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XI EPCC Anais Eletrônico 29 e 30 de outubro de 2019 NUTRIGENÔMICA, NUTRIGENÉTICA E SUAS APLICAÇÕES Lucas Felipe dos Santos¹, Eliane Papa Ambrosio-Albuquerque² ¹Acadêmico do curso de Especialização em Biotecnologia. Programa de Pós-Graduação em Biotecnologia. Universidade Estadual de Maringá (UEM). lucassantoz@outlook.com. ² Docente do Departamento de Biotecnologia, Genética e Biologia Celular. Universidade Estadual de Maringá (UEM). epaalbuquerque2@uem.br. RESUMO O presente artigo faz um panorama sobre nutrigenômica, nutrigenética e suas aplicações. Esta ciência considerada nova, busca esclarecer as interações entre os nutrientes e os genes. É sabido que uma alimentação saudável pode trazer uma vida mais longa e com qualidade, porém os caminhos pelos quais a longevidade é alcançada é uma das metas de estudo da nutrigenômica. A nutrigenética é a ciência que estuda o efeito das variações genéticas individuais, analisando polimorfismos de genes relacionados à metabolização alimentar. Acredita-se que a alimentação pode influenciar a atividade dos genes, assim como os genes podem influenciar a necessidade de nutrientes. Diversas ferramentas, como testes genéticos de identificação de sequências gênicas individuais, permitem utilizar as informações a serviço de prevenção do risco à doenças complexas e adequação da dieta a cada organismo. A nutrigenômica traz um novo olhar ao princípio de alimentação como base para a qualidade de vida e longevidade, fornecendo subsídios para a individualidade nutricional. PALAVRAS-CHAVE: Genes; Genoma; Nutrição; Polimorfismos; Testes genéticos. 1 INTRODUÇÃO Com os avanços tecnológicos, o conhecimento e dissipação da informação sobre doenças jamais antes vistas ou faladas, com o aumento da obesidade populacional e até mesmo o modismo em relação a dietas, a nutrição vem ganhando força e espaço por todo o mundo. A incorporação de análises e descobertas genéticas a esta área trouxe novas possibilidades e abriu horizontes. A genética propiciou grandes avanços na medicina como um todo. Permitiu análises mais amplas do genoma humano, da expressão gênica, da variação genética individual e das interações entre os genes e o ambiente. Para a área da genômica nutricional, os estudos atualmente nos fornecem conhecimentos sobre como os nutrientes se comportam entre a saúde e a doença, como são as alterações da expressão e/ou estrutura dos genes do indivíduo, objetivando a procura para estabelecer o melhor tratamento nutricional de acordo com o genótipo individual (BUTTENDORFF et al., 2018). A Nutrigenômica ainda é considerada uma área em desenvolvimento que pretende determinar a influência dos nutrientes no genoma. Descreve o uso de ferramentas de genômica funcional para sondar um sistema biológico seguindo um estímulo nutricional que irá permitir uma maior compreensão de como os nutrientes afetam vias e controle homeostático, esta ciência busca compreender as funções de todos os genes e suas interações com a alimentação com o intuito de uma vida saudável com menos riscos de desenvolver doenças crônicas. Já a nutrigenética, por outro lado, tem como objetivo compreender como a composição genética de um indivíduo coordena sua resposta à alimentação, ou seja, é o estudo de como o organismo responde a certos nutrientes com base em um determinado perfil genético. Com isso, estuda o efeito da variação genética na interação entre dietas e doenças, interligando a identificação, caracterização de variantes de genes associados e respostas diferenciais aos nutrientes (RODRIGUEZ et al., 2007; VALENTE et al., 2014;). Há dois mil anos atrás Hipócrates, o pai da medicina ocidental, já destacava a importância da nutrição na medicina, de acordo com a citação: “Deixe teu alimento ser teu mailto:lucassantoz@outlook.com mailto:epaalbuquerque2@uem.br XI EPCC Anais Eletrônico 29 e 30 de outubro de 2019 remédio”. É vasta a variedade de alimentos com propriedades funcionais, que vão muito além das funções nutricionais básicas, propiciando benefícios à saúde. Foram muitas as mudanças desde a época de Hipócrates, a compreensão em relação à saúde e nutrição tem crescido exponencialmente graças as descobertas sobre quais alimentos ou compostos bioativos de alimentos (CBAs) e como podem interagir com o nosso organismo para a promoção da saúde. Parte deste conhecimento se deu através da conclusão do Projeto Genoma Humano (PGH) em 2003, a era pós-genoma busca compreender a