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II JOINTH, 20 E21 DE AGOSTO DE 2012. PÁG.74 a 87 O LIVRO DIDÁTICO E O ENSINO RELIGIOSO Claudino Gilz RESUMO A presente pesquisa tem como principal objetivo identificar a importância do livro didático tanto para o desenvolvimento das aulas de Ensino Religioso como para o alcance da intencionalidade pedagógica dessa disciplina, seja para as etapas da educação básica, seja para a formação do Professor que atua em sala de aula. Apresenta análise de dados de uma pesquisa de campo que vem sendo desenvolvida desde 2005 e que ainda encontra-se em andamento. Identifica, por meio de uma breve análise empreendida, o livro didático como um dos recursos para o desenvolvimento do processo de ensino e aprendizagem de temas oriundos do fenômeno religioso nas suas mais diversas manifestações, o que postula a articulação de alguns conhecimentos relacionados principalmente à concepção de educação, à proposta metodológica, respeito à diversidade cultural religiosa salvaguardado pela Lei 9.475 (22/7/1997). Palavras-chave: Ensino Religioso. Livro Didático. Formação docente. Introdução Em um contexto sociocultural heterogêneo, plural e em constante movimento, desde meados da década de 90 do século XX, o Ensino Religioso não é mais no Brasil mera catequese ou doutrina de uma determinada Religião. Muito menos os professores e alunos dessa disciplina podem dispor de livros didáticos elaborados à luz de uma concepção confessional. Não há atalhos quando se está diante de um desafio como esse: compreender a importância do livro didático em relação aos diversos desafios que geram dificuldades à disciplina de Ensino Religioso no intuito de atender com excelência as prerrogativas escolares, curriculares, pedagógicas, fenomenológicas, cívicas da Lei 9.475, de 22/7/1997. II JOINTH, 20 E21 DE AGOSTO DE 2012. PÁG.74 a 87 O Ensino Religioso é, desde então, uma disciplina escolar cujo objeto de estudo converge para as possibilidades de apreensão e descrição do fenômeno religioso nas suas mais diversas manifestações e contextos. O estudo, a análise e a discussão sobre o livro didático tem se dado em diferentes esferas da sociedade: âmbito político, comercial, familiar, escolar, universitária, curricular e formação docente. A abordagem do tema O Livro Didático e o Ensino Religioso decorre aqui a partir de uma esfera escolar, curricular e formação docente. Aspectos como definições, características ou funções do livro didático de Ensino Religioso, contexto atual da sala de aula, história da disciplina de Ensino Religioso, legislação educacional vigente, concepções de educação, currículo escolar, critérios para a proposição de temas de ensino e aprendizagem previstos a etapa da Educação Básica e tantos outros dizem respeito ─ direta ou indiretamente ─ à abordagem do referido tema. Nesse sentido, o presente trabalho tem como objetivo identificar a importância do livro didático tanto para o desenvolvimento das aulas de Ensino Religioso como para o alcance da intencionalidade pedagógica dessa disciplina. O Livro Didático e o Ensino Religioso: o contexto histórico e educacional Não é de hoje que o Ensino Religioso apresenta-se como uma pergunta para os alunos, os pais de alunos, para os profissionais da educação e, principalmente, para a sociedade. Sim! por que estudar Ensino Religioso? E bastaria apenas responde que o Ensino Religioso é importante para reavivar valores que com o tempo foram sendo esquecidos, necessário para compreender o ser humano de uma maneira mais ampla, ou imprescindível para identificar a dimensão sagrada e transcendente da vida? II JOINTH, 20 E21 DE AGOSTO DE 2012. PÁG.74 a 87 Tanto o livro didático como o Ensino Religioso tem, em si, uma história e um contexto que não podem ser ignorados. Especificamente sobre o Ensino Religioso, o momento histórico a ser considerado diz respeito à promulgação da Lei 9.475, de 22/7/1997, que estabeleceu as prerrogativas dessa disciplina para o âmbito da educação básica: faz parte da grade curricular das escolas e da formação elementar do aluno; salvaguarda do respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil; e isenção de qualquer abordagem ou enfoque proselitista em sala de aula. Tanto o trabalho docente como o livro didático dessa disciplina de estar em sintonia com essas referidas prerrogativas da legislação educacional em vigor. Já se vão mais de 15 anos em que tais prerrogativas convergem para uma questão: e com chegar a tanto? As mudanças e transformações em todos os setores da sociedade têm sido fenômenos constantes: instabilidades econômicas, políticas, ambientais etc. Vive-se um tempo de passagem, indefinição, angústias e expectativas: da sociedade que se conhece para a que ainda não se configurou. Constata-se que principalmente o fenômeno da globalização, o jogo de interesses da mídia de massa e até mesmo a apatia de muitos líderes religiosos acabam contribuindo para uma significativa relativização da importância do cultivo da dimensão religiosa do ser humano na atualidade. Disso decorre, segundo Chassot (2011), fatores tais como: ─ uma certa alienação à condição de interdependência global. ─ apatia e descomprometimento com o coletivo. ─ enfraquecimento da pertença religiosa e vácuo de valores. ─ surgimento de novas agências produtoras do sagrado, ou seja, de felicidade, sonhos, desejos, necessidades, indução ao consumo desmedido. ─ por um lado aproximação e, por outro lado, conflito ou ínfima cooperação entre as Religiões. ─ interconectividade versus virtualização sem limites da dimensão social da vida. ─ tendência do cidadão se voltar para o próprio mundo. II JOINTH, 20 E21 DE AGOSTO DE 2012. PÁG.74 a 87 ─ propensão dos pais se engajarem para garantir a carreira dos filhos. ─ estetização demasiada da vida. ─ busca de emoções fortes versus satisfação imediata. ─ nova relação com o corpo (virou vitrine, objeto, esteriotipado com tatuagens, piercing...), em detrimento do sentido da doação, da disposição para o sacrifício e da noção de templo do Transcendente. ─ adolescentes e jovens encontrando-se tais como manadas gregárias nos shoppings centers, nas calçadas ou nos eventos públicos. ─ dispensa de consulta à instituições mediadoras (Religiões,...). Em relação a esses e a tantos outros aspectos desse atual contexto histórico e educacional, o Ensino Religioso não pode tudo mas contribuir, de acordo com Junqueira (2008), contribuir por meio de vários encaminhamentos didáticos e pedagógicos em sala de aula: ─ trabalhar a sensibilidade para o coletivo, o religioso. ─ resgatar o sentido da vida e sua sacralidade. ─ educar, cativar, moldar o caráter, mudar o destino de certas tendências. ─ apresentar razões e motivos para se aderir a uma causa, a uma confissão religiosa ─ formar para o discernimento. ─ apontar alternativas e/ou volta a princípios esquecidos. ─ ensinar que todos são provenientes de uma mesma origem, ou seja, congênitos do mesmo Mistério Divino e, por isso, chamados a viver como irmãos. ─ formar cidadãos capazes de resistir às dinâmicas de desumanização, guerra, violência, preconceito, intolerância. II JOINTH, 20 E21 DE AGOSTO DE 2012. PÁG.74 a 87 Desses aspectos depreende-se, segundo Corrêa (2008) uma constatação: o ser humano é, a cada instante, a visibilidade do que ama, busca e se propõe alcançar. Mais do que o sensorial, o intuitivo, o afetivo ou o racional, o religioso é capaz de conduzir o ser humano à excelência no modo de ser, de relacionar-se com seus semelhantes, com a criação e com o Transcendente (FÓRUM,... 1998). O religioso, assim como a inspiração ao poeta, emerge no ser humano a partir do discernimento, da livre adesão e vivência de uma crença. O religioso é intrínseco ao ser humano e abrange todos os aspectos doseu viver. Pode definir a intensidade do seu encantamento e de sua realização. Pode ajudá-lo a reconhecer sua importância e sua pequenez em relação ao mistério da origem e do destino de todas as criaturas. O Ensino Religioso, enquanto disciplina escolar, apresenta-se principalmente como uma oportunidade de: ─ descobrir respostas às perguntas que toda criança, adolescente, jovem ou adulto traz consigo em relação ao