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Mecanismos de Agressão e Defesa II Paula Febre reumática ● Identificar a(s) possível(is) doenças e prováveis etiologias; terminar fechamento até amanhã a tarde A febre reumática é uma doença inflamatória, multissistêmica,não supurativa deflagrada pelo agente infeccioso Streptococcus β-hemolítico do grupo A de Lancefield (Streptococcus pyogenes) , que ocorre em pessoas geneticamente predispostas. Essa doença inflamatória ocorre após um episódio de faringoamigdalite bacteriana provocada por Streptococcus pyogenes, tratada inadequadamente. Pode atingir as articulações, o coração e o cérebro, deixando sequelas cardíacas graves, com consequências por toda a vida e podendo levar à morte. A doença ocorre em surtos, se não for prevenida, e a cada surto aumenta a chance de ocorrerem lesões cardíacas graves. A doença pode ocorrer em todas as idades, porém, a faixa etária de 5 a 15 anos é a mais acometida. A manifestação clínica mais relevante da doença é cardíaca e se caracteriza, na maioria das vezes, por valvulite, em especial das valvas mitral e aórtica, que pode se cronificar e originar sequelas incapacitantes. Atualmente, estima-se que, ocorram a cada ano por volta de 500.000 novos casos de FR, determinando uma prevalência de mais de 15 milhões de casos de cardite reumática. Aproximadamente 233.000 pessoas morrem todos os anos em consequência desta doença. Na América Latina, 21.000 casos de FR aguda ocorrem anualmente. Os dados no Brasil são escassos. Em 2002, 5.000 casos novos foram reportados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Dados do Ministério da Saúde estimam uma prevalência de FR ao redor de 3% entre crianças e adolescentes, sendo responsável por 40% das cirurgias cardíacas no país. A FR é uma doença com grande peso na saúde pública onde seu desenvolvimento pode apresentar sequelas irreversíveis trazendo grandes riscos ao paciente e também imensos gastos com seu tratamento, reabilitação e socialização. ● Descrever os mecanismos imunopatológicos envolvidos na(s) possível(is) doença(s); Admite-se que a FR ocorra através de um mecanismo de hipersensibilidade. A origem da doença parece estar associada a uma reação cruzada de anticorpos produzidos originalmente contra produtos e estruturas dos estreptococos, porém passam a reconhecer também as células do hospedeiro, anticorpos produzidos contra o antígeno infeccioso, processo chamado mimetismo ou mimetização molecular. Sabe-se que ambas as respostas imunes mediadas por linfócitos B e T estão envolvidos no processo inflamatório da FR. Além disso, também há produção de citocinas inflamatórias que exacerbam a reação autoimune, sendo responsáveis pela progressão e manutenção da lesão valvar crônica. O processo inflamatório cardíaco está associado a uma reação cruzada entre a proteína M do Streptococcus pyogenes e as proteínas miosina, queratina e outras proteínas do tecido cardíaco humano. A reação inflamatória desencadeada em reação ao Streptococcus pyogenes induz uma inflamação no miocárdio e no endotélio da valva cardíaca que é facilitada a infiltração de células T. A lesão articular surge devido à semelhança do ácido hialurônico do estreptococo com o ácido dos tecidos humanos, ocorrendo a formação de anticorpos que atuam contra a cartilagem das articulações. De modo semelhante, anticorpos que reagem de forma cruzada com a membrana dos estreptococos citados, atuam contra contra o citoplasma de neurônios localizados nos núcleos caudados e subtalâmico do cérebro, resultando na coréia de Sydenham. A única sequela em longo prazo é a cardiopatia reumática. No início ocorrem lesões como a fragmentação das fibras colágenas, edema da substância intercelular, infiltração celular e degeneração fibrinóide. No coração, as lesões iniciais surgem nas valvas cardíacas sob a forma aparente de pequenas verrugas ao longo da linha de fechamento, podendo posteriormente, as valvas tornarem-se espessadas e deformadas, com as cordoalhas encurtadas, resultando em estenose ou insuficiência valvas. A valva mitral é mais frequentemente envolvida, vindo a seguir a aórtica, a tricúspide, e, raramente a pulmonar . Pode ocorrer degeneração difusa e até necrose das células musculares cardíacas, com lesões inflamatórias perivasculares, formando os nódulos de Aschoff, que são formados por área central fibrinóide circundada por linfócitos, plasmócitos e grandes células basofílicas. Os nódulos subcutâneos se assemelham aos nódulos de Aschoff. O dano às valvas cardíacas pode ser grave o suficiente para resultar em insuficiência e morte. As pessoas que já apresentaram um episódio de febre reumática estão em risco de novo dano imunológico, devido à estimulação do sistema imune, ao adquirirem repetidas infecções de garganta por estreptococos. ➔ Streptococcus pyogenes Isolados de estreptococos são cocos esféricos, com l a 2 μm de diâmetro, dispostos em cadeias curtas nos espécimes clínicos e em cadeias mais longas quando cultivados em meio líquido. A virulência dos estreptococos do grupo A é determinada pela capacidade do microrganismo de evitar a opsonização e a fagocitose, aderir e invadir as células hospedeiras e produzir uma variedade de toxinas e enzimas. O esqueleto estrutural básico da parede celular é a camada de peptidoglicano, que tem composição semelhante à encontrada em outras bactérias Gram-positivas. Na parede celular, estão os antígenos grupo-específicos e tipo-específicos. O carboidrato grupo-específico, que constitui aproximadamente 10% do peso seco da célula (antígeno de grupo A de Lancefield), é um dímero de N-acetilglicosamina e ramnose. Este antígeno é usado para classificar os estreptococos do grupo A, distinguindo-os de outros grupos de estreptococos. A proteína M é o principal antígeno tipo-específico associado a cepas virulentas e consiste em duas cadeias polipeptídicas complexadas Outros componentes importantes na parede celular de S. pyogenes incluem proteínas de superfície semelhantes à proteína M, ácido lipoteóico e proteína F. Estreptolisina S é uma hemolisina ligada à célula, estável ao oxigênio e não imunogênica, que pode lisar eritrócitos, leucócitos e plaquetas. Também pode estimular a liberação do conteúdo lisossômico após fagocitose pela célula, com subsequente morte do fagócito. A estreptolisina S é produzida na presença de soro (o S indica estável ao soro, do inglês stable) e é responsável pela β-hemólise característica observada no meio de ágar sangue. Estreptolisina O é uma hemolisina lábil ao oxigênio e capaz de lisar eritrócitos, leucócitos, plaquetas e células em cultura. Anticorpos são prontamente formados contra a estreptolisina O (anticorpos antiestreptolisina O [ASO]), uma característica que a diferencia da estreptolisina S e é útil para documentar uma infecção recente por estreptococos do grupo A (teste anti-ASO). No entanto, pelo fato de a estreptolisina O ser irreversivelmente inibida pelo colesterol dos lipídios da pele, pacientes com infecções cutâneas não desenvolvem anticorpos anti- ASO. ● Relacionar as manifestações clínicas com os mecanismos de agressão e de defesa - MAD; As principais manifestações clínicas se apresentam por episódios de faringoamigdalites recorrentes, que podem levar a poliartrites, cardites, Coréia, eritema marginado, nódulos subcutâneos etc. Após a crise inicial e a elaboração de uma memória imunológica, as novas infecções estreptocócicas tornam os pacientes cada vez mais vulneráveis à reativação da doença. É provável que a cardite piore com cada recorrência, e o dano é cumulativo. Contudo, a cardite reumática crônica geralmente não produz manifestações clínicas durante anos ou mesmo décadas após o episódio inicial da febre reumática. Quando se manifesta, os sinais e sintomas da doença valvar dependem da(s) valva(s) cardíaca(s) afetada(s). A artrite éa manifestação mais comum da FR, presente em 75% dos casos, com evolução autolimitada e sem sequelas. Muitas vezes é o único critério maior presente, principalmente em adolescentes e adultos. Nos casos de associação com cardite, tem sido descrita correlação inversa entre a gravidade das duas manifestações. A artrite típica da FR evolui de forma assimétrica e migratória, ou seja, quando os sintomas melhoram em uma articulação, aparecem em outra. O quadro articular afeta preferencialmente as grandes