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1 Melhoramento Vegetal: Dos objetivos aos métodos de melhoramento de plantas autógamas e alógamas Adilson Ricken Schuelter Ivan Schuster Medianeira 2019 UDC FACULDADES CURSO DE AGRONOMIA MELHORAMENTO VEGETAL 2 Sumário 1. INTRODUÇÃO AO MELHORAMENTO GENÉTICO ................................................... 4 1.1. DISCIPLINAS RELACIONADAS COM O MELHORAMENTO GENÉTICO ............. 6 2. A VARIABILIDADE GENÉTICA ENTRE OS SERES VIVOS ..................................... 9 2.1 FONTES DA VARIAÇÃO ........................................................................................... 9 2.1.1 Variação ambiental ............................................................................................... 9 2.1.2. Variação genética ................................................................................................ 9 2.1.3. Interação genótipo x ambiente ......................................................................... 10 2.1.4. Principais características ou objetivos do melhoramento de plantas .......... 12 2.2. HERANÇA E HERDABILIDADE DOS CARACTERES ........................................... 13 2.2.1. O mecanismo da herança mendeliana ............................................................. 15 2.2.2. Hipóteses genéticas .......................................................................................... 19 2.2.3. Tamanho das populações para estudo de herança........................................ 27 2.2.4. Herdabilidade das características .................................................................... 28 2.2.5. Modalidades de ação gênica relacionadas às características quantitativas (interações alélicas) .................................................................................................... 31 2.2.6. Variação quantitativa genética e ambiental: teoria das linhas puras ........... 35 2.3. ORIGEM DA VARIAÇÃO GENÉTICA .................................................................... 36 2.3.1. Recombinação gênica ....................................................................................... 36 2.3.2. Variação no número de cromossomos ............................................................ 40 2.3.3. Mutação .............................................................................................................. 41 2.3.4. Variação somaclonal ......................................................................................... 42 2.3.5. Transformação genética ................................................................................... 42 2.4. VULNERABILIDADE GENÉTICA ........................................................................... 43 2.5. CENTROS DE ORIGEM DAS ESPÉCIES CULTIVADAS ..................................... 43 2.5.1. Introdução de plantas ....................................................................................... 47 2.5.2. Bancos de germoplasma ................................................................................. 47 3. SELEÇÃO DE PROGENITORES ............................................................................. 52 3.1. TIPOS DE CRUZAMENTOS .................................................................................. 53 3.2. PROGENITORES POTENCIAIS ............................................................................ 54 3.3. MÉTODOS PARA SELEÇÃO DE PROGENITORES ............................................. 55 3.3.1. Principais métodos de escolha de progenitores ............................................ 56 4. MODOS DE REPRODUÇÃO DAS PLANTAS .......................................................... 60 4.1. PLANTAS AUTÓGAMAS E ALÓGAMAS ............................................................... 61 4.1.1. Formação da semente ....................................................................................... 64 4.2. SELEÇÃO EM PLANTAS AUTÓGAMAS .............................................................. 65 4.2.1. Práticas antigas de seleção ............................................................................. 66 3 4.2.2 Teoria das linhas puras ..................................................................................... 66 4.2.3 Seleção de linhas puras e seleção massal ...................................................... 66 4.3. O CONCEITO DE VARIEDADE ............................................................................. 67 5. HIBRIDAÇÃO NO MELHORAMENTO DE PLANTAS AUTÓGAMAS ..................... 71 5.1. Efeito da Ligação Gênica ........................................................................................ 77 5.2. Métodos Clássicos de Condução de Populações Segregantes ............................. 78 5.2.1. Método genealógico ou método do pedigree. ................................................ 79 5.2.2. Método da população, massal ou "bulk" ......................................................... 86 5.3. Variações dos Métodos Clássicos .......................................................................... 89 5.3.1. Método da descendência de uma única semente ou SSD ............................. 89 6. MÉTODO DOS RETROCRUZAMENTOS ................................................................. 93 6.1. BASES GENÉTICAS DO MÉTODO ....................................................................... 94 6.2. TRANSFERÊNCIA DE ALELOS RECESSIVOS .................................................... 97 7. MELHORAMENTO DE PLANTAS ALÓGAMAS .................................................... 100 7.1. INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 100 7.1. TEORIA DA SELEÇÃO EM PLANTAS ALÓGAMAS ............................................ 100 7.2. MELHORAMENTO DE POPULAÇÕES. .............................................................. 103 7.3. MÉTODOS DE SELEÇÃO .................................................................................... 104 7.3.1. Seleção massal ................................................................................................ 104 7.3.2. Seleção com teste de progênie ...................................................................... 106 7.3.3. Variedades híbridas ......................................................................................... 115 8. Definições de Endogamia e Heterose .................................................................. 116 8.1. HIPÓTESES EXPLICATIVAS DA HETEROSE .................................................... 117 8.1.1. Hipótese da dominância ................................................................................. 118 8.1.2. Hipótese da sobredominância ........................................................................ 119 8.2. APLICAÇÃO DA HETEROSE NO MELHORAMENTO DE PLANTAS ................. 119 8.3. VARIEDADES HÍBRIDAS ..................................................................................... 120 8.4. OUTROS TIPOS DE HÍBRIDOS .......................................................................... 124 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................... 127 4 Capítulo I 1. INTRODUÇÃO AO MELHORAMENTO GENÉTICO A população mundial cresce a taxa elevadas, de forma que foi necessário chegarmos próximos ao século XXI para atingirmos 6 bilhões de habitantes na Terra, e algumas previsões indicam que em 2025 seremos 10 bilhões, dos quais, 9 bilhões estarão habitando países sub-desenvolvidos. Ou seja, em pouco mais de 30 anos, um crescimento de mais de 4 bilhões de habitantes, quase que exclusivamente em regiões com pouco acesso a recursos (a população dos países desenvolvidos está estabilizada há décadas). Este cenário nos remete imediatamente a uma questão importante.É necessário produzir alimentos em quantidades cada vez maiores, sem aumento nos custos, para podermos alimentar a população mundial. Obviamente que também é necessário que muitas questões no campo da política sejam resolvidas, para que as pessoas tenham acesso ao alimento. No entanto, esta questão foge aos objetivos deste curso de Melhoramento Genético. Mas certamente, para que todos tenham acesso ao alimento, é necessário, antes de tudo, que a produção de alimentos seja suficiente. Em 1798, Thomas Robert Malthus, um economista inglês, previu uma grande fome no mundo, pela escassez de alimentos. Segundo Malthus “a não ser que a população humana tenha seu crescimento limitado pelas guerras ou catástrofes, ela aumentará até que a fome se torne o fator limitante.” Esta previsão catastrófica baseava-se na sua crença de que, a população humana cresceria em uma progressão geométrica, enquanto que a produção de alimentos cresceria numa progressão aritmética (Figura 1.1). Ele previu uma grande fome para a Inglaterra, para meados do século XIX. 5 A população realmente cresceu na proporção prevista por Malthus, mas o desastre não ocorreu, pois o aumento na produção de alimentos foi maior do que os previstos. Isso se deu por vários motivos: - Modernização da agricultura, - Utilização de máquinas na produção agrícola, - Melhoria no transporte e conservação da produção, - Expansão da área agrícola, - Agricultura mais científica. Os malthusianos acreditam que o desastre tenha sido apenas adiado, e que ainda teremos uma catástrofe pela falta de alimentos. Uma vez que a população cresce a taxas cada vez maiores, os aumentos na produção de alimentos devem ser contínuos. As áreas aptas à agricultura são limitadas. Ainda é possível incorporar novas áreas ao processo de produção agrícola, especialmente no Brasil e na África, mas