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2 Volume 1, Número 1, 2016The International Journal of Periodontics & Restorative Dentistry – Edição em Português Cássio Volponi Carvalho1 Rodrigo Carlos Nahas de Castro Pinto2 Maria Luisa Silveira Souto3 / Leandro Chambrone4 Fernando Peixoto Soares1 / João Batista César-Neto5 Claudio Mendes Pannuti6 / Giuseppe Alexandre Romito7 Espaço biológico: conceito chave para estética e saúde gengival em procedimentos restauradores Em casos complexos o tratamento interdisciplinar visa restabelecer saúde, função e estética. O conhecimento do complexo dentogengival é fundamental para a longevidade das reabilitações. Entretanto, frequentemente nos deparamos com tecidos periodontais inflamados ao redor de restaurações ou próteses. Métodos de diagnóstico precisos são utilizados na identificação da invasão do espaço biológico (EB) e na tomada de decisão do tratamento mais indicado para o restabelecimento dessas estruturas. O conhecimento do comportamento cicatricial dos tecidos guiará a complementação protética final. Adicionalmente, a localização dos términos cervicais deve respeitar os limites anatômicos do EB. O gerenciamento correto desses princípios garante o sucesso das reabilitações. Int J Periodontics Restorative Dent - edição em português 2016;1:825–832. doi: 10.11607/prd.1570. Os tecidos periodontais formam um complexo dentogengival cuja principal função é manter a integri- dade, o conforto e o “vedamento” biológico do dente. Algumas es- truturas periodontais importantes estão localizadas na porção interna do tecido gengival que circunda os dentes cujas dimensões verticais são conhecidas como Espaço Bioló- gico (EB).1 Essas estruturas apresen- tam dimensões verticais médias já conhecidas, com pequena variabili- dade entre os dentes e indivíduos: extensão média do sulco (0,69 mm), extensão média do epitélio juncio- nal (0,97 mm) e extensão média da inserção conjuntiva supra-alveolar (1,07mm), sendo esta última a medi- da que apresenta menor variabilida- de.2 Nos procedimentos protéticos e restauradores, um periodonto saudável é um pré-requisito para um resultado funcional previsível e esté- tico a longo prazo. Nevins e Skurow descreveram o sulco gengival como um componente importante do EB quando considerada a relação periodontia e procedimentos res- tauradores.3 Esta “interface de tran- sição” entre os ambientes interno e externo está presente em algumas 1 Mestre e Doutor em Periodontia pela FOUSP - Faculdade de Odontologia, Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil. 2 Mestre em Periodontia pela FOUSP e Doutorando do Programa de Pós-Graduação em Ciências Odontológicas – Área de concentração Periodontia - Faculdade de Odontologia, Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil. 3 Especialista em Periodontia pela Fundação Faculdade de Odontologia (FUNDECTO) , São Paulo, SP, Brasil. 4 Professor Associado, Unidad de Investigación Básica Oral (UIBO), Universidad El Bosque, Bogotá, Colômbia e Professor Titular, Mestrado em Odontologia, Universidade Ibirapuera (UNIB), São Paulo, SP, Brasil. 5 Professor Doutor da Disciplina de Periodontia da Faculdade de Odontologia, Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil. 6 Professor Associado da Disciplina de Periodontia da Faculdade de Odontologia, Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil. 7 Professor Titular da Disciplina de Periodontia da Faculdade de Odontologia, Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil. Correspondência para: Prof. Dr. Cássio Volponi Carvalho, Endereço: Av. Professor Lineu Prestes, 2227 – Cidade Universitária – CEP 05508-000 – São Paulo – SP – Brasil; Telefone: (11) 3091-7833. (11) 981221919. E-mail: cvcarvalho@mac.com. 43 Volume 1, Número 1, 2016The International Journal of Periodontics & Restorative Dentistry – Edição em Português situações clínicas como localização