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Ações Preventivas de Segurança Pública Responsável pelo Conteúdo: Prof. Dr. Reinaldo Zychan de Moraes Revisão Textual: Prof. Me. Luciano Vieira Francisco Segurança Pública como um Direito e o Ciclo de Polícia Segurança Pública como um Direito e o Ciclo de Polícia • Conhecer o direito à segurança pública e o papel de cada órgão da segurança pública dentro do ciclo de polícia. OBJETIVO DE APRENDIZADO • Introdução; • Segurança Pública como um Direito; • O Ciclo de Polícia; • Órgãos da Segurança Pública. UNIDADE Segurança Pública como um Direito e o Ciclo de Polícia Introdução O estudo de cada um dos órgãos públicos que atuam na segurança pública não pode prescindir de uma análise do Artigo 144 do texto constitucional. Conhecendo cada um dos órgãos será possível compreender o papel de cada um deles no chamado “ciclo de polícia”. Contudo, antes, faz-se necessário conhecer a natureza do direito à segurança pú- blica previsto no mesmo dispositivo constitucional. Segurança Pública como um Direito Uma das formas como a “segurança pública” deve ser vista é como um direito, sendo que dessa forma ela se encontra descrita no Caput do Artigo 144 da Consti- tuição Federal. Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabi- lidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio [...]. Esse enfoque dado por nossa Carta de Direitos indica que a segurança pública deve ser vista como um direito individual de cada cidadão, mas também como um bem jurí- dico coletivo que demanda proteção do Estado, mas com colaboração de todos. As ações de segurança pública não podem ser vistas como uma atuação contra os interesses da sociedade e dos cidadãos; bem ao contrário, decorre da forma como a segurança pública é estabelecida a necessidade de que ela seja vista como um direito do cidadão à intervenção policial sempre que a ordem pública, a incolumidade pes- soa ou o patrimônio dos integrantes da sociedade estiver em risco. A intervenção policial não é apenas uma prerrogativa do Poder Público, ela é um direito do cidadão. Vale dizer, a intervenção policial não deve apenas ser encarada como atuação limitativa do Estado em relação aos particulares para a garantia da ordem pública. Ela é também um direito subjetivo dos particulares e a legitimidade da atividade policial está na preservação e restauração dos direitos fundamentais, concepção que se encontra mais apropriada ao Estado Constitucional, no qual a Administração Pública está subordinada à Lei e à Constituição e figura em posição de paridade com o cidadão. [...] No Estado Constitucional (Democrático de Direito), interpretação dos dis- positivos referentes às questões policiais deve ser feita tendo em vista os direitos fundamentais do indivíduo, com ênfase naqueles que se opõem perante a Administração Pública. Isso porque no Estado Constitucional o cidadão não pode ser reduzido a objeto da atuação do Estado. Ele é 8 9 antes de tudo titular de direitos que podem ser opostos perante o Poder Público, principalmente, quando seus direitos vitais estão em risco. Nessa perspectiva há direito subjetivo (pretensão) do particular no sentido de que a polícia intervenha sempre que necessário para resguardar seus bens jurídicos. Como exemplo de situações em que se manifesta o direito subjetivo à in- tervenção policial, podemos citar a dos moradores que residem perto de estádios e que necessitam da polícia para retirar, da via pública, automó- veis que bloqueiam o acesso a suas casas, ou ainda, a dos moradores de zonas não policiadas, que podem invocar direito subjetivo público a uma adequada vigilância das zonas habitacionais ou o direito a que autoridades policiais intervenham para pôr a termo atos de violência ou vandalismo. (NERY JUNIOR, 2019) Esse direito subjetivo à intervenção policial apresenta algumas características: • Não possuem os órgãos da segurança pública poder de escolher atuar ou não nas situações em que a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio está em risco ou direto ataque – há, nesta situação, um verdadeiro poder-dever de agir. Observe que esse poder-dever é do órgão, razão pela qual devem ser estabelecidos mecanismos internos para que seus integrantes possam atuar nas mais variadas situações que se apresentarem – naturalmente, sem que haja risco pessoal desmedido no exercício dessa função; • O cidadão individualmente pode exigir, até mesmo por meio de ação judicial, que a atuação dos órgãos policiais se realize nas situações em que isso não ocorre de forma espontânea. Nessa linha, deve ser observada a seguinte decisão do Supremo Tribunal Federal (STF): O direito à segurança é prerrogativa constitucional indisponível, garanti- do mediante a implementação de políticas públicas, impondo ao Estado a obrigação de criar condições objetivas que possibilitem o efetivo acesso a tal serviço. É possível ao Poder Judiciário determinar a implementação pelo Estado, quando inadimplente, de políticas públicas constitucional- mente previstas, sem que haja ingerência em questão que envolve o po- der discricionário do Poder Executivo. [RE 559.646 AgR, rel. min. Ellen Gracie, j. 7-6-2011, 2ª T, DJE de 24-6-2011.]