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Rebeca Woset INTRODUÇÃO A observação do animal pode indicar inúmeras informações úteis para o diagnóstico, tais como: • Nível de consciência: alerta (normal), diminuído (deprimido, apático), aumentado (excitado) • Postura e locomoção: normal ou anormal (sugerindo dor localizada, fratura, luxação ou doenças neurológicas); observe o animal em repouso e, em seguida, em movimento • Condição física ou corporal: obeso, gordo, normal, magro, caquético • Pelame: pelos limpos, brilhantes ou eriçados, existência de ectoparasitas (carrapatos, piolhos, pulgas etc.) • Formato abdominal: normal, anormal (timpanismo, ascite etc.) • Características respiratórias: eupneia ou dispneia (postura ortopneica), tipo respiratório, secreção nasal etc. • Outros: apetite, sede, defecação, vômito, secreções (vaginal, nasal, ocular) micção etc. NÍVEL DE CONSCIÊNCIA É necessário considerar a excitabilidade do animal como “diminuída” (apático), “ausente” (coma), “normal” e “aumentada” (excitado). Há, contudo, animais sadios que reagem prontamente aos estímulos, enquanto outros o fazem lentamente; assim, em algumas ocasiões, esse parâmetro passa a ser subjetivo. POSTURA Trata-se do posicionamento que o animal adota quando em posição quadrupedal, em decúbito e durante a locomoção. É necessário avaliar se o animal assume algum padrão de postura pouco usual, indicativo, muitas vezes, de anormalidades. A maioria dos animais pecuários saudáveis, quando abordada em decúbito, ergue-se. Ao ser conduzido para o local de exame, o animal manifesta resposta a estímulos externos, por uma simples alteração nos seus movimentos e/ou por emissão de ruídos. Os animais, quando doentes, ficam com a cabeça baixa, afastam-se do rebanho ou se levantam com dificuldade (neste caso, os grandes animais) e adotam posições características como, por exemplo, postura ortopneica, que acompanha principalmente as enfermidades do sistema respiratório, caracterizada por distensão do pescoço, protrusão da língua e abdução dos membros anteriores; curvatura da coluna vertebral (cifose) em casos de processos dolorosos em cavidade abdominal etc. Em geral, os pequenos animais escondem-se, ficam indiferentes ou apáticos, gemem e, às vezes, irritam-se com facilidade. Nenhum animal adotará uma postura anormal, seja em posição quadrupedal, em decúbito ou em locomoção, sem que haja algum fator determinante. Na maioria dos casos, as posturas anormais sugerem algia localizada e/ou comprometimento do sistema nervoso. Postura de cachorro sentado: observada, por exemplo, nos casos de paralisia espástica dos membros posteriores Postura de foca: comumente vista nas paralisias flácidas dos membros posteriores Postura de cavalete: observa-se rigidez e abdução dos quatro membros, sendo vista, mais frequentemente, nos casos de tétano. ESTADO NUTRICIONAL OU ECC Ao examinar o estado nutricional do animal, é necessário considerar: (1) a espécie; (2) a raça; e (3) a utilidade ou aptidão. Convém descrever a condição corporal ou física do animal de maneira objetiva e sem dúbia interpretação, tal como “caquético, magro, normal, gordo e obeso”. AVALIAÇÃO GERAL DA PELE Rebeca Woset As alterações de pele podem ser localizadas ou generalizadas, únicas ou múltiplas, simétricas ou assimétricas etc. O grau de desidratação dos animais é frequentemente estimado, mas dificilmente quantificado. A desidratação pode ser medida comparando-se o peso corporal inicial (antes da desidratação) com o peso do animal desidratado. Existem duas causas principais de desidratação: a primeira e principal causa de desidratação observada é a perda excessiva de líquido promovida pela ocorrência de diarreia e/ou vômito; a segunda é a ingestão inadequada de água. AVALIAÇÃO DOS PARÂMETROS VITAIS Frequências cardíaca, respiratória, do rúmen e do ceco, além da temperatura corporal. Os parâmetros devem ser aferidos e monitorados rotineiramente, se possível, 2 vezes/dia, uma pela manhã e outra ao final da tarde. Rebeca Woset EXAME DAS MUCOSAS As mucosas visíveis que costumamos examinar são as oculopalpebrais (conjuntiva palpebral superior, conjuntiva palpebral inferior, terceira pálpebra ou membrana nictitante e conjuntiva bulbar ou esclerótica), mucosas nasal, bucal, vulvar, prepucial e, raramente, anal. É necessária especial atenção às alterações de coloração, como