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• O lúpus eritematoso sistêmico (LES) é uma doença inflamatória crônica pouco frequente que ocorre principalmente em mulheres jovens e acomete múltiplos órgãos e sistemas. • Apresenta alterações da resposta imune, com presença de anticorpos dirigidos contra proteínas do próprio organismo. • Sua evolução é crônica, caracterizada por períodos de atividade e remissão (sem manifestações). • A gravidade da doença é variável: desde formas leves e intermitentes até quadros graves e fulminantes. EPIDEMIOLOGIA • Doença bastante comum, com prevalência > 1/2.500 pessoas em certas populações. • Afeta predominantemente mulheres; frequência: 1/700 mulheres em idade fértil; • Proporção mulher:homem de 9:1 durante a idade reprodutiva (17-55 anos). • Desenvolvimento durante a infância ou > 65 anos: proporção mulher:homem é de 2:1. • Etnia: é universal, encontrada em todas as etnias e nas mais diferentes áreas geográficas, mas a prevalência é de 3-4x maior em negros do que em brancos; as características, a gravidade e a prevalência podem diferir em diversas etnias. • Manifestações iniciais: entre a 2ª e 3ª décadas de vida, mas pode ocorrer em qualquer idade (inclusive na infância); nessa faixa etária, há predomínio do sexo feminino (proporção 10:1). • Também ocorre em crianças e adultos mais idosos, mantendo o predomínio do sexo feminino, porém em proporção de 3:1. • EUA: prevalência de ≅ 124/100.000; incidência: 1,8-7,6/100.000/ano. • BR: incidência ≅ 4,8-8,7/100.000 habit/ano. • Prevalência maior na zona urbana: 10-400/100.000 na população norte-americana. ETIOLOGIA EMBORA AINDA NÃO COMPLETAMENTE ESCLARECIDA, A ETIOLOGIA DO LES É MULTIFATORIAL • GENÉTICO o A agregação familiar e as taxas mais altas que o esperado de concordância em estudos com gêmeos sugerem que os fatores genéticos são importantes. o O LES também é mais comum em pessoas com deficiência de complemento, em especial os homozigotos com deficiência de C2 e heterozigotos C4. o Outras associações recentemente descritas em estudos do genoma incluem a confirmação de associações com genes na região de histocompatibilidade (6p21.33; 6p21.32). A associação com polimorfismos de integrina alfa M (ITGAM) pode explicar o clearance comprometido dos imunocomplexos e a vasculopatia característica do LES. o A confirmação do papel fundamental da produção de interferona no LES foi estabelecida pelo achado de uma associação com os polimorfismos do gene do fator regulador de interferona 5 (IRF é bem conhecida uma alta prevalência da doença entre gêmeos monozigóticos (29 vezes maior que a da população geral) e nos parentes de primeiro grau (risco 17 vezes maior de desenvolver LES). o A associação entre LES e deficiência de algumas proteínas do sistema complemento, especialmente C1q e C4, é bem determinada. o Estudos recentes de avaliação genômica (genome-wide association studies, GWAS) identificaram cerca de 50 loci com polimorfismos relacionados a uma maior predisposição. Além dos genes predisponentes, como TREX1 e DNAse1, é consistente a associação com alguns alelos do complexo de histocompatibilidade maior (MHC), principalmente os alelos DR2 e DR3 de classe II. Outras associações importantes estão relacionadas à assinatura de interferon (IFN). Genes ligados à imunidade inata, como STAT4, IRF5 e TLR7, entre outros, estão ligados à sinalização e produção de IFNα, que tem sua expressão aumentada no soro de 60-80% dos pacientes. o Os SNPs (single nucleotide polymorphisms) são a forma mais comum de polimorfismo do genoma humano e no LES, alguns já foram associados, como o SNP no STAT4, que aumenta o risco de síndrome do anticorpo antifosfolipídeo (SAF), glomerulonefrite e positividade para anticorpo anti-dsDNA, e o SNP associado ao LYN, que diminui o risco de LES e de manifestações hematológicas em caucasianos. • HORMONAIS o Baseia-se na hipótese de imunomodulação. o Os estrógenos têm papel estimulador de várias células imunes, como macrófagos, linfócitos T e B. Neste sentido, favorecem a adesão dos mononucleares ao endotélio vascular, estimulam a secreção de algumas citocinas, como interleucina-1 e expressão de moléculas de adesão e MHC. Do mesmo modo, a via do IFN do tipo 1 é regulada positivamente pelo estrogênio e negativamente pelos progestágenos. Os estrogênios também têm ação semelhante à das moléculas de BLyS/BAFF, reduzindo a apoptose das células autorreativas e acelerando a