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O Uraguai
 Basílio da Gama
 Basílio da Gama: poeta, nasceu em São José do Rio das Mortes, depois São José del Rei, hoje Tiradentes, MG, em 22 de julho de 1740, e faleceu em Lisboa, Portugal, em 31 de julho de 1795. É o patrono da cadeira n. 4 da Academia Brasileira de Letras, por escolha do fundador Aluísio Azevedo.
Era filho de Manuel da Costa Vilas-Boas, fazendeiro abastado, e de Quitéria Inácia da Gama. A morte do pai, ocorrida na sua primeira infância, acarretou situação difícil, valendo nesse transe um protetor, o brigadeiro Alpoim, que o encaminhou no Rio de Janeiro e facilitou os seus estudos no Colégio dos Jesuítas, onde faria o noviciado para professar na Companhia de Jesus. Com a expulsão dos jesuítas, em 1759, os que não eram professos podiam voltar à vida secular, pela qual optou Basílio da Gama, que prosseguiu seus estudos, provavelmente no Seminário São José. Viajou depois pela Itália e Portugal, de 1760 a 1767. Em Roma, foi recebido na Arcádia Romana sob o nome de Termindo Sipílio, com a proteção dos jesuítas, que teriam emendado os versos acadêmicos do poeta principiante e sem nenhuma produção de vulto. Em começos de 1767 estava no Rio de Janeiro e assistia, em 8 de fevereiro, ao lançamento ao mar da nau Serpente, de que faz menção no Uraguai (Canto terceiro), na “Ode II” e no “Soneto VI”. Em 30 de junho de 1768, estava de viagem para Lisboa, a bordo da nau Senhora da Penha de França, com o objetivo de matricular-se na Universidade de Coimbra. Lá chegando, foi preso e condenado ao degredo para Angola, como suspeito de ser partidário dos jesuítas. Do desterro a que estava sentenciado salvou-o o Epitalâmio que escreveu às núpcias de D. Maria Amália, filha de Pombal. Este simpatizou com o poeta, perdoou-o e, depois de lhe conceder carta de nobreza e fidalguia, deu-lhe o lugar de oficial da Secretaria do Reino. Basílio identificou-se, desde então, com a política pombalina. Para conciliar as graças de Pombal, compôs O Uraguai, publicado em 1769 na Régia Oficina Tipográfica, de Lisboa. A queda do protetor, em 1777, não lhe alterou a posição burocrática. Não aderiu à Viradeira nem se juntou ao grupo dos aduladores da véspera que, após a queda de Pombal, passaram a vilipendiá-lo. No fim da vida, foi admitido na Academia das Ciências de Lisboa e publicou o poema Quitúbia (1791) e, de permeio, traduções e alguns versos de circunstância.
O poema épico O Uraguai trata da expedição mista de portugueses e espanhóis contra as missões jesuíticas do Rio Grande, para executar as cláusulas do Tratado de Madri, em 1756. Tinha também o intuito de descrever o conflito entre o ordenamento racional da Europa e o primitivismo do índio. Basílio mostra simpatia pelo índio vencido enquanto transfere o ataque aos jesuítas. Desenvolve o poema em dois planos complementares: o dos versos e o das notas, que nele são parte integrante e explicativa da composição. As notas em prosa, paralelas aos versos, chamam a si a tarefa proposta de combater os jesuítas e exaltar Pombal.
O Uraguai Resumo:
 A pobreza temática impele Basílio da Gama a substituir o modelo camoniano de dez cantos por um poema épico de apenas cinco cantos, constituídos por versos brancos, ou seja, versos sem rimas. 
Canto I: Saudação ao General Gomes Freire de Andrade. Chegada de Catâneo. Desfile das tropas. Andrade explica as razões da guerra. A primeira entrada dos portugueses enquanto esperam reforço espanhol. O poeta apresenta já o campo de batalha coberto de destroços e de cadáveres, principalmente de indígenas, e, voltando no tempo, apresenta um desfile do exército luso-espanhol, comandado por Gomes Freire de Andrade. 
Fumam ainda nas desertas praias 
Lagos de sangue tépidos e impuros 
Em que ondeiam cadáveres despidos, 
Pasto de corvos. Dura inda nos vales 
O rouco som da irada artilharia. 
MUSA, honremos o herói que o povo rude 
Subjugou do Uraguai, e no seu sangue 
Dos decretos reais lavou a afronta. 
Canto II: Partida do exército luso-castelhano. Soltura dos índios prisioneiros. É relatado o encontro entre os caciques Sepé e Cacambo e o comandante português, Gomes Freire de Andrade, à margem do rio Uruguai. O acordo é impossível porque os jesuítas portugueses se negavam a aceitar a nacionalidade espanhola. Ocorre então o combate entre os índios e as tropas luso-espanholas. Os índios lutam valentemente, mas são vencidos pelas armas de fogo dos europeus. Sepé morre em combate. Cacambo comanda a retirada. 
Canto III: O General acampa às margens de um rio. Do outro lado, Cacambo descansa e sonha com o espírito de Sepé. Este incita-o a incendiar o acampamento inimigo. Cacambo atravessa o rio e provoca o incêndio. Depois, regressa para a sede. Surge Lindóia. A mando de Balda, prendem Cacambo e matam-no envenenado. Balda é o vilão da história, que deseja tornar seu filho Baldeta, cacique, em lugar de Cacambo. Observa-se aqui uma forte crítica aos jesuítas. Tanajura propicia visões a Lindóia: a índia “vê” o terremoto de Lisboa, a reconstituição da cidade pelo Marquês de Pombal e a expulsão dos jesuítas. 
Canto IV: Maquinações de Balda. Pretende entregar Lindóia e o comando dos indígenas a Baldeta, seu filho. O episódio mais importante: a morte de Lindóia. Ela, para não se entregar a outro homem, deixa-se picar por uma serpente. Os padres e os índios fogem da sede, não sem antes atear fogo em tudo. O exército entra no templo. Com a chegada das tropas de Gomes Freire, os índios se retiram após queimarem a aldeia. 
Canto V: Descrição do Templo. Perseguição aos índios. Prisão de Balda. O poeta dá por encerrada a tarefa e despede-se. Expressa suas opiniões a respeito dos jesuítas, colocando-os como responsáveis pelo massacre dos índios pelas tropas luso-espanholas. Eram opiniões que agradavam ao Marquês de Pombal, o todo-poderoso ministro de D. José I. Nesse mesmo canto ainda aparece a homenagem ao general Gomes Freire de Andrade que respeita e protege os índios sobreviventes. 
Analise do livro: 
O Uraguai, poema épico de 1769, critica drasticamente os jesuítas, antigos mestres do autor Basílio da Gama. Ele alega que os jesuítas apenas defendiam os direitos dos índios para ser eles mesmos seus senhores. O enredo situa-se todo em torno dos eventos expedicionários e de um caso de amor e morte no reduto missioneiro.