dos términos dos preparos, perfil de emergência das coroas, forma do tecido interdental e resposta fisio- lógica dos tecidos gengivais frente aos preparos restauradores e proté- ticos. Clinicamente, em média 3 mm devem ser considerados entre o topo da crista óssea alveolar (COA) e a margem gengival3 (Fig 1). Em um periodonto saudável essas medidas podem variar em relação à posição do dente no alvéolo, entre diferen- tes dentes, assim como entre super- fícies distintas em um mesmo dente. Entretanto estas estruturas estão presentes em todas as dentições.1,4 As causas mais comuns que podem levar a uma invasão do EB são: doença cárie, fraturas, perfu- rações, reabsorções radiculares e preparos protéticos. O resultado desta violação pode provocar um processo inflamatório e, conse- quentemente, reabsorção do teci- do ósseo periodontal na tentativa de restabelecer a dimensão fisio- lógica destas estruturas. Na literatura são descritas várias opções de tratamento para o resta- belecimento do EB, dentre elas tra- tamentos não cirúrgicos e cirúrgicos periodontais com diferentes aborda- gens. O gerenciamento clínico desta condição inclui exodontia estratégi- ca, cirurgia ressectiva óssea para au- mento de coroa clínica e, em alguns casos específicos, extrusão ortodôn- tica.5 Quando corretamente indica- dos, esses diferentes procedimentos fornecem resultados satisfatórios e previsíveis. No entanto, a literatura apresenta medidas variáveis para o restabelecimento do EB, que pode variar de 3 mm3,5 a 5,25 mm.6 O objetivo deste artigo foi revi- sar a literatura a respeito dos concei- tos atuais, diagnóstico e tratamento da invasão do EB e demonstrar a sua importância em relação aos pro- cedimentos restauradores visando a saúde e estética. Embasamento científico Dentro de um plano de tratamento integrado envolvendo reabilitação protética, um dos aspectos fun- damentais é a relação harmoniosa entre a localização cervical dos tér- minos restauradores e a margem gengival. O EB foi definido por Nevins e Sckurow como a distância entre o topo da COA e a margem gengival, englobando o sulco his- tológico, o epitélio juncional e a in- serção conjuntiva.3 Durante muitas décadas padronizou-se considerar clinicamente a dimensão do EB em 3 mm. Tal distância foi baseada nos achados de um estudo realizado em cadáveres que demonstrou a média de 2,73 mm entre a margem gengival e a COA.2 Estudos mais recentes sugerem que estas medi- das podem estar limitadas quando consideramos diferentes situações clínicas e anatômicas, pois a distân- cia pode variar entre os diferentes grupos de dentes, sítios e biótipos gengivais (Tabela 1). Vacek et al.4 compararam as medidas do epitélio juncional e da inserção conjuntiva em dentes an- teriores, pré-molares e molares. Os dentes anteriores apresentaram medidas menores, enquanto que nos molares as medidas referentes ao EB encontrado foram maiores. Tristão et al.1 encontraram distâncias diferentes quando avaliado o grupo de dentes e sua localização (maxila ou mandíbula). Os diferentes sítios dos dentes também podem apre- sentar profundidades diferentes do EB. Faces livres tendem a possuir um EB menor (aproximadamente 3 mm). Sítios proximais podem ter um EB de 3 a 4,5 mm.7 Além disso, o biótipo gengival pode influenciar a dimensão do EB. Alguns autores sugeriram uma correlação entre es- pessura gengival e profundidade do sulco gengival, na qual o biótipo espesso apresentava um sulco mais profundo.8-10 O biótipo periodontal também está relacionado com a al- tura da COA. Uma maior distância entre a união cemento-esmalte à Tabela 1 Estudos que descreveram as dimensões do EB em humanos quando avaliados os grupos de dentes, localização e biótipo gengival Autor (ano) Metodologia Resultados Conclusões Espaço biológico (EB) (Considerado pelos autores) Gargiulo et al.2 Estudo em humanos (cadáver); 365 blocos de dentes; Análise