certamente há um limite para essa expansão das fronteiras agrícolas. Então, para conseguir manter o crescimento da produção de alimentos é necessário aumentar a produção por área, ou seja, aumentar a produtividade. O aumento de produtividade pode ser conseguido por duas maneiras: melhorando o ambiente, ou melhorando o potencial produtivo das variedades. O ambiente pode ser melhorado a partir da melhoria das práticas agrícolas, tais como adubação, irrigação, drenagem, preparo do solo, controle de plantas daninhas, pragas, doenças, etc. O potencial produtivo das variedades pode ser aumentado através do melhoramento genético. Obviamente que o aumento de produtividade só é conseguido com variedades mais produtivas, cultivadas sob práticas agrícolas adequadas, que permitam a expressão do potencial genético. Desta forma, a melhoria 6 das práticas agrícolas e o melhoramento genético são práticas complementares. No entanto, apenas o melhoramento genético será abordado neste curso. O melhoramento genético de plantas é uma prática muito antiga. Iniciou-se praticamente junto com a agricultura. Quando os primeiros agrupamentos humanos perceberam que podiam cultivar as sementes que coletavam, dando início à agricultura, também observaram que, ao cultivar sementes das melhores plantas, obtinham colheitas melhores. Desta forma, selecionando as melhores sementes, praticavam, de forma empírica, melhoramento genético. Com isso, influenciaram dramaticamente a evolução das espécies que cultivavam, tornando-as mais adequadas ao uso na alimentação humana. A seleção de espécies adequadas à alimentação humana também foi feita nesta época, e influencia a dieta humana até os dias atuais. Por este motivo, Vavilov (1949/1950) conceituou melhoramento de plantas como “a evolução dirigida pela vontade do homem”. Outro conceito bastante adequado ao melhoramento genético foi dado por Poehlman (1987): “Melhoramento genético é a arte e a ciência que permitem modificar e melhorar a herança das plantas.” O melhoramento genético é arte, pois o melhorista deve perceber diferenças sutis entre os indivíduos, ao praticar a seleção. Nesta etapa, o melhoramento genético é a arte de selecionar os melhores indivíduos, a partir da observação visual. O melhoramento genético também é ciência, pois utiliza princípios da genética, estatística, botânica, fisiologia, bioquímica, etc. No princípio, o melhoramento genético era praticado de forma empírica, e era apenas arte. A partir de 1900, com a redescoberta das leis de Mendel, o melhoramento passou a ser mais científico. Atualmente, com a utilização de ferramentas da biotecnologia, o melhoramento genético tem se tornado cada vez mais científico, porém, sem perder sua arte. 1.1. DISCIPLINAS RELACIONADAS COM O MELHORAMENTO GENÉTICO O melhoramento é composto pela interação de diversas disciplinas, cuja aplicação é necessária em um programa de melhoramento genético. 7 Genética: o melhoramento genético é um ramo da genética aplicada, e como tal, depende dos princípios da genética. Botânica: é necessário conhecer as características das plantas com que se trabalha. É necessário conhecer morfologia, taxonomia, adaptações a ambientes e modos de reprodução. Fisiologia vegetal: para produzir variedades tolerantes ás condições adversas (frio, calor, seca, etc.) é necessário conhecimentos de fisiologia vegetal. Fitopatologia: a obtenção de cultivares resistentes às doenças é um importante meio de controlar as moléstias das plantas. Entomologia: para a obtenção de variedades tolerantes a pragas. Bioquímica: no melhoramento de qualidade (teor de óleo, proteína, vitaminas,...) é necessário o uso de análises bioquímicas. A genética bioquímica também contribui para o melhor entendimento da estrutura e função dos genes. Estatística experimental: o melhoramento de plantas é uma atividade de pesquisa que requer o emprego constante de métodos estatísticos. Para comparar o comportamento dos materiais com que trabalha, o melhorista deve escolher o delineamento experimental apropriado, instalar o ensaio no campo, obter os resultados, analisa-los e interpreta-los corretamente. 8 Fitotecnia: o melhorista deve conhecer bem os métodos de produção da cultura com que trabalha. Deve conhecer os problemas da cultura, e o que os consumidores e agricultores desejam em relação às novas variedades. Biotecnologia: o uso de marcadores moleculares, cultura de tecidos, transformação genética, entre outras ferramentas da biotecnologia, contribui para a melhoria dos resultados do melhoramento genético. Obviamente, o melhorista não pode ser um especialista em todas estas áreas. Por este motivo, um programa de melhoramento genético exige uma equipe multidisciplinar, com especialistas nas diversas áreas. O melhorista, no entanto, deve possuir um bom treinamento em genética, estatística experimental, fitotecnia e botânica. 9 Capítulo II 2. A VARIABILIDADE GENÉTICA ENTRE OS SERES VIVOS 2.1 FONTES DA VARIAÇÃO A variabilidade (ou variação) observada entre diferentes plantas dentro de uma espécie pode ser de origem ambiental ou genética. 2.1.1 Variação ambiental É a variação em tamanho, forma, cor, composição ou desenvolvimento entre plantas, devido às influências ambientais. A variação observada entre plantas geneticamente idênticas (linhas puras ou clones), quando cultivadas em ambientes diferentes, é a variação ambiental. Quando cultivamos o mesmo híbridos de milho em solos férteis ou em solos pobres, observamos diferença no desenvolvimento das plantas. Esta diferença é devida a variação ambiental. Variações observadas em material geneticamente uniforme, causadas por efeitos ambientais, não são transmitidas para as progênies e, portanto, não permitem ganhos por seleção. 2.1.2. Variação Genética É a variação em tamanho,forma, cor, composição ou desenvolvimento entre plantas, em uma população geneticamente mista, que resultam de causas herdáveis e são transmitidas para a descendência (progênie). Variações hereditárias podem ocorrer em características simples e facilmente herdáveis, tais como: diferenças na cor das flores; diferenças na cor das sementes; tipo de endosperma, etc,,, Por outro lado, as variações hereditárias podem ser observadas em características complexas, tais como: Vigor no crescimento; Altura de plantas; Ciclo (dias para maturação); Produtividade, etc. A variação observada em uma população de plantas geneticamente variável, cultivada em um ambiente uniforme, é a variação genética. Embora variações herdáveis possam ser observadas nas progênies (descendência) das plantas selecionadas, a magnitude desta variação é influenciada pelos efeitos ambientais, Por exemplo, uma variedade pode apresentar um potencial 10 genético para maior produtividade, mas a fertilidade do solo, disponibilidade de água, etc. irão influenciar também na produtividade final destas plantas. As características observáveis em uma determinada planta constituem o seu fenótipo (F). As variações observáveis no fenótipo de um indivíduo são constituídas pelo conjunto de variações genéticas (G) e ambientais (A): F = G + A As variações genéticas e ambientais não são completamente independentes uma da outra. Freqüentemente são observadas interações entre os efeitos genotípicos e ambientais. Por exemplo, quando cultivamos duas variedades distintas em um ambiente de solo pobre, poderemos observar diferença de produtividade entre as variedades, e selecionar aquela que é mais produtiva neste ambiente. Se as mesmas variedades forem cultivadas em um solo mais fértil, ambas aumentarão a sua produtividade, mas uma variedade pode aumentar a produtividade mais do que a outra. Isso indicará que o ambiente, embora favoreça ambas as variedades, favorece mais uma variedade do que a outra. Ou seja, o ambiente influencia diferentemente o desenvolvimento das variedades. Pode ocorrer inclusive que a variedade mais produtiva no local com solo pobre, não seja a mais produtiva no solo mais fértil. A esta ação diferencial do ambiente sobre as variedades, chamamos de interação Genótipo x Ambiente (GxA). Então, as características expressas pelo fenótipo (F) são determinadas por genes específicos (G), pelos efeitos do meio ambiente (A) e pela interação entre os genes e os efeitos ambientais (GxA), ou seja: F = G + A + GxA 2.1.3. Interação Genótipo x Ambiente Como vimos anteriormente, o fenótipo é resultado da constituição genética do indivíduo, e dos efeitos do ambiente sobre o mesmo. Ao compararmos dois indivíduos, em dois ambientes diferentes, as situações representadas na figura 2.1 podem ser observadas. 