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Universidade Federal Fluminense Instituto de História História do Brasil Docente: Carlos Gabriel Guimarães Discente: Angelo Aguirre REIS, João José. "Nos achamos em campo a tratar da liberdade": a resistência negra no Brasil oitocentista. In: MOTA, Carlos Guilherme. Viagem incompleta. A experiência brasileira (1500-2000). São Paulo, Editora SENAC,2000. p. 241- 259. O artigo tem como foco discorrer sobre a resistência escrava em vários aspectos, tendo como cenário principal o Brasil oitocentista. Durante este século, João José Reis observa a expansão do tráfico negreiro no Brasil e, ao decorrer do texto, aponta a influência de outras revoluções - como a francesa na Europa - a haitiana na América e seus efeitos no Brasil. O autor aponta que as características específicas dos escravizados vindos da África variam de localidade para localidade, como também os crioulos nascidos no Brasil, que tinham suas características distintas, no entanto, por mais que as caraterísticas fossem distintas, o objetivo era comum: a liberdade. O ponto inicial da problemática é analisar que no Brasil do século XIX ocorreu uma expansão em diversos pontos, nas cidades, na agricultura e no tráfico de escravizados. O elemento principal desses três pontos é a agricultura, que tem como principal ativo o açúcar. Até então o cenário açucareiro do Brasil não obtinha crescimento, visto que o principal fornecedor de açúcar do mundo era a colônia de São Domingos que era pertencente à França. A mudança ocorre após a Revolução Haitiana, pois, devido a isso, o agora Haiti sai de cena como o principal fornecedor de açúcar e abre espaço para os concorrentes aumentarem suas demandas. Nesse contexto, os engenhos brasileiros oferecem em maior quantidade seu açúcar e, como consequência direta, também intensificam o comércio de escravos para trabalhar nos engenhos. O autor cita que a expansão açucareira durou até 1830, pois após isso a demanda focou no açúcar cubano à base de beterraba. O aumento da circulação de escravos em portos brasileiros se deve não só ao açúcar, mas também a ampliação de campos de algodão, da indústria têxtil, das fazendas de gado, do abastecimento interno, das plantações de cereais e, principalmente, das lavouras de café. O destaque ao café se deve a facilidade de seu cultivo nos mais variados territórios e a alta demanda do mesmo. A concentração do café, após 1830, foi o Vale do Paraíba e o oeste paulista. Nesse viés, com a escravidão espalhada em todo territorio - com destaque para Rio de Janeiro, Recife e Salvador - o século XIX marcou o apice da escravidão a nivel nacional com mais de 1.5 milhão e para o Rio de Janeiro o recorde de população escravizada no hemisfério, que sozinho representava mais de 80 mil escravizados. A difusão de escravizados marca a família, isso é, agora existiam diversos pequenos escravistas com escravos. A primeira parte do texto nos mostra a diversidade de serviços feitos com a mão de obra de escravizados, desde o seu aumento após a revolução haitiana até o seu ápice de 1.5 milhão até 1850. O alto número de escravizados deixou suas características marcadas por diversas partes do Brasil, desde costumes, culturas e a miscigenação. No decorrer da próxima parte, o autor foca no eixo central do texto: a resistência escrava Em segundo momento, o autor apresenta a influência da elite formada em Coimbra e o seu papel de classe dominante, nessa visão o autor analisa: ‘’Estas ganharam a independência do país, impuseram seu estilo na formação do Estado nacional, conciliaram discursos liberais e civilizatórios com a manutenção da escravidão’’ ( p. 3). A classe dominante pode impor seu modelo, no entanto o lado afetado dos escravizados não aceitam sem resistências e rebeliões. Nessa pespectiva, o autor se atenta a destrinchar que muitas das rebeliões não tinham como intuito destruir, mas, sim, reformar a escravidão. Portanto, as reivindicações visavam melhores condições de trabalho, facilidade para comercializar, poder celebrar sua cultura e religião e, nesse intuito, o objetivo era diminuir a repressão e alguns direitos mínimos de forma a serem aceitáveis aos escravizados . Durante o final do século XVIII e durante a expansão do tráfico escravo comentado no primeiro ponto, as revoltas se intensificaram, como comenta João Reis em ‘’Uma proporção alta de escravos na população e, entre estes, um maior número de africanos, e mais ainda, de africanos do mesmo grupo étnico, reforçava a identidade coletiva e estimulava a consciência de força diante das camadas livres.’’ ( p. 4). Continuamente, as regiões em que os escravizados eram formados majoritariamente por homens, isso quer dizer, homens sem a possibilidade formar famílias estavam mais propensos a revoltas, como na Bahia do século XIX, em que ocorreram diversas revoltas formadas por Haussás e Nagôs, sendo a mais conhecida a Revolta dos Malês em 1835. Em complemento ao cenário comentando, esses grupos já estavam acostumados com guerras, não à toa, um dos principais meios de vendas de escravizados eram os prisioneiros de guerra. Por outro lado, o Rio de Janeiro era formado predominantemente por pessoas de origem Banto, em outras palavras, eram escravizados jovens e sem experiência de guerra e, nesse sentido, facilitando o controle contra rebeliões. Os grupos comentados até agora foram transportados a partir da África, mas temos o grupo dos crioulos, esses, por sua vez, são nascidos no Brasil. Os crioulos eram mobilizados, fugiam, formavam quilombos e faziam revoltas com frequência. José