histométrica; Não avaliaram o biótipo gengival 0,69 mm – ES 0,97 mm – EJ 1,07 mm – IC Altura do topo da crista óssea até a margem gengival de 2,73 mm. 2,04 mm EJ + IC Vacek et al.4 Estudoem humanos (cadáver); 171 superfícies de dentes; Análise histométrica; Não avaliaram o biótipo gengival 1,14 mm – EJ 0,77 mm – IC 1,32 mm – PS + EJ (média para todas as superfícies estudadas) Quando comparadas as dimensões do EB entre as superfícies de dentes não houve diferença estatística significativa Anterior: 1,75 mm (EJ + IC) Premolar: 1,97 mm (EJ + IC) Molar: 2,08 mm (EJ + IC) Jardini e Pustiglioni12 Estudo em humanos (in vivo); 120 dentes com periodonto clinicamente saudável; Análise clínica (sondagem transulcular); Não avaliaram o biótipo gengival Não foi avaliada a média geral do espaço biológico. Foi analisada a média por sítios e grupos de dentes Os sítios proximais (mesiais e distais), tanto para o arco superior como para o inferior, apresentaram-se maiores do que os das faces livres (vestibular e palatina/ lingual) Anterior Superior (MG-COA) Sítio mesial: 2,94 ± 0,53 Sítio vestibular: 2,64 ± 0,55 Sítio distal: 2,81 ± 0,59 Sítio palatino: 2,58 ± 0,58 Médio Superior (MG-COA) Sítio mesial: 3,21 ± 0,32 Sítio vestibular: 2,65 ± 0,49 Sítio distal: 3,15 ± 0,34 Sítio palatino: 2,78 ± 0,38 Posterior Superior (MG-COA) Sítio mesial: 3,26 ± 0,21 Sítio vestibular: 2,87 ± 0,31 Sítio distal: 3,70 ± 0,36 Sítio palatino: 3,06 ± 0,37 Anterior Inferior (MG-COA) Sítio mesial: 2,84 ± 0,38 Sítio vestibular: 2,28 ± 0,25 Sítio distal: 2,79 ± 0,33 Sítio lingual: 2,50 ± 0,56 Médio Inferior (MG-COA) Sítio mesial: 3,22 ± 0,30 Sítio vestibular: 2,44 ± 0,36 Sítio distal: 3,16 ± 0,28 Sítio lingual: 3,02 ± 0,35 Posterior Inferior (MG-COA) Sítio mesial: 3,27 ± 0,36 Sítio vestibular: 2,69 ± 0,34 Sítio distal: 3,35 ± 0,36 Sítio lingual: 2,83 ± 0,33 Cook et al.11 Estudo em humanos (in vivo); 60 pacientes (26 biótipo delgado e 34 biótipo espesso); 360 dentes anteriores superiores com periodonto clinicamente saudável Análise tomográfica (tomografia Cone Beam) Biótipo delgado 3,35 a 3,39 mm: JCE - COA Biótipo espesso 3,06 a 3,15 mm: JCE – COA Comparado com o biótipo gengival espesso, o biótipo delgado apresenta uma maior distância da JCE- COA estatisticamente siginificativa (p=0,02) Biótipo Delgado (JCE-COA) Incisivo central superior: 3,35 ± 0,74 Incisivo lateral superior: 3,39 ± 0,68 Canino superior: 3,37 ± 0,59 Biótipo Espesso (JCE-COA) Incisivo central superior: 3,10 ± 0,46 Incisivo lateral superior: 3,06 ± 0,53 Canino superior: 3,15 ± 0,44 Tristão et al.1 Estudo em humanos (in vivo). 24 dentes com periodonto clinicamente saudável; Extraídos por indicação protética juntamente com suas estruturas periodontais; Análise histométrica. Não avaliaram o biótipo gengival 1,58 ± 0,41 mm: GM – JE 1,18 ± 0,42 mm: EJ – COA 2,75 ± 0,59 mm: MG – COA Altura do topo da crista óssea até a margem gengival de 2,75 ± 0,59 mm Incisivos centrais superiores: 2,95 ± 0,61 (MG-COA) Incisivos laterais superiores: 3,65 ± 0,099 (MG-COA) Caninos superiores: 2.04 ± 0.49 (MG-COA) Segundos pré-molares superiores: 2,40 ± 0,7 (MG-COA) Incisivos centrais inferiores: 2,85 ± 0,47 (MG-COA) Incisivos laterais inferiors: 2,85 ± 0,47 (MG-COA) Primeiros pré-molares inferiores: 2,85 ± 0,43 (MG-COA) Dimensão dentogengival (mm) para epitélio do sulco (ES), epitélio juncional (EJ), inserção conjuntiva (IC), profundidade de sondagem (PS) e EB (epitélio juncional + inserção conjuntiva), MG (margem gengival), COA (crista óssea alveolar). Fig 1 Esquema representativo das estru- turas e dimensões que compõem o espaço biológico (sulco histológico: 0,69 mm; epité- lio juncional: 0,97 mm; inserção conjuntiva: 1,07 mm). Gargiulo et al.2: mensurações histológicas supra-crestais. Do ponto de vista clínico, uma distância de 3 mm pode ser considerada. 