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Ginecologia Thomás R. Campos CICLO MENSTRUAL Os anos reprodutivos normais da mulher se caracterizam por variações rítmicas mensais da secreção dos hormônios femininos, e correspondem a alterações nos ovários e outros órgãos sexuais. Esse padrão rítmico é denominado ciclo sexual mensal feminino ou ciclo menstrual. – A duração de um ciclo menstrual típico é de 28 dias, podendo variar entre 21 a 35 dias – O fluxo de sangue é de aproximadamente 20-60 mL (cerca de 2 a 3 absorventes cheios), e dura em média de 3 a 5 dias – É normal que o ciclo seja irregular nos 02 primeiros anos pós-menarca e 03 anos que precedem a menopausa. O ciclo se torna mais regular entre os 20-40 anos. Conceitos Básicos: Menarca: primeira menstruação. – Marcado pelo amadurecimento do eixo hipotálamo-hipófise-ovário – Ocorre entre 11-14 anos, mas é aceitável que ocorra dos 09-16 anos Menstruação: sangramento genital de origem uterina, periódico e temporário, que se manifesta a cada mês. Menacme: período reprodutivo da mulher. – Vai da primeira menstruação (menarca) à última menstruação (menopausa) Climatério: transição do período reprodutivo para o não reprodutivo. – Marcado pelo início do declínio progressivo da atividade gonadal da mulher – Compreende um conjunto de sintomas que surgem antes e depois da menopausa, causados, principalmente, pelas variações hormonais típicas desse período Menopausa: última menstruação. – Geralmente ocorre por volta dos 50 anos – É “diagnosticada” somente após a mulher passar pelo menos 12 meses sem menstruar O processo reprodutivo feminino envolve o sistema nervoso central (sobretudo o hipotálamo), a glândula hipófise, o ovário e o útero. Todos devem funcionar de maneira apropriada a fim de que a reprodução ocorra normalmente. ▪ O GnRH (hormônio liberador de gonadotrofina hipotalâmico) regula, de maneira simultânea, tanto o LH (hormônio luteinizante) quanto o FSH (hormônio folículo estimulante) na hipófise ao ser secretado de modo pulsátil. A frequência do pulso determina a quantidade relativa da secreção de LH e FSH. ▪ O ovário responde ao FSH e ao LH de maneira definida, sequencial, para que se produza o crescimento folicular, haja a ovulação e o corpo lúteo se forme. O ciclo é concebido a fim de que se produza um ambiente adequado para a gravidez; se esta não ocorrer, o ciclo é reiniciado ▪ No início do ciclo menstrual, o ovário produz estrogênio, responsável pelo crescimento endometrial. Em seguida à ovulação, é também produzida em quantidades significativas a progesterona, a qual torna o endométrio ideal à implantação do embrião. Se não ocorrer gravidez, o ovário cessa a produção de estrogênio e progesterona, o endométrio é descartado, e o ciclo se reinicia. Ginecologia Thomás R. Campos Para entender essa loucura toda, é preciso estudar o eixo hipotálamo-hipófise-ovários No hipotálamo, neurônios em núcleos específicos (principalmente no núcleo arqueado) liberam GnRH em pulsos. A secreção pulsátil contínua de GnRH é necessária em virtude da meia-vida muito curta (cerca de 2 a 4 minutos) pela rápida clivagem proteolítica. Sua liberação pulsátil varia de acordo com a fase do ciclo ovariano: na fase folicular se caracteriza por pulsos frequentes e de pequena amplitude (a cada 60-90 minutos) e durante a fase lútea ocorre diminuição progressiva da frequência dos pulsos (a cada 210-270 minutos), mas estes apresentam amplitude maior do que na fase folicular. Essa secreção pulsátil sofre influências de exercícios físicos, estresse, dietas e problemas emocionais. -Fase folicular: baixa amplitude e alta frequência. -Fase lútea: alta amplitude e baixa frequência. Os pulsos de GnRH são modulados pelo sistema supra-hipotalâmico norepinefrina-dopamina, com influência estimuladora da norepinefrina e inibidora da dopamina. Este sistema pode ser influenciado por