Reis cita alguns movimento no Rio de Janeiro e em areás do nordeste entre 1821 e 1831 que serviam como motins anti-lusos, com frequência também se observam motins durante o período final da escravidão. No cenário mais amplo, a Revolução Francesa e a Revolução Haitiana estimulavam de forma indireta e direta o ambiente no Brasil durante o século XIX, como por exemplo, no Rio de Janeiro, os medalhões usandos por milicianos negros estapando o rosto de Jean-Jacques Dessalines, na Bahia, em 1814, os comentários espalhados no boca a boca no sucesso dos escravizados em São Domingos, no Sergipe em 1824, vivas ao ‘’Rei do Haiti’’, a Conspiração dos Alfaiates de 1798 que deixou claroa a influência francesa. Esses exemplos demonstram a disseminação do sucesso das revoluções e o simbolismo que as mesmas serviam, não só como força para resistência, como também demonstravam que era possível vencer. Em contrapartida, se criou o medo do haititismo por parte dos setores dominantes, o medo de uma nova revolução acontecer. Voltando ao cenário brasileiro, José Reis argumenta que os conflitos entre homens livres, no período da independência, favoreceu a rebelião, haja visto que, a fragilidade da vigilância dos senhores e a menor repressão pelos militares, pois no momento apaziguar as rebeliões não era o essencial. Outrossim, haviam alforrias por interesse, ou seja, aqueles que participassem das guerras e saíssem vivos teriam sua liberdade. Entretanto, esse abolicionismo era um preço caro, limitado e sem a certeza de serem realmente recompensados no final. Seguidamente, a desunião entre os homens livres possibilitou que outras parcerias, como em quilombos do Mato Grosso - localidade próxima a Guerra com o Paraguai que acontecia naquele momento - homens livres, desertores e escravos fugidos se juntaram. A guarda militar não muito fazia, devido a concentração estar na guerra e, dessa forma, fortalecendo a resistência e deixando os senhores escravistas em uma situação delicada. Ao longo da trajetória, os escravizados se organizavam coletivamente e formavam resistência, conjuntamente também estavam atentos aos noticiários que dizem respeito a sua situação. Em um recorte de fonte primária, o autor apresenta o caráter de discussão, de atenção às leis e , a partir disso, baseiam suas ações e as interpretações daquilo que liam. A interpretação aberta causava conspirações e mais rebeliões em váriasregiões, como em Campinas, Espírito Santo, São Mateus e Campos. Os episódios são variados, contudo foram resultados de interpretações das mais diversas leis e boatos. Em 1871, o Estado entrava nas relações escravistas, em outras palavras, baseado em leis, os escravos poderiam recorrer a um tribunal para pedir sua alforria ou também serem alforriados por valores mínimos. Muitos dos escravos poderiam se beneficiar desse novo formato de alforria, visto que diversos tinham sido importados da África depois de 1831 - Baseado na Lei Feijó de 1831, eles poderiam ir a júri comprovar a irregularidade da sua situação e serem soltos -. A problemática estava em encontrar homens livres conhecedores das leis (advogados) para defender os escravizados interessados em ir a júri. Um dos mais conhecidos é o advogado Luiz Gama, que não só entendia das leis como percebia as brechas das leis e tinha boa desenvoltura argumentativa para provar seu ponto. Luiz Gama defendeu e ganhou diversos casos de alforria e espalhava seus casos na imprensa, este mecanismo disseminava entre os escravizados a chance de alforria em um meio legal. O acrescimento da justiça como alforria foi válido, não suficiente. As alforrias ainda eram limitadas e individuais, apesar de legais. Dito isso, após 1871, os casos de fugas e formação de quilombos continuavam se intensificando em várias partes do Brasil. Junto a isso, a imprensa sofria um processo de censura, logo, a ampliação de quilombos ou o aumento nos assassinatos de feitores e senhores eram minimizados. Um dos casos marcantes sem repercurssão na época foi o assassinato de uma de uma família inteira de um dono de fazenda, isso aos gritos de ‘’ Mate branco e ‘’ Viva a liberdade. A situação da escravidão aos poucos chegava no seu cumulo. Chegando os últimos anos de escravidão, José Reis comenta ‘’Nos últimos anos da escravidão, a população livre, anteriormente dividida em torno de outras questões -- os conflitos luso-brasileiros, regionalistas, federalistas, republicanos --, agora estava dividida em torno da questão específica da escravidão.’’ (p. 12). A divisão levou a diversas alianças de escravos e membros da elite, setores abolicionistas e, assim, fortalecendo a causa abolicionista e levando a inevitavel criação da lei de 1888, de abolição da escravidão. Em suma, o texto discute durante seu percurso uma historiografia que demonstra o papel ativo dos escravizados, que aos poucos formavam sua resistência e, mesmo sem muito conhecimento e recursos político, se mantinham atentos aos noticiários, às leis e delas faziam suas interpretações até as brechas das leis que culminaram em diversos pedidos de alforrias vencidos. A conclusão feita por José Reis tem ótima colocação: ‘’Fizeram política sim, mas com uma linguagem própria, ou com a linguagem do branco filtrada por seus interesses, ou ainda combinando elementos da cultura escrava com o discurso da elite liberal.’’ (p. 16). Embora tivessem ocorrido mais derrotas e o Brasil ter sido o último país a abolir a escravidão do hemisfério, isso foi feito a base de resistencia e esforço dos escravizados.
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