mistério divino que perpassa a história humana no conjunto de suas etapas e aspirações. ─ compreender o sentido da vida humana a partir de sua dimensão sagrada e transcendente. ─ reavivar princípios e valores que com o tempo foram sendo esquecidos ou relativizados. ─ identificar o ideário de transformação e de felicidade humana que cada Tradição Religiosa busca propor aos seus seguidores. ─ conhecer e aprender a conviver fraternalmente com as diferenças em prol da paz no espaço escolar, familiar e social. ─ realizar com propriedade a transposição didática dos saberes inerentes ao fenômeno religioso. ─ atender às prescrições da atual lei maior da educação nacional. ─ conhecer com maior propriedade a diversidade de manifestações que configuram o fenômeno religioso. II JOINTH, 20 E21 DE AGOSTO DE 2012. PÁG.74 a 87 Se o currículo escolar abrange todas as disciplinas (Matemática, Português, História, Arte, Geografia, Ciências,...), em cada Ano Letivo (bimestre/trimestre), o Ensino Religioso, assim como cada uma dessas disciplinas, se apresenta aos alunos com temas, objetivos, atividades de aprendizagem e de avaliação. Os Parâmetros Curriculares Nacionais de Ensino Religioso, publicados no ano de 1998, vieram a ser uma das fontes bibliográficas a servir de referência à elaboração dos volumes didáticos de Ensino Religioso, particularmente ao que diz respeito à proposição de temas para a Educação Infantil e o Ensino Fundamental segundo cinco eixos: — o eixo Culturas e Religiões (contemplando aspectos do fenômeno religioso, ou seja, função e valores das Tradições Religiosos, relação entre Tradição Religiosa e ética humana, existência histórica e destinação humana nas diferentes culturas etc.). — o eixo Textos Sagrados e/ou Tradições Orais (contemplando o ensino e a aprendizagem dos registros escritos ou orais das Tradições Religiosas, suas narrativas sagradas e seus contextos culturais). — o eixo Teologias (a compreender o estudo sobre o conjunto de afirmações e conhecimentos elaborados sistematicamente pelas Tradições Religiosas, principalmente a respeito das divindades, verdades de fé, vida além da morte, a realidade última da existência humana, entendida como ressurreição, reencarnação, ancestralidade ou nada além da morte). — o eixo Ritos (a abranger o estudo sobre as práticas celebrativas das Tradições Religiosas, seus ritos, seus símbolos e suas espiritualidades). — o eixo Ethos (a fazer menção ao conjunto de valores que embasam o sentido do viver humano e o princípio da alteridade sob a perspectiva religiosa propagada pelas tradições). O livro didático é uma fonte de pesquisa com inúmeras possibilidades de análise e de constatações científicas: conjunto temático, concepção de educação, metodologia, linguagem, contextualização, sensibilidade aos conhecimentos prévios do professor e do aluno sobre o tema de estudo etc. II JOINTH, 20 E21 DE AGOSTO DE 2012. PÁG.74 a 87 O Ensino Religioso é um conhecimento humano e, enquanto tal, disponível à sociabilização escolar, salvaguardando-se a liberdade de escolha e/ou de expressão religiosa do estudante (saber de si) e o respeito às diferenças (saber do outro). Sendo assim, em termos de funções que seriam próprias de um livro didático de Ensino Religioso, é preciso averiguar se responde aos seguintes questionamentos: ─ comunga do ideário educacional proposto pelos Parâmetros Curriculares Nacionais sobre a disciplina de Ensino Religioso? ─ enfatiza a importância de se ter acesso ao conhecimento dos elementos básicos que compõem o fenômeno religioso, a partir das experiências religiosas percebidas no contexto do estudante? ─ propõe-se a mediar a professores e alunos a descoberta do sentido da vida e da importância de uma postura ética a partir do cultivo da dimensão religiosa? ─ remete para a análise da contribuição das Tradições Religiosas na promoção das diferentes culturas e manifestações socioculturais? ─ promove uma cultura de paz sustentada por uma proposta educacional voltada a uma convivência pacífica e fraterna entre os diversos? ─ propicia diferentes leituras da realidade e dos