótica de um grupo social” (Bakhtin, 2006, p. 34). Assim, ao mesmo tempo em que os signos são construções individuais, a sua manifestação precisa da socialização. Contudo, essa socialização precisa ocorrer entre indivíduos organizados (o que o autor chama de “unidade social”), pois só assim será possível o signo se constituir. (Bakhtin, 2006, p. 33). Também pontua que os signos refletem e refratam a realidade, pois nem sempre eles são reflexos diretos da realidade, podendo até mesmo modificar completamente a realidade.
Em seguida o autor afirma que “a palavra é o fenômeno ideológico por excelência”, pois considera que a palavra é o “modo mais puro e sensível de relação social” (Bakhtin, 2006, p. 34). Segundo ele, enquanto o signo “é criado por uma função ideológica precisa e permanece inseparável dela” (Bakhtin, 2006, p. 35), a palavra é o contrário, é neutra em relação a “função ideológica específica” (Bakhtin, 2006, p. 35). Assim, afirma que para compreender, realmente, o funcionamento da palavra como instrumento da consciência é preciso analisa-la precisamente como signo social, pois considera que “a palavra está presente em todos os atos de compreensão e em todas os atos de interpretação” (Bakhtin, 2006, p. 36).
Por fim, o autor conclui afirmando que: 
a única maneira de fazer com que o método sociológico marxista dê conta de todas as profundidades e de todas as sutilezas das estruturas ideológicas “imanentes” consiste em partir da filosofia da linguagem concebida como filosofia do signo ideológico. E essa base de partida deve ser traçada e elaborada pelo próprio marxismo (Bakhtin, 2006, p. 37).
 
CAPÍTULO 2: A RELAÇÃO ENTRE A INFRA-ESTRUTURA E AS SUPERESTRUTURAS
Segundo Bakhtin: “um dos problemas fundamentais do marxismo, o das relações entre a infra-estrutura e as superestruturas, acha-se intimamente ligado, em muitos de seus principais aspectos, aos problemas da filosofia da linguagem” (Bakhtin, 2006, p. 38). Na visão do autor: “o problema da relação recíproca entre a infra-estrutura e as superestruturas [...] pode justamente ser esclarecido, em larga escala, pelo estudo do material verbal” (Bakhtin, 2006, p. 40). Ele considera que as particularidades da palavra, enquanto signo ideológico, fazem dela um dos materiais mais propícios a ser utilizado para orientar o problema no plano dos princípios, graças a “ubiquidade social” dela (Bakhtin, 2006, p. 40). Em seu entendimento as palavras são construídas a partir de uma gama de encadeamentos ideológicos, as quais servem como elemento fundamental para todas as relações sociais e em todos os domínios. Assim, considera “que a palavra será sempre o indicador mais sensível de todas as transformações sociais”, pois “a palavra é capaz de registrar as fases transitórias mais íntimas, mais efêmeras das mudanças sociais” (Bakhtin, 2006, p. 40).
Bakhtin aponta que “a psicologia do corpo social se manifesta essencialmente nos mais diversos aspectos da “enunciação” sob a forma de diferentes modos de discurso, sejam eles interiores ou exteriores” (Bakhtin, 2006, p. 41). Isto quer dizer que as pessoas carregam marcas de construções ideológicas socias relacionadas a infraestrutura e que se desenvolvem ao longo do tempo, essas marcas acabam aparecendo em suas atividades comunicativas, sejam de forma verbal, na gesticulação, etc. Com isso, Bakhtin considera que cada forma de discurso social, corresponde um grupo de temas e um estudo minucioso revelaria a grande importância do componente hierárquico no processo de interação verbal. Segundo ele, uma mudança na organização social ou nas condições em que a interação ocorre acaba ocasionando uma modificação do signo. Nesse sentido, o autor afirma que esse é justamente um dos papéis da ciência das ideologias, pesquisar e entender como ocorre a evolução social do signo linguístico, pois só assim será possível uma 
expressão concreta ao problema da mútua influência do signo e do ser; é apenas sob esta condição que o processo de determinação causal do signo pelo ser aparece como uma verdadeira passagem do ser ao signo, como um processo de refração realmente dialético do ser no signo (Bakhtin, 2006, p. 43).