0,69 mm 0,97 mm 1,07 mm 65 Volume 1, Número 1, 2016The International Journal of Periodontics & Restorative Dentistry – Edição em Português crista óssea é encontrada no bióti- po delgado, enquanto que no bió- tipo espesso essa união encontra-se mais próxima à COA.11 Frente a tantas variações des- tas dimensões, quando nos de- paramos clinicamente com um término cervical de uma prótese ou restauração invadindo o EB, precisamos determinar o grau desta invasão em relação aos limi- tes dimensionais correspondentes ao sulco clínico (0,5 a 1,0 mm) e o comprometimento da COA. Este diagnóstico é fundamental para guiar a melhor conduta terapêu- tica. Diante disso, são necessárias técnicas previsíveis para mensura- ção das dimensões do EB. Jardini e Pustiglioni mensura- ram as dimensões do EB através da sondagem transgengival (isto é, inserção da sonda periodon- tal através dos tecidos gengivais para avaliar a morfologia do osso alveolar) de dentes periodon- talmente saudáveis. De forma geral, os sítios mesial e distal, tanto para arco inferior quanto superior, possuíam medidas de EB maiores do que os sítios vesti- bulares e linguais.12 Este método é útil para avaliar, clinicamente, a distância da margem gengival à crista óssea e mensurar, individu- almente, as diferentes superfícies dos dentes.1 Inicialmente, duran- te a sondagem, determinamos a junção cemento-esmalte ou o tér- mino do preparo protético (Figs 2 e 3). Sob anestesia local intro- duzimos uma sonda periodontal milimetrada no sulco gengival até alcançar o topo da COA12 (Figs 4 e 5). Dessa forma diagnosticamos se a distância correspondente ao EB é adequada ou se é indicado algum procedimento para o seu restabelecimento. Um método radiográfico para mensuração do EB, denominado técnica radiográfica paralela de perfil, foi proposto por Alpiste-Illue- ca.13 Ele permite mensurar de forma não invasiva, através de radiografias periapicais, a espessura e a dimen- são clínica dos componentes da unidade dentogengival dos den- tes anteriores. Além disso, pode ser utilizado para o diagnóstico da invasão do EB através da identifi- cação das margens intrassulculares de restaurações nos procedimentos de aumento de coroa. Mais recente- mente, Januário et al.14 propuseram uma técnica para mensuração das estruturas do periodonto através de tomografias Cone Beam. Este procedimento deve ser realizado com o auxílio de um afastador labial de plástico e um palito de madeira oclusal no intuito de manter a língua o mais baixa possível. Dessa forma, elimina-se a sobreposição do lábio e da língua dos tecidos periodontais e a unidade dentogengival pode ser visualizada e mensurada (Fig 6). Quando comparada à sondagem transgengival esta é considera- da não invasiva, sem necessidade de anestesia local e pode auxiliar nas mensurações da relação entre margem gengival e COA (distância correspondente ao EB), margem gengival e união cemento-esmalte (distância correspondente ao epi- télio de sulco e epitélio juncional), união cemento-esmalte e COA (dis- tância correspondente à inserção conjuntiva), além das espessuras do osso alveolar e gengiva vestibular. Tratamento Para determinarmos qual a melhor opção terapêutica para o restabele- cimento das dimensões biológicas do EB, o primeiro passo é a realiza- ção de procedimentos básicos pe- riodontais, visando o controle ou a eliminação dos fatores etiológicos locais com o objetivo de diminuir o processo inflamatório tecidual. Neste momento, um dos procedi- mentos é a remoção eventual do tecido cariado e/ou confecção de restauração ou prótese provisória. A orientação e a motivação do pa- ciente frente à higiene bucal são importantes, bem como procedi- mentos de raspagem, aplanamento e polimento coronário e radicular, sempre que necessário. Estes pro- cedimentos são fundamentais para o controle do edema local e con- Fig 2 Esquema representativo da identifi- cação da JCE em dente íntegro através da sondagem periodontal. Esta