sua maturação, especialmente das células B com alta afinidade pelo DNA. • FATORES AMBIENTAIS o O papel da luz ultravioleta (UV) o A exposição solar determina a apoptose de queratinócitos com subsequente expressão de moléculas como RNP, Ro, nucleossoma e fosfolipídeos nos corpúsculos apoptóticos, a secreção de citocinas (IL- 1, IL-6, TNFα, GM-CSF) com amplificação da resposta imune, além de promover a ativação de macrófagos e processamento de antígenos, o que desencadeia uma resposta inflamatória sistêmica. o Tabagismo - Substâncias presentes no cigarro ativam metaloproteinases, nocivas para os tecidos, e citocinas como a IL-6, envolvida na patogênese da doença • IMUNOLÓGICOS o Os vírus são potentes estímulos para a ativação da resposta imune e existem evidências da interface entre a infecção por Epstein-Barr virus (EBV), citomegalovírus (CMV) e pelo Mycobacterium tuberculosis com o LES. De fato, existe a detecção de autoanticorpos no soro dos pacientes infectados cujos sintomas simulam autoimunidade e também o surgimento de LES verdadeiro ou sua exacerbação após infecção por esses microrganismos ou outros agentes. • MEDICAMENTOS o O uso de algumas medicações, especialmente hidralazina e isoniazida, pode não só provocar sintomas similares, mas também atuar como gatilho para as manifestações da doença. o O tabagismo, que é o segundo fator ambiental mais associado ao desenvolvimento de LES, também reduz os efeitos terapêuticos da hidroxicloroquina. FATORES DE RISCO o FORTES o SEXO FEMININO − O lúpus eritematoso sistêmico (LES) afeta mulheres com maior frequência que homens. − A preponderância feminina sugere um papel dos hormônios sexuais no desenvolvimento de LES. Um dos vários estudos mostrou um risco elevado com o uso de pílulas anticoncepcionais contendo altas doses de estrogênio. − A terapia de reposição hormonal, no entanto, não aumenta o risco de exacerbação da doença estável em pacientes menopausadas o IDADE ENTRE 15 E 45 ANOS − O LES pode ocorrer em qualquer idade, mas a incidência aumenta nas mulheres em idade fértil. − O LES ocorre com maior frequência na faixa etária de 15 a 45 anos. − O mecanismo é desconhecido, mas pode estar ligado a fatores metabólicos e hormonais. o DESCENDENTES DE ASIÁTICOS/AFRICANOS − A doença é mais comum e grave nos descendentes asiáticos e africanos da Europa e dos EUA. − Entretanto, o LES é infrequente entre negros na África. − Isso pode ser reflexo do subdiagnóstico decorrente da falta de recursos. o MEDICAMENTOS − A associação foi relatada pela primeira vez com a procainamida, considerado como causador de predisposição ao inibir a metilação do DNA. − Entre os medicamentos comumente prescritos que podem resultar em LES estão a minociclina (dados sobre outras tetraciclinas não são tão consistentes), isoniazida terbinafina, fenitoína carbamazepina, e sulfassalazina (presumida devido ao seu componente sulfonamida) − Mais recentemente, foi observada uma ligação com anticorpos monoclonais antifator de necrose tumoral (FNT)-alfa e interferonas. • FRACOS o EXPOSIÇÃO AO SOL − Embora a associação epidemiológica seja fraca, erupções cutâneas fotossensíveis fazem parte dos critérios de diagnóstico para o lúpus e muitos pacientes relataram exacerbação dos sintomas após a exposição ao sol. − A apoptose acelerada de ceratinócitos induzida por ultravioleta B é um dos mecanismos propostos pelo qual os antígenos nuclearesexpostos podem induzir uma resposta imune. − A luz ultravioleta também pode induzir diretamente citocinas pró-inflamatórias. A exposição ao sol é o fator ambiental mais óbvio a exacerbar o LES. o HISTÓRIA FAMILIAR DE LES − Há uma taxa de concordância mais alta entre gêmeos monozigóticos (>20%) em relação a gêmeos dizigóticos e outros irmãos (2% a 5%). o TABAGISMO FISIOPATOLOGIA O LES é caracterizado por vários defeitos no sistema imune por perda da autotolerância que resultam em um processo que começa na quebra da homeostasia celular e culmina com a produção anormal de autoanticorpos, cujo aparecimento precede em anos os primeiros sintomas da doença. Entre os distúrbios da regulação imune, destacam-se: aumento da expressão de IFNα, especialmente durante os períodos de atividade inflamatória; redução do número e função das células T citotóxicas e supressoras em paralelo ao aumento do número e atividade dos linfócitos T CD4+ (helper) e ativação policlonal de células B autorreativas; múltiplas anormalidades na sinalização