opioides endógenos, catecolestrogênios e outros neurotransmissores. Esses neurônios secretores de GnRH projetam axônios que terminam nos vasos porta, na eminência mediana, onde o GnRH é secretado para ser liberado para a hipófise anterior, onde se ligam a receptores superficiais de gonadotrofos. Em resposta, os gonadotrofos secretam gonadotrofinas glicoproteicas, isto é, Hormônio Luteinizante (LH) e Hormônio Folículo-Estimulante (FSH), na circulação periférica. Dentro do ovário, LH e FSH ligam--se às células tecais e da granulosa para estimular a foliculogênese e a produção ovariana de uma variedade de hormônios esteroides (androgênios, estrogênios e progesterona), de peptídeos gonadais (ativina, inibina e folistatina) e de fatores de crescimento. O FSH tem meia-vida de 3-4h, eleva-se já no final do ciclo anterior (período pré-menstrual) e é responsável pelo crescimento folicular, aumenta os receptores de FSH e LH nas células da granulosa e aumenta a síntese e liberação de inibina e ativina (que tem ação inibitória e estimulatória seletiva da liberação do próprio FSH). O LH tem meia-vida de 20 min, age sobre as células da teca, sintetizando principalmente androgênios, além dos outros esteroides sexuais. Na fase folicular as concentrações de LH são baixas e, com a elevação do estradiol no meio ciclo o LH também aumenta e é o responsável direto pela ovulação (pico no meio ciclo). Pronto. Dito isso, agora dá pra entender um pouquinho do ciclo menstrual em si. O ciclo menstrual pode ser dividido didaticamente em dois: o ciclo ovariano e o ciclo endometrial, esse processo ocorre de forma concomitante. O ciclo ovariano é dividido em: 1. Fase folicular 2. Fase ovulatória 3. Fase lútea O ciclo endometrial é dividido em: 1. Fase proliferativa 2. Fase secretora 3. Fase menstrual Ginecologia Thomás R. Campos Ciclo Ovariano 1. Fase folicular: se inicia com a hemorragia menstrual e pode durar de 10-14 dias, e a variabilidade nessa duração é a responsável pela maioria das alterações na duração total do ciclo. 2. Fase ovulatória: culmina com a ovulação, e dura em média 1-3 dias. 3. Fase lútea/luteínica: começa na ovulação e vai até o início da hemorragia menstrual. Possui duração mais constante, de aproximadamente 14 dias. Variações hormonais: 1. No começo, o nível de hormônios gonadais está baixo, desde o ciclo anterior 2. Com a involução do corpo lúteo, o FSH começa a se elevar, recrutando novos folículos – Esses folículos passam a secretar níveis crescentes de estrogênio, que por sua vez estimula a proliferação endometrial. 3. FSH começa a declinar na metade da fase folicular e os níveis de estrogênio sobem – Folículos produzem inibina-B que inibe FSH – objetivo de selecionar apenas um folículo. – Inicialmente o LH cai em resposta aos níveis elevados de estradiol, mas num momento tardio da fase folicular o LH aumenta (resposta bifásica) 4. No final da fase folicular, receptores de LH induzidos pelo FSH estão presentes nas células da granulosa e, com o estímulo do LH, modulam a secreção de progesterona. 5. Ocorre aumento repentino de LH, após suficiente estimulação estrogênica, desencadeando a ovulação, cerca de 24-36h mais tarde (10-12h após o pico máximo). 6. Estrogênio cai na fase lútea inicial, mas volta a se elevar no meio da fase lútea, como resultado da secreção do corpo lúteo. – Corpo lúteo secreta inibina-A que inibe FSH 7. A progesterona sobe após a ovulação, produzido pelo corpo lúteo. 