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www.facebook.com/groups/livrosparadownload www.jspsi.blogspot.com http://www.facebook.com/groups/livrosparadownload http://www.jspsi.blogspot.com Dados In ternacionais de Catalogação na Publicação (c ip) (Câmara Brasileira do Livro, sp, Brasil) Rosenberg, M arshall B. Comunicação não-violenta : técnicas para aprimorar relacionamentos pes soais e profissionais / Marshall B. Rosenberg ; [tradução Mário Vilela]. — São PauLo : Ágora, 2006. Título original: Nonviolent com m unication: a language o f life. Bibliografia. ISB N 978-85-7183-826-0 1. Com unicação interpessoal 2. Conduta de vida 3. Não-violência 4. Re lações interpessoais I. Título. 05-8849 CDD-153.6 índ ice para catálogo sistem ático: 1. Com unicação não-violenta : Psicologia 153.6 Compre em lugar de fotocopiar. Cada real que você dá por um livro recompensa seus autores e os convida a produzir mais sobre o tema; incentiva seus editores a encomendar, traduzir e publicar outras obras sobre o assunto; e paga aos livreiros por estocar e levar até você livros para a sua inform ação e o seu entretenimento. Cada real que você dá pela fotocópia não autorizada de um livro financia um crime e ajuda a matar a produção intelectual em todo o mundo. Comunicação não-violentd TÉCNICAS PARA APRIMORAR RELACIONAMENTOS PESSOAIS E PROFISSIONAIS Marshall B. TCosenberg C'':€ 5 f EDITORA ÁGORA COMUNICAÇÃO NÃO-VIOLENTA Técnicas para aprimorar relacionamentos pessoais e profissionais Copyright © 2003 by Marshall B. Rosenberg Direitos desta tradução adquiridos por Summus Editorial Editora executiva: Soraia Bini Cury Assistente de produção: Claudia Agnelli Tradução: Mário V ilela Revisão técnica: Dominic Barter Capa: Renata Buono Projeto gráfico e diagramação: Acqua Estúdio Gráfico Fotolitos: Casa de Tipos 2a edição Editora Ágora Departamento editorial: Rua Itapicuru, 613 - 7fl andar 05006-000 - São Paulo - SP Fone: (11) 3872-3322 Fax: (11) 3872-7476 http://www.editoraagora.com.br e-mail: agora@editoraagora.com.br Atendimento ao consumidor: Summus Editorial Fone: (11) 3865-9890 Vendas por atacado: Fone: (11) 3873-8638 Fax: (11) 3873-7085 e-mail: vendas@summus.com.br Impresso no Brasil http://www.editoraagora.com.br mailto:agora@editoraagora.com.br mailto:vendas@summus.com.br Agradecimentos Sou grato por ter podido estudar e trabalhar com o profes sor Cari Rogers na época em que ele pesquisava os com ponen tes de um a relação de apoio. Os resultados dessa pesquisa d e sem penharam papel-chave no desenvolvim ento do processo de com unicação que descreverei neste livro. Serei e ternam ente grato ao professor M ichael Hakeem, por ter m e ajudado a ver as limitações científicas e os riscos so ciais e políticos de praticar a psicologia como fui treinado: um m odo de en tender os seres hum anos com base em patologias. Ver as limitações desse m odelo m e estim ulou a procurar for m as de praticar um a psicologia diferente, baseada na crescen te clareza a respeito de como nós, seres hum anos, deveríam os viver. Também sou grato a George Miller e a George Albee, pelos esforços para alertar os psicólogos quanto à necessidade de e n contrar m aneiras m elhores de disseminar a psicologia. Eles m e ajudaram a ver que a enorm e quantidade de sofrimento em nos so planeta requer m odos mais eficazes de distribuir habilidades tão necessárias quanto aquelas oferecidas por um a abordagem clínica. Gostaria de agradecer a L u cy Leu po r ter editado este livro e criado o m anuscrito final; a Rita Herzog e Kathy Smith pela as sistência no processo de edição; e a Darold Milligan, Sonia Nor- denson, M elanie Sears, Bridget Belgrave, M arian Moore, Kittrell McCord, Virginia Hoyte e Peter Weismiller pela ajuda adicional. Por fim, gostaria de expressar m inha gratidão à amiga Annie Muller. Ela m e encorajou a ser mais claro no referente aos fundam entos espirituais de m eu trabalho, o que o fortale ceu e enriqueceu m inha vida. Úuando conheci Marshall Rosenberg, uma comunicação pro funda se estabeleceu im ediatam ente entre nós, pois além de term os em comum os ideais de paz, fom os influenciados pelos mesmos mestres. 0 presente livro é um best-seller internacional. Ele acompanha e reforça um novo m étodo de resolução pacífica de conflitos. Seu principal m érito é nos ensinar a nos colocarmos no lugar do outro, desenvolvendo a em patia, que é de grande ajuda até em casos mais difíceis de rupturas e má comunicação. Marshall Rosenberg e sua equipe introduziram o método de comunicação não-vio lenta no Brasil há alguns anos, e esta obra encontrará um "solo" já fertilizado. De todo coração desejo grande sucesso a esta imensa co n tri buição para o desenvolvim ento de uma cultura de paz no Brasil e no mundo. PlERRE W eil 0 trabalho do dr. Marshall Rosenberg sobre a comunicação não-vio lenta revela, in icialm ente, a profundidade que a cul tura de guerra adquiriu, tan to na nossa linguagem quanto nos relacionamentos. Por outro lado, sua habilidade pedagó gica nos encoraja a entrar em contato com esse centro de hu m anidade, onde nos reconhecemos como aprendizes de novos modos de estar e de nos articular com os outros e com o mundo. Além de ser uma via de autoconhecim ento, a com u nicação não-vio lenta é um instrum ento eficiente e mais do que oportuno para capacitar aqueles que - com prom etidos com a im plem entação de uma Cultura de Paz - visam se auto -educar para restabelecer a confiança m útua entre pes soas, instituições, povos e nações. L ia D is k in Associação Palas Athena Marshall Rosenberg oferece ferram entas das mais eficientes para cuidarmos da saúde e dos relacionamentos. A c n v conec ta a alma das pessoas, promovendo sua regeneração. É o ele m ento que fa lta em tudo que fazemos. D e e p a k C h o p r a autor de As sete leis espirituais do sucesso A notável mensagem do dr. Marshall fornece aos professores passos simples para a com unicação pacífica e uma nova maneira de trabalhar com crianças e pais. B a r b a r a M o f f it i Diretora executiva do Centro Am ericano de Educadores Montessori As técnicas dinâm icas de Marshall Rosenberg transform am potenciais conflitos em diálogos pacíficos. Ele ensina fe rra mentas simples para desarmar argum entos perigosos e criar conexões de compaixão com a fam ília , amigos e outros co nhecidos. Eu recomendo este livro com entusiasmo. J o h n G r ay autor de Homens são de M arte , mulheres são de Vênus Acredito que os princípios e as técnicas deste livro podem li teralm ente m udar o mundo, porém, mais im portante do que isso, eles podem m elhorar a qualidade de vida entre com pa nheiros, filhos, vizinhos, colegas de trabalho e todas as pes soas com as quais interagim os. M inha recom endação não poderia ser mais enfática. J a c k Ca n f ie l d co -au to r da série Histórias para aquecer o coração Sumário Prefácio.............................................................................................. 1 3 1. D O FUNDO DO CORAÇÃO - O CERNE DA COMUNICAÇÃO NÃO-VIOLENTA.................................................................................................... 1 9 2 . A COMUNICAÇÃO QUE BLOQUEIA A COMPAIXÃO......................... 3 7 3 . O b s e r v a r s e m a v a l i a r ............................................................................ 4 9 4 . I d e n t if ic a n d o e e x p r e s s a n d o s e n t im e n t o s ............................. 6 3 5. A s s u m in d o a r e s p o n s a b il id a d e p o r n o s s o s s e n t im e n t o s ....................................................................................................... 7 9 6 . P e d in d o a q u il o q u e e n r iq u e c e r á n o s s a v i d a ...................... 1 0 3 7 . R e c e b e r c o m e m p a t ia ............................................................................... 13 3 8 . O p o d e r d a e m p a t ia ................................................................................... 1 5 9 9 . C o n e c t a n d o - n o s c o m p a s s iv a m e n t e c o m n ó s m e s m o s . . . . 1 7 9 1 0 . E x p r e s s a n d o a r a iv a p l e n a m e n t e .................................................. 1 9 7 1 1 . O u s o d a f o r ç a p a r a p r o t e g e r ...................................................... 2 2 3 1 2 . L ib e r t a n d o -n o s e a c o n s e l h a n d o o s o u t r o s ......................... 2 3 5 1 3 . E x p r e s s a n d o a p r e c ia ç ã o n a c o m u n ic a ç ã o n ã o - v io l e n t a .................................................................................................... 2 5 3 E pílogo ............................................................................................................................. 2 6 5 Bibliografia .................................................................................................................... 2 6 9 índice rem issivo .......................................................................................................... 2 7 3 Sobre o c n v c e a c n v ................................................................................................. 