Tema central: Pelo Tratado de Madri, celebrado entre os reis de Portugal e de Espanha, as terras ocupadas pelos jesuítas, no Uruguai, deveriam passar da Espanha a Portugal. Os portugueses ficariam com Sete Povos das Missões e os espanhóis, com a Colônia do Sacramento. Sete Povos das Missões era habitada por índios e dirigida por jesuítas, que organizaram a resistência à pretensão dos portugueses. O poema narra o que foi a luta pela posse da terra, travada em princípios de 1757, exaltando os feitos do General Gomes Freire de Andrade. Basílio da Gama dedica o poema ao irmão do Marquês de Pombal e combate os jesuítas abertamente. 
	Últimos Cantos
Gonçalves Dias
 Gonçalves Dias foi i um poeta, professor, jornalista e teatrólogo brasileiro. É lembrado como o grande poeta indianista da Primeira Geração Romântica. Deu romantismo ao tema índio e uma feição nacional à sua literatura. É lembrado como um dos melhores poetas líricos da literatura brasileira. É Patrono da cadeira nº. 15 da Academia Brasileira de Letras.
Antônio Gonçalves Dias nasceu em Caxias, Maranhão, no dia 10 de agosto de 1823. Filho de um comerciante português e uma mestiça viveu em um meio social conturbado. Durante os anos da infância, ajudou seu pai no comércio, ao mesmo tempo, que recebeu educação de um professor particular. 
Em 1838, viajou para Coimbra e ingressou no Colégio das Artes, onde concluiu o curso secundário. Em 1840 matriculou-se na Universidade de Direito de Coimbra, onde teve contato com escritores do romantismo português, entre eles, Almeida Garrett, Alexandre Herculano e Feliciano de Castilho.
Durante sua permanência em Coimbra, escreveu a maior parte de suas obras, inclusive a famosa “Canção do Exílio” (1843), onde expressao sentimento da solidão e do exílio. Em 1845, depois de formado em Direito, Gonçalves Dias retornou para o Maranhão, indo no ano seguinte morar no Rio de Janeiro procurando integrar-se ao meio literário.
Em 1847, com a publicação de “Primeiros Cantos”, conseguiu sucesso e o reconhecimento do público. Recebeu elogios de Alexandre Herculano, poeta romântico português. Ao apresentar o livro, Gonçalves Dias confessa: "Dei o nome Primeiros Cantos às poesias que agora publico, porque espero que não sejam as últimas". Em 1848 publica o livro "Segundos Cantos".
Em 1849, é nomeado professor de Latim e História do Brasil no Colégio Pedro II. Durante esse período escreveu para várias publicações, entre elas, o Jornal do Comércio, a Gazeta Mercantil e para o Correio da Tarde. Nessa época funda a Revista Literária Guanabara.
Em 1851, Gonçalves Dias publica o livro, “Últimos Cantos". Regressa ao Maranhão e conhece Ana Amélia Ferreira do Vale, por quem se apaixona, mas por ser mestiço não tem o consentimento da família dela que proíbe o casamento. Mais tarde casa-se com Olímpia da Costa.
Gonçalves Dias exerceu o cargo de oficial da Secretaria de Negócios Estrangeiros, foi várias vezes à Europa e em 1854, em Portugal, encontra-se com Ana Amélia, já casada. Esse encontro inspira o poeta a escrever o poema "Ainda Uma Vez — Adeus!".
Em 1862, Antônio Gonçalves Dias vai à Europa para tratamento de saúde. Sem resultados embarca de volta no dia 10 de setembro de 1864, porém o navio francês Ville de Boulogne em que estava, naufraga perto do Farol de Itacolomi, na costa do Maranhão, onde o poeta falece.
Gonçalves Dias faleceu na costa do Maranhão, no dia 3 de novembro de 1864.
Últimos cantos resumo: Sua obra é dividida em; poesia lírica, poesia medieval e poesia nacionalista.
Resumo de I- Juca- Pirama: Quem conta a história é um velho timbira que foi testemunha do que se passou e resolve recontar os fatos. O cenário do poema escrito por Gonçalves Dias é a floresta brasileira, já nos primeiros versos somos situados em meio a mata: "no meio tabas de amenos verdores, Cercadas de troncos — cobertos de flores".
As primeiras criaturas a serem apresentadas são os índios timbiras, conhecidos como guerreiros valentes. Anos atrás os índios timbira capturaram um prisioneiro de guerra tupi, o projeto dos timbiras era matá-lo. Ao final do terceiro canto, um dos índios timbira pediu que o prisioneiro se apresentasse e contasse um pouco da sua história de vida.
Ao longo do quarto canto ficamos conhecendo a história do índio tupi: as guerras que assistiu, os lugares por onde passou, a família que o rodeava. O pai, um velho cego e cansado, o acompanhava para todo lado. O filho era uma espécie de guia, que o conduzia sempre. Apesar de ter um pai inteiramente dependente, para provar a sua honra, o índio tupi capturado se coloca a disposição da tribo timbira para servir como escravo. O chefe da tribo timbira, ao ouvir o relato do prisioneiro, manda soltá-lo imediatamente afirmando que ele é um grande guerreiro. O tupi diz que parte, mas que, quando o pai estiver morto, irá regressar para servir. O guerreiro finalmente encontra o pai moribundo e conta o que se passou. O velho decide regressar com o filho para a tribo timbira e agradece o chefe pela generosidade de o ter libertado, embora peça que o ritual seja cumprido e o filho seja castigado. O chefe da tribo se recusa a seguir em frente e justifica que o cativo é um covarde, pois chorou diante dos inimigos e da morte. Como o plano era comer a carne do prisioneiro, o chefe temia que os seus índios se tornassem covardes assim como o tupi capturado.
O pai fica surpreso com a revelação feita pelo cacique porque os tupis não choram, menos ainda a frente dos outros, e amaldiçoa o filho. Para provar que é forte, corajoso, e para fazer valer a sua honra, o filho se volta, sozinho, contra a tribo timbira inteira. O pai percebe, pelo som da batalha, que o filho luta bravamente. O chefe da tribo, então, intervém e pede que o conflito se encerre. Pai e filho, por fim, se reconciliam
Casa de Pensão
Aluísio de Azevedo
Aluísio de Azevedo: Aluísio Tancredo Gonçalves de Azevedo nasceu em São Luís, MA, em 1857, e faleceu em Buenos Aires, em 1913. 
 Era filho do diplomata português David Gonçalves de Azevedo e de D. Emília Amália Magalhães e irmão do comediógrafo Arthur Azevedo. 
 Da infância à adolescência, Aluísio estudou em São Luís e trabalhou como caixeiro e guarda-livros. Desde cedo revelou grande interesse pelo desenho e pela pintura, o que, com certeza, auxiliou-o na técnica de caracterizar as personagens de seus romances. Em 1876, embarcou para o Rio de Janeiro, onde já se encontrava o irmão mais velho, Arthur. 
 Matriculou-se na Imperial Academia de Belas Artes, hoje Escola Nacional de Belas Artes. Para manter-se, fazia caricaturas para os jornais da época, como O Fígaro, O Mequetrefe, Zig-Zag e A Semana Ilustrada.
 A morte do pai, em 1878, obrigou-o a voltar a São Luís, para tomar conta da família, onde se lançou como escritor, com a publicação, em 1879, do romance romântico Uma Lágrima de Mulher.
