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1 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 Anestesiologia MONITORIZAÇÃO EM ANESTESIOLOGIA Introdução: - O termo monitorização vem do latim monere, que significa advertir ou avisar. - A monitorização é caracterizada por aferição (quase) contínua de variáveis do paciente que são inacessíveis por meio apenas do exame clínico. - A monitorização permite a realização de diagnósticos e tratamentos, quando indicados. Assim, ela reduz o potencial de desfechos indesejados durante o procedimento cirúrgico. - Para isso, deve-se destacar a importância dos alarmes na monitorização, que indicam quando há alteração em uma ou mais variáveis do paciente, possibilitando a realização de diagnósticos e de tratamentos precoces. - Os monitores multiparâmetros, que analisam inúmeras variáveis do paciente simultaneamente, potencializam a especificidade e a precisão das decisões clínicas. - A monitorização é utilizada na medicina em inúmeros setores, como emergência, unidade de terapia intensiva (UTI), unidade de terapia semi-intensiva e bloco cirúrgico. Monitores: - Cardioscopia. - Oximetria de pulso. - Pressão arterial não invasiva. - Temperatura. - Capnografia ou Capnometria. Todas as variáveis acima são obrigatórias em todos os monitores multiparâmetros! - Pressão arterial invasiva. - Pressão venosa central. - Pressão intracraniana. - Gases anestésicos. - Mecânica respiratória (pressão de pico, pressão de platô, pressão expiratória final positiva, fluxo respiratório, etc). - BIS (índice bispectral). - TOF (train of four). - Oximetria cerebral. - Swan-Ganz (cateter de artéria pulmonar). - Monitorização hemodinâmica avançada. - Ecocardiografia transtorácica ou transesofágica (point-of-care). - Gasometria point-of-care. - Tromboelastografia. Resolução do CFM Nº 1.802/2006: Dispõe sobre a prática do ato anestésico: Entende-se por condições mínimas de segurança para a prática da anestesia a disponibilidade de: - Monitoração da circulação, incluindo a determinação da pressão arterial e dos batimentos cardíacos, e determinação contínua do ritmo cardíaco, incluindo cardioscopia. - Monitoração contínua da oxigenação do sangue arterial, incluindo a oximetria de pulso. - Monitoração contínua da ventilação, incluindo os teores de gás carbônico exalados (capnografia) nas seguintes situações: anestesia sob via aérea artificial (como intubação traqueal, brônquica ou máscara laríngea) e/ou ventilação artificial e/ou exposição a agentes capazes de desencadear hipertermia maligna, havendo também a necessidade de monitoração contínua da temperatura. 2 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 Oximetria de Pulso: - O médico, mesmo treinado, é incapaz de detectar cianose enquanto a SpO2 ainda é > 80%. - A oximetria de pulso avalia a fração da oxiemoglobina (HbO2) em relação à fração da hemoglobina reduzida. - O oxímetro de pulso permite realizar medidas indiretas da frequência de pulso e da oxigenação arterial. - O sensor do aparelho geralmente é colocado nos dedos ou nos lóbulos da orelha. - Alterações nas medidas da oximetria de pulso podem indicar: → Choque circulatório. → Extremidades frias. → Doença arterial periférica. → Excesso de luz. → Movimentação do paciente. → Uso de contrastes endovenosos. → Uso de azul de metileno. → Unhas esmaltadas. - As diferentes frações da hemoglobina – oxiemoglobina, hemoglobina reduzida, carboxiemoglobina e metemoglobina – absorvem de formas diferentes os diferentes comprimentos de onda emitidos pelo oxímetro de pulso. - O aparelho emite duas faixas de comprimento de onda, a vermelha (660 nm) e a infravermelha (940 nm). - A hemoglobina reduzida é capaz de absorver mais o comprimento de onda vermelho. A oxiemoglobina é capaz de absorver mais o comprimento de onda infravermelho. Assim, à medida que aumenta a faixa de comprimento de onda, há diminuição da concentração de hemoglobina reduzida e aumento da concentração de oxiemoglobina. - A cada pulsação, o volume do dedo no qual está localizado o oxímetro aumenta, aumentando também o trajeto percorrido pelas ondas vermelha e infravermelha, resultando em aumento da absorbância das ondas de 660 nm e 940 nm. Pressão Arterial Não Invasiva: - Para a monitorização da pressão arterial não invasiva utiliza-se do método oscilométrico, que permite inferir indiretamente a pressão arterial por meio da detecção do fluxo arterial. - Inicialmente, o manguito insufla até um valor acima da PAS e, em seguida, esvazia- se em intervalos de 4-10 mmHg com pausas para a detecção de oscilações. - O aparelho detecta primariamente a pressão arterial média (PAM), visto que representa a pressão na qual a amplitude de oscilação é maior. - Os valores de PAS e PAD são calculados com base em algoritmos, correspondendo a pontos em que há rápidos aumentos e rápidas diminuições nas oscilações, respectivamente. - As possíveis complicações da aferição da pressão arterial não invasiva são: → Dor. → Petéquias. → Equimoses. → Edema. → Estase venosa. → Tromboflebite. → Neuropatia periférica. 