linfocitária, incluindo hiper- reatividade, decorrente dos defeitos determinados genética ou epigeneticamente; defeitos da tolerância dos linfócitos B, relacionados aos defeitos na apoptose e deficiência de complemento; aumento da expressão de BLyS/BAFF, gerando redução da apoptose das células produtoras de autoanticorpos e aumento da ativação dos toll-like receptors (TLR) e dos níveis de INFα; defeitos na sinalização entre as células T e B, com consequente redução da expressão de IL-2 e do número de células T regulatórias; redução do clearance dos imunocomplexos circulantes e do material apoptótico pelos macrófagos; aumento do microquimerismo fetal e dos níveis de micropartículas contendo material nucleico e que podem funcionar como estímulos para a autoimunidade; aumento da sinalização dos TLR7 e TLR9 nas células B, dendríticas e plasmáticas; e aumento do processo conhecido como NETose, que é uma forma de apoptose específica dos neutrófilos e que libera uma espécie de “rede” composta por DNA ligado a proteínas e que é capaz de estimular a produção de IFNα e anti-DNA, por meio da ação do TLR9 QUADRO CLINICO Manifestações gerais • Anorexia e perda de peso podem ser observados como quadro inicial da doença e preceder o aparecimento de outras manifestações em meses. • Febre de origem indeterminada • Linfoadenopatia generalizada ou localizada, com predomínio das cadeias cervical e axilar • Presença de hepato e/ou esplenomegalia. Manifestações cutâneas • A principal lesão cutânea aguda é o rash malar ou eritema em “asa de borboleta” • Caracteristicamente, após o controle da atividade inflamatória, essas lesões podem evoluir com hiperpigmentação, confundindo-se com o cloasma gravídico. • A sua forma generalizada é conhecida como rash maculopapular ou dermatite lúpica fotossensível e se apresenta como erupção exantematosa ou morbiliforme generalizada. • O lúpus bolhoso e a necrose epidérmica tóxica são também outras formas de lesões agudas da doença, juntamente com a fotossensibilidade. • O lúpus cutâneo subagudo manifesta-se como placas eritematosas escamativas em áreas expostas e com intensa fotossensibilidade • A lesão discoide no seu início é caracterizada por placa eritematosa que evolui deixando uma cicatriz central hipopigmentada com atrofia, preferencialmente identificada na face, couro cabeludo, pavilhão auricular e pescoço • Vasculite cutânea que se pode se manifestar como lesões puntiformes palmoplantares, purpúricas (principalmente em membros inferiores), urticariformes, úlceras e necrose digital. • Fenômeno de Raynaud pode ser a primeira manifestação da doença e está correlacionado com a presença dos anticorpos anti-RNP. o É um distúrbio causado pelo vasoespasmo episódico das pequenas artérias digitais, manifestando-se com a sequência palidez-cianose-rubor nos dígitos. o Ocorre em até 30% dos pacientes com LES, entretanto, trata-se de achado típico de outra colagenose a esclerose sistêmica • Nódulos subcutâneos profundos firmes podem ocorrer em consequência da paniculite lobular e são designados como lúpus profundo. • As lesões mucocutâneas incluem aftas e úlceras da boca, do nariz ou da área genital. Erosões do septo nasal levam ocasionalmente à perfuração do septo nasal. • As lesões inespecíficas do LE são vistas com frequência em pacientes de LES e se correlacionam mais à atividade do lúpus. A alopecia é uma característica comum do LES. A queda de cabelo pode ser difusa ou esparsa. Manifestações articulares • A presença de artralgia e/ou artrite possibilita forte suspeita diagnóstica • Observa-se uma poliartrite simétrica aditiva, por vezes com rigidez matinal, semelhante à da artrite reumatoide. • Artropatia de Jaccoud - caracterizada por desvio ulnar dos dedos e deformidades reversíveis do tipo “pescoço de cisne” decorrentes do acometimento inflamatório de tendões e ligamentos. Manifestações pulmonares • As características do envolvimento pulmonar primário no LES incluem uma função pulmonar anormal, pleurite, pneumonite aguda ou crônica, hemorragia pulmonar, embolia pulmonar, hipertensão pulmonar e o envolvimento da via aérea e do diafragma • A síndrome do pulmão encolhido pode ocorrer na doença, levando a instalação aguda/subaguda de quadro de dispneia, onde existe redução dos volumes pulmonares perante a elevação de diafragma determinando uma restrição da função pulmonar. • A hemorragia alveolar difusa é outra condição que determina dispneia de início