articulações, particularmente dos membros inferiores. A duração do processo inflamatório em cada articulação raramente ultrapassa uma semana e o quadro total cessa em menos de um mês. A artrite é, em geral, muito dolorosa, apesar de não mostrar sinais inflamatórios intensos ao exame físico. A resposta aos anti-inflamatórios não hormonais é rápida e frequentemente a dor desaparece em 24 horas, enquanto os outros sinais inflamatórios cessam de dois a três dias. A artrite reativa pós-estreptocócica (ARPE) afeta todas as faixas etárias, especialmente adultos, com envolvimento de mais de uma articulação, mas não preenche os critérios de Jones para diagnóstico de FR. O intervalo de tempo entre a infecção de orofaringe e o início do quadro articular é de cerca de 10 dias, portanto mais curto do que na artrite reumática. Alguns autores consideram a ARPE como parte do espectro da FR, enquanto outros a consideram uma entidade distinta. Habitualmente a ARPE tem caráter cumulativo e persistente, envolvendo grandes e/ou pequenas articulações e não apresenta resposta satisfatória ao uso de salicilatos ou de outros agentes anti-inflamatórios não hormonais(29). O grau de envolvimento cardíaco concomitante é incerto e, provavelmente, incomum. Diante das dificuldades na diferenciação da ARPE e da artrite reumática, os pacientes com ARPE devem ser considerados portadores de FR quando preencherem os critérios de Jones. A cardite é a manifestação mais grave da FR, pois é a única que pode deixar sequelas e acarretar óbito. A manifestação ocorre entre 40%-70% dos primeiros surtos, embora séries mais recentes, em que a ecocardiografia foi utilizada para avaliação, demonstrem prevalências mais elevadas. A cardite tende a aparecer em fase precoce e, mais frequentemente, é diagnosticada nas três primeiras semanas da fase aguda. O acometimento cardíaco é caracterizado pela pancardite, entretanto são as lesões valvares as responsáveis pelo quadro clínico e pelo prognóstico. O acometimento pericárdico não é comum, não ocorre isoladamente e não resulta em constrição. A pericardite está sempre associada à lesão valvar e é diagnosticada pela presença de atrito e/ou derrame pericárdico, abafamento de bulhas, dor ou desconforto precordial. Nos casos leves, o acometimento pericárdico é um achado exclusivo do estudo ecocardiográfico. Grandes derrames pericárdicos e tamponamento cardíaco são raros. A cardiopatia reumática geralmente resulta de lesão cumulativa de episódios recorrentes de FR aguda. É a manifestação mais grave e a única que pode deixar sequelas e acarretar óbito. A cardite reumática é caracteristicamente uma pancardite envolvendo o pericárdio, o miocárdio e as bordas livres das valvas cúspides. Seu aparecimento é precoce, em geral nas três primeiras semanas da fase aguda, durando até por dois meses, e manifesta-se clinicamente por insuficiência das valvas mitral e aórtica. Estudos recentes têm mostrado que, em cerca de 70% dos casos de lesão cardíaca, a valva mitral é a única atingida. Sendo que, as lesões de valva mitral são encontradas mais frequentemente em mulheres, enquanto as lesões de valva aórtica ocorrem mais em homens. A estenose mitral é uma complicação tardia que surge com o aumento da idade. Os sopros cardíacos são decorrentes da endocardite reumática, que resulta em edema e amolecimento do tecido valvar, provocando a regurgitação valvar pela disfunção aguda. A miocardite é uma manifestação comum na FR. Um aspecto patognomônico da FR que ocorre em 80% a 90% dos casos de miocardite reumática são os nódulos de Aschoff, que representam lesões inflamatórias caracterizadas pela presença de necrose fibrinóide central cercada por histiócitos modificados. A coréia de Sydenham é caracterizada por movimentos rápidos, involuntários e incoordenados dos membros e na face. A coreia de Sydenham (CS) ocorre predominantemente em crianças e adolescentes do sexo feminino, sendo rara após os 20 anos de idade. Sua prevalência varia de 5%-36% em diferentes relatos, com início insidioso caracterizado, geralmente, por labilidade emocional e fraqueza muscular que dificultam o diagnóstico. Trata-se de uma desordem neurológica caracterizada