3 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 → Síndrome compartimental. - Os fatores que podem interferir na medida da PA são: movimentação do paciente, compressão externa do manguito, desproporção entre o tamanho do manguito e o tamanho do membro do paciente, aferição em membros distantes do coração (membros inferiores). - Deve-se sempre observar a indicação da artéria no manguito, de forma a posicioná-lo corretamente. Cardioscopia: - A cardioscopia baseia-se em um sistema de 3 ou 5 cabos/canais, avaliando menos derivações no ECG, diferentemente das 12 derivações que são avaliadas no ECG padrão. - Sugere-se que, em anestesias, seja feito o seguimento de 2 derivações, geralmente D2 (para avaliar o ritmo) e uma derivação precordial, como V4-V5 (para avaliar alterações isquêmicas). - A cardioscopia detecta ritmo cardíaco, frequência cardíaca, alterações isquêmicas (segmento ST) e alguns distúrbios hidroeletrolíticos (hiper ou hipocalemia). - A atividade elétrica cardíaca nem sempre resulta em sístole ventricular adequada, daí a importância de se avaliar a frequência de pulso (oximetria de pulso) e a pressão arterial invasiva, quando disponível. - Os possíveis fatores que podem interferir na cardioscopia são: eletrocautério, fasciculações, tremores, posição dos cabos/canais, etc. - Sensibilidade na detecção de isquemia: → Derivação V5 isolada: 75%. → Derivações D2 e V5: 80%. → Derivações V4 e V5: 90%. → Derivações D2, V4 e V5: 96%. Monitorização de Gases Expirados: - Avalia a pressão parcial de CO2 expirado e de halogenados, como Halotano, Isoflurano, Sevoflurano, N2O, etc. - Para isso, utilizam-se técnicas de espectrofotometria de luz infravermelha ou espectrofotometria de massa. - A aferição da pressão parcial dos gases expirados pode ser do tipo mainstream ou do tipo sidestream. - Na aferição mainstream, a medição ocorre em tempo real, entretanto o custo é mais alto. - Na aferição sidestream, a medição ocorre de forma mais lenta e sujeita a interferências, entretanto o custo é mais baixo. - A medida da concentração de CO2 ao final da expiração (ETCO2) permite calcular de forma indireta a PaCO2, cujos valores normais variam entre 35 e 45 mmHg. - A capnometria corresponde à medida da ETCO2 e a capnografia corresponde à medida aproximada da PaCO2 e à representação gráfica da capnometria. - A monitorização contínua da capnografia permite a detecção precoce de eventos adversos durante a anestesia. Capnografia: - As ondas da capnografia são divididas em 4 fases: → Fase I: início da expiração (espaço morto). → Fase II: expiração das vias aéreas distais (já troca gasosa). → Fase III: platô alveolar. → Fase 0: inspiração. - A ausência de ondas na capnografia pode indicar: desconexões, apneiaou PCR. - Assim, quando há perda da monitorização de outros parâmetros, como a cardioscopia por alguma razão, a capnografia é fundamental para indicar se o paciente está em apneia ou PCR, determinando início dos procedimentos de ressuscitação. - O aumento da amplitude das ondas na capnografia pode indicar: hipertermia, hipertermia maligna, shivering pós- anestésico, hipertireoidismo, sepse, hipoventilação, reinalação, etc. 4 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 - A diminuição da amplitude das ondas na capnografia pode indicar: hipotermia, hiperventilação, hipoperfusão pulmonar (TEP, choque), etc. - A capnografia também pode ser utilizada para avaliar a efetividade da reanimação cardiopulmonar (RCP). Para que a RCP seja considerada efetiva, a capnografia deve indicar pressão mínima de CO2 de 10 mmHg. Se as manobras de RCP ultrapassarem 20 minutos sem que se consiga manter pressão mínima de 10 mmHg na capnografia, há indicação de suspender a RCP do paciente. Analisador de Gases: - Monitora a pressão parcial dos agentes anestésicos inalatórios. - Útil no controle da profundidade anestésica. - Avalia a existência de erros na concentração liberada de anestésicos. - Utilizado na observação das características farmacocinéticas dos gases halogenados. Pressão