11 Sem Interação: Ao passar do ambiente 1 para o ambiente 2, ambas as variedades (G1 e G2) aumentaram a produção. Isso significa que o ambiente influenciou na produtividade, e que o ambiente 2 é mais favorável para a produção das duas variedades. Mas o ambiente influenciou as duas variedades na mesma magnitude, ou seja, a diferença entre ambas continuou a mesma. Como o ambiente influenciou as duas variedades da mesma forma, não existe interação diferencial entre o genótipo da variedade e o ambiente, ou seja, não existe interação GxA. Interação Simples: O efeito de cada ambiente é diferente para cada genótipo, ou seja, o efeito do ambiente depende do genótipo (existe uma interação entre o efeito do ambiente e o genótipo do indivíduo). No exemplo acima, o ambiente 2 tem um efeito positivo para ambas as variedades, mas para a variedade G1, o efeito é maior do que para G2. Embora as duas variedades tenham sido favorecidas, a variedade G1 foi mais favorecida do que a variedade G2. Isto caracteriza uma interação. Como neste caso a classificação das variedades continua a mesma, ou seja, G1 é melhor do que G2 em ambos os ambientes, a interação é do tipo simples. Se o objetivo for avaliar qual variedade é melhor, esta interação não influenciará nos resultados. Interação Complexa: Neste caso, a variedade que era melhor em um ambiente não é a melhor no outro. Há uma inversão na classificação das variedades. Isto significa que o efeito de cada ambiente sobre as variedades é muito diferente. Existe uma interação entre o efeito do ambiente e o genótipo da variedade, e esta interação é capaz de inverter a classificação das variedades. Pode ser o caso de que a variedade G1 seja bastante rústica, e mesmo em ambientes mais pobres (em fertilidade, água, etc), mantém uma produtividade aceitável. Mas se o ambiente for altamente favorável, ou seja, possua boa fertilidade, disponibilidade de água, etc., esta variedade não é capaz de aumentar muito seu potencial produtivo. Já a variedade G2 pode ser extremamente exigente. É muito produtiva em ambientes favoráveis, mas perde muita produtividade em ambientes mais pobres. Esta interação dificulta a análise dos resultados. Se for um experimento de competição de variedades, a variedade só pode ser recomendada para os locais em que o ambiente lhe é favorável. Neste caso, deve-se explorar a interação GxA para obter o máximo de produtividade em cada ambiente, e recomendar o cultivo da variedade G1 no ambiente 1, e G2 no ambiente 2. Assim, a variação observável em uma determinada característica, pode ser herdável ou não herdável, ou ainda, ser composta por uma porção herdável e outra não herdável. A variação herdável é essencial para o melhoramento genético. Sem ela, é impossível obter ganhos herdáveis. 12 Uma das funções mais importantes do melhorista é identificar as características que apresentam variação herdável, e que possam ser úteis ao melhoramento genético, e concentrar genes que aumentem a expressão destas característica em uma variedade. As características observadas pelo melhorista geralmente são complexas. Algumas características estão relacionadas à morfologia das plantas (altura, rigidez da palha, tolerância ao acamamento, entre outros). Outras características estão associadas a processos fisiológicos (tolerância ao frio, a seca ou a outros tipos de estresses abióticos, resistência a doenças, entre outros). 2.1.4. Principais características ou objetivos do melhoramento de plantas a) Aumento da Capacidade Produtiva das Plantas É a principal meta do melhoramento de plantas. Os programas de melhoramento podem ter como objetivo, incorporar uma série de diferentes características, como as relacionadas nos itens seguintes, às novas variedades, mas sempre deverão ter como meta o aumento de produtividade. b) Melhoria da Qualidade dos Produtos Vegetais Alimentos com maior valor nutritivo, melhor paladar, com aspecto comercial mais atraente para o consumidor (cor, tamanho, forma), matérias primas de melhor qualidade para a indústria, como por exemplo, maior quantidade de açúcar e amido, maior conteúdo de proteína, melhor qualidade de óleo, etc... Um exemplo clássico é o aumento do teor de açúcar na beterraba açucareira. Em 175 anos de melhoramento, este teor de açúcar passou de 7% para 15-18%, viabilizando a extração se sacarose. Alguns exemplos atuais são o aumento do conteúdo de proteína em grãos de soja, a eliminação de lipoxigenases (responsáveis pelo sabor) e de inibidores de protease, também em grãos de soja, e a melhor qualidade do glúten de trigo para panificação, aumento do teor de sacarose na cana-de-açúcar, entre outros. c) Facilidade de Colheita Mecanizada Importante quando a mão-de-obra é cara ou escassa. Plantas que tombam, que estão sujeitas a debulha natural, ou que possuem maturação desuniforme, não se prestam a colheita mecanizada. Exemplos de ganhos para esta características são a diminuição da altura de plantas de sorgo, uniformidade de maturação e estaturade plantas de algodoeiro, arquitetura de plantas de feijoeiro, entre outras. d) Utilização de Novas Áreas Agrícolas ou Áreas de Condição Desfavorável Cultivares mais precoces, mais resistentes ao frio, calor, seca, salinidade, tolerantes a toxidez de alumínio, ente outras. Por exemplo, a soja era uma espécie adaptada ao 13 cultivo em ambientes temperados. No Brasil, o trabalho de melhoramento genético desenvolvido por instituições públicas de privadas “tropicalizou” a soja, ou seja, desenvolveu variedades adaptadas ao cultivo no clima tropical, o que permitiu a expansão do cultivo da soja para os cerrados brasileiros. e) Melhoria da Fixação Simbiótica de Nitrogênio Plantas mais eficientes na fixação de nitrogênio podem expressar melhor o seu potencial produtivo. f) Controle de Fitopatógenos O uso de variedades resistentes às doenças é um dos métodos com que os fitopatologistas contam para o controle de vírus, bactérias, fungos e nematóides. Para o agricultor é o método ideal, pois não implica em gastos adicionais de controle. Além disso, algumas doenças não têm controle, como por exemplo, bacterioses, viroses e nematóides. g) Controle de Pragas De forma semelhante ao caso de resistência às doenças, prejuízos causados por insetos e ácaros podem ser evitados pelo desenvolvimento de cultivares resistentes. Atualmente, com a utilização da engenharia genética, tem sido possível obter mais facilmente plantas resistentes a insetos. h) Tolerância a herbicidas Tanto através de mutagênese quanto através de engenharia genética, têm sido obtidas variedades tolerantes a herbicidas, que facilitam os tratos culturais e aumentam a eficiência do controle de plantas daninhas nas lavouras. Além destas, outras características podem ser alvo dos programas de melhoramento genético, como a tolerância ao acamamento, a precocidade, a adaptação ao cultivo em semeadura antecipada, ou em semeadura tardia, a tolerância a estresses abióticos, como salinidade e déficit hídrico, entre outras. 2.2. HERANÇA E HERDABILIDADE DOS CARACTERES Algumas características apresentam variação discreta, facilmente identificada mesmo em ambientes variáveis. A cor da flor das plantas de soja, por exemplo, é púrpura ou branca, independente do ambiente em que são cultivadas. A herança destas características é simples, e este tipo de característica é denominada de QUALITATIVA. Uma característica tem herança simples, quando é governada por um ou poucos genes. Outros exemplos de características qualitativas são a resistência das plantas a algumas doenças fúngicas, o tipo de crescimento em plantas de soja, 14 presença de aristas nas espigas de trigo, a presença ou ausência de fatores anti- nutricionais nas sementes de algumas espécies de plantas, entre outras. Outras características são facilmente modificadas pelo ambiente, e são expressas em uma escala contínua de variação. Estas características têm uma herança complexa, e são denominadas de QUANTITATIVAS. Características quantitativas são controladas por um grande número de genes, todos com pequeno efeito. As principais características associadas com a produtividade das plantas são quantitativas, como por exemplo, o peso de sementes, número de sementes por planta, número de vagens por planta, número de sementes por espiga, altura das plantas, entre outras. Características qualitativas são facilmente selecionadas, enquanto que para as características quantitativas, os efeitos ambientais não são facilmente isolados dos efeitos genéticos. Por este motivo, os testes de progênie são geralmente utilizados, a fim de certificar-se que a superioridade de um determinado material deve-se ao seu componente genético. O teste de progênie, como será visto adiante, consiste na avaliação da progênie (descendência) de um indivíduo selecionado, para verificar se este indivíduo foi capaz de transferir as características superiores que apresentava para a descendência (neste caso, a superioridade foi devida a causas genéticas) ou não (neste caso, a superioridade foi devida principalmente a causas ambientais). Qualitativa Quantitativa 15 2.2.1. O mecanismo da herança Mendeliana As variações herdáveis são observadas quando plantas diferentes da mesma espécie são cultivadas no mesmo ambiente, e exibem diferenças contrastantes em suas características. As características contrastantes são determinadas por alelos alternativos (contrastantes) no mesmo loco em cromossomos homólogos, e pela interação dos genes com os efeitos do ambiente durante o crescimento e desenvolvimento das plantas. Os melhoristas geralmente estão interessados em características de interesse econômico, e em métodos de melhoramento que possibilitem a combinação de alelos favoráveis destes genes, em variedades superiores. Neste aspecto, os melhoristas diferem dos geneticistas, que estão interessados primeiramente no material genético e nas rotas de ação gênica. Diferem também dos citologistas, cujo foco primário é o procedimento a ser adotado para a manipulação destes cromossomos. Para compreender melhor os mecanismos da herança Mendeliana, ou a herança das variações herdáveis é necessário revisar alguns conceitos fundamentais. Considere a ilustração apresentada na figura 2.3. Cromossomos: são estruturas que quando condensados, apresentam a forma de bastonetes, no núcleo das células, e que quando corados corretamente, podem ser visualizados durante a divisão celular. Os cromossomos contém os genes, e cada cromossomo contém centenas de genes. A distribuição dos cromossomos e dos genes que eles carregam, nas células reprodutivas (gametas), determinam a distribuição 16 específica dos genes nas progênies. Os cromossomos aparecem com uma única cópia nas células haplóides dos gametas, em pares nas células somáticas diplóides (e nas células fertilizadas), e em triplicata nas células triplóides do endosperma. O número de cromossomos haplóides ou diplóides é constante dentro da mesma espécie. Loco: é uma posição na molécula de DNA. Um loco pode conter um gene, um marcador molecular, ou uma seqüencia qualquer do DNA. As formas locus (singular) e loci (plural) são as formas latinas, e somente devem ser usadas em textos escritos em inglês, ou outra língua que não possua um termo próprio. Em português, devemos usar os termos loco (singular) e locos (plural). Genes: seqüência de nucleotídeos do DNA que pode ser transcrita em RNA mensageiro, e posteriormente, em um peptídeo. É a unidade fundamental da hereditariedade. Alelo: são formas alternativas do gene, e que são responsáveis pelas diferenças observáveis (e herdáveis) das características. Um gene pode possuir vários alelos, que diferem entre si por diferenças ocasionadas por mutações, inserções ou deleções, e que podem alterar ou inibir a expressão do gene. 17 Mecanismo de herança simples: exemplo da presença de arista na espiga de cevada. 