fenômenos religiosos, sem exigir que se faça uso dele de modo catequético, sequencial, rígido, exclusivo, mecânico ou isento de critérios pedagógicos e curriculares? ─ apresenta-se como um dos recursos didáticos e não o único, passível de constantes complementações no pleno uso da autonomia e criatividade docente? ─ aponta para uma finalidade específica: o processo de ensino-aprendizagem escolar? ─ é capaz de instaurar interações entre dois leitores também específicos: o professor e o aluno? — apresenta-se como material didático capaz tanto de balizar o processo de ensino e da aprendizagem sobre os mais diversos aspectos que dizem respeito às Tradições Religiosas e sua presença no mundo? ─ oportuniza aos leitores escolares (o professor e o aluno) galgar uma compreensão elementar dos temas que compõem o plano curricular da disciplina de Ensino Religioso? ─ dispõe de uma abordagem integrada e contextualizada dos temas, principalmente por meio de conceitos, da linguagem clara, compreensível e o mais próxima possível da vivência do aluno? ─ dispõe de um desenvolvimento dos conteúdos por meio de situações- problema, de uma proposta metodológica em sintonia com a proposta pedagógica da escola em que se atua? II JOINTH, 20 E21 DE AGOSTO DE 2012. PÁG.74 a 87 ─ busca levar os aprendizes escolares a desvendar livre e criativamente as diversas possibilidades de compreensão do tema que estiver em questão? ─ atende a intencionalidade de proporcionar conhecimentos iniciatórios e específicos sobre os temas referentes ao universo religioso? ─ oportuniza as atividades de aprendizagem de forma sistemática e propositiva, suscitando o equilíbrio entre estudo e aprendizagem, curiosidade e pesquisa, conhecimento e respeito à diversidade religiosa? ─ suscita a análise de aspectos que se interpõe na atividade educacional, a saber, fenômenos como o tempo de trabalho dos professores, o número de alunos, os saberes prévios dos estudantes, as linguagens, as Tradições Religiosas, os sentimentos coletivos, as culturas, as diversas fontes de pesquisa, os fatos do cotidiano e o específico da disciplina de Ensino Religioso? ─ pressupõe um professor capaz de articular aspectos como temas e contextualização dos mesmos, saberes didáticos e curriculares, sensibilidade religiosa e respeito à alteridade, noções sobre as diversas Tradições Religiosas e consideração à faixa etária dos estudantes? ─ pressupõe a superação do autoritarismo docente, próprio da ‘educação bancária’, na elaboração do conhecimento sobre um tema oriundo do universo religioso? ─ pressupõe uma prática docente em Ensino Religioso referendada por saberes relacionados ao contexto da prática pedagógica e do cotidiano dos alunos, por um planejamento prévio das atividades de ensino e uma condução flexível das atividades em sala de aula nas suas múltiplas possibilidades, inclusive o diagnóstico das aprendizagens desenvolvidas? ─ reitera uma prática docente interativa com, sobre e para discentes que são, enquanto pessoas humanas, também portadoras de linguagem, afetividade, personalidade, autodeterminações, habilidades cognitivas, posturas axiológicas, dotados de atitudes de iniciativa e/ou de resistência às proposições docentes (TARDIF, 2005)? O livro didático de Ensino Religioso precisaser compreendido como um dos recursos constitutivos da formação humana, acadêmica e religiosa dos sujeitos escolares na última etapa da Educação Infantil e nos anos do Ensino Fundamental (GILZ, 2009). E assim o é à medida que ele articula intencionalidade pedagógica, abordagem dos conteúdos das Tradições Religiosas cientificamente averiguados, linguagem contextualizada, estímulo à pesquisa e aspectos metodológicos em sintonia com a proposta pedagógica das escolas. II JOINTH, 20 E21 DE AGOSTO DE 2012. PÁG.74 a 87 O Livro Didático e o Ensino Religioso: percepções e inquietações de uma pesquisa ainda em andamento Desde o ano de 2005, uma pesquisa sobre as potencialidades e os limites do livro didático de Ensino encontra-se em andamento. A Coleção Redescobrindo o Universo Religioso foi um dos primeiros materiais