 Em 1881, Aluísio publica O Mulato, romance que causou escândalo entre a sociedade maranhense, não só pela crua linguagem naturalista, mas, sobretudo pelo assunto de que tratava: o preconceito racial. Por conta do sucesso da obra, Aluísio pode voltar para o Rio de Janeiro, decidido a ganhar a vida como escritor. 
 Quase todos os jornais da época mantinham folhetins, e foi num deles que Aluísio passou a publicar seus romances, baseados na observação e análise dos agrupamentos humanos, na degradação das casas de pensão e na exploração desses espaços que surgiam pelo imigrante, principalmente o português. Dessa preocupação resultariam duas de suas melhores obras: Casa de pensão (1884) e O Cortiço (1890). 
 Em 1895, ingressa na diplomacia e deixa de lado a carreira de escritor. 
Casa de Pensão: A obra foi baseada num fato real: a Questão Capistrano, crime que sensibilizou o Rio de Janeiro em 1876/77, envolvendo dois estudantes, em situação muito próxima à da narração de Aluísio Azevedo. Neste livro, o autor estuda as influências da sociedade sobre o indivíduo sem qualquer idealização romântica, retratando rigorosamente a realidade social trazendo para a literatura um Brasil até então ignorada.
 Autor fiel à tendência naturalista, Aluísio Azevedo focaliza, nesta obra, problemas como preconceitos de classe, de raças, a miséria e as injustiças sociais. Descreve a vida nas pensões chamadas “familiares”, onde se hospedavam jovens que vinham do interior para estudar na capital. Diferente do romantismo, o naturalismo enfatiza o lado patológico do ser humano, as perversões dos desejos e o comporta-mento das pessoas influenciado pelo meio em que vivem.
 É uma espécie de narrativa intermediária entre o romance de personagem (O Mulato) e o romance de espaço (O Cortiço). Como em O Mulato, todas as ações ainda estão vinculadas à trajetória do protagonista, nesse caso, Amâncio de Vasconcelos. Mas, como em O Cortiço, a conquista, ordenação e manutenção de um espaço é que impulsiona, motiva e ordena a ação. Espaço e personagem lutam, lado a lado, para evitar a degradação.
 As teses naturalistas, especialmente o Determinismo, alicerçam a construção das personagens e das tramas.
Romance naturalista de 1884, em que o autor, de carreira diplomática bastante acidentada, move personagens que se coadunam perfeitamente com a análise dos críticos de que seus tipos são, via de regra, grosseiros, não se distinguem pela sutileza da compreensão, nem pela frescura dos sentimentos. São eixos de relações da estrutura da presente narrativa a Província – Maranhão, a Corte - Rio de Janeiro, a casa paterna e a casa de pensão.
 O naturalismo está plenamente representado em Casa de Pensão desde a abertura do romance, quando Amâncio aparece marcado fatalisticamente pela escola e pela família: uma e outra o encheram de revolta. Por causa de um castigo justo ou injusto, "todo o sentimento de justiçae da honra que Amâncio possuía, transformou-se em ódio sistemático pelos seus semelhantes...". 
 O leite que o menino mamou na ama negra também está contagiado e irá marcá-lo. O médico dizia: "Esta mulher tem reuma no sangue e o menino pode vir a sofrer para o futuro." 
 Amâncio é uma cobaia, um campo de experimentação nas mãos do romancista. Nele o fisiológico é muito mais forte do que o psicológico. É o determinismo que vai acompanhar toda a carreira do personagem. Está presente também na obra o sentido documental e experimental do romance naturalista, renunciando ao sentimentalismo e à evasão, procura construir tudo sobre a realidade. Como já mencionado, a estória do romance se baseia num caso real. 
Enredo: Amâncio (Da Silva Bastos e Vasconcelos), rapaz rico e provinciano, abandona o Maranhão e segue de navio para o Rio de Janeiro (a Corte) a fim de se encaminhar nos estudos e na vida. É um provinciano que sonha com os deslumbramentos da Corte. Chega cheio de ilusões e vazio de propósitos de estudar... A mãe fica chorosa e o pai, indiferente, como sempre fora no trato meio distante com o filho. O rapaz tinha que se tornar um homem.
 Amâncio começa morando em casa do sr. Campos, amigo do Pai, e, forçado, se matricula na Escola de Medicina. Ia começar agora uma vida livre para compensar o tempo em que viveu escravizado às imposições do pai e do professor, o implacável Pires.
Por convite de João Coqueiro, co-proprietário de uma casa de pensão, junto com a sua velhusca mulher Mme. Brizard, muda-se para lá. É tratado com as maiores preferências: os donos da pensão queriam aproveitar o máximo de seu dinheiro e ainda arranjar o seu casamento com Amélia, irmã de Coqueiro. Um sujo jogo de baixo interesses, sobretudo de dinheiro. Naquele ambiente, tudo concorreria para fazer explodir a super-sensualidade do maranhense.
 "Ele, coitado, havia fatalmente de ser mau, covarde e traiçoeiro: Na ramificação de seu caráter e sensualidade era o galho único desenvolvido e enfolhado, porque de todos só esse podia crescer e medrar sem auxílios exteriores."
 A casa de pensão era um amontoado de gente, em promiscuidade generalizada, apesar da hipócrita moralidade pregada pelo seu dono: havia miséria física e moral, clara e oculta. Com a chegada de Amâncio, a pensão passou a arapuca para prender nos seus laços o jovem, inesperto e rico estudante: pegar o seu dinheiro e casá-lo com a irmã do Coqueiro. Para alcançar o fim, todos os meios eram absolutamente lícitos. Amélia, principalmente quando da doença do rapaz, se desdobrou nos mais íntimos cuidados. Até que se tornou, disfarçadamente, sua amante. Sempre mantendo as aparências do maior respeito exigido dentro da pensão pelo João Coqueiro...
 O pai de Amâncio morre no Maranhão. A mãe chama o filho. Ele pretende voltar, logo que terminarem os seus exames de medicina. Era preciso que o filho voltasse para vê-la e ver os negócios que o pai deixara. Mas o rapaz está preso à casa de pensão e a Amélia: este o ameaça e só permite sua ida ao Maranhão, depois do casamento. Amâncio prepara sua viagem às escondidas. Mas, no dia do embarque, um oficial e justiça acompanhado de policiais o prende para apresentação à delegacia e prestação de depoimentos. Amâncio é acusado de sedutor da moça. João Coqueiro prepara tudo: o caso foi entregue ao famigerado e chicanista Dr. Teles de Moura. Aparecem duas testemunhas contra o rapaz. Começa o enredado processo: uma confusão de mentiras, de fingimentos, de maucaratismo contra o jovem rico e desfrutável para os interesses pecuniários de Mme. Brizard e marido. Há uma ressonância geral na imprensa e, na maioria, os estudantes se colocam ao lado de Amâncio. O senhor Campos prepara-se para ajudar o seu protegido, mas Coqueiro lhe faz chegar às mãos uma carta comprometedora que Amâncio escrevera à sua senhora, D. Hortênsia. E se coloca contra quem não soube respeitar nem a sua casa...
 Três meses depois de iniciado o processo, Amâncio é absolvido. O rapaz é levado em triunfo para um almoço, no Hotel Paris.