18 Teste de progênie: a observação visual das plantas na geração F2 não é suficiente para inferir sobre o seu genótipo (AA e Aa são iguais). A observação da descendência destas plantas permite saber se as plantas são homozigotas (não segregam) ou heterozigotas (segregam). i. – Estudo de herança mendeliana Para avaliar o controle genético de uma característica em plantas, deve-se realizar um estudo de herança. O estudo de herança é feito a partir da obtenção de populações segregantes para a característica alvo, e avaliação das proporções fenotípicas observadas. Populações F2 e famílias F2:3 são as mais comuns para este tipo de estudo. A figura 2.4 ilustra as etapas de um estudo genético de herança, em plantas. A figura ilustra o estudo de herança da resistência a uma doença, maso mesmo modelo pode ser aplicado a qualquer característica qualitativa. Inicialmente, deve-se realizar o cruzamento entre duas variedades homozigotas contrastantes para a característica de interesse. As sementes resultantes constituem a geração F1. As plantas F1 devem ser autopolinizadas, para obtenção das sementes F2. Nas plantas F2, avalia-se a característica de interesse em um grande número de plantas. No exemplo da figura 2.4, as plantas F2 devem ser desafiadas com a doença 19 em estudo, e deve ser anotado o número de plantas resistente e suscetíveis. As plantas F2 devem ser autopolinizadas para obtenção das progênies F2:3. Utilizamos a notação F2:3 para a progênie F3 derivada de uma planta F2. As progênies F2:3 também são avaliadas para a característica de interesse, e anotam-se o número0 de progênies que são 100% resistentes, o número de progênies que são 100% suscetíveis, e o número de progênies que estão segregando, ou seja, que apresentam tanto plantas resistentes quanto suscetíveis. Os dados obtidos nas avaliações de F2 e de F2:3 são comparados com os dados esperados sob uma determinada hipótese genética. 2.2.2. Hipóteses Genéticas Diversas hipóteses genéticas podem ser testadas em um estudo de herança, utilizando populações F2 e famílias F2:3. A seguir, estão listadas as mais comuns: a) Hipótese de um gene dominante. Neste caso, o cruzamento inicial é entre uma variedade AA e outra aa. A figura 2.5 ilustra a segregação de um gene dominante, em um estudo de herança. Se o gene é dominante, não é possível distinguir o homozigoto dominante (AA) e o heterozigoto (Aa). Ambos apresentarão fenótipo de resistência. Neste caso, na geração F2, espera-se observar 3/4 de plantas resistentes e 1/4 de plantas suscetíveis. A proporção esperada na geração F2 é de 3:1 resistente:suscetível. Esta é a hipótese a ser testada para a segregação de um gene dominante, na geração F2. 20 Na geração F3, espera-se que 1/4 das famílias seja 100% resistente (descendentes de plantas F2 AA), 2/4 apresentem plantas resistentes e plantas suscetíveis (descendentes de plantas F2 Aa) e 1/4 seja 100% suscetível (descendentes de plantas F2 aa). A hipótese a ser testada na geração F2:3 é de 1:2:1 de famílias 100% resistentes:segregando:100% suscetíveis. Os dados observados devem ser comparados com dados esperados sob a hipótese de segregação 3:1 (em F2) ou 1:2:1 (em famílias F2:3) através do teste de qui-quadrado. b) Hipótese de um gene recessivo. Neste caso, o cruzamento inicial também é entre uma variedade AA e outra aa, mas a variedade com genétipo AA é suscetível, e a variedade com genótipo aa é resistente. A figura 2.6 ilustra a segregação de um gene dominante, em um estudo de herança. Neste caso, na geração F2, espera-se observar 3/4 de plantas suscetíveis e 1/4 de plantas resistentes. A proporção esperada na geração F2 é de 1:3 resistente:suscetível. A proporção esperada de famílias F2:3 continua sendo de 1:2:1. No teste de qui-quadrado, as hipóteses a serem testadas são de 1:3 resistente:suscetível na geração F2, e 1:2:1 de famílias 100% resistentes:segregando:100% suscetíveis nas famílias F2:3. 21 c) Hipóteses para 2 genes controlando uma característica Uma característica fenotípica pode ser controlada por 2 genes. Neste caso, os genes podem ser dominantes ou recessivos, e ainda pode haver epistasia entre os genes. A figura 2.7 ilustra a segregação de dois genes na geração F2 de um cruzamento entre parentais que contrastam para uma determinada característica. Nesta figura, a notação A_ representa plantas que possuem fenótipo dominante para o gene A, ou seja, é a soma dos genótipos AA e Aa. O mesmo ocorre para a notação B_. Observe que se o cruzamento inicial for entre uma planta com genótipo AAbb e outra aaBB, a mesma proporção é observada na geração F2, pois neste caso, as plantas F1 também tem genótipo AaBb. A partir das proporções 9:3:3:1 das combinações A_B_:A_bb:aaB_:aabb, podem-se testar diversas hipóteses. c.1) Hipóteses para a segregação de dois genes, sem epistasia: - Hipótese de dois genes dominantes, com ação duplicada. Neste caso, a planta possui dois genes controlando a característica, mas apenas um é necessário para a manifestação do fenótipo. Os dois genes possuem o mesmo efeito, e por isso a ação é chamada de duplicada. Considerando a presença de dois genes dominantes para a resistência a uma doença (A_ e B_), a presença de A_ ou de B_ isoladamente é suficiente para que as plantas sejam resistentes. Desta forma, plantas A_B_, A_bb e aaB_ são resistentes, enquanto que apenas plantas aabb são suscetíveis. A proporção esperada na geração F2 é de 15:1 de plantas resistentes:suscetíveis. 22 - Hipótese de dois genes recessivos, com ação duplicada. Da mesma forma, a planta possui dois genes recessivos controlando a característica, mas apenas um deles é necessário. Os dois genes possuem o mesmo efeito, e por isso a ação é chamada de duplicada. Considerando que os genes controlam a resistência a uma doença, os genótipos aa ou bb são de resistência. Assim, as plantas aabb, A_bb e aaB_ são resistentes, e na geração F2, a proporção de 7:9 entre plantas resistentes:suscetíveis é esperada. - Hipótese de um gene dominante e um gene recessivo, com ação duplicada. Neste caso, a planta possui dois genes para o controle de uma característica, sendo que um é dominante e outro é recessivo, mas apenas a presença de um deles é necessária. Neste caso, se a característica for a resistência a uma doença, as plantas com A_ ou com bb serão resistentes. Ou seja, as plantas A_B_, A_bb e aabb serão resistentes, e apenas as plantas aaB_ serão suscetíveis. Na geração F2, a proporção de 13:3 entre plantas resistentes:suscetíveis é esperada. c.2) Hipóteses com presença de epistasia Neste caso, leva-se em conta a presença de epistasia, ou seja, existe alguma relação entre os dois genes que controlam a característica. Esta relação pode ser complementar, de inibição, de mascaramento, etc. - Hipótese de dois genes dominantes epistáticos, de ação complementar Neste caso, dois genes dominantes são necessários para a expressão da característica, sendo que a ação de um deles complementa a ação do outro. Desta forma, os dois genes precisam estar presentes ao mesmo tempo para que a característica seja expressa. Se a característica é a resistência a uma doença, apenas plantas A_B_ serão resistentes, e a proporção esperada na geração F2 é de 9:7 entre plantas resistentes:suscetíveis. - Hipótese de dois genes recessivos epistáticos, de ação complementar Da mesma forma, é necessária a presença dos dois genes recessivos, uma vez que a ação de um complementa a ação do outro. Se a característica é de resistência a uma doença, apenas as plantas aabb serão resistentes, e a proporção esperada na geração F2 é de 1:15 entre plantas resistentes:suscetíveis. 