também à ocorrência de ulcerações, hemorragias e secreções durante o exame visual. A terceira pálpebra se torna evidente no tétano, na síndrome de Horner (perda da inervação simpática do globo ocular) e em algumas intoxicações (nicotina e estricnina). Nos bovinos, os vasos episclerais apresentam-se delineados e, nos equinos, a coloração da esclerótica apresenta- se castanho-amarelada, em virtude de maior Rebeca Woset pigmentação. Nos gatos, a esclerótica é completamente branca e relativamente avascular. FORMA ABDOMINAL Normal ou anormal. CARACTERÍSTICAS RESPIRATÓRIAS Eupneia ou Dispneia e o tipo respiratório. AVALIAÇÃO DA COLORAÇÃO A coloração das mucosas depende de vários fatores, dentre os quais: quantidade e qualidade do sangue circulante, eficácia (ou eficiência) das trocas gasosas, da existência ou não de hemoparasitos, da função hepática adequada, da medula óssea e outros. As mucosas costumam se apresentar úmidas e brilhantes. A tonalidade, de maneira geral, é róseo-clara com ligeiras variações de matiz, vendo-se pequenos vasos com suas ramificações. As mucosas do animal recém- nascido apresentam coloração rósea menos intensa. Em fêmeas no cio, a mucosa vulvar pode se encontrar avermelhada. Em determinadas raças de algumas espécies domésticas, a coloração das mucosas tende a ser mais avermelhada (cães: Fila Brasileiro, Cocker Spaniel, Bulldog, Boxer; bovinos: Simental; equinos: Apaloosa, por exemplo), não devendo ser confundida com processo inflamatório ou irritativo da referida mucosa. Avaliação do tempo de preenchimento capilar. Animal sadio: 1 a 2 s Animal desidratado: 2 a 4 s Animal gravemente desidratado: > 5 s A congestão de mucosas ocorre devido ao ingurgitamento de vasos sanguíneos, por processo infeccioso ou inflamatório, local ou sistêmico (congestão pulmonar, conjuntivite, estomatite); é de grande valia como indicador do estado circulatório do animal. Além disso, a hiperemia pode ser difusa ou ramiforme; é difusa quando a tonalidade avermelhada é uniforme (intoxicação), e ramiforme quando é possível notar os vasos mais salientes, com maior volume sanguíneo (dispneias). A cianose é uma coloração azulada da pele e das mucosas, causada pelo aumento da quantidade absoluta de hemoglobina reduzida no sangue. A coloração azulada das mucosas, portanto, indica um distúrbio da hematose (troca gasosa que ocorre nos alvéolos) e que depende mais dos pulmões que do coração; no entanto, caso não consiga proporcionar ao organismo circulação sanguínea adequada, esse órgão poderá levar à cianose, tanto por problemas cardíacos quanto vasculares. Ou seja, muitas são as causas de cianose: algumas, de origem circulatória; outras, por processos respiratórios ou sistêmicos. A icterícia é o resultado da retenção de bilirrubina nos tecidos, e ocorre devido ao aumento da bilirrubina sérica acima dos níveis de referência. Rebeca Woset Legenda: Tipos de icterícia e suas consequências. ALT = alamina aminotransferase; AST = aspartato aminotransferase; BD = bilirrubina direta; BI= bilirrubina indireta; FA = fosfatase alcalina; GGT = gama glutamiltransferase; VG = volume globular. *Alteração inicial. **Alteração final. As mucosas oral e bulbar costumam ser os primeiros locais em que se detecta icterícia; da mesma maneira, a coloração é mais intensa em casos de icterícia obstrutiva e hepatocelular que na icterícia hemolítica. A icterícia pode ser causada por: • Doenças hemolíticas (aumento da produção por hemólise): quando o fígado não tem condições de excretar e/ou conjugar toda a bilirrubina formada (babesiose) • Lesões hepáticas (infecções bacterianas: leptospirose; substâncias hepatotóxicas: aflatoxina, fenol “creolina”) • Obstrução dos ductos biliares, quando a bilirrubina, em vez de ser excretada pela bile, chega à circulação sistêmica. OCORRÊNCIA DE CORRIMENTOS Os corrimentos, de acordo com as características macroscópicas, são classificados em: • Fluido: líquido, aquoso, pouco viscoso e transparente (corrimento nasal normal em bovinos) • Seroso: mais denso que o fluido, mas ainda transparente (processos virais, alérgicos e precede a secreção de infecções ou inflamações) • Catarral: mais viscoso, mais pegajoso, esbranquiçado • Purulento: mais denso e com coloração variável (amarelo-esbranquiçado, amarelo-esverdeado; na verdade, é um produto de necrose em um exsudato rico em neutrófilos, indicando, por