 "Amâncio passava de braço a braço, afagado, beijado, querido, como uma mulher famosa." Todo mundo olhava com curiosidade e admiração o estudante absolvido. E lhe atiravam flores, Ouviam-se vivas ao estudante e à Liberdade. Os músicos alemães tocaram a Marselhesa. Parecia um carnaval carioca.
 Em outro plano, Coqueiro, sozinho, vendo e ouvindo tudo. A alma envenenada de raiva. Em casa o destampatório da mulher que o acusava de todo o fracasso. As testemunhas reclamavam o pagamento do seu depoimento. Um inferno dentro e fora dele. Chegaram cartas anônimas com as maiores ofensas. Um homem acuado...
 Pegou, na gaveta, o revólver do pai. E pensou em se matar. Carregou a arma. Acertou o cano no ouvido. Não teve coragem. Debaixo da sua janela, gritavam injúrias pela sua covardia e mau caráter... No dia seguinte, de manhã, saiu sinistro. Foi ao Hotel Paris. Bateu no quarto II, onde se encontrava o estudante com a rapariga Jeanete. Esta abriu a porta. Amâncio dormia, depois da festa e da bebedeira, de barriga para cima. Coqueiro atirou a queima-roupa. Amâncio passa a mão no peito, abre os olhos, não vê mais ninguém. Ainda diz uma palavra: "mamãe" ... e morre.
 Coqueiro foi agarrado por um policial, ao fugir. A cidade se enche de comentários. Muitos visitam o necrotério para ver o cadáver de Amâncio. Vendem-se retratos do morto. Um funeral grandioso com a presença de políticos, notícias e necrológicos nos jornais, a cidade toda abalada. A tragédia tomou conta de todos.
 A opinião pública começa a flutuar, a mudar de posição: afinal, João Coqueiro tinha lavado a honra da irmã...
Quando D. Ângela, envelhecida e enlutada, chega ao Rio de Janeiro, se viu no meio da confusão, procurando o filho. Numa vitrine, ela descobriu o retrato do filho "na mesa do necrotério, com o tronco nu, o corpo em sangue. Uma legenda: “Amâncio de Vasconcelos, assassinado por João Coqueiro, no Hotel Paris...”
Clara dos Anjos
Lima Barreto
 Lima Barreto: nasceu em 13 de maio de 1881, na cidade do Rio de Janeiro. Era negro e de família pobre. Sua avó materna, Geraldina Leocádia da Conceição, foi uma escrava alforriada. Sua mãe era professora primária e morreu de tuberculose quando Lima Barreto tinha 6 anos. Seu pai era tipógrafo, porém sofria de doença mental.
O autor, no entanto, tinha um padrinho com posses – o Visconde de Ouro Preto (1836-1912) –, o que permitiu que o escritor estudasse no Colégio Pedro II. Depois, ingressou na Escola Politécnica, mas não concluiu o curso de Engenharia, pois precisava trabalhar. Em 1903, fez concurso e foi aprovado para atuar junto à Diretoria do Expediente da Secretaria da Guerra. Assim, concomitantemente ao trabalho como funcionário público, escrevia os seus textos literários.
Em 1905, trabalhou como jornalista no Correio da Manhã. Lançou, em 1907, a revista Floreal. Em 1909, o seu primeiro romance foi editado em Portugal: Recordações do escrivão Isaías Caminha. Já o romance Triste fim de Policarpo Quaresma foi publicado, pela primeira vez, em 1911, no Jornal do Comércio, em forma de folhetim. Em 1914, Lima Barreto foi internado em um hospital psiquiátrico pela primeira vez.
Lima Barreto, que se candidatou três vezes a uma vaga na Academia Brasileira de Letras, recebeu dela, segundo Francisco de Assis Barbosa (1914-1991)|1|, apenas uma menção honrosa em 1921. Morreu em 01 de novembro de 1922.
O escritor Lima Barreto está inserido no Pré-modernismo. Fazem parte desse período as obras de autores brasileiros publicadas entre 1902 e 1922. É uma fase de transição entre o Simbolismo e o Modernismo. Portanto, durante esse período, é possível perceber influências de estilos de época anteriores, tais como o Parnasianismo e o Simbolismo (na poesia) e o Naturalismo (na prosa).
Além dessa característica, são perceptíveis elementos de cunho nacionalista, que já preanunciam a estética modernista brasileira. Assim, não há mais a idealização romântica e nota-se um nacionalismo crítico, em que os problemas sociais do Brasilsão expostos, em que a crítica política é escancarada. O realismo, nessas obras, é predominante.
As obras de Lima Barreto, portanto, apresentam tais características. Contudo, estão também impressos, em seus textos, elementos que remetem à experiência de vida do autor, marcada pela exclusão e pelo preconceito, devido à sua origem pobre, à sua negritude e aos problemas de saúde que enfrentava
Assim, seus romances, memórias, crônicas e contos trazem a imagem de um Brasil de início do século XX, a partir da visão bastante crítica de um homem e artista excluído da sociedade e do meio acadêmico. Em romances como Recordações do escrivão Isaías Caminha (1909) e Clara dos Anjos (1948), a temática do preconceito racial é focalizada, a visão de um país justo e tolerante não se sustenta.
Esses dois romances também fazem crítica à política brasileira, quando, no primeiro, é evidenciado o poder político da imprensa e, no segundo, os poderes estatais são criticados por não se preocuparem em solucionar os problemas do subúrbio. Sua obra, portanto, caracteriza-se pela denúncia das desigualdades sociais, que se mantinham devido aos interesses políticos individuais em prejuízo da coletividade. Assim, o escritor, com ironia, apontava a hipocrisia da sociedade brasileira de sua época.
Clara dos anjos: narrado em terceira pessoa por um narrador onisciente e por vezes intruso, Clara dos Anjos tem como tema central o racismo e o lugar ocupado pela mulher na sociedade carioca do princípio do século XX.
Clara, a protagonista da história, é uma bela jovem de dezessete anos que vive no subúrbio do Rio de Janeiro. Pobre, mulata, filha de um carteiro e de uma dona de casa, a menina sempre recebeu a melhor educação e acolhimento. Viviam todos numa casa modesta de dois quartos com quintal no subúrbio fluminense. O ambiente urbano ao redor era descrito contendo “casas, casinhas, casebres, barracões, choças”, já pela descrição percebemos que se tratava de uma vizinhança relativamente humilde.
Clara foi a única filha sobrevivente do casal, os irmãos da menina todos morreram e pouco se sabe do destino deles. A vida da garota muda subitamente quando, num domingo, numa roda de amigos, Lafões, parceiro do pai, sugere uma comemoração diferente para o aniversário de Clara. 
Cassi, o músico sugerido por Lafões, fará a vida da família virar pelo avesso. Sedutor convicto, sem qualquer tipo de preocupação com as mulheres com quem andava, Cassi colecionava no seu currículo amoroso dez defloramentos e a sedução de muito maior número de senhoras casadas. Sua fama já era conhecida nos jornais, nas delegacias e entre os advogados. As moças, vítimas, eram quase sempre mulatas ou negras, humildes e ingênuas. A mãe do rapaz, contudo, sempre o defendeu com unhas e dentes de todas as acusações feitas contra o filho. Lafões havia conhecido Cassi na prisão: enquanto o primeiro havia causado distúrbios em um botequim, o segundo havia se metido com uma mulher casada e, quando descoberto pelo marido, foi perseguido com arma em punho. Cassi, com os conhecimentos que tinha, consegue libertar Lafões. Clara era o oposto de Cassi: muito recatada, raramente saía de casa e estava sempre na companhia dos pais. Por fim chegou o dia da festa de aniversário da jovem: amigos reunidos, casa cheia, grande expectativa para o baile. A menina ainda chegou a ser alertada por uma de suas colegas. 