23 - Hipótese de um gene dominante e um gene recessivo, epistáticos, de ação complementar Também é necessária a presença dos dois genes, uma vez a ação de que um complementa a ação do outro, sendo que um gene é recessivo e outro é dominante. Assim, apenas as plantas A_bb serão resistentes, e a proporção esperada na geração F2 é de 3:13 entre plantas resistentes:suscetíveis. Observe que se as plantas resistentes forem aaB_ a mesma proporção é esperada. - Hipótese de dois genes epistáticos com ação modificadora A ação modificadora de um gene é observada quando um gene produz um efeito apenas na presença de outro gene, em outro loco. Este outro gene é denominado de gene modificador. Exemplo: Cor da aleurona no grão de milho. A aleurona púrpura é produzida pelo gene dominante Pr (purple) somente na presença do gene dominante R (red). Na ausência do R, não produz corna aleurona. Observa-se, em uma população F2, uma segregação do tipo 9:3:4. Neste caso, o gene Pr é modificador do gene R. O gene R codifica para aleurona vermelha (quando o alelo dominante estiver presente) ou ausência de cor na aleurona (quando estiver no estado homozigoto recessivo). O gene Pr (dominante) modifica a expressão do gene R de vermelho para púrpura. OBS: Quando o grão de milho tem aleurona incolor, o fenótipo observado é o de grão branco ou amarelo, pois a cor do endosperma é branca ou amarela. 24 - Hipótese de dois genes epistáticos com ação inibidora Um gene pode agir como inibidor da ação de outro gene. Exemplo: O mesmo gene R, que produz aleurona colorida em milho, não produz nenhum efeito na presença do gene inibidor dominante I, resultando em aleurona incolor. O resultado é uma segregação 3:13 na geração F2. Considerando a presença dos três genes (Pr, R e I), as seguintes proporções são observadas na geração F2. - Hipótese de dois genes epistáticos com ação mascaradora Um gene pode ocultar o efeito de outro quando ambos estão presentes. Exemplo: Em aveia, o gene dominante Y (yellow) produz tegumento da semente amarelo, enquanto que no estado homozigoto recessivo, o tegumento da semente é branco. O gene dominante B (black) produz semente com tegumento preto. O gene Y não apresenta efeito visível na presença do gene B, pois o tegumento preto mascara a cor. O resultado é uma segregação 12:3:1 na geração F2. 25 - Hipótese de dois genes epistáticos com efeito aditivo Dois genes podem produzir o mesmo efeito, mas o efeito é aditivo se ambos estão presentes. O resultado na geração F2 pode ser uma segregação 3:10:3, ou 9:6:1 dependendo da característica ser controlada por alelos dominantes ou recessivos. Exemplo1: Um gene dominante e um recessivo, aditivos, controlando a resistência a uma doença. Exemplo2: Dois genes dominantes aditivos controlando a resistência a uma doença. ii. - Teste de Qui-quadrado (Χ2) Quando desejamos testar uma hipótese genética de segregação (por exemplo 3:1; 15:1; 9:7; etc...), os valores observados nunca são exatamente aqueles esperados para as várias possíveis hipóteses. Existem alguns desvios entre o que seria esperado, e o que é observado. Por exemplo, estudar a herança da resistência do feijoeiro a antracnose no caule, foram avaliadas 160 plantas F2. Os resultados estão apresentados na tabela 2.1. 26 Observe que existe uma diferença entre o que era esperado, e o que foi observado. Como saber se esta diferença é devida ao acaso (ou a amostragem), ou ele é suficientemente grande para rejeitar a hipótese de segregação independente? Para responder a este tipo de questionamento, utiliza-se o teste de qui-quadrado. Para se testar uma hipótese genética, é necessário obter duas estatísticas denominadas 2 calculado e Χ2 tabelado. O Χ2 calculado é obtido a partir dos dados experimentais, levando-se em conta os valores observados e aqueles que seriam esperados com base na hipótese genética formulada. O Χ2 tabelado depende dos graus de liberdade associados à hipótese e do nível de significância adotado. A tomada de decisão é feita comparando-se o valor do Χ2 calculado com o valor do Χ2 apresentado nas tabelas. As comparações a seguir resultam nas decisões: Ho refere-se à hipótese formulada a respeito do caráter que se está estudando. Assim, rejeita-se uma hipótese quando a máxima probabilidade de erro ao rejeitar aquela hipótese for baixa (α baixo). Ou, quando a probabilidade dos desvios terem ocorrido pelo simples acaso é baixa. Na prática, utiliza-se geralmente α = 5%. O valor do Χ2 tabelado é encontrado em vários livros de estatística e são obtidos para um determinado nível de significância (α) e certos graus de liberdade. O grau de liberdade, na maioria das vezes, é igual ao número de classes fenotípicas menos 1,0. O nível de significância (α) representa a máxima probabilidade de erro que se tem ao rejeitar uma hipótese verdadeira. O valor do qui-quadrado, a ser comparado com o tabelado, é calculado por meio da expressão: em que Oi e Ei representam, respectivamente, os valores observados e esperados para a i-ésima classe fenotípica. Para os dados da tabela 2.1 temos: 27 O número de graus de liberdade para as duas hipóteses é 1 (um). Adotando-se o nível de significância igual a 5%, encontra-se na tabela de qui-quadrado (tabela 2.1) que o valor de qui-quadrado tabelado a 5% de probabilidade é 3,84. Neste caso, rejeita-se a hipótese de um gene recessivo (1:3), e aceita-se a hipótese de dois genes epistáticos, um dominante e um recessivo (3:13). 2.2.3. Tamanho das populações para estudo de herança Na prática, para testar hipóteses de 3:1 são necessárias em torno de 100 a 120 indivíduos na geração F2. Se a hipótese a ser testada é de 15:1, a população deve ser maior, em torno de 200 a 250 indivíduos. Quanto menor a proporção esperada da classe menos freqüente, maior deve ser a população, para permitir um número suficiente de indivíduos nesta classe. Por exemplo, na hipótese de 3:1, a classe menos freqüente corresponde a 1/4 da população, e em uma população de 100 indivíduos, espera-se em torno de 25 nesta classe. Já na hipótese de segregação 15:1, a classe menos freqüente corresponde a 1/16 da população, e em uma população de 100 indivíduos, espera-se obter em torno de seis indivíduos nesta classe. Em uma população de 250 indivíduos, espera-se obter em torno de 17 na classe menos frequente. 28 2.2.4. Herdabilidade das características Muitas características de interesse em um programa de melhoramento de plantas tem herança simples, como por exemplo, grande parte dos genes de resistência às doenças fúngicas, e muitos genes relacionados com os aspectos de coloração dos diferentes órgãos das plantas (cor de flor, de grãos, de pubescência, de hilo, etc.) No entanto, a maior parte das características associadas ao desempenho agronômico das variedades, tais como produção de grãos, estatura, adaptabilidade e estabilidade, é controlada por vários genes, em diversos locos. São as chamadas características quantitativas. Para características qualitativas, aplicam-se os conceitos clássicos da herança mendeliana, sendo facilmente identificável o número de genes que controlam a característica. Para características quantitativas, o estudo da herança mendeliana não é facilmente aplicado, e é difícil estimar o número de genes que controlam a característica. Estas características são ditas de herança quantitativa. Se considerarmos uma característica de herança simples, com ausência de dominância, teremos: Em 1908, H. Nilsson-Ehle, um geneticista sueco, estudou a herança da cor de grãos em trigo. No cruzamento entre duas variedades de trigo, uma de grão vermelho muito escuro e outra de grão branco, produziu uma descendência F1 com grãos vermelho intermediários. Na geração F2, conseguiu dividir os grãos em cinco classes, de acordo com a cor dos grãos. 29 Na geração F2, encontrou uma segregação 1:4:6:4:1. Observou que a medida que aumenta o número de alelos dominantes, aumenta a intensidade da cor vermelha. Com apenas dois genes controlando a característica, obteve uma distribuição contínua do fenótipo. Em trabalhos posteriores, o mesmo autor identificou um terceiro gene associado com a cor do grão de trigo. Neste caso são obtidas sete classes, e a característica tem ainda mais semelhança com a distribuição normal. A medida que aumenta o número de genes controlando determinada característica, a distribuição torna-se ainda mais contínua. Cada gene contribui com uma pequena parte para a variação, resultando em uma variação contínua. Não é possível estratificar a população em classes (com por exemplo baixo, médio e alto). Em termos estatísticos,esta variação é descrita pela média e pela variância. 30 Considere o caso hipotético de que uma característica quantitativa (produção de grãos, por exemplo) fosse controlada por um único gene, com ação aditiva, ou seja, cada alelo dominante contribui com a mesma quantidade de aumento na produção. Teríamos a seguinte situação: Observe que seria extremamente fácil distinguir os genótipos, uma bez que a diferença entre eles é de 500g. Considere agora que a característica produção de grão é controlada por dois genes. Cada alelo A contribui com 375g, e cada alelo B com 125g. Teríamos a configuração abaixo: A diferença entre dois genótipos próximos diminuiu para 125g. Ainda assim, é relativamente fácil identificar os genótipos superiores. A medida que aumenta o número de genes controlando a característica, a diferença entre dois genótipos próximos vai ficando cada vez menor, de forma que pequenas variações ambientais podem confundir-se com as variações genéticas. O ambiente pode gerar mais variação do que a variação entre alguns genótipos. 