por movimentos rápidos involuntários incoordenados, que desaparecem durante o sono e são acentuados em situações de estresse e esforço. Esses movimentos podem acometer músculos da face, lábios, pálpebras e língua e são, com frequência, generalizados. Disartria e dificuldades na escrita também podem ocorrer. O surto da coreia dura, em média, de dois a três meses, mas pode prolongar-se por mais de um ano. Também foram descritas manifestações neuropsiquiátricas, como tiques e transtorno obsessivo compulsivo. Embora possa ocorrer como manifestação isolada da FR, a CS se apresenta, com frequência, associada à cardite clínica ou subclínica e, mais raramente, à artrite. Também pode aparecer no início do surto, mas geralmente ocorre como manifestação tardia até 7 meses após a infecção estreptocócica. O Eritema marginatum constitui manifestação rara, sendo descrita em menos de 3% dos pacientes. Caracteriza-se por eritema com bordas nítidas, centro claro, contornos arredondados ou irregulares, sendo de difícil detecção nas pessoas de pele escura. As lesões são múltiplas, indolores, não pruriginosas, podendo haver fusão, resultando em aspecto serpiginoso. As lesões se localizam principalmente no tronco, abdome e face interna de membros superiores e inferiores, poupando a face; são fugazes, podendo durar minutos ou horas, e mudam frequentemente de forma. Ocorrem geralmente no início da doença, porém podem persistir ou recorrer durante meses. Essa manifestação está associada à cardite, porém não necessariamente à cardite grave. Os nódulos subcutâneos são raros, presentes apenas em 2%-5% dos pacientes, e estão fortemente associados à presença de cardite grave. São múltiplos, arredondados, de tamanhos variados (0,5-2 cm), firmes, móveis, indolores e recobertos por pele normal, sem características inflamatórias. Localizam-se sobre proeminências e tendões extensores, sendo mais facilmente percebidos pela palpação do que pela inspeção. Ocorrem preferencialmente em cotovelos, punhos, joelhos, tornozelos, região occipital, tendão de Aquiles e coluna vertebral. O aparecimento é tardio (uma a duas semanas após as outras manifestações), regride rapidamente com o início do tratamento da cardite e raramente persiste por mais de um mês. Os nódulos não são patognomônicos de FR, já que estruturas semelhantes podem ser encontradas em outras doenças reumáticas, tais como artrite idiopática juvenil poliarticular, lúpus eritematoso sistêmico e doença mista do tecido conjuntivo. Além disso, tem-se outras manifestações menores associadas que se apresentam como critérios menores, é o caso da febre e a artralgia. A existência de processo autoimune na FR foi postulada após a observação de que as lesões no coração estavam associadas a anticorpos que reconheciam tecido cardíaco por mimetismo molecular, cujos dados foram experimentalmente confirmados por Kaplan. Assim, anticorpos e linfócitos T do hospedeiro dirigidos contra antígenos estreptocócicos também reconhecem estruturas do hospedeiro, iniciando o processo de autoimunidade. A resposta mediada por linfócitos T parece ser especialmente importante em pacientesque desenvolvem cardite grave. Os anticorpos na FR são importantes durante sua fase inicial e, provavelmente, pelas manifestações de poliartrite e coreia de Sydenham. Na cardite reumática, anticorpos reativos ao tecido cardíaco, por reação cruzada com antígenos do estreptococo, se fixam à parede do endotélio valvar e aumentam a expressão da molécula de adesão VCAM I, que atrai determinadas quimiocinas e favorecem a infiltração celular por neutrófilos, macrófagos e, principalmente, linfócitos T, gerando inflamação local, destruição tecidual e necrose. Estudos histológicos de pacientes com cardite e CRC mostraram células plasmáticas cercadas por linfócitos T CD4+ próximos a fibroblastos, sugerindo interação entre a célula plasmática (linfócito B) e o linfócito T. Os nódulos de Aschoff, considerados patognomônicos da doença e compostos por agregados de células semelhantes a macrófagos e monócitos, exercem a função de células apresentadoras de antígeno para as células T. Várias citocinas pró-inflamatórias são produzidas nas