8. Progesterona, estrogênio e inibina-A ficamelevados enquanto houver corpo lúteo, e suprimem a secreção de gonadotrofina. – Com a involução do corpo lúteo esses hormônios diminuem, preparando um caminho para um novo ciclo – o FSH já começa a subir no final do ciclo. F A S E F O L IC U L A R F A S E O V U L A T Ó R IA F A S E L Ú T E A Inibina B Before a ovulação Inibina A After a ovulação Ginecologia Thomás R. Campos Desenvolvimento folicular: ▪ Folículo primordial: é o primeiro estágio, presente ao nascimento. Está parado na prófase I da meiose. Independe das gonadotrofinas e seu mecanismo regulador é o próprio ovário. ▪ Folículo primário: começa a surgir após a puberdade, quando se iniciam os ciclos. Consiste no oócito + duas ou mais camadas de células da granulosa e membrana basal. O crescimento depende do FSH. ▪ Folículo pré-antral: o oócito é envolto por duas ou mais camadas de células foliculares. Estas camadas de células foliculares constituem a Granulosa. Entre a granulosa e o ovócito, surge a Zona Pelúcida, uma camada de glicoproteínas secretadas pelas células foliculares. Esta camada se apresenta com uma coloração avermelhada e quanto maior o folículo, mais espessa ela fica. A teca folicular também se organiza. ▪ Folículo antral/pré-ovulatório: é bastante grande e se caracteriza pelo aparecimento de um espaço intercelular denominado de ANTRO, que está preenchido por líquido folicular, produzido por estímulo do estrogênio e do FSH. – É o folículo que possui maior taxa de proliferação da granulosa, maiores concentrações de estrogênios e oócitos de melhor qualidade. O folículo dominante é aquele que tem mais receptores de FSH, maior ação local do FSH (pois o FSH age aumentando a síntese do próprio receptor e isso sensibiliza sua ação), é mais vascularizado e possui maior capacidade de aromatização. Por esse motivo, o folículo dominante mantém o meio estrogênico e os demais folículos entram em atresia. Teoria das duas células e duas gonadotrofinas: TELHA / GRÃO DE FSHTA O LH age nas células da Teca, o que resulta na ativação de AMPc e síntese de androstenediona a partir do colesterol. Essa adrostenediona atravessa a membrana basal e vai para a célula da granulosa. O FSH age nas células da Granulosa, estimulando a conversão de androstenediona em estrona e estradiol, pela enzima aromatase. Mecanismo de ovulação: O folículo pré-ovulatório apresenta maior síntese de estradiol. A exposição previa ao estradiol sensibiliza a adeno-hipófise a lançar na circulação reservas de LH acumuladas, assim ocorre o pico de LH. Esse LH em altas concentrações atua no folículo pré-ovulatório, bloqueando a expressão dos genes associados à proliferação da granulosa. Um treco que pode confundir: A ovulação é desencadeada pelo pico de LH, MAS quem determina o momento da ovulação é o próprio folículo (porque o pico de LH só ocorre devido ao aumento do estradiol, secretado no folículo) *Obs. a ovulação não acontece em mulheres em uso de anticoncepcionais anovulatórios, em gestantes, em pré-púberes, mas nessas mulheres o processo de desenvolvimento folicular e atresia/destruição é constante! Desenvolvimento folicular é uma coisa, ovulação é outra coisa. Número de oócitos: Feto: 6-7 milhões Nascimento: 1-2 milhões Puberdade: 300 mil* *Desses, apenas 400-500 serão liberados durante a ovulação. Ginecologia Thomás R. Campos Tá, mas e como o oócito é liberado? ▪ Reação inflamatória: as gonadotrofinas causam acúmulo de prostaglandinas E e F e produção de fator ativador de plasminogênio, que por sua vez ativa a colagenase, que digere o colágeno presente na parede do folículo. ▪ FSH e LH: estimulam a produção de ácido hialurônico em volta do oócito, separando ele da camada da granulosa. ▪ Ação sinérgica das PGEs e do LH: contração das células musculares da parede folicular e extrusão do oócito. Depois da ovulação, o folículo vazio é transformado pelo LH numa estrutura chamada corpo lúteo/amarelo, que produz estradiol e progesterona. Essa progesterona exerce junto com o estradiol um feedback negativo sobre a secreção de FSH e LH, isso é importante porque retarda o desenvolvimento de novos folículos, impossibilitando novas ovulações inadequadas. Ciclo Endometrial As modificações que ocorrem no endométrio devem-se a essas variações hormonais cíclicas. Para entender, é preciso lembrar antes que o endométrio possui duas camadas: 1. Camada funcional / decidua funcionalis: são os 2/3 superficiais do endométrio, correspondedo à zona que prolifera. Possui duas camadas: – Zona Compacta: situada superficialmente. – Zona Esponjosa: situada profundamente. 