31 Para o caso de variação quantitativa, pelo fato de muitos genes de pequeno efeito estarem envolvidos, as características são muito mais influenciadas pelos efeitos ambientais. Nestes caso, geralmente há interesse em saber quanto da variação tem origem genética. Esta estimativa é denominada de herdabilidade, e é expressa pelo símbolo h2. A herdabilidade de uma característica expressa a proporção da variação total (ou fenotípica), que é devida a causas genéticas (ou ao genótipo): É fácil observar, portanto, que quanto maior for a variação ambiental, menor será a herdabilidade da característica, e vice-versa. Também é fácil de perceber que quanto maior a herdabilidade, mais facilmente os indivíduos superiores poderão ser identificados, pois a variância genética predomina nestes casos. Portanto, o bom controle do ambiente é fundamental para que a variação devida às diferenças na composição genética dos indivíduos (variância genotípica) seja predominante, e assim, os indivíduos superiores possam ser mais facilmente selecionados. Os ambientes dos locais onde se pratica seleção devem ser uniformes, ou divididos em blocos uniformes, de forma a diminuir ou isolar a variação ambiental. Como a herdabilidade é função, além da variância genotípica, da variância ambiental e da variância da interação entre o genótipo e o ambiente, é de se esperar que a mesma característica possua estimativas de herdabilidades diferentes, quando estudada em ambientes diferentes. 2.2.5. Modalidades de ação gênica relacionadas às características quantitativas (Interações alélicas) Características quantitativas são o resultado da expressão de vários genes. Cada um destes genes possui as mesmas propriedades gerais dos genes qualitativos, 32 ou seja, estão sujeitos as mesmas leis da genética Mendeliana. Podem, portanto, possuir ação gênica aditiva (ausência de dominância), ação dominante, sobredominante (heterose) e epistática (interações não-alélicas). -Ação Aditiva: Cada alelo contribui individualmente para o valor do fenótipo. Não existe dominância. Considere o exemplo de dois genes, cada um com dois alelos: A=2, a=1, B=6, b=3 Pais AABB x aabb 16 8 F1 AaBb 12 Características da ação aditiva: a) A média da geração F1 é igual à média dos pais; b) A média da geração F2 é igual à média da geração F1; c) O erro padrão da geração F2 é maior do que o erro padrão da geração F1; d) A distribuição da geração F2 é simétrica. É possível ocorrer segregação transgressiva, quando os pais são semelhantes (ex: AAbb x aaBB) e) A descendência de um indivíduo qualquer tem média igual a deste indivíduo. -Ação de dominância: A aditividade ocorre apenas entre genes não alélicos. No mesmo loco, o heterozigoto tem o mesmo valor do homozigoto. Exemplo: AA ou Aa=4, aa=2, BB ou Bb=12, bb=6 Pais AABB x aabb 16 8 F1 AaBb Características da ação de dominância: a) A média da geração F1 é igual ao valor do pai de maior valor, quando os pais são muito diferentes. Quando os pais são semelhantes, a medida do F1 é superior a qualquer dos pais: Pais AAbb x aaBB 10 14 F1 AaBb 16 33 b) A média da geração F2 é menor do que a méida da geração F1. c) O erro padrão da distribuição de F2 é maior do que o erro padrão da geração F1. d) A distribuição da F2 tende a ser assimétrica. Nenhum indivíduo tem valor superior ao F1. A assimetria apenas é acentuada quando poucos genes estão envolvidos. Aumentando o número de genes, a assimetria diminui e a F2 tende para a curva normal (considerando que a dominância é bi-direcional) e) A descendência de qualquer indivíduo tem média inferior a este, a não ser quando for homozigoto. Quando houver dominância bi-direcional, a distribuição do F2 tende para o modelo aditivo, com todas as suas características. -Ação de Sobredominância O heterozigoto tem valor superior ao de qualquer dos homozigotos Ex: AA=4, aa=2, Aa=5 ,BB=12, bb=6, Bb=14 Pais AABB x aabb 16 8 F1 AaBb 19 Características da ação de sobredominância: a) A média da geração F1 é sempre maior do que qualquer valor de qualquer dos pais; b) A média da geração F2 é menor do que a média da F1; c) O erro padrão da distribuição de F2 é maior do que o erro padrão da geração F1; d) A distribuição da geração F2 é assimétrica, com nenhum indivíduo de valor maior do que o F1; e) A não ser para indivíduos homozigotos, a média da descendência de qualquer indivíduo será inferior a ele. Descendentes superiores são conseguidos por cruzamento entre indivíduos com os mesmos valores. 34 Relação do tipo de ação gênica com o melhoramento: a) A ação aditiva caracteriza-se por ter cada genótipo um valor próprio. No caso de dominância, genótipos diferentes tem valores iguais. A aditividade dos genes permite melhor detectar-se os diferentes genótipos, o que é fundamental para a seleção. b) A ação aditiva é a que apresenta maior amplitude de variação entre os valores dos genótipos segregantes. Com dominância, a distribuição tende a ser mais compacta. c) A ação aditiva é a que apresenta melhor resposta a seleção, pois a descendência se assemelha aos indivíduos selecionados. No caso de dominância, os genótipo selecionados geralmente são os heterozigotos, que segregam para tipos inferiores. 35 2.2.6. Variação quantitativa genética e ambiental: teoria das linhas puras Em 1903, W. Johannsen, um botânico dinamarquês, estabeleceu que a variação no tamanho de sementes de feijões, em um lote de sementes composto por uma mistura de genótipos, continha tanto componentes genéticos quanto ambientais. A partir de uma amostra de feijões de um lote misto, ele selecionou diversos grãos de feijão, por tamanho. Em seguida ele cultivou estes grãos e observou que a descendência dos grãos menores produzia grãos com peso médio menor, e a descendência dos grãos maiores produzia grãos maiores. Observou ainda, que dentro de cada descendência os tamanhos dos grãos variavam. Continuou a observar diferenças de tamanho nas progênies, mas as progênies do grupo de feijões menores apresentavam praticamente a mesma média, independentemente de terem sido obtidas a partir do maior ou do menor grão dentro do grupo. O mesmo ocorreu com a descendência dos grãos grandes e pequenos selecionados no grupo dos maiores. Na primeira geração, grãos maiores produziam descendência com grãos grandes, enquanto a descendência dos grãos menores era de grãos pequenos. Na segunda geração, dentrodo mesmo grupo, grãos maiores e menores produziam a mesma descendência. Johannsen observou, acertadamente, que isso somente era possível, pois na primeira geração havia variabilidade genética, uma vez que os feijões 36 foram selecionados de uma amostra mista, ou seja, que continha uma mistura de feijões de diversas variedades, ou diversos genótipos. Já na segunda geração não havia variabilidade genética dentro dos grupos, uma vez que em feijão, por ser uma planta autógama (que se reproduz por autofecundação), todas as plantas de uma população são homozigotas para todos os locos (com exceção de populações segregantes). Plantas homozigotas produzem descendentes iguais à planta mãe, quando reproduzidos por autofecundação. Todos os descendentes de uma planta homozigota, que se reproduz por autofecundação, possuem o mesmo genótipo, e isto caracteriza uma linha pura. Dentro de uma linha pura, toda variação observada é ambiental, uma vez que todas as plantas possuem o mesmo genótipo. Na primeira geração, a variação observada foi devida a efeitos genéticos e ambientais, uma vez que havia diferenças genéticas entre os indivíduos. 2.3. ORIGEM DA VARIAÇÃO GENÉTICA Como já vimos, a variação herdável, ou variação genética, é a base para o sucesso do melhoramento genético. A origem desta variação herdável deve-se basicamente aos seguintes fatores: - Recombinação genética - Variação no número de cromossomos - Mutação - Variação somaclonal - Transformação genética 2.3.1. Recombinação Gênica Considerando o cruzamento entre duas plantas que diferem em mais de um gene, combinações diferentes daquelas observadas nos parentais podem ser obtidas na descendência. P1 AAbb P2 aaBB X F1 AaBb Autofecundando por diversas gerações AABB Novo genótipo (recombinante) AAbb Genótipo parental aaBB Genótipo parental Fα Apenas homozigotos 37 a) Freqüências genotípicas na descendência - Considerando um gene Pais AA X aa F1 Aa 100% AA 25% 1/4 F2 Aa 50% 1/2 aa 25% 1/4 AA 37,5% 3/8 F3 Aa 25% 1/4 aa 37,5% 3/8 AA 43,75% 7/16 F4 Aa 12,5% 1/8 aa 43,75% 7/16 AA 46,875% 15/32 F5 Aa 6,25% 1/16 aa 46,875% 15/32 AA 48,4375% 31/64 F6 Aa 3,125% 1/32 aa 48,4375% 31/64 AA 49,21875% 63/128 F7 Aa 1,5625% 1/64 aa 49,21875% 63/128 AA 49,609375% 127/256 F8 Aa 0,78125% 1/128 aa 49,609375% 127/256 AA 50% 1/2 Fα Aa 0% 0 aa 50% 1/2 - Para dois genes Observe que a cada geração, a freqüência de heterozigotos se reduz pela metade. Depois de várias gerações de autofecundação, não existem mais heterozigotos. Por este motivo, plantas que se reproduzem por autofecundação tendem a ser completamente homozigotas. Considerando que no Fα temos AA=1/2, aa=1/2, BB=1/2 e bb=1/2, então as freqüências esperadas para dois genes em conjunto é obtida pelo produto da freqüência esperada para cada gene: AABB = ½ x ½ = ¼ AAbb = ½ x ½ = ¼ aaBB = ½ x ½ = ¼ 38 aabb = ½ x ½ = ¼ - Para três genes AABBCC = ½ x ½ x ½ = 1/8 AABBcc = ½ x ½ x ½ = 1/8 AAbbCC = ½ x ½ x ½ = 1/8 AAbbcc = ½ x ½ x ½ = 1/8 aaBBCC = ½ x ½ x ½ = 1/8 aaBBcc = ½ x ½ x ½ = 1/8 aabbCC = ½ x ½ x ½ = 1/8 aabbcc = ½ x ½ x ½ = 1/8 - Genótipos na geração F2 Considerando o cruzamento AABB x aabb, na descendência (geração F1), todos os indivíduos terão genótipo AaBb. Se os indivíduos da geração F1 forem autofecundados ou intercruzados, teremos na geração F2 os genótipos abaixo. Parentais: AABB x aabb F1 AaBb Símbolo de autofecundação F2 Gametas ¼ AB ¼ Ab ¼ aB ¼ ab ¼ AB AABB (1/16) AABb (1/16) AaBB (1/16) AaBb (1/16) ¼ Ab AABb (1/16) AAbb (1/16) AaBb (1/16) Aabb (1/16) ¼ aB AaBB (1/16) AaBb (1/16) aaBB (1/16) aaBb (1/16) ¼ ab AaBb (1/16) Aabb (1/16) aaBb (1/16) aabb (1/16) Considerando que, para cada gene, os genótipos homozigotos apresentam freqüência ¼ na geração F2, e os heterozigotos têm freqüência ½, a freqüência dos 9 genótipos possíveis na geração F2 pode ser obtida diretamente: Genótipos F2 Freqüência AABB 1/16 = ¼ x ¼ 9/16 A_B_ AABb 2/16 = ¼ x ½ AAbb 1/16 = ¼ x ¼ 3/16 A_bb AaBB 2/16 = ½ x ¼ AaBb 4/16 = ½ x ½ Aabb 2/16 = ½ x ¼ aaBB 1/16 = ¼ x ¼ 3/16 aaB_ aaBb 2/16 = ¼ x ½ aabb 1/16 = ¼ x ¼ 1/16 aabb 39 - Geração F2, considerando 3 genes: AABBCC = 1/16 x 1/4=1/64 AABBCc = 1/16 x 2/4=2/64 AABBcc = 1/16 x 1/4=1/64 M AaBbCc = 4/16 x 2/4=8/64 M aabbcc = 1/16 x 1/4=1/64 Como pode ser observado, se dois indivíduos diferem em 2 genes, serão produzidos 4 diferentes tipos de gametas na geração F1, e 9 genótipos diferentes na geração F2. No caso de os parentais diferirem em 3 genes, apresentarão 8 gametas na geração F1, e 27 genótipos diferentes na geração F2. Se os genitores diferem em n genes, o número de tipos de gametas distintos, produzidos na geração F1 é 2 n. 1 gene (AA x aa) = 21 = 2 gametas (A ; a) 2 genes (AABB x aabb) = 22 = 4 gametas (AB, Ab, aB, ab) 3 genes = 23 = 8 gametas Caso os indivíduos da geração F1 sejam intercruzados ou autofecundados, produzirão 3n genótipos diferentes na geração F2. 