função dos quase 20.000 genes humanos, e como podem ser afetados por fatores ambientais como: tabagismo, poluição, estresse, dieta e medicamentos (CONTI, 2010). Com o desenvolvimento do PGH e das técnicas da biologia molecular uma nova era de tecnologia para a nutrição e medicina emergiu. A alimentação pode influenciar a expressão de determinados genes, assim como a metabolização de determinados alimentos de acordo com as variações genômicas individuais. Como exemplo, os componentes nutricionais bioativos, como: carotenoides, limonóides, monoterpenos, triterpenóides, catequinas, isotiocinatos, cumarinas, flavonoides entre outros são os responsáveis por interagir com os genes, podendo regular sua expressão principalmente através dos fatores de transcrição, provocando desta forma alterações fenotípicas. Apesar da aplicação da biologia molecular na área de nutrição ter ocorrido de forma lenta, observou-se mais recentemente, a integração dessas duas áreas no ensino de biologia molecular e a aplicação desta no surgimento de testes genéticos (MARTI et al., 2005). Dentro da área da Nutrigenômica, outras ômicas são utilizadas para filtrar, sendo subáreas de estudo: transcriptômica que analisa os produtos da transcrição, o RNA mensageiro e suas alterações frente a um nutriente ou bioativo; proteômica que analisa o conjunto de proteínas e as alterações sofridas quando na presença ou ausência de nutrientes bioativos e metabolômica que analisa como se dá o controle do transporte de determinado nutriente e metabólitos na sua rota bioquímica. Desta forma, a nutrigenômica, assim como outras ciências ômicas, procuram definir e caracterizar as “assinaturas dietéticas” que refletem a ação dos nutrientes na estrutura e expressão do genoma e posteriormente os seus efeitos sobre a saúde. A nutrigenômica tem buscado decifrar o impacto que os fatores nutricionais têm sobre a regulação e expressão de genes específicos, associando o potencial destes compostos no controle de doenças e os seus efeitos positivos a curto e longo prazo (CAHILL et al., 2011). Como forma de integrar e facilitar as pesquisas no campo da nutrigenômica na Europa e países próximos, foi instituída em 2004 a Organização Europeia de Nutrigenômica (NUGO), que estabelece colaborações com vários países fora da Europa. Em 2007, foi criada a Rede Brasileira de Nutrigenômica, para fortalecer ainda mais a área em crescente expansão. Por se tratar de uma ciência relativamente nova, mas que já traz consigo questões éticas, existe ainda a necessidade de se traçar diretrizes bioéticas adequadas, o que fez parte dos principais objetivos da NUGO (BERGMANN et al., 2006). No mesmo ano foi redigido um documento com 19 diretrizes de bioética que norteiam os estudos com humanos, enfatizando a necessidade de estabelecer padrões para a realização das pesquisas no campo da nutrição, por utilizar material biológico humano em larga escala. (FUJII; MEDEIROS; YAMADA, 2010). O presente estudo teve como objetivo sintetizar os principais avanços e aplicações na área, para traçar um perfil atual da relação da nutrição com a saúde e o genoma. Desta forma, a informação é um caminho para identificar alimentos que possam auxiliar no tratamento à diversas doenças, assim como reduzir os riscos de indivíduos com pré- disposição a elas. 2 MATERIAIS E MÉTODOS XI EPCC Anais Eletrônico 29 e 30 de outubro de 2019 O método utilizado foi a revisão integrativa de literatura que tema finalidade de reunir e sintetizar o conhecimento disponível sobre o tema proposto, seguindo critérios bem definidos para a realização da pesquisa (SOUZA; SILVEIRA; GALVÃO, 2010). O processo desta revisão cumpre seis etapas: 1. Elaboração da pergunta norteadora; 2. Busca ou amostragem na literatura. 3. Coleta de dados; 4. Análise crítica dos estudos incluídos; 5. Discussão dos resultados; 6. Apresentação da revisão integrativa. Os bancos de dados utilizados foram PubMed Central (PMC) (https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/); Eletronic Library Online (SciELO) (http://www.scielo.org/php/index.php), Science Direct (https://www.sciencedirect.com), Profissão Biotec (http://www.profissaobiotec.com ), Google acadêmico (https://scholar.google.com.br/ ). Os descritores utilizados foram: nutrigenômica, nutrigenética e aplicações. Foram excluídos artigos anteriores ao ano 2002 e de linguagem diferente de português, inglês e espanhol. 