súbito, associada a tosse, hemoptises, febre e infiltrados pulmonares difusos, e associada à marcada redução dos níveis de hemoglobina. • A hipertensão pulmonar pode ocorrer em decorrência da própria doença ou secundária a valvopatia cardíaca, doença intersticial pulmonar ou embolia pulmonar (geralmente devido à associação com a SAF). • Os quadros de pneumonite aguda e crônica na doença são menos frequentes. Manifestações cardíacas • O LES pode afetar qualquer camada do coração e causar endocardites, miocardites e pericardites, que se refletem geralmente em sintomas e numa incapacidade funcional • A pericardite pode ser a primeira manifestação do LES, podendo aparecer isoladamente ou associada a serosite generalizada, particularmente associando-se à pleurite. Os quadros variam desde assintomáticos até tamponamento, podendo ser detectado por atrito pericárdico, alterações ecocardiográficas ou na tomografia. • A miocardite sintomática é suspeitada na presença de taquicardia persistente e sinais clínicos de insuficiência cardíaca aguda, geralmente com alterações no mapeamento cardíaco e enzimas musculares. • A endocardite de Libman-Sacks é caracterizada pela presença de vegetações verrucosas localizadas próximas das bordas valvares, e habitualmente não produzem repercussão clínica Manifestações neuropsiquiátricas As manifestações mais frequentes são cefaleia, transtornos psiquiátricos e disfunção cognitiva, porém as duas únicas manifestações incluídas nos critérios ACR para LES são síndrome orgânica cerebral e convulsões. Essas síndromes, que nem sempre se correlacionam à atividade sistêmica, podem ocorrer isoladamente ou em combinação a outras manifestações neuropsiquiátricas. MANIFESTAÇÕES NEUROPSIQUIÁTRICAS DO LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO • Sistema nervoso central o Crises convulsivas o Meningite asséptica o Cefaleia (incluindo enxaqueca e hipertensão intracraniana benigna) o Doença cerebrovascular o Síndrome desmielinizante o Mielopatia o Desordem do movimento (coreia) o Mielopatia o Estado confusional agudo o Desordens de ansiedade o Disfunção cognitiva o Alterações do humor o Psicose • Sistema nervoso periférico o Polirradiculoneuropatia desmielinizante inflamatória aguda (síndrome de Guillain-Barré) o Desordens autonômicas o Mononeuropatia o Miastenia gravis o Neuropatiacraniana o Plexopatia o Polineuropatia Manifestações hematológicas • Leucopenia e linfopenia são encontradas com alta frequência no LES, fazendo parte dos critérios de classificação. • A plaquetopenia pode ser a primeira manifestação de doença e pode preceder em anos outras manifestações clínicas do LES. • Clinicamente observam-se petéquias ou equimoses, principalmente de membros inferiores, além de fenômenos hemorrágicos. • A anemia hemolítica Coombs positivo também pode ocorrer de forma isolada no início da doença, contudo, o achado mais frequente é a anemia de doença crônica. Manifestações renais • O envolvimento renal é uma das manifestações mais graves do LES e se associa ao aumento da morbidade e da mortalidade. • As características mais comumente vistas em pacientes apresentando a nefrite do lúpus são proteinúria, cilindros na urina, hematúria, piúria, creatinina sérica elevada e hipertensão. • Fora a glomerulonefrite, o envolvimento renal no lúpus pode se dar também devido a uma nefrite intersticial, um acometimento tubular, uma microangiopatia trombótica, uma vasculite, à arterioloesclerose e à vasculopatia do lúpus. ATIVIDADE E ÍNDICES DE CRONICIDADE NA NEFRITE POR LÚPUS Atividade Cronicidade Lesões glomerulares - Proliferação - Necrose/cariorrexe - Trombos hialinos - Crescentes celulares - Exsudação leucocitária - Glomérulos esclerosados - Crescentes fibróticos Lesões tubulointersticiais - Infiltrado de células mononucleares - Fibrose intersticial - Atrofia tubular Classificação da glomerulonefrite (GN) do lúpus eritematoso sistêmico segundo a International Society of Nephrology/Renal Pathology Society, 2003 Classe I - Nefrite lúpica mesangial mínima - Glomérulos normais à microscopia óptica - Depósitos imunes mesangiais à imunofluorescência Classe II - Nefrite lúpica mesangial proliferativa - Matriz mesangial à microscopia óptica, com depósitos imunes mesangiais. Pode haver alguns depósitos subepiteliais ou subendoteliais isolados, visíveis à imunofluorescência ou à microscopia eletrônica, porém não à microscopia óptica Classe III - Nefrite lúpica focal - Glomerulonefrite endocapilar ou extracapilar; focal, segmentar ou global; ativa ou inativa, envolvendo < 50% de todos os glomérulos, tipicamente com depósitos imunes subendoteliais focais, com ou sem alterações mesangiais - Classe III (A): com lesões ativas; classe III (A/C): com lesões ativas e crônicas; classe III (C): com lesões crônicas Classe IV - Nefrite lúpica difusa - Glomerulonefrite endocapilar ou extracapilar; difusa, segmentar ou global; ativa ou inativa - Envolvendo ≥ 50% de todos os glomérulos, tipicamente com depósitos imunes subendoteliais difusos, com ou sem alterações mesangiais - Essa classe é dividida em: nefrite lúpica segmentar difusa (IV-S): ≥ 50% dos glomérulos envolvidos têm lesões segmentares; nefrite lúpica global difusa (IV-G): ≥ 50% dos glomérulos envolvidos têm lesões globais. Uma lesão segmentar é definida como uma lesão glomerular que envolva menos da metade do tufo glomerular. Essa classe inclui casos com depósitos em rolo de fio difusos, porém pouca ou nenhuma proliferação glomerular - Classe IV-S (A): com lesões ativas; classe IV-S (A/C): com lesões ativas e crônicas; classe IV-S (C): com lesões inativas crônicas - Classe IV-G (A): com lesões ativas; classe IV-G (A/C): com lesões ativas e crônicas; classe IV-G (C): com lesões inativas crônicas Classe V - Nefrite lúpica membranosa - Depósitos imunes subepiteliais globais ou segmentares ou suas sequelas morfológicas à microscopia óptica e à imunofluorescência ou à microscopia eletrônica, com ou sem alterações mesangiais - Pode ocorrer em combinação às classes III ou IV (onde ambas vão ser diagnosticadas), e pode evidenciar esclerose Classe VI - Nefrite lúpica com esclerose avançada - > 90% dos glomérulos globalmente esclerosados, sem atividade residual MÉTODOS DIAGNÓSTICOS O diagnóstico de LES baseia-se na combinação de manifestações clínicas e alterações laboratoriais, desde que outras doenças sejam excluídas. CRITÉRIOS DE CLASSIFICAÇÃO CRITÉRIOS DE 1997 REVISADOS PARA A CLASSIFICAÇÃO DO LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO Uma pessoa possui LES se 4 ou mais, dentre esses 11 critérios, estão presentes de forma sequencial ou simultânea durante qualquer período de observação RASH MALAR Eritema fixo, liso ou elevado, sobre as eminências malares, com a tendência de poupar os sulcos nasolabiais. RASH DISCOIDE Placas eritematosas com descamação ceratótica aderente e tamponaento folicular; cicatrizes atróficas podem ocorrer em lesões mais antigas FOTOSSENSIBILIDADE Erupção resultante de uma reação incomum à luz do sol, pela história do paciente ou observação médica ÚLCERAS ORAIS Ulcerações orais ou nasofaríngeas, geralmente sem dor, observadas por um médico. ARTRITE Artrite não erosiva envolvendo duas ou mais articulações periféricas, caracterizada por dor, edema ou efusão. SEROSITE - Pleurite: história convincente de dor pleurítica ou ruído ouvido por um médico ou evidência de efusão pleural - Pericardite: documentada por um eletrocardiograma ou ruído ou evidência de efusão pericárdica DISTÚRBIO RENAL - Proteinúria persistente > 0,5 g/dL ou > 3 se a quantificação não for realizada - Cilindros celulares: podem ser de eritrócitos, hemoglobina, granulares, tubulares ou mistos. DISTÚRBIOS NEUROLÓGICOS - Convulsões: na ausência de medicamentos que causem lesão ou desarranjos metabólicos conhecidos (ex: uremia, cetoacidose ou desequilíbrio eletrolítico) - Psicose: na ausência de medicamentos que causem lesão ou desarranjos metabólicos conhecidos (ex: uremia, cetoacidose ou desequilíbrio eletrolítico). DISTÚRBIOS HEMATOLÓGICOS - Anemia hemolítica: com reticulocitose, ou - Leucopenia: < 400/mm3 total em duas ou mais ocasiões, ou - linfopenia: < 1.500/ mm3 total em duas ou mais ocasiões, ou - trombocitopenia: < 100.000/ mm3 total em duas ou mais ocasiões, ou DISTÚRBIO IMUNOLÓGICO - Anticorpo anti-DNA para o DNA nativo em títulos anormais - Anti-Sm: presença do anticorpo para o antígeno nuclear Sm - Achados positivos de anticorpos antifosfolipídios com base no (1) nível sérico anormal dos anticorpos anticardiolipina IgG ou IgM, (2) um teste positivo para o anticoagulante lúpico utilizando um teste padrão, (3) um teste sorológico falsamente positivo para sífilis quando se sabe que ele é positivo por, pelo menos, 6 meses e confirmado pela imobilização do T. pallidum negativa ou teste de absorção de anticorpos antitreponema fluorescente. ANTICORPO ANTINUCLEAR Título anormal do