medida clínica corresponde, histologicamente, ao epitélio do sulco e epitélio juncional em condições fisiológicas normais, em média 2 mm. Fig 4 Esquema representativo da identi- ficação da COA em dente íntegro através da sondagem periodontal transgengival. Esta medida clínicacorresponde, histologi- camente, ao epitélio do sulco, epitélio jun- cional e inserção conjuntiva em condições fisiológicas normais, em média 3 mm. Fig 3 Avaliação clínica da identificação da JCE em dente íntegro através da sondagem periodontal. Esta medida clínica correspon- de, histologicamente, ao epitélio do sulco e epitélio juncional em condições fisiológicas normais, em média 2 mm. Fig 5 Avaliação clínica da identificação da COA em dente íntegro através da sonda- gem periodontal transgengival. Esta medida clínica corresponde, histologicamente, ao epitélio do sulco, epitélio juncional e inser- ção conjuntiva em condições fisiológicas normais, em média 3 mm. Fig 6 Diagnóstico tomográfico da unidade dentogengival. Com este método podemos ter uma avaliação aproximada da distância da MG-JCE, JCE-COA, MG-COA, espessura do tecido gengival e espessura do tecido ósseo. 2 mm 3 mm 87 Volume 1, Número 1, 2016The International Journal of Periodontics & Restorative Dentistry – Edição em Português tração tecidual, permitindo melhor diagnóstico da violação ou não do EB. Caso seja necessária interven- ção cirúrgica, ela será realizada em uma condição mais favorável, res- peitando o princípio cirúrgico de não operar em área inflamada.15 Neste sentido, duas situa- ções clínicas podem ser encon- tradas (Fig 7). a) sem invasão da área correspondente ao EB: O preparo protético está sub- gengival, mas existem os três mi- límetros até o topo da COA. Tal condição clínica permite algumas opções terapêuticas. A primeira delas é que, após o controle dos fatores etiológicos locais, haja uma contração tecidual de tal porte que exponha o remanescente radicular saudável de dente. Caso a contra- ção tecidual não seja suficiente, podemos utilizar uma complemen- tação cirúrgica. As opções são gen- givectomia, retalho com excisão de margem reposicionado e retalho deslocado apicalmente. A tomada de decisão para a escolha da técni- ca está na dependência da quanti- dade de tecido queratinizado. Se a situação clínica permitir que, após a excisão de margem ainda sejam mantidos no mínimo 2 mm de te- cido queratinizado, podemos optar pela gengivectomia ou retalho com excisão de margem. Caso contrá- rio, optamos por retalho deslocado apicalmente no intuito de preser- varmos, no mínimo, 2 mm de teci- do queratinizado.16 b) com invasão da área correspondente ao EB: O término protético está sub- gengival e não existem 3 mm até o topo da COA. Para que haja devolução da distância equiva- lente ao EB, algumas técnicas são necessárias para distanciar o tecido ósseo do término do pre- paro protético. A extrusão ortodôntica pode ser uma alternativa não cirúrgica em áreas onde a realização de ci- rurgias pode causar sequelas es- téticas e/ou funcionais. A técnica de extrusão lenta permite o des- locamento dos tecidos ósseo e gengival em conjunto com o des- locamento do dente.17 Diferentes recursos associados à extrusão podem impedir o deslocamento Procedimentos básicos Não cirúrgico CirúrgicoCirúrgico Procedimentos básicos Extrusão ortodôntica Sem invasão do E.B (união dentro-gengival) Com invasão do E.B (união dentro-gengival) Faixa adequada de tecido querainizado Gengivectomia ou retalho com excisão de margem sem osteotomia Faixa adequada de tecido querainizado Retalho com excisão de margem e osteotomia Faixa insuficiente de tecido queratinizado Retalho deslocado apicalmente sem osteotomia Faixa insuficiente de tecido queratinizado Retalho deslocado apicalmente e osteotomia Fig 7 Fluxograma de tomada de decisão para o tratamento da invasão do espaço biológico. “Procedimentos Básicos”: procedimentos