1 gene (AA x aa) = 31 = 3 genótipos (AA, Aa, aa) 2 genes (AABB x aabb) = 32 = 9 genótipos 3 genes = 23 = 27 genótipos O número mínimo de indivíduos necessários em uma população F2, para permitir o aparecimento de todos os genótipos possíveis é 4n. 1 gene = 41 = 4 (AA, Aa, aA, aa) 2 genes = 42 = 16 3 genes = 43 = 64 4 genes = 44 = 256 5 genes = 45 = 1.024 10 genes = 410 = 1.048.576 20 genes = 420 = 1.099.511.627.776 Considerando-se uma diferença de 20 genes entre progenitores, o que é uma estimativa muito conservadora, para o caso da soja, onde se cultivam cerca de 350.000 plantas/ha, seriam necessários 3,14 milhões de ha para obter todas as combinações possíveis na geração F2. 40 Considerando apenas os genótipos homozigotos, na geração Fα, o número de genótipos possíveis é 2n. 1 gene = 21 = 2 (AA, aa) 2 genes = 22 = 4 3 genes = 23 = 8 4 genes = 24 = 16 5 genes = 25 = 32 10 genes = 210 = 1.024 20 genes = 220 = 1.048.576 Mesmo neste caso, para o caso de avaliar simultaneamente 20 genes, no caso da soja seriam necessários 3ha da população Fα. Programas de melhoramento conduzidos pelo método SSD (como veremos adiante), conduzem as populações até um elevado grau de homozigose, e estas populações tem tamanho máximo de 10.000 plantas, e geralmente tamanhos muito menores (2.000 até 4.000 plantas). Em populações de 10.000 plantas, somente é possível esperar todas as combinações possíveis para 13 genes. Isto significa que se uma determinada população não produziu, ao final, nenhuma nova variedade, este mesmo cruzamento pode ser novamente realizado, pois tipos diferentes surgirão. É possível, em outra oportunidade, encontrar uma combinação que produza uma variedade superior. Os dados acima demonstram que a variabilidade criada pela recombinação é extremamente grande, permitindo a obtenção de tipos novos, e a seleção por parte do melhorista. 2.3.2. Variação no número de cromossomos Poliploidia: -Autopoliplóides: Duplicação do genoma da espécie, de forma espontânea. Ex. batata (autotetraplóide). Geralmente são estéreis, e se reproduzem vegetativamente. Também tem como características, órgãos aumentados (flores, sementes, tubérculos, etc.). -Alopoliplóides: Cruzamento entre duas espécies, com posterior duplicação do número de cromossomos. Ex. Café (Coffea arábica) tem 44 cromossomos. As demais espécies de café tem 22 cromossomos. C. arábica é a única espécie de café auto- compatível (fértil). A provável origem é C. eugenióidesx C. canephora, ou C. 41 congensis x C. liberica, seguida de duplicação cromossômica. Cerca de 75% do café comercializado no mundo é C. arábica. Outros exemplos de alopoliplóides: fumo, algodão cultivado, trigo, etc... Provavelmente a metade das plantas cultivadas e 70% das gramíneas forrageiras são alopoliplóides. Ex: Trigo Triticum monococcum x Aegilops speltóides (??) 2n=2x=14 2n=2x=14 AA BB Triticum durum x Aegilops squarosa 2n=4x=28 2n=2x=14 AABB DD Triticum aestivum 2n=6x=42 AABBDD -Triplóides: Bananas comerciais têm 33 cromossomos. As espécies diplóides têm 22. A triploidia em bananas é importante, pois resulta na produção de frutos sem sementes, e maiores. Cerca de 25% das cultivares de maçã americana e de pêra européias são triplóides. A poliploidia, por apresentar maior número de alelos por loco, aumenta a chance de mutação e, consequentemente, a variabilidade genética 2.3.3. Mutação As mutações gênicas ocorrem a uma razão constante, e tem sido a base para a seleção natural. No entanto, em sua grande maioria, as mutações são deletérias e recessivas. 42 A taxa de mutação na natureza é de aproximadamente 1x10-6, ou seja, um mutante a cada 1.000.000 de indivíduos. Por exemplo, em soja devemos encontrar um mutante a cada 2,5 ha, enquanto que em milho, a freqüência é um a cada 20 ha. Tipos de mutação: - Macromutação: Mutação que é percebida em um indivíduo. Pode ser pelo maior vigor, maior período vegetativo, etc... Se a mutação resultar em plantas de ciclo mais precoce, pode passar despercebida. Mesmo que o indivíduo seja observado, pode-se pensar em outras causas (como problemas de raiz, de solo, pragas, doenças, etc.). - Micromutação: Geralmente passam despercebidas, pois alteram apenas a composição das plantas. ex: teor de fibra, teor de óleo, etc. Exemplos de produto comerciais obtidos por mutação natural: -Tomate longa vida -Milho opaco -Soja: Bossier é mutação em Lee UFV-1 é mutação em Viçoja Paranagoiano é mutação em Paraná 2.3.4. Variação Somaclonal Plantas reproduzidas assexuadamente são denominadas de clone. Não há recombinação genética, pois não há formação de gametas. Pode haver variações em células somáticas, tais como mutações de ponto, rearranjos cromossômicos, inversões, deleções, duplicações, etc, resultando em indivíduos diferentes dos parentais. Este tipo de variação é muito comum em culturas de tecidos. 2.3.5. Transformação Genética Com as técnicas recentemente desenvolvidas, na área da engenharia genética, é possível isolar genes de interesse e transferi-los para outras espécies, utilizando-se de Agrobacterium ou biobalística. Estas tecnologias proporcionam ao melhorista um novo e variado conjunto de genes, rompendo a barreira das espécies. 43 2.4. VULNERABILIDADE GENÉTICA A necessidade de produzir variedades altamente produtivas levou a uniformização das variedades. Esta uniformização é necessária para facilitar a mecanização dos cultivos. Por exemplo, o desenvolvimento de variedades semi-anãs de trigo, pelo CIMMYT, que foi um dos responsáveis pela revolução verde, permitiu que a produção mundial de trigo conseguisse atender a demanda pelo produto. No entanto, a rápida disseminação destas novas variedades pelo planeta, promoveu uma substituição das inúmeras variedades antes existentes, por algumas poucas variedades novas, em mais de 10 milhões de hectares. Esta uniformização permitiu grandes aumentos de produtividade, mas torna a cultura muito vulnerável ao ataque de patógenos, que podem causar grandes prejuízos. Alguns exemplos já foram experimentados no passado: - Batata: A grande fome na Irlanda, em 1840, em razão da epidemia da requeima (Phytophtora infestans) nos batatais. - Trigo: A epidemia da ferrugem-do-colmo-do-trigo (Puccinia graminis) nos Estados Unidos, em 1947. - Milho: A dizimação de lavouras de milho híbrido portador do citoplasma T de macho-esterilidade, em 1970/71, em virtude da helmintosporiose (Helminthosporium maydis), em vários países. Embora as preocupações sejam justificáveis, a agricultura não pode ser competitiva, e não teria condições de produzir alimentos para alimentar a humanidade, não fosse a uniformidade das culturas. Além disso, não há evidências de que a agricultura de hoje seja mais vulnerável do que a praticada a um século atrás. Nos programas de melhoramento, continuamente são incorporados genes de resistência aos patógenos nas novas variedades, aumentando o grau de proteção das mesmas. 2.5. CENTROS DE ORIGEM DAS ESPÉCIES CULTIVADAS No início do século XX, exploradores russos coletaram milhares de plantas cultivadas em diversos países, nos cinco continentes. Estudando esta enorme quantidade de espécies, o geneticista russo Nicolai Ivanovich Vavilov identificou 11 centros de origem ou de diversidade, separados por desertos, montanhas ou mares. Destes, 8 são centros de origem primários e 3 são centros de origem secundários: 44 1 – Centro Chinês 2 – Centro Indiano 2A – Centro Indo-Malaio 3 – Centro Asiático Central 4 – Centro do Oriente Próximo 5 – Centro Mediterrânico 6 – Centro Abissínio (ou Etíope) 7 – Centro Mexicano do Sul e Centro-Americano 8 – Centro Sul-Americano 8A – Centro Chiloé 8B – Centro Brasileiro-Paraguaio Conforme pode ser visto na figura abaixo, os centros de origem coincidem com os antigos sítios da civilização humana. Os centros de origem são os locais onde as espécies apresentam maior diversidade genética. Nos centros primários a diversidade é máxima, e nos centros secundários desenvolveram-se tipos oriundos dos centros primários. As plantas cultivadas sempre foram movimentadas de uma região para outra, e mesmo de um continente para outro. Com a descoberta das Américas, diversas espécies até então desconhecidas foram introduzidas no Velho Mundo, tais como o milho, a mandioca, o tomate, a batata, o fumo, o feijão e a abóbora. 