Arterial Invasiva: - Indicada quando há necessidade de aferições contínuas da pressão arterial e/ou quando há necessidade de coleta de amostras repetidas de sangue arterial para análise. - Indicada quando se espera grandes variações da pressão arterial, grandes sangramentos ou desvios hídricos ou quando as comorbidades do paciente exigem controle contínuo da pressão arterial (pacientes com alto risco cardiovascular). - As medidas da pressão arterial invasiva são realizadas por canulação arterial. As artérias que podem ser puncionadas para a aferição da pressão arterial invasiva são radial, braquial, femoral, etc. - Para a correta aferição da pressão arterial invasiva, há necessidade de zerar o aparelho em relação à pressão atmosférica. - Deve-se atentar para a leitura de acordo com a posição do transdutor. O transdutor usualmente é posicionado ao nível do coração do paciente que deve estar ao nível do coração do paciente. Ao movimentar o transdutor 10 cm acima do nível do coração, a PA diminui em 8 mmHg. Ao movimentar o transdutor 10 cm abaixo do nível do coração, a PA aumenta em 8 mmHg. - As possíveis complicações da aferição da pressão arterial invasiva são: isquemia distal, pseudoaneurisma, hematoma, hemorragia, embolização arterial, infecção do sítio da punção arterial e neuropatia periférica. Temperatura: - A monitorização da temperatura é recomendada para procedimentos cirúrgicos com duração > 120 minutos ou para anestesias nas populações pediátrica e geriátrica independentemente da duração do procedimento cirúrgico. - A monitorização da temperatura permite a detecção precoce de perdas de calor pelo paciente. Além disso, ela também permite o diagnóstico de hipertermia, inclusive de hipertermia maligna. 5 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 - Para a aferição da temperatura, utiliza-se mais comumente nasofaringe, esôfago, membrana timpânica e reto. - A manutenção da temperatura depende de mecanismos termorreguladores centrais no hipotálamo. - A anestesia inibe profundamente as defesas termorreguladoras do organismo contra a hipotermia e, por isso, tremores raramente são observados em pacientes anestesiados. Assim, a monitorização contínua da temperatura torna-se ainda mais importante, uma vez que os mecanismos termorreguladores intrínsecos do paciente estão inibidos pela anestesia. - Há inúmeros fatores que podem contribuir para a queda da temperatura corporal do paciente anestesiado: → Infusão venosa de soluções frias e, eventualmente, de sangue resfriado. → Ventilação artificial com gases secos e não aquecidos. → Baixa temperatura na sala de cirurgia. → Superfície corporal do paciente exposta. → Ausência de meios para manter o paciente aquecido. - A hipotermia pode causar aumento da incidência de infecções operatórias, retardo da recuperação anestésica e aumento da duração da hospitalização, aumento da morbimortalidade cardíaca, e aumento da perda de sangue e, consequentemente, da necessidade de transfusão de hemoderivados. Pressão Venosa Central: - A pressão venosa central (PVC), no indivíduo normal, representa o equilíbrio entre o volume sanguínea, a capacitância venosa, a função cardíaca direita e, indiretamente, a função cardíaca esquerda. - Os valores normais de pressão venosa central variam entre 4 e 8 mmHg. - A pressão venosa central é formada por 3 ondas ascendentes (a, c, v), 2 ondas descendentes (x, y) e 1 onda platô (h). - A PVC é historicamente utilizada como indicativa do estado volêmico do paciente, de sua responsividade à reposição volêmica e de sua função cardíaca. Entretanto, estudos demonstram correlação fraca entre PVC e estes parâmetros, não devendo ser utilizada como método estático. - Para a aferição da pressão venosa central, é necessária a implantação de um cateter por meio de um acesso venoso central. Os acessos mais frequentemente utilizados são veia jugular interna, veia jugular externa, veia subclávia e veia femoral. - O transdutor que mede a PVC é semelhante ao transdutor utilizado para aferir a pressão arterial invasiva. - As complicações possíveis são as mesmas da punção de acesso venoso central: hematoma, punção arterial inadvertida, pseudoaneurisma, pneumotórax, infecção do cateter, arritmias, etc. - As ondas que formam a pressão venosa central e o evento correspondente no ciclo cardíaco são: → Onda A: final da diástole ventricular, contração atrial. OBS.: A onda A está ausente nos pacientes que apresentam fibrilação atrial. → Onda C: início da sístole ventricular, fase de contração ventricular isovolumétrica, movimento da valva tricúspide em direção ao átrio direito. → Onda V: final da sístole ventricular, enchimento diastólico do átrio. → Onda H: do meio para o final da diástole ventricular, platô diastólico. → Onda X: meio da sístole ventricular, relaxamento atrial. → Onda Y: início da diástole ventricular, início do enchimento ventricular. Monitorização Bloqueio Neuromuscular: - As principais razões para monitorar a função neuromuscular dos pacientes são: → Facilitar o timing (momento mais adequado) para a intubação. 