Para fazer isso, o autor aponta três regras metodológicas que precisam ser seguidas: 1) não separar a ideologia da realidade material do signo; 2) não dissociar o signo das formas concretas da comunicação social; 3) não dissociar a comunicação e suas formas de sua base material (Bakhtin, 2006, p. 43). 
Segundo Bakhtin, todo signo ideológico e linguístico assimila características do meio, da forma e do tempo em que são construídos socialmente, pois “o tema e a forma do signo ideológico estão indissoluvelmente ligados, e não podem, por certo, diferenciar-se a não ser abstratamente” (Bakhtin, 2006, p. 45). Assim, considera que “os temas e as formas da criação ideológica crescem juntos e constituem no fundo as duas facetas de uma só e mesma coisa” (Bakhtin, 2006, p. 45). No entendimento do autor, este processo de integração da realidade na ideologia é mais facilmente observável no plano da palavra. (Bakhtin, 2006, p. 45).
Por fim, Bakhtin aponta que todo signo possui duas faces, uma em que ele pode ser considerado um elogio e outra que o considera uma ofensa. O que o determina é a dialética interna que possui, a qual só fica em evidência em épocas de crise social e de comoção revolucionária, pois nas condições normais da vida social, esse dilema fica oculto, graças a ideologia dominante estabelecida. Nas palavras do autor:
o signo ideológico é sempre um pouco reacionário e tenta, por assim dizer, estabilizar o estágio anterior da corrente dialética da evolução social e valorizar a verdade de ontem como sendo válida hoje em dia. Donde o caráter refratário e deformador do signo ideológico nos limites da ideologia dominante” (Bakhtin, 2006, p. 46).
CAPÍTULO 3: FILOSOFIA DA LINGUAGEM E PSICOLOGIA OBJETIVA
No início desta seção Bakhtin afirma que “uma das tarefas mais essenciais e urgentes do marxismo é constituir uma psicologia verdadeiramente objetiva” (Bakhtin, 2006, p. 47). Para isso, afirma que é preciso que seus fundamentos sejam sociológicos e não fisiológicos ou biológicos, pois os dois últimos não têm condições de resolver este problema. Isso se dá porque não é possível estudar o aspecto psíquico do homem extraindo-o de seu lugar de fala, para estuda-lo é preciso considerar o contexto social em que este está inserido.Em sequência o autor aponta que a consciência é um fato socioideológico. Ele afirma isso porque considera que os procedimentos que definem o psiquismo ocorrem fora do organismo (fora do homem). Assim, entende o psiquismo subjetivo como um traço particular de cada indivíduo, traço este que precisa ser estudado de forma sociológica, pois “uma vez compreendido e interpretado, é explicável exclusivamente por fatores sociais, que determinam a vida concreta de um dado indivíduo, nas condições do meio social” (Bakhtin, 2006, p. 47). 
Bakhtin compreende que o que faz da atividade psíquica uma atividade psíquica é a sua significação. Isto quer dizer que o psiquismo interior só pode ser compreendido e analisado como signo. Dessa forma, a função da psicologia consiste em “descrever com discernimento, dissecar e explicar a vida psíquica como se se tratasse de um documento submetido à análise do filólogo” (Bakhtin, 2006, p. 49). Ele afirma isso porque compreende que o psiquismo se expressa por meio das palavras, as quais são neutras e precisam de um contexto para que manifeste os signos que compõem o psiquismo. Assim, a atividade mental, obrigatoriamente, deve manifestar-se no campo semiótico. Portanto, “a significação só pode pertencer ao signo” (Bakhtin, 2006, p. 50). Mais adiante Bakhtin afirma que toda atividade mental constitui uma expressão potencial. A partir disso, ele considera que a função expressiva não pode ser separada da atividade mental sem que ela altere a própria natureza desta (Bakhtin, 2006, p. 51). Assim, não existe uma ruptura entre o processo de atividade mental e a expressão exterior, mesmo que para realizar essa expressão seja utilizado mais de um código, essa mudança “ocorre no quadro de um mesmo domínio qualitativo, e se apresenta como uma mudança quantitativa” (Bakhtin, 2006, p. 51). O que constitui o material semiótico do psiquismo é tudo que ocorre no organismo: a respiração; a circulação do sangue; a articulação; etc. Porém, para ele, nem todos os elementos possuem o mesmo valor e considera a palavra o material semiótico privilegiado do psiquismo. A palavra seria a base do psiquismo, sem ela o psiquismo se resumiria a nada, mas a exclusão de todos os outros movimentos expressivos não o diminuiria em quase nada. 