2 8 3 Prefácio Crescer como pessoa de cor na África do Sul do Apartheid, na década de 1940, não era nada agradável. Principalm ente se você era brutalm ente lem brado da cor de sua pele a cada m o m ento do dia. Depois, ser espancado aos 10 anos por jovens brancos que o consideravam negro demais e em seguida por jo vens negros que o consideravam branco demais era um a expe riência hum ilhante que poderia levar qualquer um à vingança violenta. Fiquei tão indignado com essa vivência que m eus pais de cidiram me levar para a índia e me deixar por algum tem po com m eu avô, o lendário M ohandas K aram chand Gandhi, para que eu pudesse aprender com ele a lidar com a raiva, a frustração, a discriminação e a hum ilhação que o preconceito racial violento pode provocar. Naqueles dezoito meses, aprendi mais do que esperava. Hoje, m eu único arrependim ento é que eu tinha ape nas 13 anos e, ainda por cima, era aluno medíocre. Se eu fosse mais velho, um pouco mais sensato e pensasse mais, poderia ter 13 I MARSHALL B. ROSENBERG I aprendido m uito mais. No entanto, as pessoas devem se con ten tar com o que recebem e não ser dem asiado gananciosas - um a lição fundam ental no m odo de vida não-violento. Como pode rei esquecer isso? Uma das m uitas coisas que aprendi com m eu avô foi a com preender a profundidade e a am plitude da não-violência e a re conhecer que somos todos violentos e precisamos efetuar um a m udança qualitativa em nossas atitudes. Com freqüência, não reconhecem os nossa violência porque somos ignorantes a res peito dela. Presum im os que não somos violentos porque nossa visão da violência é aquela de brigar, matar, espancar e guerrear - o tipo de coisa que os indivíduos com uns não fazem. Para m e fazer com preender isso, m eu avô m e fez desenhar um a árvore genealógica da violência, usando os m esm os princí pios usados nas árvores genealógicas das famílias. Seu argu m ento era que eu entenderia m elhor a não-violência se com preendesse e reconhecesse a violência que existe no m undo. Toda noite, ele m e ajudava a analisar os acontecim entos do dia - tudo que eu experim entara, lera, vira ou fizera aos outros - e a colocá-los na árvore, sob as rubricas "física" (a violência em que se tivesse em pregado força física) ou "passiva" (a violência em que o sofrim ento tivesse sido mais de natureza em ocional). Em poucos meses, cobri um a parede de m eu quarto com atos de violência "passiva", a qual m eu avô descrevia como mais insidiosa que a violência "física". Ele explicava que, no fim das contas, a violência passiva gerava raiva na vítima, que, como in divíduo ou m em bro de um a coletividade, respondia v iolenta m ente. Em outras palavras, é a violência passiva que alim enta a fornalha da violência física. Em razão de não com preenderm os ou analisarm os esse conceito, todos os esforços pela paz não frutificam, ou alcançam apenas um a paz tem porária. Como po- 14 I COMUNICAÇÃO NÃO-VIOLENTA I demos apagar um incêndio se antes não cortamos o suprim en to de combustível que alim enta as chamas? M eu avô sem pre enfatizou de forma eloqüente a necessida de da não-violência nas comunicações - algo que M arshall Ro- senberg vem fazendo de m odo adm irável há muitos anos, em seus escritos e seminários. Li com considerável interesse seu livro Comunicação não-violenta - Aprimorando seus relacionamentos pessoais e profissionais e fiquei im pressionado com a profundida de do trabalho e a simplicidade das soluções. A m enos que "nos tom em os a m udança que desejamos ver acontecer no m undo" (como diria m eu avô), nenhum a m u d an ça jam ais acontecerá. Infelizmente, estamos todos esperando que os outros m udem prim eiro. A não-violência não é um a estratégia que se possa utilizar hoje e descartar am anhã, nem é algo que nos tom e dóceis ou fa cilmente influenciáveis. Trata-se, isto sim, de inculcar atitudes positivas em lugar das atitudes negativas que nos dom inam . Tudo que fazemos é condicionado por motivações egoístas ("Que vantagem eu levo nisso?"), e essa constatação se revela ainda mais verdadeira num a sociedade esm agadoram ente m aterialis ta, que prospera com base num duro individualismo. N enhum desses conceitos negativos leva à construção de um a família, co m unidade, sociedade ou nação hom ogênea. Não é im portante que nos reunam os nos m om entos de cri se e dem onstrem os patrio tism o agitando a bandeira; não b as ta que nos tornem os um a superpotência, construindo um arse nal que possa destruir várias vezes este m undo; não é suficiente que subjuguem os o resto do m undo com nosso poderio militar, porque não se pode construir a paz sobre alicerces de medo. A não-violência significa perm itirm os que venha à tona aquilo que existe de positivo em nós e que sejamos dom inados 15 I MARSHALL B. ROSENBERG I pelo amor, respeito, compreensão, gratidão, compaixão e preo cupação com os outros, em vez de o sermos pelas atitudes ego cêntricas, egoístas, gananciosas, odientas, preconceituosas, sus peitosas e agressivas que costum am dom inar nosso pensam ento. É com um ouvirm os as pessoas dizerem: "Este é um m undo cruel, e, se a gente quer sobreviver, tam bém tem de ser cruel". Tomo hum ildem ente a liberdade de discordar de tal argum ento. O m undo em que vivemos é aquilo que fazemos dele. Se hoje é impiedoso, foi porque nossas atitudes o to rnaram assim. Se m udarm os a nós mesmos, poderem os m udar o m undo, e essa m udança começará por nossa linguagem e nossos m étodos de comunicação. Recom endo entusiasticam ente este livro e a aplicação do processo de Com unicação Não-Violenta que ele prega. É um prim eiro passo significativo para m udarm os nossa com unicação e criarmos um m undo mais compassivo. A r u n G a n d h i Fundador e presidente do M. K. Gandhi Institute for Nonviolence 16 P alavras são janelas (ou são paredes) Sinto-me tão condenada por suas palavras, Tão julgada e dispensada. Antes de ir, preciso saber: Foi isso que você quis dizer? Antes que eu me levante em minha defesa, Antes que eu fale com mágoa ou medo, Antes que eu erga aquela muralha de palavras, Responda: eu realmente ouvi isso? Palavras são janelas ou são paredes. Elas nos condenam ou nos libertam. Quando eu falar e quando eu ouvir, Que a luz do amor brilhe através de mim. Há coisas que preciso dizer, Coisas que significam muito para mim. Se minhas palavras não forem claras, Você me ajudará a me libertar? Se pareci menosprezar você, Se você sentiu que não me importei, Tente escutar por entre as minhas palavras Os sentimentos que compartilhamos.R u th B e b e r m e y e r 1 . Do fundo do coração 0 CERNE DA COMUNICAÇÃO NÃO-VIOLENTA O que eu quero em minha vida é compaixão, um fluxo entre mim mesmo e os outros com base numa entrega mtítua, do fundo do coração. M a r s h a l l B . R o s e n b e r g Introdução Acredito que é de nossa natureza gostar de dar e receber de forma compassiva. Assim, duran te a m aior parte da vida, tenho m e preocupado com duas questões: o que acontece que nos desliga de nossa natureza compassiva, levando-nos a nos com portarm os de m aneira violenta e baseada na exploração das o u tras pessoas? E, inversam ente, o que perm ite que algumas pes soas perm aneçam ligadas à sua natureza compassiva m esm o nas circunstâncias mais penosas? M inha preocupação com essas questões começou na in fân cia, por volta do verão de 1943, quando nossa família se m udou para Detroit. Na segunda sem ana após nossa chegada, eclodiu um conflito racial, que com eçou com um incidente num parque público. Nos dias seguintes, mais de quarenta pessoas foram mortas. Nosso bairro ficava no centro da violência, e passamos três dias trancados em casa. 19 I MARSHALL B. ROSENBERG I Quando term inaram os tum ultos raciais e com eçaram as aulas, descobri que o nom e pode ser tão perigoso quanto qual quer cor de pele. Q uando o professor disse m eu nom e durante a chamada, dois m eninos m e encararam e perguntaram , com veneno: "Você é kike?" Eu nunca tinha ouvido aquela palavra e não sabia que algumas pessoas a utilizavam de m aneira depre ciativa para se referir aos judeus. Depois da aula, os dois já es tavam m e esperando: eles m e jogaram no chão, m e chutaram e m e bateram . Desde aquele verão de 1943, venho exam inando aquelas duas questões que m encionei. O que nos perm ite, por exem plo, perm anecer sintonizados com nossa natureza compassiva até nas piores circunstâncias? Penso em pessoas como Etty Hil- lesum, que continuou compassiva m esm o quando sujeita às grotescas condições de um campo de concentração alem ão. Na época, ela escreveu: Não é fácil me amedrontar. Não porque eu seja corajosa, mas por que sei que estou lidando com seres humanos e que preciso tentar ao máximo compreender tudo que qualquer pessoa possa fazer. E foi isso o que realmente importou hoje de manhã - não que um jovem oficial da Gestapo, contrariado, tenha gritado comigo, mas, sim, que eu não tenha me sentido indignada, antes tenha sentido verdadeira compaixão e desejado perguntar: "O senhor teve uma infância muito infeliz? Brigou com a namorada?". É, ele parecia atormentado e obcecado, mal-humorado e fraco. Eu gostaria de ter começado a tratá-lo ali mesmo, pois sei que jovens dignos de pena como ele se tomam perigosos tão logo fiquem soltos no mundo. (Etty H illesum, A diary) 20 I COMUNICAÇÃO IMÃO-VIOLENTA I Enquanto estudava os fatores que afetam nossa capacidade de nos m anterm os compassivos, fiquei im pressionado com o papel crucial da linguagem e do uso das palavras. Desde então, identifiquei um a abordagem específica da com unicação — falar e ouvir — que nos leva a nos entregarm os de coração, ligando- nos a nós m esm os e aos outros de m aneira tal que perm ite que nossa compaixão natu ral floresça. D enom ino essa abordagem Com unicação Não-Violenta, usando o term o "não-violência" na m esm a acepção que lhe atribuía Gandhi — referindo-se a nosso estado compassivo natural quando a violência houver se afastado do coração. Embora possamos ~ i s ✓ M C L U Í U L M v ivras nao raro m duzem a m a goa e à dor, seja para os outros, seja para nós mesmos. Em algumas com unidades, o processo que estou descrevendo é co nhecido como com unicação compassiva; em todo este livro, a abreviatura cnv será utilizada para se referir à com unicação não-violenta. Uma m a n e ira d e c o n c e n t r a r a a te n ç ã o A cnv se baseia em habilidades de linguagem e comunicação que fortalecem a capacidade de continuarm os hum anos, mesmo em condições adversas. Ela não tem nada de novo: tudo que foi integrado à cnv já era conhecido havia séculos. O objetivo é nos lem brar do que já sabemos — de como nós, hum anos, devería mos nos relacionar uns com os outros — e nos ajudar a viver de modo que se m anifeste concretam ente esse conhecim ento. A cnv nos ajuda a reform ular a m aneira pela qual nos ex pressam os e ouvim os os outros. Nossas palavras, em vez de se não considerar "violenta" a m a neira de falarmos, nossas pala- c n v : uma forma de comunicação que nos leva a nos entregarmos de coração. 