6 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 → Medir objetivamente o relaxamento muscular durante a cirurgia. → Avaliar o grau de recuperação do paciente à anestesia de forma a determinar o momento mais adequado para a extubação (TOF > 90%). - Titulação das drogas anestésicas de acordo com a resposta do paciente. - Os estimuladores de nervos periféricos utilizam vários padrões para a estimulação. O TOF (sequência de 4) é o mais comumente utilizado. - A resposta do músculo adutor do polegar à estimulação do nervo ulnar é um dos parâmetros mais frequentemente utilizados. - Para isso, eletrodos são posicionados no punho sobre a topografia do nervo ulnar e conectados a um gerador de pulsos, que entrega uma variedade de estímulos elétricos, que são específicos de cada método de estimulação utilizado. - No caso do TOF, são gerados 4 estímulos com intervalos de 0,5 segundo entre eles. - Após a administração de um bloqueador neuromuscular não despolarizante, as contrações musculares diminuem de amplitude, com respostas proporcionais ao grau de bloqueio. - O TOF quantifica a amplitude de cada resposta de contração muscular (1-4) e a relação da intensidade entre a primeira e a quarta resposta. - Outra modalidade de avaliação do bloqueio neuromuscular é a double burst (dupla salva), que é mais utilizada para a avaliação de bloqueio neuromuscular residual. Monitorização do Plano Anestésico: - A monitorização do planoanestésico é realizada principalmente por meio do Índice Bispectral (BIS). - O BIS foi criado para descrever as alterações eletroencefalográficas que se correlacionam com os estados de sedação, perda de consciência e amnésia. - As ondas eletroencefalográficas são processadas, possibilitando a avaliação da atividade cortical por meio de um índice que varia de 0 a 100. - O BIS avalia de forma objetiva os efeitos hipnóticos dos anestésicos sobre o SNC. - À medida que o paciente é sedado e vai perdendo a consciência, as ondas eletroencefalográficas de atividade cortical diminuem de frequência e aumentam de amplitude. - Quando os efeitos dos hipnóticos são mais profundos do que o necessário, o despertar torna-se mais lentificado e o tempo na sala de recuperação pós-anestésica mais aumentado. 7 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 - Com o BIS é possível realizar uma titulação mais adequada dos agentes hipnóticos, utilizando as menores doses necessárias com o objetivo de manter os pacientes suficientemente inconscientes para não apresentarem lembranças do procedimento cirúrgico, porém, com um despertar precoce. - Uma das grandes vantagens do BIS é a facilidade de instalação do equipamento, o qual é formado por 3 eletrodos acoplados entre si que são fixados na região frontal do paciente e, alguns segundos após, pode-se visualizar um valor numérico que varia de 0 a 100. Monitorização da Mecânica Ventilatória: Avalia-se volume de ar em mL, fluxo de ar inspirado e expirado em L/min e pressão dos gases em cmH2O. Monitorização Hemodinâmica Avançada: - Monitorização realizada por meio da implantação de um cateter na artéria pulmonar, permitindo calcular a pressão venosa central (PVC), a pressão sistólica da artéria pulmonar (PSAP), a pressão de oclusão da artéria pulmonar (PAOP), o débito cardíaco, a resistência vascular pulmonar e a resistência vascular sistêmica. - A monitorização hemodinâmica avançada é o método padrão-ouro para a aferição do débito cardíaco do paciente. - Pode haver a medida da saturação venosa central de oxigênio (SvcO2) associada aos outros parâmetros avaliados. - A monitorização hemodinâmica avançada é o método padrão-ouro para a detecção precoce de alterações hemodinâmicas, como choque e para a determinação da causa do choque, de forma a iniciar o tratamento o mais rápido possível. - O ecocardiograma transtorácico e o ecocardiograma transesofágico são formas complementares de monitorização do estado hemodinâmico do paciente. Oximetria Cerebral. Tromboelastograma.
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