45 É interessante notar que as espécies nem sempre se adaptam melhor em seu centro de origem. Por exemplo, a seringueira, originária da Amazônia brasileira adaptou-se melhor na Malásia do que no Brasil, pois na Malásia não existe o “mal-das- folhas”, causado pelo fungo Microcylus ulei. O eucalipto, originário da Austrália, onde muitos insetos pragas prejudicam seu desenvolvimento, adaptou-se muito bem no Brasil. A relação abaixo contém alguns exemplos de espécies originárias de cada um dos centros vavilovianos. 1 – Centro Chinês Soja Várias espécies de Prunus Várias espécies de bambus Espécies de Pyrus Rabanete Diversas espécies de Citrus Espécies de Brassica e Allium Caqui Berinjela Rami Feijão adzuki 2 - Centro Indiano Arroz Manga Sorgo (centro secundário) Diversas espécies de Citrus Guandu Cana-de-açúcar Caupi Coco Berinjela Algodão (Gossypium arboreum) Pepino Crotalária juncea Cará Pimenta-do-reino 2A – Centro Indo-Malaio Espécies de banana Pimenta-do-reino Côco Adlai Cana-de-açúcar Cará 3 - Centro Asiático Central Trigo Centeio (centro secundário) Lentilha Ervilha Algodão (G. herbaceum) Cebola Melão (centro secundário) Alho Cenoura Espinafre Rabanete Pêra Linho Uva Girassol 46 4 - Centro do Oriente Próximo Espécies de trigo Repolho Centeio Cebola (centro secundário) Aveia Alho-porro Lentilha Alface Ervilha (centro secundário) Figo Melão Espécies de Pyrus Beterraba (centro secundário) Uva Cenoura Espécies de Prunus Alfafa Cevada Melão Linho 5 - Centro Mediterrânico Espécies de trigo Cebola (centro secundário) Lentilha (de sementes grandes) Alho (centro secundário) Ervilha (de sementes grandes) Alho-porro Beterraba Alface Repolho Aspargo Nabo Tremoço 6 - Centro Abissínio Espécies de trigo Caupi CevadaMamona Sorgo Café Lentilha Quiabo Ervilha Linho 7 - Centro Mexicano do Sul e Centro-Americano Milho Algodão (G. hirsutum) Feijão Mamão Espécies de Cucurbita Abacate Batata-doce Goiaba Pimentão e pimenta 8 – Centro Sul-Americano Espécies de batata Moranga Batata doce Algodão (G. barbadense) Milho (centro secundário) Maracujá Feijão (centro secundário) Goiaba Tomate fumo 47 8A - Centro Chiloé Batata 8B – Centro brasileiro-paraguaio Mandioca Jaboticaba Amendoim Abacaxi Cacau Castanha-do-Pará Seringueira Caju Chá-mate Maracujá 2.5.1. Introdução de plantas A maioria das espécies cultivadas no Brasil foi introduzida de outros países. Por exemplo, as principais culturas da agricultura brasileira, como soja, café, cana-de- açúcar, trigo, arroz, entre outras. Novas cultivares podem ser obtidas a partir das introduções. As introduções de plantas podem gerar novas cultivares da seguinte maneira: a) Utilização direta como cultivar, após avaliação em ensaios de competição com materiais já cultivados; b) Seleção de genótipos dentro do material introduzido, quando este for heterogêneo; c) Cruzamento do material introduzido com outras cultivares. Para a maioria das espécies, esta é a forma mais comum de utilização de variedades introduzidas, atualmente. Introduz-se uma variedade por possuir alguma característica especial, e esta é cruzada com os materiais comerciais, para produzir tipos superiores, contendo esta característica especial. Características especiais, neste caso, são resistência a doenças, tolerância a estresses (frio, calor, seca, salinidade), qualidade (teor de proteína, óleo, etc...). No processo de introdução de variedades, deve-se assegurar que não serão introduzidos também pragas ou doenças que ainda não existam no país. Por este motivo, as sementes introduzidas sempre devem passar por um processo de quarentena, em um centro quarentenário apropriado, antes da utilização. 2.5.2. Bancos de Germoplasma A variabilidade genética pode ser introduzida nas populações de melhoramento a partir de germoplasma introduzido, especialmente quando se deseja introduzir uma característica que não existe no germoplama adaptado. Variedades introduzidas são mantidas em um banco de germoplasma, para sua conservação. No banco de germoplasma, as sementes devem ser armazenadas a baixa temperatura (cerca de – 48 18oC) em recipientes hermeticamente fechados. Nestas condições, as sementes podem ser armazenadas por um longo período de tempo (superior a 10 anos). EXERCÍCIOS 1) Diferencie variação ambiental de variação genética. Como podemos saber se a variação observada em determinada característica é de origem ambiental ou genética? 2) Qual é a importância da variação observada, porém não herdável? É possível obter ganhos não herdáveis? 3) Qual é a importância da variação herdável? 4) O que é a interação genótipo x ambiente? Qual a sua importância? 5) Diferencie gene, loco e alelo? 6) Diferencie loco, loci, locus e locos? 7) Qual é a característica de um gene dominante? 8) Qual é a característica de um gene com ausência de dominância? 9) Algumas características de importância econômica podem ter seus fenótipos divididos em classes, enquanto que outras têm uma distribuição contínua de valores do fenótipo. Sob o ponto de vista genético, qual a diferença entre estas características? (controle genético) 10) Suponha que estamos interessados em estudar 7 genes que contrastam entre dois indivíduos homozigotos. Para isso, em primeiro lugar realizamos o cruzamento entre estes dois indivíduos. a) Qual é o número de gametas diferentes produzidos pela geração F1? b) Quantos genótipos diferentes são possíveis na geração F2? c) Qual o tamanho mínimo da população F2 para obter todos os genótipos? d) Qual o número de genótipos homozigotos possíveis na geração Fα (Finfinito), obtida por autofecundações sucessivas a partir da geração F1? 11) Quando cruzamos dois indivíduos que diferem em 20 genes, obteremos na geração Fα obtida por autofecundações sucessivas, mais de 1 milhão de genótipos homozigotos diferentes. O que podemos concluir a partir desta informação? 12) Considere que foi identificada uma variedade de trigo que é resistente a ferrugem da folha. Qual o procedimento para se identificar o número de genes que controlam esta resistência, nesta variedade (estudo de herança)? 13) Do cruzamento entre duas variedades homozigotas de feijão, foram obtidas, na geração F2, 150 indivíduos resistentes e 50 indivíduos suscetíveis a uma doença 49 fúngica. Qual é o controle genético da resistência a esta doença? Qual é o genótipo dos pais? 14) Do cruzamento entre duas variedades homozigotas de algodão, foram obtidas, na geração F2, 100 indivíduos resistentes e 300 indivíduos suscetíveis a uma doença bacteriana. Qual é o controle genético da resistência a esta doença? Qual é o genótipo dos pais? 15) Do cruzamento entre duas variedades homozigotas de trigo, foram obtidas, na geração F2, 30 indivíduos com folha bandeira ereta e 450 indivíduos com folha bandeira “caída”. Qual é o controle da característica? Qual é o genótipo dos pais? Explique. 16) Do cruzamento entre duas variedades homozigotas de soja, foram obtidas, na geração F2, 30 indivíduos resistentes e 130 indivíduos suscetíveis ao nematóide de cisto da soja. Qual é o controle genético da resistência a este nematóide? Qual é o genótipo dos pais? Explique. 17) Do cruzamento entre duas linhagens homozigotas de milho, foram obtidas, na geração F2, 180 indivíduos com a característica “stay green” e 140 indivíduos sem a característica. Qual é o controle genético da característica? Qual é o genótipo dos pais? Explique. 18) Do cruzamento entre duas variedades homozigotas de azaléia, foram obtidas, na geração F2, 30 plantas altas e 100 plantas intermediárias e 30 plantas baixas. Qual é o controle genético da altura de plantas? Qual é o genótipo dos pais? Explique. 19) Do cruzamento entre duas variedades homozigotas de tomate, foram obtidas, na geração F2, 45 plantas com frutos grandes e 30 plantas com frutos intermediários e 10 plantas com frutos pequenos. Qual é o controle genético da altura do tamanho de frutos? Qual é o genótipo dos pais? Explique. 20) Em uma espécie de orquídea, na geração F2 do cruzamento entre plantas com flor vermelha e amarela foram obtidas 45 plantas com flores vermelhas, 20 plantas com flores amarelas e 15 plantas com flores brancas. Qual é o controle genético da cor de flor? Qual é o genótipo dos pais? Explique. 21) Em uma espécie de crisântemo, na geração F2 do cruzamento entre plantas com flor branca e lilás foram obtidas 60 plantas com flores lilás, 15 plantas com flores vermelhas e 5 plantas com flores alaranjadas. Qual é o controle genético da cor de flor? Qual é o genótipo dos pais? Explique. 22) Em uma espécie de roseira, na geração F2 do cruzamento entre plantas baixas com flor vermelhas e plantas altas com flores amarelas, foram obtidas 45 plantas baixas com flores vermelhas, 15 plantas baixas com flores amarelas, 15 plantas altas com 50 flores vermelhas e 5 plantas altas com flores amarelas. Qual é o controle genético da altura de plantas e da cor de flor? Qual é o genótipo dos pais? Explique. 23) Em 1903 o botânico dinamarquês W. Johannsen selecionou sementes grandes e pequenas, em uma amostra de sementes de feijão. Após cultivar separadamente plantas de feijão derivadas de sementes grandes e pequenas, observou, na descendência, que continuava havendo variação no tamanho das sementes, tanto na descendência das plantas obtidas das sementes grandes quanto naquelas derivadas das sementes pequenas. No entanto, as sementes derivadas das plantas obtidas das sementes grandes apresentavam peso médio superior às sementes derivadas das plantas obtidas das sementes
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