3 RESULTADOS DA PESQUISA Utilizando os descritores separadamente a busca resultou em aproximadamente 583 artigos com a referência de Nutrigenômica, 2.510 artigos com Nutrigenética e quando os três descritores foram utilizados em conjunto, foram encontrados de 67 a 102 artigos, de acordo com os bancos de dados utilizados. Foram encontrados artigos, resumos, dissertações e teses, sendo os principais resultados sintetizados. O foco se manteve onde a nutrição foi utilizada como auxilio na prevenção e tratamento de doenças de fundo genético. 4 DESENVOLVIMENTO 4.1 Genética e Nutrição O princípio da longevidade e qualidade de vida tem como base uma alimentação de qualidade, porém a individualidade genética pode influenciar nestes fatores. Segundo Conti (2010), a nutrigenômica pode ser entendida de duas maneiras, tanto a alimentação pode influenciar a atividade dos genes, como os genes podem influenciar a necessidade de nutrientes. Por exemplo: o consumo de ácidos graxos insaturados (principalmente ômega- 3) presente em alguns tipos de peixes altera a expressão de mais de 1.000 genes, muitos dos quais envolvidos com a inibição do desenvolvimento de paredes de gordura na artéria. Apesar do genoma humano ser 99% idêntico entre as populações e somente 0,1% divergente, é essa diferença que é responsável pelas características individuais, sejam físicas ou metabólicas e também a pré-disposição a determinadas doenças, para alguns mais que os outros (CONTI, 2010). Esta porcentagem diferencial é composta basicamente por polimorfismos genéticos. A investigação destas variações individuais de genes responsáveis pela absorção, metabolismo e excreção dos nutrientes é uma das vertentes da nutrigenômica. Essa abordagem é possível com a aplicação da biologia molecular, que cria ferramentas para possibilitar a visão de como a dieta reage frente ao genoma humano alterando o fenótipo e influenciando a resposta à dieta. Esses conhecimentos permitem entender como a influência de nutrientes e compostos bioativos podem modular a expressão gênica. Além das variantes em genes de metabolismo alimentares, os polimorfismos também são responsáveis por fenótipos diferentes, pela diversidade humana, como o sistema ABO, e podem ser fatores de risco de doenças comuns, porém complexas. É o caso da doença de Alzheimer, onde a estrutura genética da apolipoproteina E tem sido relacionada como fator determinante para a patologia, assim como para a variação clínica https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/ http://www.scielo.org/php/index.php https://www.sciencedirect.com/ http://www.profissaobiotec.com/ https://scholar.google.com.br/ XI EPCC Anais Eletrônico 29 e 30 de outubro de 2019 entre os indivíduos, mesmo sabendo que outras mutações colaboram com a evolução da doença (ROCHA et al., 2007). Dentre os polimorfismos, os mais frequentes são os polimorfismos de nucleotídeo único (single nucleotide polymorphism – SNP), que são variações gênicas de uma única base que podem ocorrer em uma porção significativa, ou seja, em mais de 1% da população. Por serem significativos na população, SNPs de genes envolvidos com efeitos metabólicos ou nutrição podem ser genotipados e utilizados como testes genéticos, como os de intolerância a determinadas substâncias. Quando amostras individuais são analisadas, estes testes genéticos mostram como o organismo de cada indivíduo metaboliza alguns nutrientes e substâncias. Atualmente há testes de metabolismo de ômega 3 e cafeína, de predisposição à obesidade, para intolerâncias alimentares como lactose e glúten, etc. Para a nutrição individualizada essas descobertas são consideradas características metabólicas preciosas, mas não são suficientes para a personalização (BUTTENDORFF et al., 2018). A personalização nutricional depende não só do conhecimento do genoma individual e da influência dos alimentos sobre eles, mas também do conhecimento sobre se os indivíduos poderão ou não ter benefícios diante da interposição nutricional, em combinação à pré-disposição à determinadas doenças. Todo este processo não depende somente de um único alimento, mas de uma dieta e de acompanhamento nutricional, para que haja efeito benéfico ao indivíduo (BAUMLER, 2012). Os nutrientes podem alterar as moléculas, seus processos e até mesmo a expressão gênica, levando a variações no fenótipo, como pode ser ilustrado na Figura 1. De acordo com a velocidade do metabolismo frente aos nutrientes, pode-se acumular metabólitos e desencadear doenças, ou levar à sua progressão, conhecendo a característica individual, é