21 I MARSHALL B. ROSENBERG I rem reações repetitivas e autom áticas, tornam -se respostas conscientes, firm em ente baseadas na consciência do que esta mos percebendo, sentindo e desejando. Somos levados a nos expressar com honestidade e clareza, ao m esm o tem po que d a m os aos outros um a atenção respeitosa e empática. Em toda troca, acabamos escutando nossas necessidades mais p ro fu n das e as dos outros. A cnv nos ensina a observarm os cuidado sam ente (e sermos capazes de identificar) os com portam entos e as condições que estão nos afetando. A prendem os a identifi car e a articular claram ente o que de fato desejam os em d e term inada situação. A form a é simples, mas profundam ente transform adora. À m edida que a cnv substitui nossos velhos padrões de de fesa, recuo ou ataque diante de ju lgam entos e críticas, vamos percebendo a nós e aos outros, assim como nossas intenções e relacionam entos, por um enfoque novo. A resistência, a postu ra defensiva e as reações violentas são minimizadas. Q uando nos concentram os em to rnar mais claro o que o ou tro está ob servando, sentindo e necessi tando em vez de diagnosticar e julgar, descobrimos a p ro fund i dade de nossa própria com pai xão. Pela ênfase em escutar p ro fundam ente — a nós e aos outros —, a cnv prom ove o res peito, a atenção e a em patia e gera o m ú tuo desejo de nos e n tregarm os de coração. Embora eu m e refira à cnv como "processo de com unica ção" ou "linguagem da compaixão", ela é mais que processo ou linguagem. N um nível mais profundo, ela é um lem brete per- Quando utilizamos a c n v para ouvir nossas necessidades mais profundas e as dos outros, perce bemos os relacionamentos por um novo enfoque. 22 I COMUNICAÇÃO NÃO-VIOLENTA I m anente para m anterm os nossa atenção concentrada lá onde é mais provável acharm os o que procuram os. Existe a história de um hom em agachado debaixo de um poste de ilum inação, procurando algum a coisa. Um policial pas sa e pergunta o que ele está fazendo. "Procurando as chaves do carro", responde o hom em , que parece ligeiram ente bêbado. "Você as perdeu aqui?", pergunta o policial. "Não, perdi no b e co." Vendo a expressão intrigada do policial, o hom em se apres sa a explicar: "É que a luz está m uito m elhor aqui". Acho que m eu condicionam ento cultural m e leva a con centrar a atenção em lugares onde é im provável que eu consi ga o que quero. Desenvolvi a cn v co m o u m a m a n e ira d e faz e r Vamos fazer brilhar a luz da b r ilh a r a lu z d a co n sc iên c ia — consciência nos pontos em que d e c o n d ic io n a r m in h a a te n ç ã o a possamos esperar achar aquilo se concentrar em pontos que te- que procuramos. n h am o potencial de m e dar o que procuro. O que almejo em m inha vida é compaixão, um fluxo entre m im e os outros com base num a entrega m útua, do fundo do coração. Essa característica da compaixão, que denom ino "entregar- se de coração", se expressa na letra da canção "Given to", com posta por m inha amiga R uth Beberm eyer em 1978: Nunca me sinto mais presenteada Do que quando você recebe algo de mim - Quando você compreende a alegria que sinto ao lhe dar algo. E você sabe que estou dando aquilo não para fazer você ficar me devendo, 23 I MARSHALL B. ROSENBERG I Mas porque quero viver o amor quesinto por você. Receber algo com boa vontade pode ser a maior entrega. Eu nunca conseguiria separar as duas coisas. Quando você me dá algo, Eu lhe dou meu receber. Quando você recebe algo de mim, Eu me sinto tão presenteada. Q uando nos entregam os de coração, nossos atos brotam da alegria que surge e resplandece sem pre que enriquecem os de boa vontade a vida de outra pessoa. Isso beneficia tan to quem doa quanto quem recebe. Este últim o aprecia o presente sem se preocupar com as conseqüências que acom panham o que foi dado por medo, culpa, vergonha ou desejo de lucrar alguma coisa. Quem doa se beneficia daquele reforço de auto-estim a que se produz sem pre que vemos nossos esforços contribuírem para o bem -estar de alguém. Para usarm os a cnv, as pessoas com quem estamos nos co m unicando não precisam conhecê-la, ou m esm o estar m otiva das a se com unicar com passivam ente conosco. Se nos ativermos aos princípios da cnv, motivados som ente a dar e a receber com compaixão, e fizermos tudo que puderm os para que os outros saibam que esse é nosso único interesse, eles se unirão a nós no processo, e acabaremos conseguindo nos relacionar com com paixão uns com os outros. Não estou dizendo que isso sempre aconteça rapidam ente. Afirmo, en tretanto , que a compaixão inevitavelm ente floresce quando nos m antem os fiéis aos princí pios e ao processo da cnv. 24 I COMUNICAÇÃO NÃO-VIOLENTA I O PROCESSO DA C1W Para chegar ao m útuo desejo de nos entregarm os de cora ção, concentram os a luz da consciência em quatro áreas, às quais nos referirem os como os quatro com ponentes do modelo da cnv. Primeiramente, observamos o que está de fato acontecendo num a situação: o que estamos vendo os outros dizerem ou faze rem que é enriquecedor ou não para nossa vida? O truque é ser capaz de articular essa observação sem fazer nenhum julgam ento ou avaliação — mas simplesmente dizer o que nos agrada ou não naquilo que as pessoas estão fa zendo. Em seguida, identifica- Os quatro componentes da c n v : mos como nos sentimos ao ob- 1. observação; servar aquela ação: magoados, 2. sentimento; assustados, alegres, divertidos, 3. necessidades; irritados etc. Em terceiro lugar, 4 . pedido. reconhecemos quais de nossas necessidades estão ligadas aos sentimentos que identificamos aí. Temos consciência desses três componentes quando usamos a cnv para expressar clara e honestam ente como estamos. Uma m ãe poderia expressar essas três coisas ao filho adoles cente dizendo, por exemplo: "Roberto, quando eu vejo duas bolas de meias sujas debaixo da m esinha e mais três perto da tv, fico irritada, porque preciso de mais ordem no espaço que usa mos em comum". Ela im ediatam ente continuaria com o quarto com ponente — um pedido bem específico: "Você poderia colocar suas meias no seu quarto ou na lavadora?" Esse com ponente enfoca o que estamos querendo da outra pessoa para enriquecer nossa vida ou torná-la mais maravilhosa. 25 I MARSHALL B. ROSENBERG I Assim, parte da cnv consiste em expressar as quatro infor mações m uito claram ente, seja de form a verbal, seja por outros meios. O outro aspecto dessa fo rm a de comunicação consiste em receber aquelas m esmas quatro informações dos outros. Nós nos ligamos a eles prim eiram ente percebendo o que estão ob servando e sentindo e do que estão precisando; e depois desco brindo o que poderia enriquecer suas vidas ao receberem a quarta inform ação, o pedido. À m edida que m antiverm os nossa atenção concentrada nessas áreas e ajudarm os os outros a fazerem o m esm o, esta belecerem os um fluxo de com unicação dos dois lados, até a com paixão se m anifestar na tu ra lm ente : o que estou observan do, sentindo e do que estou necessitando; o que estou pedindo para enriquecer m inha vida; o que você está observando, sen tindo e do que está necessitando; o que você está pedindo para enriquecer sua vida... 0 p rocesso da cnv As ações concretas que estamos observando e que afetam nosso bem-estar; Como nos sentim os em relação ao que estamos observando; As necessidades, valores, desejos etc. que estão gerando nos sos sentimentos; As ações concretas que pedim os para enriquecer nossa vida. Ao usarm os esse processo, podem os começar nos expres sando ou então recebendo com em patia essas quatro inform a 26 I COMUNICAÇÃO NÃO-VIOLENTA I ções dos outros. Dos capítulos 3 ao 6, aprenderem os a perceber e a expressar verbalm ente cada u m desses com ponentes, m as é im portan te ter em m ente que a cnv não consiste n um a fó rm u la preestabelecida; antes, ela se adapta a várias situações e esti los pessoais e culturais. E m bo ra eu, por conveniência, me refira à c n v com o "processo" ou "linguagem ", é possível rea lizar todas as quatro partes do processo sem p ro n u n c iar um a só palavra. A essência da cnv está em nossa consciência da queles quatro com ponentes, não nas palavras que efetiva m ente são trocadas. As duas partes da c n v : 1. expressar-se honestamente por meio dos quatro compo nentes; 2. receber com empatia por meio dos quatro componentes. Aplicando a cnv em no ssa vida e no m undo Q uando utilizamos a c n v e m nossas interações — com nós mesmos, com outra pessoa ou com um grupo —, nós nos colo camos em nosso estado compassivo natural. Trata-se, portanto, de um a abordagem que se aplica de m aneira eficaz a todos os níveis de com unicação e a diversas situações: • relacionam entos íntimos; • famílias; • escolas; • organizações e instituições; • terapia e aconselham ento; • negociações diplomáticas e comerciais; • disputas e conflitos de toda natureza. 