anticorpo antinuclear através da imunofluorescência ou um teste equivalente a qualquer momento, e na ausência de medicamentos conhecidos como associados à síndrome lúpica induzida por medicamentos. SLICC (2012) O paciente deverá preencher pelo menos 4 critérios (incluindo 1 clínico e 1 imunológico) ou ter nefrite lúpica comprovada por biópsia renal com presença de FAN positivo ou anti-DNA nativo positive Manifestação clínica Alteração imunológica LÚPUS CUTÂNEO AGUDO, INCLUINDO: eritema malar (não discoide), lúpus bolhoso, necrólise epidérmica tóxica – variante lúpus, eritema maculopapular, eritema fotossensível do lúpus ou lúpus cutâneo subagudo (psoriasiforme/anular). 1FAN Hep2 positivo LÚPUS CUTÂNEO CRÔNICO: lúpus discoide, lúpus hipertrófico/verrucoso, lúpus profundus (paniculite), lúpus túmido, lúpus mucoso, sobreposição líquen plano/lúpus discoide. Anti-dsDNA positivo ÚLCERA NA MUCOSA: palato, cavidade oral, língua, ou úlcera nasal (na ausência de outras causas). Anti-Sm positivo ALOPÉCIA NÃO CICATRICIAL. Anticorpo antifosfolipídeo positivo: anticoagulante lúpico positivo, anticardiolipina positiva (título moderado/alto – IgA/IgM/IgG), anti- β2glicoproteína-1 positivo,VDRL falso-positivo ARTRITE/ARTRALGIA: - Sinovite (edema/derrame articular) ≥ 2 articulações; - Artralgia (dor) em 2 ou + articulações com rigidez matinal ≥ 30’. Complemento baixo: C3 baixo, C4 baixo, CH50 baixo SEROSITE: - Pleurite (dor ≥ 1 dia/derrame pleural/atrito pleural); - Pericardite (dor ≥ 1 dia/derrame/atrito/alteração no ECG). Coombs direto positivo (na ausência de anemia hemolítica) NEFRITE: proteinúria 24h >500mg ou R P/C > 0,5, cilindro eritrocitário. NEUROLÓGICA: convulsão, psicose, mononeurite múltipla, mielite, neuropatia periférica/craniana, estado confusional agudo (na ausência de outras causas). ANEMIA HEMOLÍTICA. LEUCOPENIA (<4.000/mm³, em pelo menos uma ocasião) ou LINFOPENIA (<1.000/mm³, em pelo menos uma ocasião). PLAQUETOPENIA (< 100.000/mm³, em pelo menos uma ocasião). EXAMES LABORATORIAIS • Os exames laboratoriais são muito úteis no diagnóstico e acompanhamento dos pacientes. Essas análises podem identificar anormalidades imunológicas, acometimento de órgãos/sistemas e alterações inflamatórias. • As anormalidades imunológicas são as mais características e incluem a presença de autoanticorpos e redução do complemento. • A maioria dos pacientes (> 98%) tem o teste de FAN (fator antinuclear) positivo em títulos altos, em particular durante os períodos de atividade de doença. o Ressalta-se que a positividade desse exame não é específica do LES e pode ocorrer em outras doenças autoimunes, além de doenças infecciosas e neoplásicas e até mesmo em indivíduos saudáveis. Desta forma, o teste é relevante pelo seu alto valor preditivo negativo DIAGNÓSTICOS DIFERENCIAIS O diagnóstico diferencial é amplo e depende das manifestações clínicas apresentadas, principalmente no início da doença, o que determina considerar • Infecções: virais como citomegalovírus (CMV), Epstein-Barr (EBV), parvovírus B19, HIV, hepatite B e hepatite C, além de bacterianas como endocardite, tuberculose, sífilis e hanseníase. • Doenças autoimunes: artrite reumatoide particularmente na fase inicial dos quadros articulares (verificar positividade de antiCCP, fator reumatoide e raio X de mãos); doença mista do tecido conectivo – por possuir manifestações que se sobrepõem ao LES (considerar títulos elevados de anti-RNP); síndrome de Sjögren quando manifestações extraglandulares podem ser observadas no LES (verificar presença de xeroftalmia e xerostomia, além de positividade de anti-Ro e anti-La); vasculites sistêmicas primárias, doença de Behçet, doenças inflamatórias intestinais, dermatomiosite/polimiosite. • Outras doenças hematológicas: doenças linfoproliferativas, púrpura trombocitopênica imunológica (PTI), púrpura trombocitopênica trombótica (PTT), doença de Kikuchi e esclerose múltipla, entre outras CONDUTAS TERAPÊUTICAS NÃO FARMACOLÓGICO • Mudanças de estilo de vida • Educação do paciente • Dieta • Exercício físico • Eliminar o tabagismo • Proteção solar TRATAMENTO MEDICAMENTOSO • Anti-inflamatótios não hormonais o Devem ser utilizados com cautela na doença, particularmente nos pacientes com envolvimento renal, pois podem agravar esta disfunção ou mesmo dificultar o monitoramento dos quadros renais. o O uso está indicado para o controle do quadro articular crônico, serosites leves a moderadas e febre associada