Assim que adentrou no ressinto, Cassi fez a alegria das damas que lá estavam. O rapaz foi apresentado por Lafões aos donos da casa e à aniversariante e logo se interessou pela jovem.
A mãe, percebendo a intenção do rapaz, pediu ao marido que nunca mais levasse Cassi à casa. Joaquim imediatamente concordou com a esposa e garantiu que "não porá mais os pés na minha casa".
O modo superprotetor como a menina fora criada pelos pais, especialmente pela mãe, parece ter sido um erro que viria a culminar no trágico destino na filha. Como vivia reclusa, sem convivência, sem relações, Clara não tinha sequer uma pequena experiência da vida, sendo facilmente enganada por quem quer que fosse. Clara não reparava, por exemplo, no preconceito social despertado por ela ser mulata. Naquela altura, no subúrbio do Rio de Janeiro, uma mulata não se casava e constituía família com um homem branco. Cassi, aos poucos, foi se aproximando da moça. Um dia passou na casa da família e chamou por Joaquim, com o argumento de ter ido visitar um amigo e ter passado ali a porta. Outras vezes mandou cartas destinadas à jovem. Por fim, a moça finalmente caiu na lábia do interesseiro rapaz.
O padrinho de Clara, ao se aperceber da situação, resolve interceder para defender a afilhada, mas acaba, contudo, sendo assassinado por Cassi e um colega. Cassi chega a confessar o crime para Clara e argumenta que se tratou de um ato de amor. Frágil e iludida com a promessa de uma paixão verdadeira, Clara cede as insistências de Cassi. O tempo passa e Clara descobre que está grávida. Quando recebe a notícia Cassi imediatamente desaparece, deixando a moça sozinha e desamparada. Sem saber o que fazer, Clara, antes de abortar, decide seguir o conselho da mãe, Engrácia, e vai procurar a mãe do rapaz.
Qual é a sua surpresa quando, ao ser recebida por Salustiana, é maltratada e humilhada, especialmente devido a cor da sua pele e a sua condição social. Assim como havia acontecido em outras ocasiões, Salustiana defende o filho até o fim e praticamente acusa a pobre jovem do acontecido. Após ouvir o discurso cru e duro de Salustiana, finalmente Clara se torna consciente da sua condição social de mulher, oprimida, mestiça, pobre e faz um desabafo final à mãe.
Análise 
Não faltam influencias realistas e naturalistas na obra, porém, a sutileza com a qual Lima Barreto descreve seus cenários dá a obra muito mais objetividade, e um tom bem menos ficcional – característica das obras pré-modernistas que fundiam fatos políticos ao enredo ficcional. A linguagem informal dá dinamismo às cenas, possibilitando que a inúmeras descrições não se tornem cansativas ou enfadonhas. A narrativa é leve, dinâmica e de fácil compreensão, algo que assegurou o sucesso desse autor até os dias de hoje. Lima Barreto procura retratar o preconceito racial e social. Cassi era de uma família remediada e isso o deixava impune. A fala final de Clara (que encerra a obra) demonstra bem isso. O romance denuncia a impunidade, o preconceito, e a perda de valores morais.
Sagarana 
Guimarães Rosa
 Guimaraes Rosa: João Guimarães Rosa nasceu em Cordisburgo (MG) no ano de 1908 e faleceu no Rio de Janeiro, em 1967. Além de escritor foi também médico e diplomata.
Sua obra é ambientada no chamado sertão brasileiro, e destaca-se, sobretudo, pelas inovações de linguagem, sendo marcada pela influência de falares populares e regionais. Tudo isso, somado a sua erudição, permitiu a criação de inúmeros vocábulos a partir de arcaísmos e palavras populares, invenções e intervenções semânticas e sintáticas.
Ainda pequeno, mudou-se para a casa dos avós, em Belo Horizonte, onde concluiu o curso primário. Em 1925, matriculou-se na então "Faculdade de Medicina da Universidade de Minas Gerais", com apenas 16 anos.
Em 27 de junho de 1930, casou-se com Lígia Cabral Penna, de apenas 16 anos, com quem teve duas filhas: Vilma e Agnes. Ainda nesse ano se formou e passou a exercer a profissão em Itaguara, interior de Minas, onde permaneceu cerca de dois anos. Foi nessa localidade que passou a ter contato com os elementos do sertão que serviram de referência e inspiração a sua obra.
Serviu como médico voluntário da Força Pública, durante a Revolução Constitucionalista de 1932, indo para o setor do Túnel em Passa-Quatro (MG) onde tomou contato com o futuro presidente Juscelino Kubitschek. Posteriormente, entrou para o quadro da Força Pública, por concurso.
Aprovado em concurso, passou alguns anos de sua vida como diplomata na Europa e na América Latina.
No Brasil, foi eleito para a Academia Brasileira de Letras em 1963. Temendo ser tomado por uma forte emoção, adiou a cerimônia de posse por quatro anos. Emseu discurso, quando enfim decidiu assumir a cadeira da Academia, em 1967, chegou a afirmar sob tom sarcástico: “...a gente morre é para provar que viveu.” Faleceu três dias mais tarde na cidade do Rio de Janeiro, em 19 de novembro.
Sagarana: Publicado em 1946, Sagarana constitui uma obra-prima da produção de Guimarães Rosa; uma obra introdutória da linguagem recriada almejada pelo autor. Assim, Sagarana promove uma total renovação do regionalismo brasileiro que se afasta da perspectiva social para lançar-se às análises mais universais. 
São nove contos ou novelas, que descortinam o universo da linguagem regionalizam-te de Guimarães Rosa e recriam, na ficção, a vida de personagens saídos interior de Minas Gerais. A grandeza dessas produções narrativas não está apenas presa ao cenário, ou à linguagem, mas à riqueza da experiência humana traduzida através de personagens que parecem, em certos momentos, vencer suas fraquezas humanas para entrar para a galeria dos mitos e heróis. 
Neste universo, a paisagem integra-se ao homem, delirando junto com ele (Sarapalha), servindo de itinerário sensorial à sua cegueira (São Marcos), servindo de caminho e descaminhos (Duelo), mostrando seus avisos e perigosos (O Burrinho Pedrês) bem como possibilitando a ascensão ao plano do divino (A hora e vez de Augusto Matraga). 
As histórias e desenrolar dos fatos prendem-se a um sentido ou moral, à maneira das fábulas. As epígrafes que encabeçam cada conto condensam sugestivamente a narrativa e são tomadas da tradição mineira, dos provérbios e cantigas do sertão. 