. ARE 654.823 AgR, rel. min. Dias Toffoli, j. 12-11-2013, 1ª T, DJE de 5-12-2013 Outro ponto que deve ser destacado em relação ao direito à segurança pública é que, sendo um direito coletivo, é necessária a colaboração do Poder Público, da sociedade e do cidadão para que ele se torne efetivo. Isso faz com que: • Todas as esferas do Poder Público tenham o dever de contribuir para a efeti- vação desse direito, não somente por meio dos órgãos que atuam diretamente nessa área, mas também na criação de mecanismos que favoreçam o seu pleno exercício. É o caso, por exemplo, da zeladoria urbana, com a limpeza de espa- ços públicos que possam criar riscos para as pessoas; a iluminação pública de vias em que há o trânsito de pessoas no horário noturno, dentre outras medidas; 9 UNIDADE Segurança Pública como um Direito e o Ciclo de Polícia • Cabe à sociedade, por meio de suas instituições como associações, clubes etc., buscar colaborar para que se estabeleçam condutas coletivas que possam favo- recer o exercício do direito à segurança pública; • Cabe a cada cidadão atuar de forma que esse direito seja efetivado. Pouco adian- tariam as medidas realizadas pelo Poder Público se não houvesse uma preocu- pação individual com essas questões. Igualmente merece destaque, na análise do “Caput” do Artigo 144 da Constituição Federal, a diretriz dada aos órgãos da segurança pública, ou seja, devem atuar buscando proteger os bens jurídicos ligados à preservação: • Da ordem pública; • Da incolumidade das pessoas; e • Do patrimônio das pessoas (públicas e privadas). A importância desses bens jurídicos faz com que essa proteção ocorra por meio da instituição de infrações penais (crimes e contravenções penais); contudo, há tam- bém uma série de mecanismos administrativos que são utilizados para a proteção deles. Em especial, devem ser lembradas as normas administrativas de: • Trânsito, sobretudo as instituídas pelo Código de Trânsito Brasileiro – Lei n.º 9.503/97, as quais estão afeitas à atuação dos órgãos da segurança pública; • Proteção ambiental que, em muitos casos, também são afeitas à competência de órgãos da segurança pública. O Ciclo de Polícia Antes de conhecermos cada um dos órgãos indicados no Artigo 144 da Constitui- ção Federal, é importante conhecermos o chamado “ciclo de polícia”, que se destina a explicar os limites de atuação e de interação de cada um deles. Para compreendermos como funciona o ciclo de polícia se faz necessário pontu- ar os dois grandes ramos da atividade policial, ou seja, a polícia administrativa e a polícia judiciária. Devemos destacar que essa classificação se refere à polícia como atividade e não à polícia como órgão – posteriormenteveremos como cada um dos órgãos policiais atua em cada uma dessas áreas. Polícia Administrativa A polícia administrativa, chamada também de preventiva ou ostensiva, objetiva re- alizar um “[...] conjunto de intervenções da administração, conducentes a impor à livre ação dos particulares a disciplina exigida pela vida em sociedade” (MORAES, 2019). Atua, portanto, antes da ocorrência das infrações penais, buscando evitar que elas ocorram, bem como tem atuação em outras atividades, voltadas para a atuação 10 11 típica do Direito Administrativo, mas que pela relevância social também estão a seu cargo, tal como a fiscalização de trânsito. Polícia Judiciária Já a polícia judiciária (ou polícia repressiva) está voltada para as atividades que devem ser desencadeadas pelo Estado após a ocorrência da infração penal, com o objetivo de apurar a sua ocorrência e autoria. O nome “polícia judiciária” tem sentido na medida em que não se cuida de uma atividade policial ostensiva (típica da Polícia Militar para a ga- rantia da segurança nas ruas), mas investigatória, cuja função se volta a colher provas para o órgão acusatório e, na essência, para o Judiciário avaliar no futuro. (NUCCI, 2020) Como principal instrumento para a condução das investigações e registros das provas colhidas, conta a polícia judiciária com o inquérito policial, cuja principal dis- ciplina está no Código de Processo Penal. Dinâmica do Ciclo de Polícia Pois bem, o ciclo de polícia que trataremos aqui é dividido por fases, em especial, antes e depois da eclosão da infração. Antes da Ocorrência da Infração Penal Depois da Ocorrência da Infração Penal Atuação da Polícia