27 I MARSHALL B. ROSENBERG I Algumas pessoas usam a cnv para estabelecer m aior grau de profundidade e afeto em seus relacionam entos íntimos. Eis o depoim ento de um a participante de um de nossos seminários, em San Diego: '2; 'ViOOÔOG ’ -'C' Quando aprendi como posso receber (escutar) e dar (expressar) por meio da c n v , superei a fase em que me sentia agredida e feita de capacho e comecei a realmente escutar as palavras e a captar nelas os sentimentos subjacentes. Eu me dei conta do homem com quem tinha estado casada por 28 anos, um homem muito sofrido. Ele havia pedido o divórcio uma semana antes do seminário [sobre c n v J . Para encurtar uma história bem comprida, estamos aqui hoje - juntos - e estou ciente da contribuição que [a c n v ] deu para termos um final feliz. [...] Aprendi a escutar sentimen tos, a expressar minhas necessidades, a aceitar respostas que nem sempre queria ouvir. Ele não está aqui só para me agradar, nem eu estou aqui para dar felicidade a ele. Ambos aprendemos a crescer, a aceitar e a amar de modo que ambos possamos nos rea lizar. Outros usam a cnv para estabelecer relacionam entos mais eficazes no trabalho. Uma professora de Chicago escreve: Há cerca de um ano venho utilizando a c n v em minha turma de alunos especiais. Ela pode funcionar até mesmo com crianças que têm desenvolvimento retardado da linguagem, dificuldades de 28 aprendizado e problemas de comportamento. Um aluno de nossa sala cospe, diz palavrões, grita e espeta outros alunos com lápis quando se aproximam de sua carteira. Eu lhe dou a deixa: "Por favor, diga isso de outro jeito. Use sua conversa de girafa". [Em alguns seminários, para demonstrar a cm , usam-se fantoches de girafa.] Na mesma hora, ele se levanta, olha para a pessoa de quem está com raiva e diz com toda a calma: "Por favor, você po deria sair de perto da minha carteira? Eu fico com raiva quando você fica tão perto de m i m Os outros alunos em geral respon dem com algo nesta linha: “Me desculpe, eu tinha esquecido que isso deixa você aborrecido Comecei a pensar em minha frustração com essa criança e tentar descobrir do que (além de harmonia e ordem) eu precisava. Per cebi quanto tempo eu dedicava ao planejamento das aulas e como minha necessidade de ser criativa e contribuirestava sendo pas sada para trás pela necessidade de manter o bom comportamen to da classe. Também senti que não estava atendendo às necessi dades educacionais dos outros alunos. Quando ele tinha alguma demonstração de raiva na aula, comecei a dizer: "Preciso que você preste atenção em mim". Eu talvez tivesse de dizer isso cem vezes ao dia, mas ele acabava captando a mensagem e geralmen te se concentrava na aula. 'OtX'* Um a médica de Paris escreve: I COMUNICAÇÃO NÃO-VIOLENTA Cada vez mais, uso a c m na prática clínica. Alguns pacientes perguntam se sou psicóloga, explicando que seus médicos não cos tumam se interessar pela maneira que vivem ou lidam com as 29 I MARSHALL B. ROSENBERG I doenças. A c n v me ajuda a compreender quais são as necessida des dos pacientes e o que eles precisam ouvir em determinado mo mento. Acho que isso ajuda sobretudo no relacionamento com he mofílicos e aidéticos, pois ocorre tanta raiva e dor que é comum a relação entre o paciente e o profissional de saúde ficar seriamen te abalada. Faz pouco tempo, uma aidética que venho tratando hâ cinco anos me disse que o que mais a tinha ajudado foram mi nhas tentativas de achar maneiras para ela desfrutar o dia-a- dia. Nesse sentido, a c n v me auxilia muito. Antes, quando sabia que um paciente tinha uma doença fatal, eu freqüentemente me atinha ao prognóstico, e, assim, era difícil estimulá-los sincera mente a viver a vida. Com a c n v , desenvolvi uma nova consciên cia, bem como uma nova linguagem. Fico assombrada em ver quanto ela se encaixa bem em minha prática clínica. À medida que me envolvo cada vez mais na dança da c n v , sinto mais ener gia e alegria no trabalho. Outros, por sua vez, em pregam esse processo na política. Uma m inistra francesa, ao visitar a irmã, no tou quanto esta e o m arido estavam se com unicando e respondendo um ao outro de m aneira diferente. Encorajada pela descrição que fizeram da cnv, m encionou que, na sem ana seguinte, estaria negociando com a Argélia algumas questões delicadas, referentes a procedi m entos de adoção. Embora o tem po fosse curto, despachamos para Paris um instru tor que falava francês, a fim de trabalhar com a m inistra. Posteriorm ente, ela atribuiu grande parte do sucesso de suas negociações na Argélia às novas técnicas de co municação que tinha adquirido. Em Jerusalém , durante um sem inário ao qual com parece ram israelenses de diversas convicções políticas, os participantes 30 I COMUNICAÇÃO NÃO-VIOLENTA I usaram a cnv para se expressar a respeito do problem a da Cis- jordânia, extrem am ente polêmico. M uitos dos colonos israelen ses que ali se estabeleceram acreditam que cum priam um a de term inação religiosa ao fazê-lo; eles estão enredados num conflito não apenas com os palestinos, mas tam bém com israe lenses que reconhecem o desejo palestino de ter soberania n a cional na região. D urante um a sessão, um de m eus instrutores e eu criamos um m odelo de escuta com em patia usando a cnv. Em seguida, convidamos os participantes a se alternarem nos papéis uns dos outros. Passados vinte m inutos, um a colona de clarou que, caso seus opositores políticos se m ostrassem capazes de ouvi-la do m esm o m odo que havia acabado de ser ouvida, ela estaria disposta a considerar abrir m ão de suas reivindica ções fundiárias e sair da Cisjordânia para algum lugar em terri tório in ternacionalm ente reconhecido como israelense. Hoje, em todo o m undo, a cnv serve como recurso valioso para com unidades que enfrentam conflitos violentos ou graves tensões de natureza étnica, religiosa ou política. O avanço do treinam ento em cnv e seu uso em mediações entre partes em conflito em Israel, no território da Autoridade Palestina, na Ni géria, em Ruanda, em Serra Leoa e em outros lugares têm sido motivo de especial satisfação para mim. Certa vez, m eus asso ciados e eu estivemos em Belgrado durante três dias muitíssimo tensos, treinando cidadãos que trabalhavam pela paz. Logo ao chegarmos, vimos estam pada no rosto dos participantes um a expressão de visível desespero, pois o país estava então envolvi do num a guerra brutal na Bósnia e na Croácia. À m edida que o Ireinam ento avançou, começamos a ouvir o som de riso em suas vozes, ao expressarem sua profunda gratidão e alegria por le re m encontrado o recurso de que precisavam. Nas duas sem a nas seguintes, trabalhando na Croácia, em Israel e na Palestina, 31 I MARSHALL B. ROSENBERG I to rn a m o s a v e r c id ad ão s d ese sp e rad o s de p aíses a rra sad o s p e la g u e rra re c u p e ra re m o â n im o e a co n fian ça a p a r t i r do t r e in a m e n to e m CNV q u e receb iam . Sinto-me abençoado por poder viajar o m undo todo ensi nando às pessoas um processo de comunicação que lhes dá poder e alegria. Agora, com este livro, estou feliz e empolgado por poder com partilhar com você a riqueza da Comunicação Não-Violenta. Resum o A cnv nos ajuda a nos ligarmos uns aos outros e a nós m es mos, possibilitando que nossa compaixão na tu ra l floresça. Ela nos guia no processo de reform ular a m aneira pela qual nos ex pressamos e escutamos os outros, m ediante a concentração em quatro áreas: o que observamos, o que sentimos, do que neces sitamos, e o que pedim os para enriquecer nossa vida. A cnv p ro move m aior profundidade no escutar, fom enta o respeito e a em patia e provoca o desejo m útuo de nos entregarm os de cora ção. Algumas pessoas usam a cnv para responder compassiva m ente a si mesmas; outras, para estabelecer m aior p rofund i dade em suas relações pessoais; e outras, ainda, para gerar relacionam entos eficazes no trabalho ou na política. No m undo inteiro, utiliza-se a cnv para m ediar disputas e conflitos em todos os níveis. A c n v em ação “Assassino, matador de crianças!” Intercalados em todo este livro, há diálogos in titu lados "A c n v em ação" Eles se destinam a proporcionar o gostinho de um 32 I COMUNICAÇÃO NÃO-VIOLENTA I in t e r c â m b io r e a l e m q u e u m d o s in t e r lo c u to r e s a p l iq u e o s p r in c íp io s d a c o m u n ic a ç ã o n ã o - v io le n t a . E n t r e ta n to , a c n v n ã o é m e r a m e n te u m a l in g u a g e m , n e m u m c o n ju n to d e té c n ic a s p a r a u s a r a s p a la v r a s ; a c o n s c iê n c ia e a in te n ç ã o q u e a c n v a b ra n g e p o d e m m u i t o b e m se e x p re s s a r p e lo s i lê n c io (u m a c a r a c te r ís t ic a d o e s ta r p re s e n te ) , p e la e x p re s s ã o fa c ia l e p e la l in g u a g e m c o rp o ra l. O s d iá lo g o s d e “A c n v e m a ç ã o " q u e você le r á s ã o v e rs õ e s n e c e s s a r ia m e n te d e s t i la d a s e re s u m id a s d e in te r c â m b io s d a v id a re a l, n o s q u a is m o m e n to s d e e m p a t ia s i le n c io s a , n a r r a t iv a s , h u m o r , g e s to s e tc . c o n t r ib u i r ia m p a r a q u e s e e s ta b e le c e s s e e n t r e a s d u a s p a r te s u m a c o n e x ã o m a is n a t u r a l d o q u e p o d e p a r e c e r q u a n d o s e c o n d e n s a m o s d iá lo g o s n a fo r m a im p re s s a . Num a mesquita do campo de refugiados de Deheisha (em Belém, na Cisjordânia), eu estava apresentando a com u nicação não-v io lenta a cerca de 170 m uçulm anos palestinos. Na época, as atitudes para com os americanos não eram po sitivas. De repente, enquanto falava, percebi que uma onda de tu m u lto abafado se espalhava entre o público. "Estão co chichando que você é am ericano!", alertou meu intérprete, no mesmo m om ento em que um dos participantes se levan tava subitam ente. Olhando fixo para mim, ele gritou a plenos pulmões: “Assassino!" De im ediato, uma dúzia de outras vozes se ju n to u a ele em coro: "Assassino! M atad o r de crianças! As