diversas fases evolutivas dos nódulos de Aschoff. Dessa forma, além da reação cruzada inicial, há apresentação continuada de antígenos no sítio da lesão, o que amplifica a resposta imune e a ativação de grande número de clones auto reativos de linfócitos T. A presença de linfócitos T CD4+ no tecido cardíaco foi demonstrada em grande quantidade em pacientes com CRC e sugere papel direto destas células na patologia da doença. ● Justificar a realização dos exames complementares (hemograma, PCR, VHS, ASLO) e cardiológicos, relacionando as possíveis alterações observadas nestes exames e a patogênese da doença; Não existe um marcador bioquímico ou sorológico específico para DR. Os exames são adicionais à clínica e ajudam a confirmar o diagnóstico 37. Hemograma - Pode haver leucocitose leve com pequeno desvio para esquerda e anemia normocítica e normocrômica leve. A presença de leucocitose expressiva deve levantar a suspeita de outras doenças como artrite infecciosa. Leucocitose severa com atipias é comum nas leucoses, nas quais o mielograma é exame diagnóstico definitivo. A velocidade de hemossedimentação estará elevada em proporção à gravidade da doença. A VHS é um exame de grande valor diagnóstico. A presença de artrite com VHS normal praticamente exclui a possibilidade de DR. Poderá estar normal ou baixa em doenças concomitantes como hepatopatia, IC, uso de antiinflamatórios não hormonais (salicilatos) e corticosteróides. Na anemia está elevada. Proteína C reativa (PCR) - Altera precocemente na DR, tendo meia vida curta. Constitui evidência de atividade inflamatória bastante inespecífica. Não se altera com uso de antiinflamatórios e é útil em casos de recorrências 27,38. Mucoproteínas - Mostram-se positivas em quase 100% dos pacientes com DR, permanecendo assim em toda a evolução da doença 25. Todavia, mostram-se positivas em outras condições como injeções repetidas de penicilina, insuficiência renal avançada, EI, neoplasias, doença linforreticular (leucoses) e tuberculose ativa 38,39. Proteínas séricas - Na eletroforese das proteínas, podemos ter albumina diminuída, aumento da alfa2 e gamaglobulina. Destas, a alfa2 globulina tem meia vida mais longa e serve com critério de cura 39 . Anticorpos contra antígenos estreptocócicos - A antiestreptolisina O, anti-hialuronidase, anti-estreptoquinase e anti-desoxiribonuclease B (anti-DNASE B) são os principais Ac formados pelo hospedeiro contra os constituintes do streptococcus 32,39. A ASO mostra-se positiva em mais de 70% dos casos de surto reumático agudo. Seu pico máximo (15 dias) coincide com o quadro articular agudo e é a prova de estreptococcia prévia 39. Na coréia isolada, que pode se manifestar tardiamente, a ASO pode ser normal (positividade em torno de 20%) 39. Neste caso a anti-DNASE B mostra-se de melhor acurácia diagnóstica, pois tem meia vida mais longa (positividade em torno de 40%) 39. Título normal de ASO: £ 240 em adultos, em crianças. Na DR geralmente aumenta duas ou mais vezes o valor normal. A presença de dois anticorpos positivos tem um sensibilidade de 95% para DR. Cultura de garganta (padrão ouro)- Os streptococcus podem ser isolados da garganta na vigência de infecção ativa. Todavia, a cultura positiva pode também ocorrer no portador crônico que faça uma faringite viral, tornando-se útil na tipagem da bactéria causadora da infecção ou na distinção das faringites virais e bacterianas. Tem valor limitado, uma vez que o streptococcus é um patógeno natural da cavidade oral 39. Na vigência de DR ativa (artrite) somente 25% dos pacientes têm cultura positiva. Teste de detecção antigênica - A pesquisa de antígenos estreptocócicos no sangue é de execução fácil e rápida, mas se mostra de pouco valor prático, pois não distingue a infecção ativa do estado de portador crônico, têm alta especificidade e baixa sensibilidade (± 25%) 25,29. Cobre, ceruloplasmina - podem estar elevados na coréia. Urinálise - Pode apresentar cilindrúria, albuminúria. Radiografia de tórax: deve ser realizada para investigação de cardiomegalia e de sinais de congestão pulmonar. A caracterização do progressivo aumento da área cardíaca à radiografia evidencia atividade reumática. A