dedicados à eliminação e/ou controle dos fatores etiológicos locais visando à eliminação e/ou controle do processo inflamatório periodontal. desses tecidos, evitando, assim, a necessidade de complementação cirúrgica.5,18-20 O tecido queratinizado e o comprometimento estético de- verão ser considerados na com- plementação cirúrgica. Em áreas com menor requisito estético e pequena faixa de tecido quera- tinizado o retalho deslocado apicalmente, associado à osteo- tomia, pode ser considerado. Em áreas estéticas com ampla faixa de gengiva queratinizada, o re- talho de espessura total com ex- cisão de margem reposicionado, associado à osteotomia, pode ser a melhor opção. Nos casos onde precisamos de osteotomia mais extensa (em altura e volu- me), um retalho total deve ser realizado para facilitar o acesso (Figs 8 e 9). Em casos onde há necessidade de remoção óssea em altura e não em espessura, a cirurgia flapless (sem retalho) e o acesso ao tecido ósseo via sulco gengival devem ser indica- dos. Esta opção pode gerar me- nos trauma cirúrgico aos tecidos, maior conforto pós-operatório e melhor qualidade de vida por parte do paciente. Os resultados clínicos desta abordagem foram similares às cirurgias a retalho.21 Uma vez realizado o procedi- mento cirúrgico para exposição da coroa clínica, a dúvida mais comum é com relação ao tempo que se deve aguardar para a mol- dagem do trabalho protético defi- nitivo. A primeira consideração é que, independente do tempo de espera, um provisório extrema- mente adaptado e com as mesmas características anatômicas da peça final é fundamental para o suces- so do resultado final.22 Respeitada esta condição, devemos avaliar algumas características clínicas como biótipo periodontal; técnica cirúrgica realizada e área reabilita- da com imperativo estético na re- gião cervical. Basicamente, os trabalhos mos- tram que o período final de cicatri- zação e remodelação pode variar de seis meses22-24 até um ano.25 Se estivermos trabalhando em áreas sem imperativo estético, o período correspondente entre 6 e 12 sema- nas pode ser considerado para a reabilitação final.26 Em regiões com imperativo estético e em pacientes com linha de sorriso alta, devemos aguardar entre três a seis meses para os procedimentos de molda- gem, uma vez que neste intervalo de tempo pode haver alteração significativa da posição da margem gengival.28,29 Este tempo de espe- ra pode ser estendido para até 12 meses se a cirurgia realizada foi o retalho deslocado apicalmente e com biótipo espesso.25 Em casos de próteses livres de metal com prepa- ros minimamente invasivos (prefe- rencialmente em esmalte), cabe o bom senso do profissional quanto ao tempo de espera, visto que deve ser analisada a localização cervical da prótese em relação à posição da margem gengival. Fig 8 Aspecto clínico inicial de uma paciente com biótipo espesso necessitando de aumen- to de coroa clínica para o restabelecimento correto do EB. A correção cirúrgica foi realizada com excisão de margem e redução em altura e espessura do tecido ósseo. Fig 9 Aspecto clínico após o procedimento cirúrgico e abordagem restauradora com pre- paros minimamente invasivos e laminados cerâmicos (dissilicato de lítio). 109 Volume 1, Número 1, 2016The International Journal of Periodontics & Restorative Dentistry – Edição em Português Relação entre os limites cervicais dos preparos dentários e o espaço biológico Evidências científicas demonstra- ram o efeito deletério que os pre- paros protéticos e restauradores subgengivais podem causar aos tecidos periodontais.7,29 Términos subgengivais localizados 1 mm subgengivalmente podem gerar resposta inflamatória exacerbada, aumento do sangramento à son- dagem, da profundidade clínica de sondagem e perda nos níveis clínicos de inserção.7 Estudos em modelo animal concluíram que as restaurações posicionadas na altura da crista óssea podem