1. O burrinho pedrês. O fazendeiro Major Saulo determina que seus homens levem uma grande quantidade de bois para comercialização em uma cidade distante. Para cumprir a tarefa, convoca seus vaqueiros mais experientes, montados em cavalos jovens e fortes. Acompanha a condução o burrinho Sete-de-Ouros, velho e fraco. Depois de uma chuva torrencial, um pequeno riacho, que foi facilmente superado na ida, torna-se rio caudaloso no retorno dos vaqueiros à fazenda. O único animal a escapar da correnteza é justamente o burrinho, que conta com sua experiência para poupar suas forças e deixar-se levar pelas águas ao invés de tentar lutar contra elas, como fizeram os outros.
2. A volta do marido pródigo (Traços biográficos de Lalino Salãthiel). O mulato Lalino Salãthiel vive no interior de Minas mas sonha com aventuras amorosas em terras cariocas. Junta algum dinheiro e parte, deixando para trás a esposa Maria Rita. Depois de algum tempo, terminam o dinheiro e a empolgação, e ele retorna. Encontra Maria Rita envolvida com o espanhol Ramiro. Lalino se envolve então nas disputas políticas locais e, com a vitória de seu candidato, consegue a expulsão dos estrangeiros. Alcança também o perdão de Maria Rita.
3. Sarapalha. Os primos Ribeiro e Argemiro vivem isolados, com seu cachorro Jiló, em Sarapalha, lugarejo do interior de Minas Gerais. Sofrem com a malária, doença que lhes provoca febre e tremedeiras. Para Ribeiro, a dor maior vem do fato de ter sido abandonado pela esposa Maria Luísa, que fugiu com outro homem. Durante as intermináveis conversas que mantêm para tentar distrair da doença, Argemiro confessa ter sentido igual amor pela moça, embora sem jamais faltar com o respeito ao primo. Ribeiro, decepcionado com o que considera uma traição, expulsa o parente de suas terras.
4. Duelo. Voltando de uma pescaria mal sucedida, Turíbio Todo flagra sua mulher Dona Silivana com o ex-militar Cassiano Gomes. Contém seu ímpeto e adia a vingança. No entanto, ao executá-la, acaba por assassinar o irmão de Cassiano, fugindo em seguida. Segue-se uma grande perseguição pelo interior de Minas, que dura até Turíbio se retirar para São Paulo. Cassiano, sofrendo do coração, é obrigado a interromper sua busca no lugarejo do Mosquito. Ali, torna-se amigo de Timpim Vinte-e-Um, homem simples que recebe o auxílio financeiro de Cassiano para comprar remédio para sua família. Em troca, Cassiano, pouco antes de morrer, pede a Timpim que vingue seu irmão. Turíbio fica sabendo da morte de seu perseguidor e retorna a Minas. No caminho para a casa de Silivana, encontra Timpim, que cumpre a promessa feita a Cassiano.
5. Minha gente. O narrador é um inspetor escolar que, de férias, visita a fazenda de seu Tio Emílio no interior de Minas. Lá, reencontra a prima Maria Irma, namorada de infância, e tenta retomar a aventura amorosa. A moça consegue fazer com que a atenção do primo seja atraída para a amiga Armanda, noiva de Ramiro, rapaz pretendido por ela. O narrador, aficionado do jogo de xadrez, se vê vítima de uma jogadora perspicaz nas estratégias amorosas. Ela consegue fazer com que Armanda se interesse pelo narrador, deixando Ramiro livre para ela. O final feliz é composto pelo duplo casamento.
6. São Marcos. Izé, o narrador, faz pouco caso das crendices populares, não perdendo a oportunidade de passar diante da casa de certo João Mangolô, negro tido como feiticeiro, para zombar de seus feitos. Durante um passeio, vê-se repentinamente cego. Seguindo certa lenda, reza a oração de São Marcos, que tem fama de ser poderosa. Orientado pelo olfato, pela audição e pelo tato, aproxima-se da casa do feiticeiro. Consegue avançar sobre este e recupera a visão no momento em que o negro retira a venda dos olhos de um boneco. Izé se despede de Mangolô e parte, agora um pouco mais crédulo.
7. Corpo fechado. No lugarejo da Laginha vive Manuel Fulô, que tem duas paixões: sua noiva Das Dores e uma mulinha de estimação, a Beija-Fulô, cobiçada por Antonico das Pedras, que tem fama de feiticeiro. Targino, um valentão local, avista Das Dores e comunica a Manuel Fulô o desejo de dormir com ela antes do casamento. Para impedir essa ofensa, Manuel teria que enfrentar o valentão. O narrador, médico local e amigo de Manuel Fulô, não encontra meio de ajudá-lo. O rapaz recorre a Antonico, que fecha seu corpo com feitiço. No duelo com Targino, Manuel escapa por milagre dos tiros que lhe são dirigidos e fere mortalmente o rival com uma pequena faca. Depois desse feito, torna-se o novo valentão do lugar.
8. Conversa de bois. O menino Tiãozinho vive um drama: seu pai, entrevado, nada pode fazer contra os amores que a esposa mantém com Agenor Soronho, condutor de carros de boi. Quando o pai morre, Tiãozinho ajuda a transportar o corpo a um cemitério próximo, com outras mercadorias. Pelo caminho, Agenor prenuncia a vida que o menino teria dali por diante, agora sob suas ordens, na condição de padrasto. A crueldade que Agenor demonstra para com o menino, manifesta-se também no trato com os bois de carga. Estes se comunicam entre si e articulam uma forma de matar o carreiro. Aproveitam-se de um cochilo de Agenor e, sacudindo o carro, derrubam-no e passam com as rodas sobre ele. Sem desconfiar de nada, Tiãozinho se desespera, enquanto os bois lançam berros triunfais.
9. A hora e a vez de Augusto Matraga. Augusto Esteves é um fazendeiro de comportamento violento. Gasta dinheiro com jogos e prostitutas, maltrata a esposa Dionóra, despreza a filha e enfrenta seus opositores com a ajuda dos capangas que o acompanham. A esposa foge com outro homem, enquanto seus empregados o abandonam, reclamando o pagamento de salários atrasados. Augusto vai tirar satisfações e acaba agredido por eles. Durante a surra, atira-se de um barranco e é dado como morto. No entanto, é encontrado por um casal de negros que cuida dele. 
Durante a convalescença, Augusto reflete sobre sua vida e se penitencia dos pecados cometidos. Recuperado, parte para uma pequena propriedade que possui no Tombador, lugar distante, passando a servir o casal de negros, trabalhando arduamente. Certo dia, aparece no lugar o cangaceiro Joãozinho Bem-Bem, que simpatiza com Augusto e o convida a participar de seu bando. Augusto recusa. Tempos depois, sente irresistível desejo de partir. Segue sem rumo, até reencontrar o bando de cangaceiros no lugarejo do Rala-Coco. Quando vê a ameaça de Joãozinho Bem-Bem de fazer mal a um homem velho e à sua família, Augusto sente que chegou sua hora deconcluir a remissão de seus pecados. Enfrenta o bando e vence o líder, morrendo em seguida. 
Morte e Vida Severina
João Cabral de Melo Neto
 João Cabral de Melo Neto: foi poeta, escritor e diplomata brasileiro. Conhecido como “poeta engenheiro”, ele fez parte da terceira geração modernista no Brasil, conhecida como Geração de 45.