presença de congestão pulmonar caracteriza a cardite grave; Eletrocardiograma - Pode-se ter taquicardia, bloqueio atrioventricular de 1o grau (aumento do intervalo PR), distúrbios de condução intraventricular (aumento QRS), alterações de repolarização ventricular e aumento do QTc (preditor de cardite mais grave) 33. Ecocardiografia - Exame de grande sensibilidade no diagnóstico de cardite subclínica, podendo identificar desde uma valvulite até a extensão e gravidade de outras lesões como miocardite e envolvimento pericárdico 27-34. O exame com a técnica Doppler ou com mapeamento de fluxo a cores é de grande valor nos casos onde a ausculta cardíaca é duvidosa ou com sopros discretos. Uma simples regurgitação mitral ou aórtica em um paciente, previamente saudável, é um critério seguro de comprometimento cardíaco 27,34. Cintilografia - Na cintilografia miocárdica, o radiofármaco mais utilizado é o gálio-67. É considerada positiva quando há presença de captação do radioisótopo. Soares Jr 28, em estudo no INCOR-SP, abrangendo 36 pacientes com cardite reumática, detectou 31 casos com cintilografia positiva, sendo que, 25 mostraram histopatologia positiva e seis negativas. As cinco cintilografias negativas tiveram também histopatologia negativa. Feitos na fase crônica da doença (inatividade reumática) os exames tiveram a mesma correlação cintilografia negativa/histopatologia negativa. A cintilografia com gálio-67, portanto, é exame de grande acurácia não só em detectar o processo inflamatório miocárdico como também um referencial para biópsia endomiocárdica que é considerada positiva pela presença de infiltrado linfocitário. Ambos os exames complementam-se permitindo demonstrar grau de atividade reumática na fase aguda e regressão reumática na fase crônica . ● Apresentar as principais formas de diagnóstico, controle e tratamento. Diagnóstico O diagnóstico da febre reumática é clínico, não existindo sinal patognomônico ou exame específico. Os exames laboratoriais, apesar de inespecíficos, sustentam o diagnóstico do processo inflamatório e da infecção estreptocócica. Os critérios de Jones, estabelecidos em 1944, tiveram a sua última modificação em 1992 e continuam sendo considerados o “padrão ouro” para o diagnóstico do primeiro surto da FR (Tabela 1). A divisão dos critérios em maiores e menores é baseada na especificidade e não na frequência da manifestação. Outros sinais e sintomas, como epistaxe, dor abdominal, anorexia, fadiga, perda de peso e palidez podem estar presentes, mas não estão incluídos entre as manifestações menores dos critérios de Jones.A probabilidade de FR é alta quando há evidência de infecção estreptocócica anterior, determinada pela elevação dos títulos da antiestreptolisina O (ASLO), além da presença de pelo menos dois critérios maiores ou um critério maior e dois menores. Os critérios de Jones modificados pela American Heart Association (AHA) em 1992 devem ser utilizados para o diagnóstico do primeiro surto da doença, enquanto os critérios de Jones revistos pela OMS e se também ao diagnóstico das recorrências da FR em pacientes com CRC estabelecida. Uma vez que outros diagnósticos sejam excluídos, a coreia, a cardite indolente e as recorrências são três exceções em que os critérios de Jones não têm que ser rigorosamente respeitados: Considerando-se a raridade de outras etiologias para a coreia, sua presença implica no diagnóstico de FR, mesmo na ausência dos outros critérios ou da comprovação da infecção estreptocócica anterior; Na cardite indolente, as manifestações clínicas iniciais são pouco expressivas e, quando o paciente procura o médico, as alterações cardíacas podem ser a única manifestação, e os exames de fase aguda, assim como os títulos de anticorpos para o estreptococo, podem estar normais; Nos casos em que o paciente tem história de surto agudo prévio ou de cardiopatia crônica comprovada, o diagnóstico de recorrência pode ser baseado em apenas um sinal maior ou em vários sinais menores ou, simplesmente, em dois sinais menores pelo critério da OMS. Controle A FR é uma doença passível de prevenção, a qual requer vigilância constante por parte do paciente, dos familiares