sassino!"Felizmente, fui capaz de concentrar minha atenção no que aquele hom em estava sentindo e necessitando. No caso em questão, eu tinha algum as pistas. A cam inho do campo de refugiados, eu tinha visto várias latas vazias de gás lacrim o gêneo, que haviam sido atiradas contra o campo na noite an 33 terior. Em cada uma delas, estavam claram ente marcadas as palavras m a d e in usa (fabricado nos Estados Unidos). Eu sabia que os refugiados tinham m uita raiva dos eua por fornecerem gás lacrim ogêneo e outras armas a Israel. D irig i-m e ao homem que havia me chamado de assassino: eu Você está com raiva porque você gostaria que meu go verno usasse seus recursos de form a diferente? (E u n ã o s a b ia s e m e u p a lp i t e e s ta v a c e r to ; n o e n ta n to , o f u n d a m e n t a l e ra m e u e s fo r ç o s in c e ro d e m e s in to n iz a r c o m s e u s e n t im e n to e s u a s n e c e s s id a d e s .) ele Pode ter certeza de que estou! Você acha que precisa mos de gás lacrimogêneo? Precisamos é de esgotos, não do gás lacrimogêneo de vocês! Precisamos de mo radias! Precisamos te r nosso próprio país! eu Então você está furioso e gostaria de algum apoio para m elhorar suas condições de vida e obter a independên cia política? ele Você sabe o que é viver 27 anos aqui, do je ito que tenho vivido com a fam ília - filhos e tudo mais? Você possui a mais pálida noção do que isso tem sido para nós? eu Está me parecendo que você está m uito desesperado e que está im aginando se eu ou qualquer outra pessoa pode realm ente com preender o que significa viver nes sas condições. Foi isso mesmo que você quis dizer? ele Você quer compreender? M e diga: você tem filhos? Eles vão à escola? Eles têm p la y g r o u n d s l M eu filho está doente! Ele brinca no esgoto a céu aberto! Sua sala de aula não tem livros! Você já viu uma escola que não tem livros? I MARSHALL B. ROSENBERG I 34 I COMUNICAÇÃO NÃO-VIOLENTA I eu Estou ouvindo quanto é penoso para vocês criarem suas crianças aqui. Você gostaria que eu soubesse que o que você quer é o que todos os pais desejam para os filhos — uma boa educação, a oportunidade de brincar e crescer num am biente saudável... ele É isso mesmo! 0 básico! Direitos humanos - não é isso que vocês americanos dizem? Por que não vêm mais de vocês aqui para ver que tipo de direitos humanos vocês estão trazendo para cá? eu Você gostaria que mais americanos tomassem cons ciência da enorm idade do sofrim ento que ocorre aqui e vissem profundam ente as conseqüências de nossas ações políticas? Nosso diálogo continuou; ele expressando sua dor por quase vinte minutos mais, e eu procurando escutar o senti m ento e a necessidade por trás de cada frase. Não concordei nem discordei. Recebi as palavras dele não como ataques, mas como presentes de outro ser hum ano que estava disposto a com partilhar comigo sua alm a e suas profundas vu lnerab ili- dades. Uma vez que se sentiu compreendido, o homem foi capaz de me ouvir explicar o m otivo de eu estar naquele campo. Uma hora depois, o mesmo homem que havia me cha mado de assassino estava me convidando para ir a sua casa para um ja n ta r de ramadã. 35 2 . A comunicação que bloqueia a compaixão Não julgueis, para que não sejais julgados. Pois, com o critério com que julgardes, sereis julgados. M a t e u s 7 , 1 Ao estudar a questão do que nos afasta de nosso estado natu ral de compaixão, identifi- Certas formas de comunicação nos alienam de nosso estado compassivo natural.quei algumas formas específicas de linguagem e com unicação que acredito contribuírem para nosso com portam ento violento em relação aos outros e a nós mesmos. Para designar essas formas de comunicação, utilizo a expressão "comunicação alienante da vida". J ulgam entos moralizadores Um tipo de comunicação alienante da vida é o uso de julga mentos moralizadores que subentendem um a natureza errada ou maligna nas pessoas que não agem em consonância com nossos valores. Tais julgamentos aparecem em frases como: "O teu proble ma é ser egoísta demais", "Ela é preguiçosa", "Eles são preconcei tuosos", "Isso é impróprio". Culpa, insulto, depreciação, rotulação, crítica, comparação e diagnósticos são todos formas de julgamento. 37 I MARSHALL B. ROSENBERG I No mundo dos julgamentos, o Certa vez, o poeta sufi Rumi que nos importa é QUE/l/l "É" O escreveu: "Para além das idéias QUÊ. de certo e errado, existe um cam po. Eu m e encontrarei com você lá". No entanto, a comunicação alienante da vida nos prende num m undo de idéias sobre o certo e o errado — um m undo de julgam entos, um a linguagem rica em palavras que classificam e dicotomizam as pessoas e seus atos. Q uando em pregam os essa linguagem, julgam os os outros e seu com portam ento enquanto nos preocupam os com o que é bom, m au, norm al, anorm al, responsável, irresponsável, inteligente, ignorante etc. M uito antes de ter chegado à idade adulta, aprendi a m e co m unicar de um a m aneira impessoal que não exigia que eu re velasse o que se passava dentro de mim. Q uando encontrava pessoas ou com portam entos de que não gostava ou que não com preendia, reagia considerando que fossem errados. Se m eus professores m e determ inavam um a tarefa que eu não queria fazer, eles eram "medíocres" ou estavam "exorbitando". Se al guém m e dava um a fechada no trânsito, m inha reação era gri tar: "Palhaço!" Quando usam os tal linguagem, pensam os e nos com unicam os em term os do que há de errado com os outros para se com portarem desta ou daquela m aneira — ou, ocasio nalm ente, o que há de errado com nós mesmos para não com preenderm os ou reagirmos do m odo que gostaríamos. Nossa atenção se concentra em classi- Analisar os outros é, na realida- ficar, analisar e determ inar ní- de, uma expressão de nossas ne- veis de erro, em vez de fazê-lo cessidades e valores. no que nós e os outros necessi tam os e não estamos obtendo. Assim, se m inha m ulher deseja mais afeto do que estou lhe dando, ela é "carente e dependente". Mas, se quero mais a ten 38 I COMUNICAÇÃO NÃO-VIOLENTA I ção do que m e dá, então ela é "indiferente e insensível". Se m eu colega aten ta mais aos porm enores do que eu, ele é "cricri e compulsivo". Por outro lado, se sou eu quem presta mais a ten ção aos detalhes, ele é "lambão e desorganizado". Estou convicto de que todas essas análises de outros seres hum anos são expressões trágicas de nossos próprios valores e necessidades. São trágicas porque, quando expressamos nossos valores e necessidades de tal forma, reforçamos a postura defen siva e a resistência a eles nas próprias pessoas cujos com porta m entos nos interessam. Ou, se essas pessoas concordam em agir de acordo com nossos valores porque aceitam nossa análise de que estão erradas, é provável que o façam por medo, culpa ou vergonha. Todos pagamos caro quando as pessoas reagem a nossos va lores e necessidades não pelo desejo de se entregar de coração, mas por medo, culpa ou vergonha. Cedo ou tarde, sofreremos as conseqüências da dim inuição da boa vontade daqueles que se subm etem a nossos valores pela coerção que vem de fora ou de dentro. Eles tam bém pagam um preço emocional, pois p rova velm ente sentirão ressentim ento e m enos auto-estim a quando reagirem a nós por medo, culpa ou vergonha. Além disso, toda vez que os outros nos associam a qualquer desses sentim entos, reduzim os a probabilidade de que no futuro venham a reagir com passivam ente a nossas necessidades e valores. Aqui, é im portante não confundir juízos de valor com ju lga mentos moralizadores. Todos fazemos juízos de valor sobre as qua lidades que admiramos na vida; por exemplo, podemos valorizar a honestidade, a liberdade ou a paz. Os juízos de valor refletem o que acreditamos ser m elhor para a vida. Fazemos julgamentos mo ralizadores de pessoas e com portam entosque estão em desacordo com nossos juízos de valor; por exemplo, "A violência é ruim; 39 pessoas que m atam outras são más". Se tivéssemos sido criados falando um a linguagem que facilitasse exprimir compaixão, te ríamos aprendido a articular diretam ente nossas necessidades e nossos valores, em vez de insinuarm os que algo é ou está errado quando eles não são atendidos. Por exemplo, em vez de "A vio lência é ruim", poderíamos dizer: "Tenho m edo do uso da violên cia para resolver conflitos; valorizo a resolução de conflitos por outros meios". A relação entre linguagem e violência é tem a das pesquisas de O. J. Harvey, professor de psicologia na U niversidade do Colorado. Ele tom ou am ostras aleatórias de obras literárias de países m undo afora e tabulou a freqüência das palavras que classificam e julgam as pessoas. Seu estudo constata elevada cor relação entre o uso freqüente dessas palavras e a incidência de violência. Não m e surpreende saber que existe consideravel m ente m enos violência em culturas nas quais as pessoas p e n sam em term os das necessidades hum anas do que em outras nas quais as pessoas se rotulam de "boas" ou "más" e acreditam que as "más" m erecem ser punidas. Em 75% dos program as exibidos nos horários em que existe m aior probabilidade de as crianças am ericanas estarem as- Classificar e julgar as pessoas sistindo à tv, o herói ou m ata estimula a violência. pessoas, ou as espanca. Tal vio lência costum a constituir o "clí m ax" do espetáculo. Os telespectadores (a quem se ensinou que os m aus m erecem castigo) sentem prazer em ver essa violência. Na raiz de grande parte ou talvez de toda violência — ver bal, psicológica ou física, entre familiares, tribos ou nações —, está um tipo de pensam ento que atribui a causa do conflito ao fato de os adversários estarem errados, e está a correspondente incapacidade de pensar em si mesmos ou nos outros em term os I MARSHALL B. ROSENBERG I 40 I COMUNICAÇÃO