didáticos dessa disciplina a ser lida e analisada. O que se pode constatar? A Coleção Redescobrindo o Universo Religioso foi elaborada numa época em que nos mais diversos espaços escolares (públicos e privados) imperavam diversas temeridades: a passagem do modelo confessional de Ensino Religioso para o modelo fenomenológico (a partir da diversidade) iria de fato ser implantado? Quais os recursos didáticos que ajudariam o professor de Ensino Religioso a desenvolver processos de ensino e aprendizagem em sala de aula, sem tender ao proselitismo e a respeitar a diversidade cultural religiosa do Brasil? De que modo seria possível desenvolver a aprendizagem de um conjunto de temas (currículo), contemplando o ponto de vista a respeito desses mesmos temas em várias Tradições Religiosas, e não mais somente discorrendo sobre o ponto de vista de uma delas? Como salvaguardar, por meio do Ensino Religioso, a intencionalidade de educar as gerações escolares para uma convivência respeitosa, fraterna e pacífica, sem deixar a desejar na formação de novos cidadãos conscientes, criativos e sujeitos da sua história? O Ensino Religioso ainda estaria, segundo o que prescrevia a referida Lei 9.475, ainda a contribuir para o desenvolvimento da dimensão religiosa do ser humano e o discernimento do sentido de sua vida, de suas ações e propósitos? Como seria possível articular objetivos, conteúdos, metodologias e livros didáticos, sendo que nessa época ainda não havia nas livrarias nenhum novo livro didático de Ensino Religioso capaz de atender as prerrogativas da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional? Fato é que os livros didáticos de Ensino Religioso oferecidos nas livrarias do Brasil não mais atendiam à nova legislação e nem à diversidade cultural religiosa em sala de aula. Pelo que se pode perceber, a necessidade de elaborar um material didático próprio para o Ensino Religioso era, então, uma necessidade. E a Coleção Redescobrindo o Universo Religioso acabou exercendo um certo protagonismo nesse sentido. Após a publicação dos volumes da Coleção, outros materiais didáticos também passaram a ser elaborados e oferecidos às escolas do país. II JOINTH, 20 E21 DE AGOSTO DE 2012. PÁG.74 a 87 O que nos objetivos dessa mencionada pesquisa sobre os volumes didáticos da Coleção Redescobrindo o Universo Religioso não estava contemplado e que continua gerando inquietação para novos estudos e análises? Trata-se do aspecto que diz respeito à concepção de educação dessa Coleção: seria tradicional, escolanovista, tecnicista, ou o quê? De acordo com José Carlos Libâneo (1985), os objetivos da metodologia tradicional consistem na preparação intelectual e moral dos estudantes para assumir sua posição na sociedade, tendo em vista formação clássica, humanista e científica. Os processos de ensino baseiam-se no repasse descontextualizado de conteúdos tidos como verdades aos estudantes, por meio de exposição verbal e exercícios de memorização. Predomina em tal metodologia a autoridade do professor a postular uma atitude receptiva dos estudantes da ‘verdade’ sobre o tema a ser absorvida por eles. Pressupõe-se que a capacidade de assimilação da criança idêntica à do adulto, apenas menos desenvolvida. Entende e propõe um processo de aprendizagem baseado numa progressão lógica, estabelecida pelo adulto, sem respeitar as características próprias de cada idade. Infelizmente, o aluno acaba aprendendo quase sempre de forma receptiva, mecânica, por meio de exercícios memorização e decoreba. A metodologia oriunda do ideário da Escola Nova encontra-se centrada no estudante e acentua, por sua vez, a adaptação progressiva do mesmo ao contexto social (costumes, comportamentos, percepções,...), o autodesenvolvimento, a aprendizagem contextualizada, um processo ativo (protagonismo do aluno) de construção e reconstrução do conhecimento. Procura-se oportunizar ao estudante os meios para buscarem por si mesmos os conhecimentos, seja por experiências, situações-problemas ou desafios cognitivos do cotidiano dos mesmos. Estudante esse compreendido como