à doença • Glicocorticoides o São preferencialmente usados no início da doença ou durante os surtos de atividade, pois promovem rápido controle das manifestações clínicas. O tratamento medicamentoso deve ser individualizado para cada paciente e dependerá dos órgãos ou sistemas acometidos e da gravidade das manifestações. A forma “leve” incluiria sintomas constitucionais, articulares, lesões mucocutâneas e pleurite sem acometimentos sistêmicos que determinem risco à vida. A forma moderada os casos com gravidade “intermediária” como miosite, pericardite e trombocitopenia A forma grave inclui situações de risco à vida ou que determinem lesões permanentes de órgãos, como manifestações neurológicas, psiquiátricas, anemia hemolítica, nefrite proliferativa, miocardite, pneumonite, vasculite necrosante, pancreatite e outras. o São empregados em formulações tópicas (hidrocortisona, triancinolona e betametasona), orais (prednisona) e parenterais (metilprednisolona). o Em razão dos efeitos colaterais, a menor dose possível deve ser indicada nesta fase e se baseia na experiência clínica, uma vez que a gravidade e a rapidez de progressão do processo determinam a dose inicial a ser utilizada. o Doses muito altas (1 mg/kg/dia para adultos e 1 a 2 mg/kg/ dia para crianças/adolescentes) estariam indicadas nos casos graves, como manifestações renais, hematológicas (plaquetopenia e anemia hemolítica) e de SNC. o Uma alternativa é a utilização de pulsoterapia de glicocorticoide (metilprednisolona) com dose intravenosa de 500 a 1.000 mg/dia em 3 dias consecutivos. o Doses baixas a moderadas são usadas para o controle inicial de manifestações mais brandas. • Antimaláricos o São habitualmente prescritos, independentemente do órgão ou do sistema acometido, embora sejam considerados de primeira escolha nos quadros cutâneos e/ou articulares da doença. o A hidroxicloroquina (6 mg/kg/dia, dose máxima 400 mg/dia) ou cloroquina (250-500 o mg/dia) é o antimalárico de escolha, pois possui menor toxicidade ocular e se mostrou efetiva no controle da atividade inflamatória da doença, na redução do tempo da corticoterapia e na promoção de um melhor controle das dislipidemias. • Imunossupressores o Estão indicados como poupadores de glicocorticoides e para o controle da atividade da doença. o Nos casos leves a moderados, utiliza-se a azatioprina, o metotrexato, a ciclosporina e o micofenolato de mofetila. o A ciclofosfamida em dose alta estaria indicada nos casos mais graves, enquanto o esquema de dose mais baixa (Euro-Lupus) está indicado para os casos leves e moderados. • Biológicos o O rituximabe, anticorpo monoclonal quimérico anti-CD20, é eficaz em melhorar atividade articular, trombocitopenia, índices de atividade de doença, títulos de anti-dsDNA e hipocomplementenemia, além de ter efeito poupador de glicocorticoide. o O belimumabe (anticorpo monoclonal humano que promove bloqueio do BLyS-estimulador de células B), recentemente liberado para o tratamento do LES24, tem maior eficácia em pacientes com atividade cutânea, articular, anti-dsD-NA positivo e hipocomplementenemia. o Outros agentes, como o crelizumabe (anticorpo monoclonal anti-CD20 humanizado) e o epratuzumabe (anti-CD22), também estão sendo estudados. Terapêutica medicamentosa específica • Tratamento para envolvimento cutâneo o Talidomida (100 a 200 mg/dia) o Dapsona (100 mg/ dia) − É efetiva nas lesões bolhosas e no lúpus discoide e possui como principal efeito colateral a hemólise, por isso, é contraindicada na deficiência de G6PD o Metotrexato (10 a 20 mg/semana) − É uma excelente indi-cação quando houver quadros cutâneos e articulares o Azatioprina (1 a 2 mg/kg/dia) − Deve ser considerado nos quadros cutâneos mais graves, mas está particularmente indicada quando existir a concomitância com vasculites • Quadros hematológicos o Como plaquetopenia e hemólise, requerem doses altas de glicocorticoide via oral ou em pulsoterapia nas suas fases iniciais. o Nos casos refratários após a associação com os antimaláricos, deve-se considerar o uso de azatioprina (1 a 3 mg/kg/dia), esteroides androgênicos e ciclofosfamida endovenosa. o A gamaglobulina está particularmente indicada para o rápido controle de sangramento em casos de plaquetopenia NEFRITE LÚPICA NOVIDADES • Belimumabe o É um anticorpo completamente monoclonal que inibe a atividade de um fator estimulador de linfócitos B(BLys) de proteína. O BLys é um fator essencial na seleção e