possível elaborar dietas direcionadas reduzindo a predisposição genética para doenças crônicas não transmissíveis. Esses avanços permitem também a produção de alimentos com composição química mais adequados a saúde e sua manutenção (CARVALHO; FÉRES; SANTOS, 2010). Figura 1: Princípio científico da nutrigenômica. Fonte: Fujii; Medeiros; Yamada (2010). A busca por mais genes chave no metabolismo alimentar parte de análises em larga escala, derivadas da transcriptômica e proteômica. Nestas análises, ferramentas de bioinformática são imprescindíveis na identificação de genes relacionados à enfermidades, utilizando as bases de dados do Projeto Genoma Humano. Os alimentos estão sendo observados como agravantes de patologias, desta forma conhecer as mudanças que ocorrem dentro das células na presença deles e sua interação com o transcriptoma e o metaboloma é importante para a personalização dos efeitos da dieta e a correção do metabolismo. A comparação de um genoma individual com uma base de dados pode XI EPCC Anais Eletrônico 29 e 30 de outubro de 2019 permitir a prescrição de medicamentos individualizados genótipo-dependente. O mesmo enfoque pode ser utilizado para o estudo dos metabólitos humanos, com o qual, em um futuro não muito distante, possam encontrar soluções personalizadas para melhorar a saúde nutricional e ainda permitir uma padronização racional da produção de alimentos para as próximas gerações (ESPÍNDOLA et al., 2016). As dietas nutricionais já têm tido uma base em análises genéticas, buscando a necessidade e estado nutricional tendo como meta prevenir ou atenuar doenças. A grande dificuldade ainda é o alto custo deste exame e a falta de conhecimento técnico dos profissionais na compreensão dos resultados. 4.2 Pesquisa e Nutrição As pesquisas genômicas na área de Nutrição podem ser englobadas em princípios básicos: compostos químicos que estão presentes nos alimentos e que foram identificados por metodologias de metabolômica e agem diretamente e indiretamente no genoma alterando a expressão ou sua estrutura; a expressão gênica está ligada à dietas, podendo interferir na incidência de doenças crônicas e sua progressão; o grau em que a dieta pode interferir na saúde e na doença dependendo do perfil genético do indivíduo. Em adição, a intervenção na dieta diante do conhecimento genético, que pode ser utilizada para prevenir, mitigar ou até mesmo curar doençase as variações genéticas encontradas nos indivíduos, dando diferentes respostas frente a determinados alimentos (MARIOS, 2018). A identificação das variações genéticas, possibilitadas pelo avanço tecnológico das pesquisas permite evitar riscos de certos alimentos a grupos populacionais assim como prevenir distúrbios futuros. A nutrigenômica pode ser considerada uma ciência multidisciplinar que nasceu a partir do conhecimento do genoma com a principal tarefa de ser mais um aliado na prevenção de doenças. (LIMA, 2014). A genômica estrutural foi fundamental no conhecimento integral da sequência do genoma humano, contudo, o proteoma e o metaboloma humanos não são ainda completamente elucidados. Desta forma estudos amplos, com abordagem em larga escala, como os microarranjos e as análises de transcriptômica auxiliam na identificação das vias moleculares afetadas por nutrientes e compostos bioativos dos alimentos, estabelecendo hipóteses de estudo direcionadas e que não seriam consideradas a princípio (KUSSMAN et al, 2006; MUTCH et al., 2005). As pesquisas nessa área levantam também dilemas éticos, grande parte da variabilidade genética humana está relacionada a diferenças étnicas, desta forma a identificação genética pode se tornar uma ferramenta para criar novas divisões entre a humanidade. O acesso aos testes de perfil genético nutricional para dietas personalizadas também é um tabu, levando-se em consideração que o serviço de saúde pública no Brasil é ineficiente ainda em necessidades básicas. Outro item relevante é a identificação de pré- disposição a doenças, que pode trazer eventuais ações discriminatórias (CONTI, 2010). 