participante, interativo, curioso, interessado e protagonista do processo de aprendizagem e aquisição do conhecimento. A ênfase metodológica converge para o aprender fazendo por meio de tentativas experimentais, pesquisas e descobertas, na qual o papel do professor consiste em ajudar o aluno a se organizar, a sensibilizar e a fomentar o interesse do mesmo pela aprendizagem. Tal metodologia tem como principal objetivo levar o estudante a agir em função do alcance de metas cognitivas e de situações do seu cotidiano. II JOINTH, 20 E21 DE AGOSTO DE 2012. PÁG.74 a 87 A metodologia tecnicista ─ introduzida no Brasil no final dos anos 60 com o objetivo de adequar o sistema educacional à orientação político-econômica do regime militar, ou seja, inserir a escola nos moldes do sistema de produção/otimização capitalista ─ tem como objetivo modelar o comportamento e a eficiência do ser humano por meio de técnicas educacionais específicas. Propõe um processo de aquisição de habilidades, atitudes, eficiências, dados científicos, precisos e objetivos tidos como úteis à integração futura do estudante no mercado de trabalho. O ensino dos conteúdos decorre de informações observáveis, mensuráveis, validadas pelo método científico etc., sistematizadas nos manuais, nos módulos e dispositivos de ensino. Privilegia-se procedimentos e técnicas que assegurem tanto a transmissão como a recepção de informações referendados por objetivos instrucionais e pelo apreço à ortodoxia científica. O professor é compreendido como uma ponte entre a verdade científica do conteúdo e o estudante, a quem repassa de forma objetiva as informações. A ênfase converge para a importância de se adquirir desempenho e eficiência, mesmo que à custa de um ensino diretivo dado à estímulos e à obtenção de respostas condicionadas. Da leitura e análise dos volumes apenas da primeira edição da Coleção Redescobrindo o Universo Religioso, identificou-se aquilo que foi não só uma preocupação inicial dos autores, mas uma potencialidade metodológica de cada um dos referidos volumes: considerar, na disposição e no desenvolvimento didático dos temas, o pressuposto de que os conhecimentos oriundos do fenômeno religioso não servem ao proselitismo, mas à sensibilização do educando para o mistério, à leitura da linguagem mítico-simbólica e ao diagnóstico da manifestação da presença do Transcendente nas mais diferentes Tradições Religiosas. Identificou-se também os volumes didáticos inerentes à Coleção Redescobrindo o Universo Religioso, já na sua primeira edição, mostravam-se: substratos para a construção da experiência religiosa do professor e do estudante; portadores de uma intencionalidade educativa não indutiva e nem bitoladora dos pensamentos ou da autonomia docente em mediar o processo de construção do conhecimento a respeito das manifestações do fenômeno religioso; portadores também de uma organização e um desenvolvimentometodológico propositivo, sensível à faixa etária dos estudantes e estimulador da criatividade docente. II JOINTH, 20 E21 DE AGOSTO DE 2012. PÁG.74 a 87 Identificou-se (GILZ, 2009), enfim, enquanto diferenciais, que a referida Coleção constituiu-se como: um material didático de Ensino Religioso dado à abordagem dos conhecimentos oriundos do fenômeno religioso, à sensibilização do estudante para a dimensão sacra da vida; um material didático capaz de desobscurecer os temores de quem havia atuado até então como professor de Ensino Religioso segundo o modelo confessional; um material didático que viabilizava, por meio de uma proposta legislativamente contextualizada, o estudo e a compreensão das tradições religiosas a partir da diversidade; um material didático que oportunizava um desenvolvimento metodológico propositivo, gradativo, sensível à faixa etária do corpo discente e de fomento a compreensão da experiência religiosa, a pesquisa e a criatividade docente; um material didático que oportunizava, por assim dizer, conhecimento embasado e sistemático oriundo do fenômeno religioso, sensibilidade à dimensão religiosa da vida, consonância legislativa, respeito à diversidade, impostação