NÃO-VIOLENTA I de vulnerabilidade — o que a pessoa pode estar sentindo, te m endo, ansiando, do que pode estar sentindo falta, e assim por diante. D urante a Guerra Fria, testem unham os essa perigosa m aneira de pensar. Nossos líderes viam os russos como um "im pério do mal" dedicado a destruir o American way oflife. Os líde res russos se referiam ao povo am ericano como "opressores im perialistas" que tentavam subjugá-los. N enhum dos dois lados reconhecia o m edo que se escondia por trás daqueles rótulos. F azendo comparações Outra forma de julgam ento é o uso de comparações. No livro How to m akeyourself miserable [Como enlouquecer você mesmo: o poder do pensamento negativo], Dan Greenberg demonstra por meio do hum or o poder insidioso que o pensam ento comparativo pode Comparações são uma forma de exercer sobre nós. Ele sugere julgamento, que, se os leitores tiverem um desejo sincero de tornar suas vidas infelizes, devem aprender a se comparar a outras pessoas. Para aqueles que não estão familiari zados com essa prática, Greenberg fornece alguns exercícios. O primeiro mostra as figuras de corpo inteiro de um hom em e um a m ulher que encarnam o presente ideal de beleza física expresso pela mídia. Os leitores são instruídos a tom ar suas próprias m edi das corporais, compará-las às indicadas nas figuras daqueles dois espécimes atraentes e ficar m atutando sobre as diferenças. O exercício cum pre o que prom ete: quando fazemos essas comparações, começamos a nos sentir infelizes. No m om ento em que já estamos tão deprimidos quanto julgam os possível, nós viramos a página e descobrimos que o prim eiro exercício tinha sido só aquecim ento. Já que a beleza física é relativam en- I MARSHALL B. ROSENBERG I te superficial, Greenberg nos oferece agora a oportunidade de nos com pararm os aos outros em algo que im porta para valer: as realizações pessoais. Ele escolhe ao acaso alguns indivíduos com quem possam os nos com parar. O prim eiro nom e que ele diz te r achado é o de W olfgang A m adeus M ozart. Greenberg enum era os idiom as que M ozart falava e as obras im portantes que compôs quando ainda era adolescente. O exercício nos instru i então a nos lem brar de nossas respectivas realizações n a atual fase de nossa vida, com pará-las com o que M ozart já havia conseguido aos 12 anos e refletir longam ente sobre as di ferenças. Por m eio daquele exercício, até os leitores que nunca con seguem sair da infelicidade auto-im posta são capazes de ver quanto esse tipo de pensam ento bloqueia a compaixão, tanto por si próprios quanto pelos outros. N egação de responsabilidade O utro tipo de com unicação alienante da vida é a negação de responsabilidade. A com unicação alienante da vida turva nossa consciência de que cada um de nós é responsável por seus próprios pensam entos, sentim entos e atos. O uso corriqueiro da ponsabilidade pessoal por nossos atos fica obscurecida nesse tipo de linguagem. A expressão "fazer alguém sentir-se" (como em "Você m e faz sentir culpado") é outro exem plo da m aneira pela qual a linguagem facilita a negação da responsabilidade pessoal por nossos sentim entos e pensam entos. Nosso linguagem obscurece a consciência da responsabilidade pessoal. expressão "ter de" (como em "Há algum as coisas que você tem de fazer, quer queira, quer não") ilustra de que modo a res- 42 I COMUNICAÇÃO NÃO-VIOLENTA I Em Eichmann em Jerusalém, livro que docum enta o ju lg a m ento do oficial nazista A dolph E ichm ann por crimes de guer ra, H annah A rendt conta que ele e seus colegas davam um nom e à linguagem de negação de responsabilidade usada por eles. C ham avam -na de Amtssprache, que se poderia traduzir li vrem ente como "linguagem de escritório", ou "burocratês". Por exem plo, se lhe perguntassem por que ele tom ara certa a ti tude, a resposta poderia ser: "Tive de fazer isso". Se lhe perg u n tassem por que "teve de fazer", a resposta seria: "Ordens supe riores", "A política institucional era essa", "Era o que m andava a le i" . Negamos responsabilidade por nossos atos quando os atri buím os a: • forças vagas e impessoais ("Limpei m eu quarto porque tive de fazê-lo"); • nossa condição, diagnóstico, histórico pessoal ou psicológico ("Bebo porque sou alcoólatra"); • ações dos outros ("Bati no m eu filho porque ele correu para a rua"); • ordens de autoridades ("M enti para o cliente porque o chefe m e m andou fazer isso"); • pressão do grupo ("Comecei a fum ar porque todos os m eus amigos fumavam"); • políticas, regras e regulam entos institucionais ("Tenho de suspender você por conta dessa infração; é a política da es cola"); • papéis determ inados pelo sexo, idade e posição social ("De testo ir trabalhar, m as vou porque sou pai de família"); • impulsos incontroláveis ("Fui tom ado por um desejo de com er aquele doce"). 43 I MARSHALL B. ROSENBERG I Certa vez, durante um a discussão entre pais e professores sobre os perigos de um a linguagem que implicasse ausência de escolha, um a m ulher objetou, irada: "Mas existem algumas coi sas que você tem de fazer, gostando ou não! E não vejo nada de errado em dizer aos m eus filhos que há coisas que tam bém eles têm de fazer". Q uando pedi que desse um exem plo de algo que "tinha de fazer", ela respondeu: "É fácil! Q uando eu sair daqui esta noite, tenho de ir para casa e cozinhar. Eu detesto cozinhar! Detesto do fundo da alma, m as venho fazendo isso todos os dias há vinte anos, até quando estava m uito doente, porque é um a das coisas que a gente sim plesm ente precisa fazer". Eu lhe disse que estava consternado em ouvir que ela passara tan to tem po de sua vida fazendo algo que detestava só porque se achava compelida a fazê-lo, e que eu esperava que ela pudesse encon trar possibilidades m elhores aprendendo a linguagem da cnv. Tenho o prazer de inform ar que ela aprendeu rápido. No final do seminário, foipara casa e anunciou à família que não queria mais cozinhar. A oportunidade de receberm os algum re torno de seus familiares ocorreu três sem anas depois, quando os dois filhos chegaram para parti- Podemos substituir uma lingua- cipar de um seminário. Eu esta- gem que implique falta de esco- va curioso para saber como ti- Iha por outra que reconheça a n h am reagido à declaração da possibilidade de escolha. mãe. O filho mais velho suspi rou — "Marshall, eu simples m ente pensei: 'Graças a Deus!'" Vendo m inha expressão in tri gada, ele explicou: "Pensei comigo m esm o: Talvez ela finalm ente pare de reclam ar duran te as refeições!'" Em outra ocasião, quando eu prestava consultoria a um a secretaria m unicipal de ensino, um a professora observou: "De testo dar nota. Acho que elas não ajudam e ainda criam m uita ansiedade nos alunos. Mas tenho de dar, é a política da secreta 44 I COMUNICAÇÃO NÃO-VIOLENTA I ria". Tínham os acabado de praticar como introduzir na sala de aula um tipo de linguagem que aum entasse a consciência da res ponsabilidade pessoal. Sugeri que a professora substituísse a frase "Tenho de dar nota porque é a política da secretaria" por esta, completando-a: "Eu opto por dar nota porque desejo..." Ela respondeu sem hesitação: "Eu opto por dar nota porque desejo m anter o emprego". Apressou- se a acrescentar: "Mas não gosto de dizer dessa m aneira. Faz que eu m e sinta tão responsável pelo que faço..." Respondi: "É exata m ente por isso que quero que você diga dessa maneira". Com partilho dos sentim entos do rom ancista e jornalista francês George Bernanos quando escreve: 'O ’ Já acreáito há muito tempo que, se a eficiência caáa vez maior da tecnologia de destruição um dia fizer que nossa espécie desa pareça da Terra, não terá sido a crueldade a responsável por nossa extinção, menos ainda a indignação que a crueldade des perta ou as represálias e vinganças que ela atrai [...], mas sim a docilidade, a falta de responsabilidade do homem moderno, sua desprezível aceitação subserviente de qualquer decreto comum. Os horrores que já vimos, os horrores ainda maiores que logo ve remos, são sinal não de que os homens rebeldes, insubordinados e indomáveis estejam aumentando em número no mundo todo, e sim de que aumenta constantemente o número de homens obe dientes e dóceis. Ficamos perigosos quando não temos consciência de nossa res ponsabilidade por nossos com portamentos, pensamentos e sentimentos. 