exemplo, a ocorrência de processos infecciosos, corpos estranhos) • Sanguinolento: vermelho-vivo ou enegrecido; pode resultar de traumas, distúrbios hemorrágicos sistêmicos, processos patológicos agressivos etc. Rebeca Woset AVALIAÇÃO DOS LINFONODOS LOCALIZAÇÃO DOS LINFONODOS Os linfonodos possíveis de serem examinados na rotina prática são: (1) mandibulares ou maxilares; (2) retrofaríngeos; (3) cervicais superficiais ou pré- escapulares; (4) subilíacos (pré-femorais ou pré- crurais); (5) poplíteos; (6) mamários; e (7) inguinais superficiais ou escrotais. Os linfonodos mandibulares, na maioria das espécies, costumam ser dois e estão localizados superficialmente entre as veias faciais e a pele. Nos equinos, estão situados mais profundamente e ventralmente à língua. Os mesmos drenam a metade ventral da cabeça (cavidade nasal, lábios, língua, glândulas salivares). Denominação Coloração Significado Principais causas Pálida Esbranquiçada Anemia Ecto e endoparasitose Hemorragias/choque hipovolêmico Aplasia medular Insuficiência renal Falência circulatória periférica Congesta ou hiperêmica Avermelhada ↑ Permeabilidade - vascular Inflamação e/ou infecção local Septicemia/bacteriemia Febre Congestão pulmonar Endocardite Pericardite traumática Cianótica Azulada Distúrbio na hematose Anafilaxia Obstrução das vias respiratórias Edema pulmonar Insuficiência cardíaca congestiva Pneumopatias Exposição ao frio Ictérica Amarelada Hiperbilirrubinemia Estase biliar (obstrução) Anemia hemolítica imune Isoeritrólise neonatal Anemia hemolítica microangiopática – Babesiose – Anaplasmose – Hemobartonelose Hepatite tóxica e/ou infecciosa Rebeca Woset 1 – mandibular; 2 – pré-escapular; 3 – poplíteo e 4 – inguinal superficial (cão macho). 1 – mandibular; 2 – retrofaríngeo; 3 – pré-escapular e 4 – subilíaco (pré-crural). Grau de dificuldade (–) ou de facilidade (+) à palpação dos principais linfonodos examináveis nas diferentes espécies domésticas. Animais Linfonodo s Cãe s Gato s Equin os Ruminant es Mandibular es + + ± ± Pré- escapulare s + ± ↓ + Subilíacos NE NE ± + Poplíteos + + NE ↓ Mamários ↓ ↓ ↓ ± Inguinais + ± ↓ ↓ Os linfonodos retrofaríngeos laterais e mediais localizam-se na região cervical, entre o atlas e a parede da faringe (NP). Os linfonodos cervicais (pré-escapulares) superficiais são palpáveis na face lateral da porção distal do pescoço e ficam em uma fossa formada pelos músculos trapézio, braquiocefálico e omotransverso. Essa fossa se encontra imediatamente adiante da escápula, um pouco acima da articulação escapuloumeral. Em equinos, repousam abaixo do músculo peitoral cranial profundo, sendo de difícil palpação. Os linfonodos subilíacos (pré-femorais ou pré- crurais) podem ser palpados no terço inferior do abdome, a meia distância da prega do flanco e da tuberosidade ilíaca. Na maioria das vezes, os linfonodos mamários são representados por dois nódulos de cada lado, entre o assoalho ósseo da pelve e a parte caudal do úbere (transição da parede abdominal e parênquima glandular). Os linfonodos inguinais superficiais ou escrotais apresentam-se medial e lateralmente ao corpo do pênis. Os linfonodos poplíteos superficiais, ausentes nos equinos, estão localizados na origem do gastrocnêmio, entre os músculos bíceps femoral e semitendíneo, posteriormente à articulação femorotíbio-patelar. Muitos linfonodos, tais como parotídeos, retrofaríngeos e axilares, são palpados somente quando estão hipertrofiados, ou seja, quando estão reativos a algum processo inflamatório, infeccioso ou neoplásico nas respectivas regiões de drenagem. Rebeca Woset CARACTERÍSTICAS EXAMINÁVEIS DOS LINFONODOS Tamanho Há muita variação no tamanho dos linfonodos, mesmo quando palpados em animais saudáveis e de uma mesma espécie. Em geral, os gânglios linfáticos apresentam formato de grão de feijão e são relativamente maiores em animais jovens, visto que são expostos a uma grande variedade de estímulos antigênicos, tais como vacinação. O aumento do tamanho dos linfonodos deve ser descrito por meio de termos comparativos tirados da vida diária, tais como: “caroço de azeitona”, “azeitona pequena ou grande”, “limão”, “ovo de galinha”, “laranja”, dentre outros. Sensibilidade Sempre que possível (quando a hipertrofia do linfonodo for visível), deve-se palpar primeiramente as áreas menos dolorosas para, em seguida, chegar à área