Nesse momento, os escritores estavam mais preocupados com a palavra e a forma, sem deixar de lado a sensibilidade poética. De maneira racional e equilibrada, João Cabral se destacou por seu rigor estético.
“Morte e Vida Severina” foi, sem dúvida, a obra que o consagrou. Além disso, seus livros foram traduzidos para diversas línguas (alemão, espanhol, inglês, italiano, francês e holandês) e sua obra é conhecida em diversos países
O pernambucano João Cabral de Melo Neto nasceu no Recife em 6 de janeiro de 1920. Filho de Luís Antônio Cabral de Melo e de Carmen Carneiro Leão Cabral de Melo, João era primo de Manuel Bandeira e Gilberto Freyre. Passou parte da infância nas cidades pernambucanas de São Lourenço da Mata e Moreno. Muda-se com a família em 1942 para o Rio de Janeiro, onde publica seu primeiro livro, “Pedra do Sono”. Começa atuar no serviço público em 1945, como funcionário do Dasp (Departamento de Administração do Serviço Público). No mesmo ano, inscreve-se para o concurso do Ministério das Relações Exteriores e passa a integrar em 1946 o quadro de diplomatas brasileiros. Após passar por vários países, assume o posto de cônsul-geral da cidade do Porto, em Portugal em 1984.
Permanece no cargo até 1987, quando volta a viver com a família no Rio de Janeiro. É aposentado da carreira diplomática em 1990. Pouco depois, começou a sofrer com uma cegueira, fato que o leva a depressão. João Cabral morreu em 9 de outubro de 1999, no Rio de Janeiro, com 79 anos. O escritor foi vítima de um ataque cardíaco.
Morte e Vida Severina: Morte e Vida Severina retrata a trajetória de Severino, que deixa o sertão nordestino em direção ao litoral em busca de melhores condições de vida. Severino encontra no caminho outros nordestinos que, como ele, passam pelas privações impostas ao sertão. A aridez da terra e as injustiças contra o povo são percebidas em medidas nada sutis do autor. Assim, ele retrata o enterro de um homem assassinado a mando de latifundiários. Assiste a muitas mortes e, de tanto vagar, termina por descobrir que é justamente ela, a morte, a maior empregadora do sertão. É a ela que devem os empregos, do médico ao coveiro, da rezadeira ao farmacêutico.
Nota, ao vagar pela Zona da Mata, onde há muito verde, que a morte a ninguém poupa. Retrata, contudo, que a persistência da vida é a única a maneira de vencer a morte. No poema, Severino pensa em suicídio jogando-se do Rio Capibaribe, mas é contido pelo carpinteiro José, que fala do nascimento do filho. A renovação da vida é uma indicação clara ao nascimento de Jesus, também filho de um carpinteiro e alvo das expectativas para remissão dos pecados.
Morte e Vida Severina é um poema de construção dramática com exaltação à tradição pastoril. Ele foi adaptado para o teatro, a televisão, o cinema e transformado em desenho animado. Por meio da obra, João Cabral de Melo Neto, que também era diplomata, foi consagrado como autor nacional e internacional. Como diplomata, o autor trabalhou em Barcelona, Madri e Sevilha, cidades espanholas que permitiram clara influência sobre sua obra.
João Cabral de Melo Neto foi seduzido pelo realismo espanhol e confessou ter, daquela terra, o reforço ao seu anti idealismo, antiespiritualismo e materialismo. Os instrumentos lhe permitiram escrever com mais clareza sobre o nordeste brasileiro em Morte e Vida Severina e outros poemas. A obra é, acima de tudo, uma ode ao pessimismo, aos dramas humanos e à indiscutível capacidade de adaptação dos retirantes nordestinos. O poema choca pelo realismo demonstrado na universalidade da condição miserável do retirante, desbancando a identidade pessoal.
Nove Noites
Bernardo Carvalho
 Bernardo Carvalho: Nasceu no Rio de Janeiro, em 05/09/1960, e radicou-se em São Paulo, onde se tornou um jornalista conhecido. Romancista e jornalista, foi editor do “Folhetim” e correspondente em Nova York e Londres, da Folha de S.Paulo, onde mantém uma coluna semanal de crítica literária. Segundo José Castelo é o “mais radical dos ficcionistas surgidos nos anos de 1990, o mais corajoso deles... mas quase não tem leitores”. Ele mesmo se conforma com a dificuldade de se vir a ser um best-seller. “Acho difícil. Espero que o editor não saiba, mas acho difícil. Se eu chegar, acho que vai ser por acaso.” Sua estréia se deu em 1993 com o livro de contos Aberração e o primeiro romance se deu em 1995, com Onze, uma História. Tem produzido uma literatura cuja característica marcante é a mistura entre ficção e realidade sem deixar muito claro as diferenças entre ambas. Sua narrativa é composta de fatos reais e históricos misturados com ficção, que sustentam e dão veracidade aos enredos. Em 1996, publicou Os Bêbados e os Sonâmbulos e foi se firmando como escritor no Brasil e na França, onde o livro foi traduzido. O livro seguinte – Teatro (1998) –, um romance (muito bem) narrado na primeira pessoa, coloca-o num plano desvinculado da literatura feita no Brasil: “Sou o que sou, faço o que sou. Não pareço com nada do que está aí”. Em 1999, com o lançamento de As Iniciais, foi reverenciado como um dos mais importantes escritores brasileiros da nova geração. Tal importância tornou-se mais clara em 2002, com a publicação de Nove Noites, que lhe rendeu o prêmio “Portugal Telecom de Literatura Brasileira”. No ano seguinte, nova surpresa com o lançamento de Mongólia, agraciado com o prêmio da Associação Paulista de Críticos de Artes na categoria romance. A partir daí seus lançamentos não são tão frequentes, mas são constantes: O sol se põe em São Paulo(2007); O filho da mãe (2009) e Reprodução (2013).
 Nove noites: 
Nove noites conta a história do misterioso caso do suicídio de um antropólogo norte-americano em solo brasileiro, chamado Buell Quain. Quain teria se suicidado diante de índios de uma tribo localizada no Tocantins (Krahôs), em 1939. O caso foi rapidamente esquecido, por não ter sido muito difundido ao público pela mídia. Mas o narrador decide investigar as razões de Quain, 62 anos após o ocorrido, ao se deparar com a história intrigante em um artigo de jornal.
Nove noites é baseado em fatos reais: o misterioso caso do suposto suicídio de Buell Quain, um antropólogo norte-americano de 27 anos, em 1939. O fato se tornou um escândalo sem uma resolução certa e que entrou no esquecimento da mídia. Um dos pontos mais intrigantes da história é o fato de Quain ter consumido o ato diante dos índios Krahôs, uma tribo localizada no Tocantins. Nessa obra, Carvalho tenta despertar a curiosidade do leitor, atraindo-o para uma busca incessante pela verdade por trás de um acontecimento incompreensível.
Apesar de trazer personagens fictícios e outros baseados na vida real, há três principais personagens em Nove noites: Buell Quain (protagonista), o antropólogo suicida, Manoel Perna, o engenheiro local, e o jornalista, que não tem a identidade revelada.