45 I MARSHALL B. ROSENBERG I Outras form as de comunicação alienante da vida Com unicar nossos desejos como exigências é outra forma de linguagem que bloqueia a compaixão. Uma exigência am ea ça os ouvintes explícita ou im plicitam ente com culpa ou p u n i ção se eles não a atenderem . É um a form a de comunicação com um em nossa cultura, especialm ente entre aqueles que detêm posições de autoridade. M eus filhos m e deram algumas lições valiosas sobre exigên cias. De algum a forma, m eti em m inha cabeça que, como pai, era m eu papel fazer exigências. Nunca conseguimos forçar as Contudo aprendi que, mesm o pessoas a fazer nada. que eu fizesse todas as exigên cias do m undo, isso não os leva ria a fazer coisa alguma. É um a lição de hum ildade no exercício do poder, para aqueles entre nós que acreditam que, por sermos pais, professores ou adm inistradores, é nossa tarefa m udar as outras pessoas e fazê-las se com portar. Pois ali estavam aqueles jovens me m ostrando que eu não conseguiria obrigá-los a nada. No máxim o poderia, por m eio da punição, fazê-los desejar ter feito o que eu queria. E eles acabaram m e ensinando que, sem pre que eu fosse tolo o bastante para fazer isso, teriam meios para me fazer desejar não tê-los punido! Voltaremos a esse assunto quando aprenderm os a diferen ciar pedidos e exigências — parte im portante da cnv. A com unicação alienante da vida tam bém se associa ao conceito de que certos atos m erecem recom pensa e outros p u nição. Tal form a de pensar se o pensamento baseado em expressa pelo verbo "merecer", “quem merece o quê" bloqueia a como em "João m erece ser pu- comunícação compassiva. nido pelo que fez". Ela presum e 46 I COMUNICAÇÃO NÃO-VIOLENTA I "maldade" da parte das pessoas que se com portam de determ i nadas m aneiras e dem anda algum a punição para fazê-las se a r rependerem e se em endarem . Acredito ser do interesse de todos que as pessoas m udem não para evitarem punições, mas por perceberem que a m udança as beneficiará. A m aioria de nós cresceu usando um a linguagem que, em vez de nos encorajar a perceber o que estamos sentindo e do que precisamos, nos estim ula a . . A comunicação alienante da vidarotular, comparar, exigir e pro- . . . . , tem profundas raízes filosóficas eferir julgam entos. Acredito que políticas.a com unicação a lien an te da vida se baseia em concepções sobre a natureza hum ana que exerceram influência duran te vários séculos. Tais visões dão ê n fase a nossa maldade e nossa deficiência inatas, bem como a n e cessidade de educar para controlar nossa natureza ineren te m ente indesejável. É com um que esse tipo de educação nos faça questionar se há algo errado com os sentim entos e as necessida des que possamos estar vivenciando. Aprendem os desde cedo a isolar o que se passa dentro de nós. A com unicação alienante da vida tanto se origina de socie dades baseadas na hierarquia ou dom inação quanto sustenta essas sociedades. Onde quer que um a grande população se e n contre controlada por um núm ero pequeno de indivíduos para o benefício desses últimos, é do interesse dos reis, czares, n o bres etc. que as massas sejam educadas de forma tal que a m en talidade delas se torne sem elhante à de escravos. A linguagem do "errado", o "deveria" e o "tenho de", é perfeitam ente ade quada a esse propósito: quanto mais as pessoas forem instru í das a pensar em term os de julgam entos m oralizadores que im plicam que algo é errado ou m au, mais elas serão treinadas a Consultar instâncias exteriores — as autoridades — para saber a 47 I MARSHALL B. ROSENBERG I definição do que constitui o certo, o errado, o bom e o mau. Q uando estamos em contato com nossos sentim entos e necessi dades, nós, hum anos, deixamos de ser bons escravos e lacaios. R esum o É de nossa natureza gostarm os de dar e receber com com paixão. Entretanto, aprendem os m uitas formas de "com unica ção aliénante da vida" que nos levam a falar e a nos comportar de maneiras que ferem aos outros e a nós mesmos. Uma forma de co m unicação aliénante da vida é o uso de julgam entos moraliza- dores que implicam que aqueles que não agem em consonância com nossos valores estão errados ou são m aus. O utra form a desse tipo de com unicação é fazer comparações, que são capa zes de bloquear a compaixão tan to pelos outros quanto por nós mesmos. A comunicação aliénante da vida tam bém prejudica nossa com preensão de que cada um de nós é responsável por seus próprios pensam entos, sentim entos e atos. Com unicar n o s sos desejos na form a de exigências é ainda outra característica da linguagem que bloqueia a compaixão. 48 3 . Observar sem avaliar OBSERVEM!!! Há poucas coisas tão importantes, tão religiosas, quanto isso. P ASTO R F R E D E R IC K B u EC H N E R Posso lidar com você me dizendo O que eu fiz ou deixei de fazer. E posso lidar com suas interpretações. Mas, por favor, não misture as duas coisas. Se você quer deixar qualquer assunto confuso, Posso lhe dizer como fazer: Misture o que eu faço Com a maneira que você reage a isso. Diga-me que você está decepcionada Com as tarefas inacabadas que você vê, Mas me chamar de "irresponsável" Não é um modo de me motivar. E me diga que fica magoada Quando digo "não" às suas aproximações, Mas me chamar de um homem "frígido" Não vai melhorar suas chances. 49 I MARSHALL B. ROSENBERG I Sim, posso lidar com você me dizendo0 que fiz ou deixei de fazer. E posso lidar com suas interpretações. Mas, por favor, não misture as duas coisas. M arshall B. R osenberg O prim eiro com ponente da cnv acarreta necessariam ente separar observação de avaliação. Precisamos observar claram en te, sem acrescentar n enhum a avaliação, o que vemos, ouvimos ou tocamos que afeta nossa sensação de bem-estar. As observações constituem um elem ento im portante da cnv, em que desejamos expressar clara e honestam ente a outra pes soa como estamos. No entanto, ao com binarm os a observação com a avaliação, dim inuím os a probabilidade de que os outros ouçam a m ensagem que desejamos lhes transmitir. Em vez dis so, é provável que eles a escutem como crítica e, assim, resistam ao que dizemos. A cnv não nos obriga a permanecermos completamente obje tivos e a nos abstermos de avaliar. Ela apenas requer que m ante nham os a separação entre nossas observações e nossas avaliações. A cnv é um a linguagem dinâmica, que desestimula generalizações estáticas; ao contrário, as avalia- Quando combinamos observação ções devem sempre se basear nas com avaliação, as pessoas teu- observações específicas de cada dem a receber isso como crítica. momento e contexto. O sem anti- cista Wendell Johnson observou que criamos m uitos problemas para nós mesmos ao usarmos um a linguagem estática para expressar ou captar um a realidade que está sempre m udando: "Nossa linguagem é um instrum en to imperfeito, criado por hom ens antigos e ignorantes. É um a 50 I COMUNICAÇÃO NÃO-VIOLENTA I linguagem animista, que nos convida a falar a respeito de esta bilidade e constância s, de sem elhanças, norm alidades e tipos, de transform ações mágicas, curas rápidas, problem as simples e so luções definitivas. No entanto, o m undo que tentam os simboli zar com essa linguagem é um m undo de processos, m udanças, diferenças, dimensões, funções, relações, crescimentos, in te ra ções, desenvolvimento, aprendizado, abordagem, complexidade. E o desencontro entre este nosso m undo sem pre em m utação e as formas relativam ente estáticas de nossa linguagem é parte de nosso problema". N um a canção que ilustra a diferença entre avaliação e ob servação, m inha colega R uth Beberm eyer m ostra o contraste entre linguagem estática e linguagem dinâmica: Í ‘K.' > Nunca vi um homem preguiçoso; já vi um homem que nunca corria enquanto eu o observava, e já vi um homem que às vezes dormia entre o almoço e o jantar, e ficava em casa em dia de chuva; mas ele não era preguiçoso. Antes que você me chame de louca, pense: ele era preguiçoso ou apenas fazia coisas que rotulamos de "preguiçosas"? Nunca vi uma criança burra; já vi criança que às vezes fazia coisas que eu não compreendia, ou as fazia de um jeito que eu não planejara; já vi criança que não conhecia 51 I MARSHALL B. ROSENBERG I as mesmas coisas que eu; mas não era uma criança burra. Antes de chamá-la de burra, pense: era uma criança burra ou apenas sabia coisas diferentes das que você sabia? Procurei quanto pude, mas nunca vi um cozinheiro. Já vi alguém que combinava ingredientes que depois comíamos, uma pessoa que acendia o fogo e cuidava do fogão que cozinhava a carne. Vi todas essas coisas, mas não vi cozinheiro. Diga-me o que você vê: você está vendo um cozinheiro ou alguém fazendo coisas que chamamos de cozinhar? 0 que alguns chamam de preguiçoso outros chamam de cansado ou tranqüilo; 0 que alguns de nós chamamos de burro para outros é apenas um saber diferente. Então, cheguei à conclusão de que evitaremos toda confusão se não misturarmos o que podemos ver com o que é nossa opinião. E, por isso mesmo, também quero dizer que sei que esta é apenas minha opinião. Em bora os efeitos de rótulos negativos como "preguiçoso" e "burro" sejam mais evidentes, até um rótulo positivo ou apa 52 I COMUNICAÇÃO NÃO-VIOLENTA I ren tem ente neutro como "cozinheiro" lim ita nossa percepção da totalidade do ser de outra pessoa. A FORMA MAIS ELEVADA DE INTELIGÊNCIA HUMANA Certa vez, o filósofo indiano J. K rishnam urti disse que ob servar sem avaliar é a form a mais elevada de inteligência h u m a na. Q uando li essa afirmação pela prim eira vez, o pensam ento "Que disparate!" passou por m inha cabeça antes que eu perce besse que acabara de fazer um a avaliação. Para a m aioria de nós, é difícil fazer observações que sejam isentas de ju lgam en to, crítica ou outras formas de análise sobre as pessoas e seu com portam ento . Adquiri aguda consciência dessa dificuldade quando traba lhei n um a escola prim ária onde eram freqüentes as dificuldades de com unicação entre os professores e o diretor. A Secretaria de Ensino havia me pedido que os ajudasse a resolver o conflito. Eu deveria conversar prim eiro com os professores e depois com estes e o diretor juntos. Iniciei a reunião perguntando aos professores: "O que o d i retor está fazendo que en tra em conflito com as necessidades de vocês?" A resposta foi rápida: "Ele fala mais que a boca!" Eu havia pedido um a observação, mas, em bora a expressão "falar mais que a boca" m e desse informações de como aquele profes sor avaliava o diretor, ela não descrevia o que este dissera ou f i zera que levara o professor a interpretar que ele "falava mais que a boca". Q uando assinalei isso, outro professor disse: "Sei o que ele quer dizer: o diretor fala demais!" Em vez de um a observação clara do com portam ento do diretor, era mais um a vez um a ava liação (de quanto o diretor falava). Um terceiro professor então 53 I MARSHALL B. ROSENBERG I declarou: "Ele acha que é o único capaz de dizer algo que valha a pena". Expliquei que inferir o que outra pessoa pensa não é a m esm a coisa que observar seu com portam ento. Por fim, um quarto professor arriscou: "Ele quer sempre ser o centro das atenções". Quando apontei que aquilo tam bém era um a