metodológica propositiva, estímulo e iniciação à pesquisa. Pode-se aqui, enfim, aventar que nem a metodologia tradicional e nem a tecnicista preponderaram no modo de a Coleção Redescobrindo o Universo Religioso se constituir como material didático às escolas do Brasil. Aproxima-se e a assemelha-se, mas não se enquadra-se inteiramente a referida Coleção a um encaminhamento metodológico escolanovista. A Coleção, pelos motivos acima já mencionados, inaugura uma nova metodologia. Uma metodologia ainda por ser melhor estudada e identificada como proposta de ensino e aprendizagem dos temas que dizem respeito ao fenômeno religioso, ou seja, às mais diversas manifestações religiosas. Considerações apenas - para não concluir Em termos de definições, compreende-se o livro didático de Ensino Religioso como: um dos recursos disponíveis ao desenvolvimento das atividades de ensino- aprendizagem; um dos caminhos de acesso ao conhecimento sistematizado de um campo do saber; um auxiliar do trabalho docente em sala de aula, principalmente para articular o processo de ensino e da aprendizagem formal; um material essencialmente iniciatório; uma fonte de pesquisa das concepções educacionais e metodológicas que historicamente foram sendo propostas e chegaram a ser implantadas. II JOINTH, 20 E21 DE AGOSTO DE 2012. PÁG.74 a 87 Caracteriza-se o livro didático de Ensino Religioso como meio de acesso a conteúdos com enfoques diversos e específicos, seja por meio de textos introdutórios, informativos ou conjunto de atividades, exercícios e ilustrações. Por assim caracterizar-se, o livro didático não é e não pode ser visto como um produto pronto, mas sim um recurso de ensino e aprendizagem passível de constantes complementações. Porque, entre as inúmeras funções que se pode atribuir a um livro didático de Ensino Religioso, destacam-se as seguintes: instaurar interações entre o professor e o aluno; propiciar diferentes leituras da realidade e dos fenômenos à esfera religiosa; propor um modo de compreender o tema em questão; tornar mais acessível aos iniciantes nos estudos o conhecimento que decorre do crivo científico sobre o fenômeno religioso; oferecer, enfim, uma abordagem integrada e contextualizada dos temas, com linguagem clara, compreensível e mais próxima possível da vivência do aluno, com desenvolvimento dos conteúdos por meio de situações-problema e com aspectos metodológicos em sintonia com a proposta pedagógica da escola; assegurar a interdependência entre ensino e aprendizagem, ensino e pesquisa, conteúdo e forma, professor teoria e prática, escola e sociedade, finalidades e objetivos. REFERÊNCIAS BRASIL. Lei n. 9.475 de 22 de julho de 1997. Da nova redação ao artigo 33 da Lei n.° 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Brasília: Diário Oficial da União, de 23 de julho de 1997, seção I. BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto, Secretaria de Educação Fundamental. Referencial curricular nacional para a educação infantil. Volume 1. Brasília: MEC/SEF, 1998. BRASIL. Resolução 07 de 14 de dezembro de 2010. Fixa Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental de 9 (nove) anos. Diário Oficial da União, Brasília, 15 de dezembro de 2010, seção 1, p. 34. CHASSOT, Attico. A ciência através dos tempos. 2. ed. São Paulo: 2011. CORRÊA, Rosa Lydia Teixeira. Cultura e diversidade. Curitiba: IBPEX, 2008. FÓRUM NACIONAL PERMANENTE DO ENSINO RELIGIOSO. Parâmetros curriculares nacionais: ensino religioso. 3.ª ed. São Paulo: Ave-Maria, 1998, p. 29. GILZ, Claudino. O livro didático na formação do professor de ensino religioso. Petrópolis: Vozes, 2009. II JOINTH, 20 E21 DE AGOSTO DE 2012. PÁG.74 a 87 JUNQUEIRA, Sérgio Rogério Azevedo. História, legislação e fundamentos do Ensino Religioso. Curitiba: IBPEX, 2008. LIBÂNIO, José Carlos. Tendências pedagógicas na prática escolar. In: LUCKESI. Cipriano Carlos. Filosofia da Educação. São Paulo: Loyola, 1985. TARDIF, M. Saberes docentes e formação profissional. Tradução de Francisco Pereira. 5. ed. Petrópolis: Vozes, 2005.
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