Segundo o autor, o signo ideológico é um território comum entre a ideologia e o psiquismo e não existe fronteira a priori entre os dois, o que existe é apenas uma diferença de grau (Bakhtin, 2006, p. 57). Assim, o pensamento que só existe no contexto de uma consciência individual e não é reforçado no contexto da ciência é apenas um pensamento obscuro e inacabado, que aos poucos vai se formando no contexto da consciência, uma vez que se apoia no sistema ideológico, pois ele próprio foi produzido através de signos ideológicos que foram assimilados anteriormente. O que acaba gerando a diferença qualitativa são:
os processos cognitivos provenientes de livros e do discurso dos outros e os que se desenvolvem em minha mente pertencem à mesma esfera da realidade, e as diferenças que existem, apesar de tudo, entre a mente e os livros não dizem respeito ao conteúdo do processo cognitivo (Bakhtin, 2006, p. 57).
Isto quer dizer que a diferença qualitativa corresponde ao processo de assimilação de um conteúdo distante, o qual passa por um processo de modificação, de “simplificação”, ou ainda, de apropriação deste conteúdo.
O conceito do “individual” também acaba dificultando a delimitação do signo ideológico, pois muitos apontam que o psiquismo é individual e a ideologia social. No entanto, Bakhtin afirma que isso é falso, “o conteúdo do psiquismo “individual” é, por natureza, tão social quanto a ideologia” (Bakhtin, 2006, p. 58). Sobre as manifestações ideológicas considera que “são tão individuais (no sentido ideológico deste termo) quanto psíquicas” (Bakhtin, 2006, p. 58). A partir disso, aponta que o que diferencia o signo interior e o signo exterior, entre o psíquico e o ideológico é que o pensamento pertence ao sistema ideológico e é subordinado a suas leis e ao mesmo tempo também faz parte de outro sistema único, o qual também possui leis próprias, o sistema do psiquismo. O caráter único desse sistema não é determinado somente pela unicidade do organismo biológico e sim pela totalidade das condições vitais e sociais em que esse organismo se encontra colocado (Bakhtin, 2006, p. 59). Dessa forma, o que determina a diferença entre os processos de compreensão do signo interior e do signo exterior, puramente ideológico é que “no primeiro caso, compreender significa relacionar um signo interior qualquer com a unicidade dos outros signos interiores, isto é, apreendê-lo no contexto de um certo psiquismo” (Bakhtin, 2006, p. 59). Já o segundo, “trata-se de apreender um dado signo no contexto ideológico correspondente.” (Bakhtin, 2006, p. 59).
Para Bakhtin, a enunciação, pode assumir duas orientações, uma em direção ao sujeito e outra em direção à ideologia. No primeiro caso, aponta que o objetivo é traduzir em signos exteriores os signos interiores e fazer com que o interlocutor os relacione a um contexto interior, sendo este um ato de compreensão puramente psicológico. Já o outro caso precisa de uma compreensão ideológica objetiva e concreta, da enunciação. A introspecção constitui, para o indivíduo, a compreensão de seu próprio signo interior, permite que o indivíduo exteriorize o signo interior e também que ele compreenda esse signo. Assim, o autor entende que o aprofundamento da introspecção só é possível “quando constantemente vinculado a um aprofundamento da compreensão da orientação social”, pois “o signo não pode ser separado da situação social sem ver alterada sua natureza semiótica” (Bakhtin, 2006, p. 62).
Mais adiante o autor afirma que a atividade psíquica é “uma passagem do interior para o exterior; para o signo ideológico, o processo é inverso”, por conseguinte, “existe entre o psiquismo e a ideologia uma interação dialética indissolúvel” (Bakhtin, 2006, p. 64), pois o autor, compreende que é preciso que o signo ideológico consiga estar sempre em evidência, em uso, se não ele acaba por cair em desuso e consequentemente virando uma relíquia de museu ou até mesmo caindo no esquecimento.

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