sobrevivência das células B, cujos altos níveis podem contribuir para a produção de autoanticorpos. O belimumabe reduz os níveis de anticorpos no lúpus eritematoso sistêmico (LES) • Rituximabe o Um anticorpo monoclonal quimérico humano-murino direcionado contra o CD20 e contra células B e seus precursores; não é direcionado contra plasmócitos. Acredita-se que, além da depleção de células B, outros mecanismos sejam igualmente importantes em sua ação no LES. Pode ser útil em casos resistentes à terapia inicial com esquemas convencionais • Blisibimode o É um inibidor potente e seletivo do fator de ativação das células B (BAFF). O BAFF é um mediador de diferenciação, maturação e sobrevivência de células B. o O blisibimod está em avaliação clínica para o tratamento do LES • Rontalizumabe o É um anticorpo monoclonal humanizado do tipo IgG1 anti-alfainterferona. o O rontalizumabe foi associado a melhoras na atividade da doença, redução de surtos e diminuição do uso de corticosteroides em pacientes com LES que tinham uma baixa métrica de assinatura de interferona, uma medida da expressão gênica regulada por interferona • Voclosporina o É um novo inibidor da calcineurina, produzido por uma modificação de um único aminoácido da molécula da ciclosporina, resultando em uma relação farmacocinética e farmacodinâmica mais previsível. Recebeu a designação de tramitação rápida ("fast track") da Food and Drug Administratio (FDA) dos EUA para o tratamento da nefrite lúpica. • Sifalimumabe o É um anticorpo monoclonal IgG1 kappa totalmente humano que se liga e neutraliza a maioria dos subtipos de alfainterferona. • Baricitinibe o É um inibidor oral seletivo de Janus quinase (JAK) que bloqueia JAK-1 e JAK-2. o Seu uso é licenciado em muitos países para o tratamento de adultos com artrite reumatoide. • Obinutuzumabe o É um anticorpo monoclonal desenvolvido para ligar-se à CD20, uma proteína encontrada apenas em determinados tipos de células B. • Itolizumabe o É um anticorpo do tipo IgG1 monoclonal humanizado. De maneira seletiva, ele age no CD6, o novo receptor de checkpoints imunológicos que desempenha um papel fundamental na modulação da atividade e do tráfego de células T que levam a várias doenças imunoinflamatórias COMPLICAÇÕES • Anemia • Leucopenia • Trombocitopenia • Catarata relacionada a corticosteroides • Osteoporose relacionada a corticosteroides • Diabetes mellitus relacionada a corticosteroides • Amenorreia secundária à ciclofosfamida • Infertilidade masculina secundária à ciclofosfamida e/ ou à doença • Miocardite • Endocardite • Pleurite • Derrame pleural • Malignidade secundária a ciclofosfamida ou azatioprina • Necrose avascular relacionada a corticosteroides • Anemia hemolítica • Leucoencefalopatia multifocal progressiva (LEMP) • Fenômeno de Raynaud • Infecção decorrente de imunossupressão • Insuficiência renal relacionada a anti-inflamatórios não esteroidais (AINEs) • Gastrite relacionada a AINE • Perda fetal • Depressão • Hipertensão pulmonar • Doença pulmonar intersticial difusa • Risco de fraturas • Artrite séptica decorrente de imunossupressão • Hematúria secundária à ciclofosfamida • Hepatite crônica ativa • Peritonite lúpica • Pancreatite secundária à doença ou à azatioprina • Trombose arterial • Trombose venosa • Ruptura de tendão • Valvopatia cardíaca • Mielite transversa • Hemorragia pulmonar SEGUIMENTO • A frequência das consultas de seguimento é determinada pela atividade e gravidade da doença e de suas complicações. • Pacientes com doença leve podem ser avaliados em intervalos de 3-6 meses. • Pacientes com doença grave ou com complicações do tratamento devem ter consultas mais frequentes, assim como aqueles que estão iniciando a terapia sistêmica. • Recomenda-se a realização dos seguintes exames periodicamente, cuja lista pode ser modificada de acordo com as manifestações clínicas encontradas em cada paciente) o Hemograma completo com contagem de plaquetas o Complementos (CH50, C3 e C4) o Anti-DNA nativo o Creatinina o Aspartato-aminotransaminase (AST/TGO) o Alanina-aminotransferase (ALT/TGP) o Fosfatase alcalina o Exame qualitativo de urina (EQU) e urocultura o Velocidade de hemossedimentação (VHS) o Proteína C reativa o Albumina sérica e proteinúria de 24 horas: se houver história de nefrite ou lúpus grave (em risco de ter nefrite). • A conduta a ser adotada depende da alteração encontrada nos exames
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