2. Camada basal / decidua basalis: é a região mais profunda, responsável pela regeneração do endométrio após a menstruação. Como mencionado anteriormente, o ciclo endometrial pode ser dividido em três fases: 1. Fase proliferativa: coincide com a fase folicular do ovário. O estradiol elevado estimula o crescimento do endométrio, desenvolvimento das artérias espiraladas e estimula a síntese de receptores para progesterona, preparando a fase seguinte do ciclo. 2. Fase secretora: coincide com a fase lútea do ovário. A progesterona elevada estimula o desenvolvimento de glândulas uterinas e acúmulo de glicogênio. Junto com o estradiol, a progesterona também contribui para tornar o endométrio mais espesso, bem vascularizado e de aspecto esponjoso (preparado para receber um embrião). 3. Fase menstrual: coincide com o final da fase lútea. Resulta da queda da secreção hormonal ovárica. Ocorre necrose, desagregação do endométrio, por causa da contricção das artérias espiraladas, por ação de prostaglandinas produzidas localmente. – Coincide com a fase folicular ovariana – No início, o endométrio é fino (1-2 mm) – Com a elevação dos níveis séricos de estradiol, ocorre crescimento mitótico progressivo da camada funcional – O endométrio fica mais espesso (atinge 10 mm) – Desenvolvem-se vasos tortuosos: as artérias espiraladas – O estradiol estimula a síntese de receptores para a progesterona, preparando para a fase seguinte do ciclo F A S E P R O L IF E R A T IV A Ginecologia Thomás R. Campos – Coincide com a fase lútea ovariana – 48-72h após a ovulação, a progesterona induz o endométrio a entrar na fase secretora – A progesterona diminui os receptores de estrogênio, bloqueando a mitose celular – Ocorre desenvolvimento de glândulas endometriais, com vacúolos ricos em glicogênio – O endométrio torna-se espesso, bem vascularizado e de aspecto esponjoso, preparado para acolher um embrião – Coincide com o final da fase lútea e resulta da queda da secreção hormonal – Sem os hormônios sexuais, ocorre profundo espasmo vascular das artérias espiraladas, levando à isquemia endometrial – Simultaneamente, ocorre rompimento de lisossomos e liberação de enzimas proteolíticas – Prostaglandinas produzidas localmente atingem sua concentração máxima – Como resultado desses eventos, a secreção glandular cessa e ocorre necrose e desagregação da camada funcional do endométrio, o que constitui a menstruação Menstruação A menstruação normal contém: sangue, células endometriais, prostaglandinas e fibronolisina. A fibronolisina (de origem endometrial) lisa os coágulos,por esse motivo o sangue menstrual normal não tem coágulos (a não ser que seja anormalmente volumoso). – Duração: 3-5 dias – Volume: 20-60 mL (depende da espessura do endométrio, medicação e coagulopatias) MODIFICAÇÕES NO MUCO CERVICAL: Fase folicular: predomina a ação do estrogênio, o muco cervical tem mais filância (você vai esticando esticando...) mais receptivo, pronto para ovular e encontrar com o espermatozoide. Quando observado no microscópio, ocorre o fenômeno de cristalização (aspecto arboriforme / folhas de samambaia). Fase lútea: predomina a ação da progesterona, o muco cervical se torna mais espesso, menos receptivo a ascensão de espermatozoides e também de agentes infecciosos (para não contaminar o menino lá dentro). É um muco que não ocorre o fenômeno da cristalização. Fase proliferativa inicial Fase proliferativa tardia Fase secretora (pós-menstrual) (aspecto trilaminar) F A S E S E C R E T O R A F A S E M E N S T R U A L
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