A narrativa da obra é feita a partir dos pontos de vista de Manoel Perna e do jornalista. A visão de Perna é importante para a história porque ele teve proximidade com Buell Quain: uma relação amorosa casual que resultou em importantes confidências. Já o jornalista é quem se dedica a uma investigação extraoficial a respeito do misterioso suicídio de Quain. Um fato curioso é que muitos leitores interpretam que o jornalista é o próprio Bernardo Carvalho, contudo essa informação não é oficial. Além dos personagens citados, há uma personagem não fictícia que faz referência à mentora da Antropologia no Brasil: a própria Heloisa Alberto Torres (1895-1977).
Os acontecimentos principais da história se desenrolam por meio de uma narrativa única, que mistura elementos de ficção com a realidade. Carvalho insere, em meio às palavras, fotos e personagens imagináriose reais, utilizando o mesmo artifício em relação às localizações em espaços geográficos delimitados. Além disso, o autor utiliza seu lado jornalista para registrar as histórias por meio de uma visão “semidocumental”, sem abrir mão do privilégio da visão parcial do escritor. Porém, deixa evidente, nos agradecimentos, que Nove noites é uma obra de caráter fictício.
Relato de um certo oriente
Miltom Hatoum
Miltom Hatom: Milton Hatoum nasceu em 1952, em Manaus, onde passou a infância e uma parte da juventude. Em 1967 mudou-se para
Brasília, onde estudou no Colégio de Aplicação da UnB. Morou durante a década de 1970 em São Paulo, onde se diplomou em arquitetura na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, trabalhou como jornalista cultural e foi professor universitário de
História da Arquitetura. Em 1980 viajou como bolsista para a Espanha, onde morou em Madri e Barcelona. Depois passou três anos em Paris, onde estudou literatura comparada na Sorbonne (Paris III).
Autor de quatro romances premiados, sua obra foi traduzida em dez línguas e publicada em catorze países. Foi professor de literatura francesa da Universidade Federal do Amazonas (1984-1999) e professor visitante da Universidade da California (Berkeley/1996). Foi também escritor residente na Yale University (New Haven/EUA), Stanford University e na Universidade da California (Berkeley). Bolsista
da Fundação VITAE, da Maison des Ecrivains Etrangers (Saint Nazaire,França) e do International Writing Program (Iowa/EUA).
Em 1989 seu primeiro romance (Relato de um certo Oriente), ganhou o prêmio
Jabuti de melhor romance. Em 2000 publicou o romance Dois irmãos (prêmio Jabuti – 3º lugar na categoria romance/ indicado para o prêmio IMPAC-DUBLIN), eleito o melhor romance brasileiro no período 1990-2005 em pesquisa feita pelos jornais Correio Braziliense e O Estado de Minas. Em 2005, seu terceiro romance (Cinzas do Norte), obteve cinco prêmios: Prêmio Portugal Telecom, Grande Prêmio da Crítica/APCA-2005, Prêmio Jabuti/2006 de Melhor romance, Prêmio Livro do Ano da CBL, Prêmio
BRAVO! de literatura). Em 2008 recebeu do Ministério da Cultura a Ordem do mérito cultural. Em 2010 a tradução inglesa de Cinzas do Norte (Ashes of the Amazon/Bloomsbury,2008) foi indicada para o prêmio IMPAC-DUBLIN.
Em 2008 publicou seu quarto romance (Órfãos do Eldorado), prêmio Jabuti – 2º lugar na categoria romance. Em 2009 publicou o livro de contos A cidade ilhada. Sua obra já foi traduzida em 12 línguas e publicada em 14 países. Desde 1998 mora em São Paulo, onde é colunista do Caderno 2 (O Estado de S. Paulo) e do site Terra Magazine. 
Relato de um certo oriente: Relato de um certo Oriente, de 1989, é um relato composto de outros relatos distribuídos em oito capítulos, os quais se assemelham ou resgatam a forma oral do narrar, em que uma história é evocada para completar outras à medida que é um ou outro narrador quem detém a posse de certa informação que vai esclarecer uma outra apontada anteriormente ou outra que ainda virá.
A trama se passa numa cidade marcada pelo hibridismo cultural e atravessada pelas idéias de fronteira e trânsito: Manaus, uma capital que se separa da floresta pelas águas fluviais e se situa num estado que faz divisa com três outros países. No livro também estão presentes a diversidade de costumes, línguas, e a convivência entre indivíduos de diferentes nacionalidades.
Uma mulher visita a cidade de sua infância depois de ter passado quase 20 anos fora, e a partir dos acontecimentos que se desenrolam após sua chegada, ela vai relembrando e descobrindo histórias do seu passado e da família que a criou. Ao retornar a Manaus, após ter permanecido internada em uma clínica de repouso em São Paulo, a narradora chega justamente na noite que precede o dia da morte de Emilie, sua mãe adotiva.
Inicia-se, então, um outro trabalho, o de recuperar Emelie através da memória, não apenas a sua, mas também a de outros personagens que entrelaçaram seu percurso de forma significativa ao daquela família: o filho mais velho, o único a aprender o árabe e que também irá se distanciar de todos, ao mudar-se para o sul; o alemão Dorner, amigo da família e fotógrafo; o marido de Emelie, recuperado, mesmo depois de morto, através da memória de Dorner, e Hindié Conceição, amiga sempre presente, a partilhar com a conterrânea a solidão da velhice. Muitas vozes a compor um mosaico, nem sempre ordenado, nem sempre claro naquilo que revela, mas sobretudo rico em pequenos detalhes de extrema significação.
No intuito de enviar uma carta ao irmão, que se encontra em Barcelona, a fim de lhe revelar a morte de Emilie, acaba escrevendo um relato com depoimento de membros da família e de amigos, conforme o irmão lhe pedira na última correspondência que lhe enviara. Esses testemunhos proporcionam uma verdadeira viagem à memória, com regresso à infância e aos fatos marcantes da vida familiar.
Logo no primeiro capítulo, a narradora nos descreve uma parte da casa na qual acabara de acordar, em Manaus. A descrição das duas salas contíguas é repleta de marcas identificatórias do Oriente, indicando uma representação estilizada desse território: tapete de Isfahan, elefante indiano e reproduções de ideogramas chineses são alguns dos objetos de consumo dos ocidentais, tomados como símbolos, que estão presentes nos cômodos.
As histórias falam das possibilidades e das dificuldades do trabalho com a memória, das tensões e da convivência de culturas, religiões, línguas, lugares, sentimentos e sentidos diferentes das personagens em relação ao mundo. A casa de Emilie, matriarca da família na narrativa do Relato, é um microcosmo onde estas tensões aparecem e são vividas cotidianamente.O que mantêm a tensão no romance é a narrativa centrada em incidentes – o atropelamento de Soraya Ângela, o afogamento de Emir.
A obra, em sua estrutura e estratégia de composição, parece transitar e oscilar entre a narração, em que a figura do narrador é extremamente importante e o relato é feito principalmente com base nas tradições orais, como uma tentativa de rememoração das experiências coletivas do passado, e o romance, que apareceria como um gênero literário decorrente das transformações da sociedade capitalista, que destrói cada vez mais a possibilidade que a experiência comum viva e se revele no relato dos narradores.

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