inferên cia (do que outra pessoa está querendo), dois professores disse ram em coro: "Bem, sua pergunta é m uito difícil de responder!" Mais tarde, trabalham os jun tos para criar um a lista que identificasse comportamentos específicos do diretor que os incom o davam, e nos asseguramos de que essa lista estivesse isenta de avaliações. Por exemplo, o diretor costum ava contar histórias de sua infância e suas experiências de guerra duran te as re u niões com os docentes; como resultado, as reuniões às vezes de m oravam vinte m inutos além da conta. Q uando perguntei se já tinham com unicado seu aborrecim ento ao diretor, responde ram que haviam tentado, mas que o fizeram apenas com co m entários de caráter avaliador. Nunca tinham feito nenhum a referência a com portam entos específicos (o hábito de contar histórias, por exemplo) e concordaram em trazê-los à baila quando nos reuníssem os todos. Quase tão logo começou a reunião geral, en tendi do que os professores falavam. Não im portando o que estivesse sendo dis cutido, o diretor sempre dizia: "Isso me lem bra de quando ..." — e iniciava um a história sobre a infância ou a guerra. Esperei que os professores expressassem seu m al-estar com o com porta m ento do diretor. Entretanto, em vez de Comunicação Não- Violenta, eles aplicaram condenação não-verbal: alguns revira ram os olhos, outros bocejaram ostensivam ente, outro ficou olhando o relógio. A güentei essa situação penosa até que finalm ente pergun tei: "Alguém vai dizer algum a coisa?" Seguiu-se um silêncio 54 I COMUNICAÇÃO NÃO-VIOLENTA I constrangido. O professor que havia se pronunciado prim eiro em nossa reunião anterior criou coragem, olhou direto para o diretor e disse: "Ed, você fala mais que a boca". Como m ostra essa história, nem sem pre é fácil nos livrar mos dos velhos hábitos e dom inarm os a capacidade de separar a observação da avaliação. Os professores acabaram conseguin do esclarecer para o diretor os atos específicos que os aborre ciam. O diretor escutou de boa vontade e entãodisparou: "Por que n en h u m de vocês m e disse isso antes?" Reconheceu ter consciência do hábito de contar histórias e, em seguida, com e çou a contar um a a respeito! Eu o interrom pi, observando (com bom hum or) que ele estava fazendo aquilo de novo. Term ina mos nossa reunião desenvolvendo m aneiras pelas quais os p ro fessores poderiam gentilm ente fazer o diretor saber quando suas histórias não estavam sendo apreciadas. D istinguindo observações de avaliações A tabela a seguir distingue observações isentas de avalia ções daquelas que têm avaliações associadas. Comunicação Exemplo de observação Exemplo de observação 1. Usar o verbo ser sem Você é generoso demais. Quando vejo você dar com avaliação associada isenta de avaliação ind icar que a pessoa que avalia aceita a responsabilidade pela avaliação. para os outros todo o d inheiro do almoço, acho que está sendo generoso demais. 2. Usar verbos de João vive deixando as João só estuda na véspera conotação avaliatória. coisas para depois. das provas. (con tinua ) 55 I MARSHALL B. ROSENBERG I (con tinuação) Comunicação 3. Im plicar que as inferências de uma pessoa sobre os pensamentos, sentimentos, intenções ou desejos de outra são as únicas possíveis. 4. C onfundir previsão com certeza. 5. Não ser específico a respeito das pessoas a quem se refere. 6. Usar palavras que denotam habilidade sem indicar que se está fazendo uma avaliação. 7. Usar advérbios e adjetivos de maneiras que não indicam que se está fazendo uma avaliação. Exemplo de observação com avaliação associada 0 traba lho dela não será aceito. Se você não fizer refeições balanceadas, sua saúde f i cará prejudicada. Os estrangeiros não cuidam da própria casa. Zequinha é péssimo jogador de fu tebo l. Carlos é feio. Exemplo de observação isenta de avaliação Acho que o trabalho dela não será aceito. Ou: Ela disse que o trabalho dela não seria aceito. Se você não fizer refeições balanceadas, tem o que sua saúde fique prejudicada. Não vi aquela fam ília es trangeira da outra rua lim par a calçada. Em v in te partidas, Zequinha não marcou nenhum gol. A aparência de Carlos não me atrai. Note-se que as palavras sempre, nunca, jam ais etc. expressam observações quando usadas das seguintes maneiras: • Sempre que vi Ricardo ao telefone, ele falou pelo m enos m eia hora. • Não consigo m e lem brar de você jam ais ter escrito para mim. 56 I COMUNICAÇÃO NÃO-VIOLENTA I Às vezes, tais palavras são usadas como exagero de lingua gem — caso em que se associam avaliações às observações: • Você está sempre ocupado. • Ela nunca está quando precisamos dela. Q uando essas palavras são usadas como exagero de lingua gem, é com um provocarem não compaixão, mas reações defen sivas. Palavras como freqüentemente e raramente tam bém podem contribuir para confundir observação com avaliação. Avaliações Observações Você raram ente faz o que eu quero. Nas últim as três vezes em que comecei alguma atividade, você disse que nâo queria fazê-la. Ele aparece aqui com freqüência. Ele aparece aqui pelo menos três vezes por semana. Resum o O prim eiro com ponente da cnv acarreta necessariam ente que se separe observação de avaliação. Q uando combinamos observações com avaliações, os outros tendem a receber isso como crítica e resistir ao que dizemos. A cnv é um a linguagem dinâmica que desestim ula generalizações estáticas. Em vez disso, as observações devem ser feitas de m odo específico, para um tem po e um contexto determ inado. Por exemplo, "Zequi- nha não m arcou n en h u m gol em vinte partidas", em vez de "Zequinha é péssimo jogador de futebol". 57 I MARSHALL B. ROSEIMBERG I : A cisiv em ação “ 0 p a le s t r a n te m a is a r r o g a n te q u e já t i v e m o s ! ” Este diálogo ocorreu durante um seminário que eu conduzia. Após cerea de meia hora de apresentação, fiz uma pausa para abrir espaço para m anifestações dos participantes. Um deles levantou a mão e declarou: "Você é o palestrante mais arro gante que já tivemos!" Tenho várias opções para escolher quando as pessoas se diri gem a m im dessa maneira. Uma delas é levar a mensagem a mal; sei que faço isso quando sinto grande necessidade de me curvar, me defender ou arranjar desculpas. Outra opção (na qual estou bem treinado) é atacar a outra pessoa pelo que considero um ataque contra mim. Naquele dia, escolhi uma terceira opção: concentrar-m e no que poderia estar por trás da afirm ação daquele hom em. eu (d e d u z in d o d a s o b s e rv a ç õ e s q u e e le e s ta v a fa z e n d o ) Será que você está reagindo por eu te r dem orado tr in ta minutos corridos para apresentar minhas idéias até vocês terem tido chance de falar? ele Não! Falando, você faz tudo parecer simples demais. eu ( te n t a n d o e s c la re c e r m e lh o r ) Você está reagindo por eu não te r d ito nada sobre como, para algumas pes soas, pode ser difícil pôr o processo em prática? ele Não, não para algumas pessoas — para você! eu Então você está reagindo por eu não ter dito que o processo às vezes pode ser difícil para mim mesmo? ele Isso mesmo. eu Você está aborrecido porque você teria apreciado algum tipo de sinal de minha parte que indicasse que eu mesmo tenho alguns problemas com o processo? I COMUNICAÇÃO NÃO-VIOLENTA I ele (d e p o is d e u m a p e q u e n a p a u s a ) É isso mesmo. eu ( m a is re la x a d o , a g o ra q u e e s ta v a e m c o n ta t o c o m o s e n t im e n t o e a n e c e s s id a d e d a p e s s o a e d i r ig in d o m in h a a te n ç ã o p a r a o q u e e la p o d e r ia e s ta r m e p e d in d o ) Você gostaria que eu reconhecesse agora mesmo que esse processo pode ser difícil para eu mesmo colo car em prática? ele Sim. eu ( te n d o e s c la re c id o s u a o b s e rv a ç ã o , s e u s e n t im e n t o e s e u p e d id o , fa ç o u m a in t r o s p e c ç ã o p a r a v e r s e e s to u d is p o s to a fa z e r o q u e e/e p e d e ) É, esse processo m ui tas vezes é difícil para mim. Ao longo do seminário, você provavelm ente me ouvirá descrever vários inci dentes em que lutei - ou perdi com pletam ente o con ta to - com esse processo, essa consciência que estou apresentando para vocês. Mas o que me faz persistir são as conexões de proximidade com outras pessoas, conexões que acontecem quando consigo me m anter no processo. vC^OO'/1 ■ ■ E x e rc íc io 1 ■■ . - W ' O b s e r v a ç ã o o u a v a l ia ç ã o ? Para determ inar sua habilidade de discernir entre observações e avaliações, faça o exercício a seguir. Circule o núm ero de qualquer afirm ação que seja uma observação pura, sem nenhuma avaliação associada. 1. O ntem , João estava com raiva de mim sem nenhum motivo. 2. Ontem à noite, Lúcia roeu as unhas enquanto assistia à tv. I MARSHALL B. ROSENBERG I 3. Marcelo não pediu minha opinião durante a reunião. 4. Meu pai é um homem bom. 5. M aria trabalha demais. 6. Luís é agressivo. 7. Cláudia fo i a primeira da fila todos os dias desta semana. 8. M eu filh o freqüentem ente deixa de escovar os dentes. 9. A ntônio me disse que eu não fico bem de amarelo. 10. M inha tia reclama de algum a coisa toda vez que fa lo eom ela. A q u i e s t ã o m i n h a s r e s p o s t a s p a r a o e x e r c íc io 1 : 1. Se você circulou esse número, discordamos. Considero "sem ne nhum m otivo" uma avaliação. Também considero uma avaliação in ferir que João estava com raiva. Ele podia estar magoado, am e drontado, triste ou outra coisa. Exemplos de observações sem avaliação poderiam ser "João me disse que estava com raiva" ou "João esmurrou a mesa". 2. Se você circulou esse número, estamos de acordo em que se fez uma observação à qual não estava associada nenhum a avaliação. 3. Se você circulou esse número, estamos de acordo em que se fez uma observação à qual não estava