4.3 Nutrigenômica e Saúde Como citado previamente, as utilizações de ferramentas avançadas de genética molecular contribuem para uma melhor compreensão de como as dietas interagem com o genoma humano. Doenças crônicas e complexas acometem milhares de pessoas todos os anos, levando muitas vezes a morte. Nestas doenças, como diabetes, obesidade, doenças cardiovasculares, a dieta tem papel fundamental pois está incluída entre os fatores ambientais que também exercem influência sobre os genes no desenvolvimento e progressão das mesmas (AZEVEDO; MARTINEZ; STEEMBURGO, 2009). Os genes podem sofrer alterações desde a vida intrauterina, com os nutrientes e outros compostos de alimentos modelando suas expressões. A alimentação contribui como XI EPCC Anais Eletrônico 29 e 30 de outubro de 2019 ferramenta para modular as respostas do organismo frente a exposição a compostos tóxicos e infecções. É preciso cada vez mais aprofundar os estudos sobre a influência dos compostos bioativos, assim como as consequências de polimorfismos gênicos nas necessidades de nutrientes e destes compostos no risco do aparecimento de doenças (LIMA, 2014). O alimento é um fator ambiental que merece destaque, visto a exposição a diversos patógenos podendo causar consequências. Os hábitos alimentares são os fatores que mais merecem atenção, uma vez que a identificação de que os nutrientes têm a capacidade de interagir e modular mecanismos moleculares essenciais nas funções fisiológicas dos organismos sugere uma revolução no campo da nutrição. Atualmente, sabe-se que o genoma humano possui de 20 a 25.000 genes, um número muito menor daquele pensado antes. A tecnologia atual permite identificar um número superior a 500.000 polimorfismos por pessoa. Alguns deles podem afetar as funções das proteínas, bem como suas interações com outras proteínas e substratos. (FUJII; MEDEIROS; YAMADA, 2010). O conhecimento empírico sobre nutrição baseado em pesquisas e rotina já é aplicado para o benefício da saúde pública, como trabalhos de conscientização junto à população sobre os benefícios e malefícios dos alimentos individualmente (cardápios personalizados). Estudos têm sido realizados com a indicação de cardápios individualizados para a redução de peso em pacientes obesos, em tratamento de câncer, diabetes tipo I e tipo II, sendo que o cardápio adequado pode resultar em significativa perda de peso e na melhora metabólica (BAUMLER, 2012). Baseado nestas aplicações, a grande contribuição da nutrigenômica é a nutrição personalizada, uma vez que os indivíduos não respondem da mesma forma aos tratamentos e as dietas, sendo alguns favoráveis e a outros não. Esta vertente vem de encontro também com a medicina personalizada, sendo que na primeira, os dados genéticos devem estar relacionados com a dieta para um determinado genótipo, a fim de reduzir o risco de doença, enquanto na segunda, os dados genotípicos estão ligados ao risco de desenvolver doença (GIBNEY; WALSH, 2013). 4.4 Testes Genéticos Os avanços nas ferramentas de biologia molecular permitiram o desenvolvimento e oferecimento de testes genéticos em genes relacionados à nutrição. Estes testes incluem identificação de variações nos genes relacionados aos mecanismos de absorção dos nutrientes, o metabolismo, a excreção e até mesmo o paladar. Além disso, estudos genéticos têm demonstrado o quanto determinados genes determinam a preferência alimentar e o grau de satisfação (saciedade e apetite) dos seres humanos (OLGUIN, 2018). Os exames laboratoriais permitem detectar, por exemplo, níveis séricos anormais de IgG4 (proteínas associadas à sensibilidade). A intolerância alimentar, corresponde a uma reação de hipersensibilidade tipo III, nas quais se formam imunocomplexos circulantes, mediada por IgG específicas (IgG4). A reação de hipersensibilidade alimentar que culmina na produção de IgG4, tem na base uma má tolerância alimentar a algum grupo de alimentos, onde a digestão permanece incompleta, provavelmente por alguma deficiência enzimática do sistema digestivo. Como consequência, são produzidos polipeptídios que o organismo reconhece como substâncias estranhas e que causam uma reação de sensibilidade alimentar. (MONTE, 2015). Algumas evidências sugerem que a eliminação do consumo dos alimentos para os quais são detectados níveis de IgG específicas acima da normalidade, induz melhorias notáveis em elevada porcentagem das situações clínicas. Testes mais conhecidos, como da intolerância a lactose e ao glúten tem se tornado bastante populares e acessíveis. A intolerância a lactose ocorre pela incapacidade do organismo de digerir a lactose devido a quantidade insuficiente de enzimas digestivas responsáveis por quebrar as moléculas lácteas, como a lactase (SWALLOW, 2003). Os principais sintomas em decorrência à intolerância são gastrointestinais, como inchaço, XI EPCC Anais Eletrônico 29 e 30 de outubro de 2019 flatulência, dor abdominal, fezes