e do serviço de saúde. Programas multidisciplinares de prevenção e controle da doença devem ser desenvolvidos com o objetivo de promover uma perfeita adesão à profilaxia, o controle das lesões residuais e cuidados relacionados ao bem-estar físico e mental desses pacientes. A profilaxia primária baseia-se na prevenção dos episódios de FR aguda através do tratamento das faringoamigdalites pela erradicação do Streptococcus b-hemolítico do grupo A com antibióticos (Tabela 2)3. A chave para a prevenção primária é reduzir a exposição aos estreptococos do grupo A, o que exige melhorias em habitação, infraestrutura de higiene e acesso a cuidados de saúde para a população do mundo em desenvolvimento4. A Organização Mundial de Saúde e a Federação Mundial do Coração têm recomendado essa abordagem, desde a década de 19804. Nos últimos 20 anos vários pesquisadores têm se esforçado para desenvolver uma vacina segura e eficaz contra o Streptococcus do grupo A. O desafio de produzir vacina é induzir proteção contra S. pyogenes sem desenvolver reações autoimunes que podem desencadear FR. Atualmente existem 12 modelos de vacinas, a maioria em fase pré-clínica. Os antígenos candidatos têm como base a proteína M do estreptococo (regiões N e C-terminal) e outros antígenos conservados da bactéria. Tratamento O objetivo do tratamento da FR aguda é suprimir o processo inflamatório, minimizando as repercussões clínicas sobre o coração, articulações e sistema nervoso central, além de erradicar o EBGA da orofaringe e promover o alívio dos principais sintomas. S. pyogenes é muito sensível à penicilina. Assim, penicilina V oral ou amoxicilina podem ser usadas no tratamento da faringite estreptocócica. Para pacientes alérgicos à penicilina, pode ser usada uma cefalosporina oral ou um macrolídeo. O uso combinado de penicilina intravenosa com um antimicrobiano inibidor de síntese proteica (p. ex., clindamicina) é recomendado para o tratamento de infecções sistêmicas graves. A presença de resistência ou resposta clínica pobre tem limitado a utilização de tetraciclinas e sulfonamidas. Medidas gerais - Repouso: na ausência de envolvimento cardíaco, que deverá durar enquanto persistir os sintomas/sinais de artrite 3,4. Na presença de cardite deverá haver repouso enquanto permanecerem sinais/sintomas de disfunção cardíaca 15 (taquicardia de repouso, dispnéia aos pequenos esforços e fadiga). Poderá variar de três semanas a seis meses, conforme o grau e extensão do envolvimento cardíaco 8. Dieta hipossódica, antitérmicos, antieméticos etc. Tratamento da estreptococcia - A infecção estreptocócica mesmo subclínica ou inaparente deve ser tratada com rigor pelos riscos de recorrência ainda na fase hospitalar 24,29. Os antibióticos de escolha são: penicilina benzatínica, penicilina procainada 400.000UI IM 12/12h, penicilina V 250mg 3x/dia - 10 dias. Não existe nenhuma vantagem em se utilizar as penicilinas semi-sintéticas, uma vez que aquelas têm a mesma eficácia sobre a bactéria com uma relação custo/benefício significativamente menor 40-44. Pacientes alérgicos à penicilina podem ser tratados com eritromicina (estolato ou succinato) 20-40mg/kg/dia - 10 dias, ou cefalexina 500mg 3´/dia - 10 dias (paciente adulto) 44-47. Antiinflamatórios não hormonais (AINH) - Ácido acetilsalicílico (AAS) 100mg/kg/dia - máximo de 3g/dia, é o medicamento de eleição para artrite 27. A resposta da artrite ao AAS é tão imediata e eficaz que se deve questionar o diagnóstico de DR se não há remissão dos sintomas articulares em poucos dias 28. A duração da terapia com o AAS é em média de quatro semanas, ou seja, enquanto durar os sintomas e as provas de atividade inflamatória 27,28. Os efeitos colaterais do AAS (salicismo) são: sonolência, lipotímia, zumbidos nos ouvidos, hiperpnéia, taquipnéia, náuseas, agitação, distúrbios de consciência, até coma, hipertermia e convulsões 28,30. Mais raramente e dependendo da dose pode haver hipoprotrombinemia, retenção de água, IC e edema agudo de pulmão 29,36. Corticosteróides (prednisona) - Em presença de cardite ou coréia utilizamos a prednisona na dose de 1 - 1,5mg/kg/dia (máximo 60mg em adulto e 40mg na criança <12 anos) em