le- var à migração apical do epitélio juncional e, consequentemente, à perda da COA de até 5 mm. A gravidade de destruição estava diretamente associada à espes- sura da crista óssea subjacente à restauração.30 O biótipo periodontal exer- ce um papel de grande impor- tância para a localização cervical dos preparos restauradores.31 A resposta biológicado biótipo delgado nos casos de preparos subgengivais pode estar relacio- nada com maior inflamação gen- gival, retração gengival, migração apical do epitélio juncional e re- absorção da crista óssea alveolar. Após o período de dez anos, os términos subgengivais tendem a se tornar supragengivais e cáries radiculares foram frequentemente encontradas. Em áreas estéticas este conceito pode ser de grande importância na conduta clínica. Fig 10 Aspecto inicial de uma paciente com queixa principal de comprometimento estético do sorriso. Avaliação clínica revelou a necessidade de aumento de coroa clínica para o posicionamento correto do EB dos dentes 15 a 25 e complementação restauradora minimamente invasiva para restabelecer a anatomia ideal dos dentes 12 e 22 (lâminas cerâmicas) e 23 (fragmento cerâmico). Fig 11 Aspecto clínico após o procedimento de aumento de coroa clínica. Fig 12 Aspecto clínico do preparo suprassulcular minimamente invasivo do dente 12. Este término é o ideal do ponto de vista da manutenção da saúde periodontal. Fig 13 Design digital do dente 12 realizado em CAD/CAM. Fig 14 Aspecto final do sorriso após o tratamento interdisciplinar. Notar a saúde do tecido gengival dos dentes anteriores e a relação harmoniosa com os elementos dentais hígidos e restaurados. Nos biótipos espessos a margem gengival raramente se altera, o epitélio juncional migra para api- cal, ocorre reabsorção da COA e, consequentemente, formação de bolsa periodontal.32 Inúmeras situações clínicas exigem que preparos cervicais se localizem no nível subgengival. Devido à importância do EB e do sulco histológico neste contexto, a classificação proposta por Car- valho et al. apresenta 3 condições de términos cervicais:5 • Subsulcular: término cervical do preparo restaurador invadindo a área da união dentogengival. • Intrassulcular: término cervi- cal do preparo restaurador localizado dentro das dimen- sões do sulco histológico (aproximadamente 0,5 mm) sem invasão do complexo dentogengival. • Suprassulcular: término cer- vical do preparo restaurador localizado em um nível su- pragengival (Figs 10 a 14). 1211 Volume 1, Número 1, 2016The International Journal of Periodontics & Restorative Dentistry – Edição em Português Considerações finais Existem inúmeros estudos que quantificam a dimensão das estru- turas que compõem o espaço bio- lógico. Diferentes metodologias são acompanhadas de resultados diver- gentes que, frequentemente, estão relacionados a fatores anatômicos locais. Na prática clínica, podemos enfatizar que as mensurações do EB são dependentes da técnica de diagnóstico utilizada, do grupo, da face, localização dos dentes ava- liados e do biótipo periodontal. O bom senso clínico é fundamental na tomada de decisão do tratamento da invasão do EB visto que os limi- tes biológicos deverão ser avaliados para maior previsibilidade e manu- tenção dos resultados ao longo do tempo. Desta forma, mais estudos de qualidade são necessários para avaliar as dimensões do EB, suas re- lações com o tipo e a posição dos dentes, biótipo periodontal, largura da gengiva queratinizada, morfolo- gia do osso e sua resposta biológica nos casos de términos cervicais. Referências 1. Tristão GC, Barboza CA Jr, Rodrigues DM, Barboza EP. Supracrestal gingival tissue measurement in normal perio- dontium: a human histometric study. Int J Periodontics Restorative Dent. 2014;34(1):97-102. 2. Gargiulo AW, Wentz FM, Orban B. Di- mensions of the dentogingival junction in humans. 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