moles e diarreia ou constipação (KATSILA; PATRINOS; PAVLIDIS, 2015). Polimorfismos populacionais são testados para a identificação da intolerância primária. O SNP no intron 13 do gene da lactase LCT (LCT-13910 C>T ou rs4988235) é o mais prevalente entre os polimorfismos para o gene. Um indivíduo homozigoto para o alelo C é considerado intolerante à lactose ou lactase não persistente. Diferente da maioria das variantes genéticas que apresentam consequências nutrigenômicas de perda de função, mutações no gene LCT resultam em persistência da lactase (PL), conferindo a habilidade de produzir a enzima lactase até a idade adulta (KATSILA; PATRINOS; PAVLIDIS, 2015). Notavelmente, a doença é mais frequente em algumas populações do que outras (HEANEY, 2013), evidenciando o fator genético herdado. A recomendação dietética para estas populações, na confirmação da variante genética é eliminar ou limitar alimentos contendo lactose, usar suplementos de lactase ou consumir produtos sem lactose para evitar desconforto gastrointestinal (SWAGERTY et al., 2002). Como consequência da grande parcela da população incluída nesta limitação alimentar, foram desenvolvidas enzimas sintéticas que podem ser ingeridas como suplemento à falha da enzima corpórea. Um outro exemplo é a intolerância ao glúten, uma reação do organismo a alimentosque tenham trigo, cevada, centeio e outros tipos específicos de grãos. Chamada de doença celíaca, esta intolerância é uma inflamação crônica hereditária comum no intestino delgado causada por intolerância permanente a glúten/gliadina (FERRETI et al., 2012). Após uma digestão proteolítica não completa, a estrutura e as funções da célula intestinal são afetadas, modulando a expressão gênica de citocinas pró-inflamatórias, moléculas de adesão e enzimas da via NF-κB. Portanto, glúten deve ser restrito como parte do manejo nutricional e dietético da doença (LUDVIGSSON et al., 2014). Há uma forte associação entre a doença celíaca e os genes específicos do antígeno leucocitário humano (HLA), tornando a genotipagem do HLA uma ferramenta útil em situações clínicas específicas. Da mesma forma, há variabilidade étnica e populacional, sendo que os principais genes de susceptibilidade são o HLA-DQ2 (especificamente HLA- DQ2.5 e HLA-DQ2. 2) e HLA-DQ8, que são encontrados na grande maioria (99%) dos pacientes com doença celíaca, o que auxilia o diagnóstico (Tye-Din, 2018). Embora esses genes, transmitam risco relativo substancial para a doença celíaca, o risco absoluto é baixo e a maioria dos pacientes com um ou mais desses genes não desenvolverá doença celíaca. Um teste HLA positivo não diagnostica a doença celíaca, mas indica que mais investigações podem ser necessárias. 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS A nutrigenômica emergiu como uma forte aliada à nutrição, fornecendo conhecimento e ferramentas para que vias metabólicas de absorção e degradação de compostos alimentares sejam identificadas, sugerindo novos marcadores moleculares que podem ser utilizados em testes genéticos. O esforço de profissionais multidisciplinares no tratamento e prevenção de doenças é imprescindível para a formulação de dietas personalizadas. O custo dos testes ainda é elevado para grande parte da população e nem todos estão disponíveis comercialmente, porém acredita-se que em um futuro breve a acessibilidade será maior. E que serão implantadas políticas públicas de prevenção, em detrimento aos altos custos de tratamentos de doenças complexas. A nutrição como base para a qualidade de vida saudável do indivíduo, aliada aos conhecimentos fornecidos pela nutrigenômica sugerem adicionalmente alterações no cultivo, processamento e consumo dos alimentos. O desenvolvimento tecnológico, pesquisas e conscientização da população sobre a influência do estilo de vida no desenvolvimento de doenças multifatoriais aliados ao avanço da medicina permitirão não XI EPCC Anais Eletrônico 29 e 30 de outubro de 2019 somente o aumento da expectativa de vida, mas um aumento com qualidade para usufruir com saúde da melhor idade. REFERÊNCIAS AZEVEDO, M. J. de; MARTINEZ, J. A; STEEMBURGO, T. Interação entre gene e nutriente e sua associação à obesidade e ao diabetes melito. Artigo publicado no site Scielo em 2 de junho de 2009, disponível no link: < http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0004-27302009000500003> ,acesso em 28 de outubro de 2018 as 15h. BAUMLER, M. D. 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