dose única matinal por quatro semanas ou enquanto durar sinais de cardite e provas de atividade inflamatória. A partir da remissão dos sinais/sintomas de cardite deve-se suspender gradativamente o medicamento ±5mg/semana 30. Para evitar sintomas de rebote (febre, dores osteomusculares, taquicardia) deve-se associar 2g de AAS e mantê-lo por 2-4 semanas após a suspensão da prednisona 30. Os principais efeitos benéficos do corticosteróide na DR são inibição da migração de polimorfonucleares, ação anti fibroblástica, estabilização dos lisossomas celulares, diminuição da permeabilidade vascular, inibição das cininases e outros mediadores da inflamação 27,29. Os efeitos colaterais mais comuns são: fácies cushingóide (lua cheia), retenção hidrossalina, hipertensão arterial, úlcera péptica, diabetes mellitus, osteoporose, hirsutismo, hipocalemia, glaucoma, necrose asséptica de cabeça do fêmur, catarata e pancreatite 20,29. Insuficiência cardíaca - Dieta hipossódica, repouso, diuréticos, digitálicos, inibidores da ECA. Os compostos digitálicos (deslanasídeo-C, digoxina) devem ser empregados com cautela pelos riscos que estes pacientes têm de intoxicação pela droga 32,34. Coréia - No tratamento da coréia, recomenda-se manter ambiente calmo, sem estímulos sonoros e visuais, evitar atitudes que excitem ou irritem o paciente, com orientações sobre a evolução e prognóstico da doença. Os medicamentos empregados são: ácido valpróico 20-40mg/kg/dia, 3-4 vezes ao dia. O mecanismo de ação do ácido valpróico seria pelo aumento de ácido gama aminobutírico intracerebral (GABA), um neurotransmissor inibidor que melhora os movimentos involuntários e a labilidade emocional. Por ter toxicidade hepática deve-se dosar periodicamente as enzimas aspartato aminotransferase e alanino aminotransferase (AST, ALT). Haloperidol 0,5-5mg/dia, medicamento que na criança têm o inconveniente de causar impregnação dos núcleos da base e desencadear sintomas extrapiramidais (tipo doença de Parkinson) e distúrbios de comportamento. Clorpromazina 1-3mg/kg/dia,fenobarbital 5-7mg/kg/dia. Dessas drogas, a mais eficaz e melhor tolerada para criança e adolescente tem sido o ácido valpróico. Para o adulto a melhor escolha é o haloperidol . ● Explicar as consequências da não aderência ao tratamento farmacológico. A não aderência ao tratamento se mostra um problema de saúde pública, ela pode trazer como conseqüências individuais o sofrimento e a morte. Do ponto de vista socioeconômico, a não-adesão representa desperdício de recursos e perda de produtividade. Em relação à febre reumática, sabe-se que indivíduos que apresentam um episódio agudo estão propensos a desenvolver ataques recorrentes (recidivas), caso experimentem orofaringites pelos streptococcus β-hemolíticos do grupo A. Além da morbidade das próprias manifestações, tais como artrite e coréia, isso representa um risco aumentado para o desenvolvimento ou exacerbação da cardiopatia reumática. ● Relacionar os principais fatores determinantes desta doença com a situação social e epidemiológica na Bahia e no Brasil. Os gastos gerados pela assistência aos pacientes com FR e CRC no Brasil são significativos: em 2007, foram gastos pelo Sistema Único de Saúde (SUS) cerca de R$ 157.578.000,00 em internações decorrentes de FR ou CRC, de origem clínica ou cirúrgica, sendo que, das cirurgias cardíacas realizadas neste período, 31% abordaram pacientes com sequelas de febre reumática. Dados do Ministério da Saúde estimam uma prevalência de FR ao redor de 3% entre crianças e adolescentes, sendo responsável por 40% das cirurgias cardíacas no país. Não há predomínio de cor e afeta ambos os sexos por igual, ainda que o prognóstico seja pior para as mulheres. É uma doença que predomina na idade pediátrica, entre 5 a 15 anos, sendo a média de idade de 10 anos. Apenas em 20% dos casos ocorre em adultos. É muito rara antes dos três anos e depois dos 23 anos. Como já citado anteriormente,existe certa predisposição genética. Além disso, é mais frequente em ambientes desfavoráveis caracterizados por pobreza, acesso restringido aos serviços de saúde e má nutrição.
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