mais sensível ao toque, na tentativa de se obter melhor cooperação do paciente. Consistência Em geral, apresentam consistência firme, ou seja, são moderadamente compressíveis, cedendo à pressão, e voltando ao formato inicial uma vez cessada a pressão. Nos processos inflamatórios e infecciosos agudos, a consistência não se altera, mas é possível denotar o aumento de volume e de sensibilidade. Nos processos inflamatórios e infecciosos crônicos e neoplásicos, os linfonodos ficam duros. Mobilidade Os linfonodos costumam apresentar boa mobilidade; eles são móveis tanto com relação à pele quanto às estruturas vizinhas quando palpados. A perda ou a ausência de mobilidade é um achado comum nos processos inflamatórios bacterianos agudos, devido ao desenvolvimento de celulite localizada, que os fixa nos tecidos vizinhos. Temperatura Em geral, os linfonodos apresentam temperatura igual à da pele que os recobre. A elevação da temperatura é acompanhada, na maioria das vezes, de dor à palpação. AVALIAÇÃO DA TEMPERATURA CORPORAL O episódio da febre pode ser dividido em três fases: • Ascensão ou de aparecimento (stadium incrementi): a fase inicial do aumento progressivo da temperatura. Na maioria das vezes, corresponde ao período de invasão do agente mórbido. Quando o ponto fixo do centro termorregulador aumenta e alcança um nível acima do normal, todos os mecanismos para a elevação da temperatura corporal são ativados, incluindo a conservação de calor e o aumento de sua produção. O corpo se ajusta como se aquela fosse a sua verdadeira temperatura. Com isso, ocorre vasoconstrição periférica e o animal demonstra frio e tremores • Acme (“fastígio”):quando a temperatura alcança seu limite máximo, determinando, até certo ponto, a estabilização térmica; os tremores desaparecem • Defervescência (stadium decrementi): quando ocorre o declínio da temperatura. É possível observar decréscimo por lise (queda lenta e progressiva da temperatura/pode demorar alguns dias) ou por crise (a temperatura retorna ao normal em poucas horas). TIPOS DE FEBRE • Simples ou típica: acompanha os três estágios previamente descritos, com a Rebeca Woset temperatura permanecendo elevada, mas flutuando dentro de pequenos limites (até 1°C). A temperatura permanece alta por vários dias, podendo cair em virtude da recuperação ou da morte do animal • Remitente: a temperatura permanece elevada durante grande parte do dia (geralmente maior que 1°C), caindo em intervalos de tempo curtos e irregulares, sem voltar aos valores normais • Intermitente: os períodos de pirexia perduram por um ou vários dias, sendo intercalados por períodos normotérmicos ou mesmo hipotérmicos • Atípica: apresenta curso irregular, às vezes com grandes oscilações de temperatura em um mesmo dia. Nos casos de adenite equina, por exemplo, a febre pode apresentar um padrão bifásico e, em outras, pode haver quatro ou cinco picos febris, com ou sem períodos de apirexia, em um mesmo dia (septicemias, processos supurativos). INTENSIDADE DO PROCESSO FEBRIL De acordo com o grau de elevação da temperatura, a febre pode ser classificada em: (1) febrícula; (2) medianamente alta; (3) alta; (4) muito alta, como demonstrado em algumas espécies. Em todos os casos, o retorno da temperatura deve ser acompanhado pela normalização do pulso ou da frequência cardíaca, visto que se trata de um excelente parâmetro para avaliar a evolução do processo febril. Se a queda da temperatura for acompanhada pela diminuição do pulso e da frequência respiratória, esse tipo de declínio tem significado favorável, pois conduz à melhora do estado geral do animal. Caso ocorra diminuição da temperatura para os limites normais, mas o pulso e a frequência respiratória permaneçam elevados, isso indica colapso circulatório, com prognóstico reservado. No entanto, nos casos em que a temperatura cai e o pulso sobe (colapso álgido), o prognóstico é desfavorável (ruim) e é prenúncio de morte. Classificação da febre de acordo com o grau de elevação da temperatura. Tipo Equinos Bovinos Cães Febrícula 38 a 39°C 39,5 a 40°C 39,3 a 40°C Febre mediana 39,1 a 40°C 40,1 a 41°C 40,1 a 41°C Febre alta 40,1 a 41°C 41,1 a 42°C 41 a 41,5°C Febre muito alta > 41°C > 42°C > 41,5°C REFERÊNCIAS F., FEITOSA,.Francisco. L. Semiologia Veterinária - A Arte do Diagnóstico. Grupo GEN, 2020.
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