Administrativa Eclosão da Infração Penal Repressão Imediata Repressão Mediata Atuação da Polícia Judiciária Figura 1 – Ciclo de Polícia Nessa linha, existem dois momentos básicos, antes e após a eclosão da infração. No momento de normalidade pública, quando a ordem está preservada, existe a es- tabilidade social, na qual tudo está funcionando dentro dos parâmetros de regularidade. Na visão figurada, enxerga-se a presença da polícia ostensiva como órgão que promove a preservação da ordem pública, considerando que serve como fonte pre- sencial de segurança, identificada pelo uniforme, viaturas e equipamentos caracte- rizados. Essas condições ostensivas atuam como elementos de dissuasão de ações que estejam à margem da lei, sendo, evidentemente, uma ação preventiva de polícia. 11 UNIDADE Segurança Pública como um Direito e o Ciclo de Polícia Muito embora tenha atuado a polícia administrativa buscando a prevenção da ocorrência da infração penal, múltiplas situações poderão ocorrer e que permitem a sua eclosão, sendo que, com o surgimento desse desequilíbrio, que promove a de- sarmonia e a quebra da ordem pública, de pronto aparece a necessidade imediata de reestabelecer a normalidade, de modo que sejam realizadas ações repressivas ime- diatas que restaurem a situação de paz social – o que, em muitas situações, resulta na prisão em flagrante do autor da infração penal. Após a quebra da ordem pública, surge a repressão mediata com a fase inves- tigativa e a prática de atos de polícia judiciária que, processualmente, servirão para reunir subsídios para materializar a autoria e tipificar a conduta. Traduzindo, por meio do inquérito policial ou auto de prisão em flagrante delito, inicia-se a fase cartorária e pré-processual que objetiva reunir o conjunto probatório necessário à instrução, ou seja, de forma simples, os elementos de convicção que auxiliaram na formação do convencimento do órgão acusador – normalmente, o Ministério Público. Nessa dinâmica, o que se observa é que a repressão imediata caberá tanto à po- lícia administrativa, quanto à polícia judiciária, visto que tanto a uma como à outra cabe a atuação para, por exemplo, prender em flagrante aquele que for encontrado na prática da infração penal, porém, o registro da prisão em flagrante e as demais medidas para a instauração e instrução do inquérito policial devem sempre ficar a cargo da polícia repressiva – na repressão mediata. Órgãos da Segurança Pública Os incisos do “Caput” do Artigo 144 da Constituição Federal apresentam os chama- dos “órgãos policiais” do Estado brasileiro, contudo, como veremos há também nesse mesmo artigo referência a outros órgãos integrantes do sistema de segurança pública. Com esses elementos e, principalmente, para que possamos compreender o pa- pel de cada um deles no ciclo de polícia, estudaremos as normas constitucionais básicas sobre esses órgãos da segurança pública. Polícia Federal No Artigo 144 da Constituição Federal encontramos as seguintes disposições sobre a polícia federal: Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabi- lidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos: I – polícia federal; [...] 12 13 §1º. A polícia federal, instituída por lei como órgão permanente, organi- zado e mantido pela União e estruturado em carreira, destina-se a: I – apurar infrações penais contra a ordem política e social ou em de- trimento de bens, serviços e interesses da União ou de suas entidades autárquicas e empresas públicas, assim como outras infrações cuja prá- tica tenha repercussão interestadual ou internacional e exija repressão uniforme, segundo se dispuser em Lei; II – prevenir e reprimir o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o contrabando e o descaminho, sem prejuízo da ação fazendária e de outros órgãos públicos nas respectivas áreas de competência; III – exercer as funções de polícia marítima, aeroportuária e de fronteiras; IV – exercer, com exclusividade, as funções de polícia judiciária da União. Ao observarmos as atribuições estabelecidas para a polícia federal, pela Constituição Federal e pela legislação, observamos uma série de detalhes que precisamos destacar: • Esse órgão policial possui a estrutura de suas carreiras, condição fixada, em especial, pela Lei n.º 9.266/96, sendo que nesta encontramos o seguinte: » Os cargos são todos de nível superior, acessíveis por concurso público de provas e títulos, sendo que no concurso para delegado federal há os seguintes elementos adicionais: » É obrigatória a participação de representante da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) na realização do concurso público; » Os candidatos devem ser bacharéis em Direito, com três anos de atividade jurídica ou policial, comprovados quando da posse; • Esse órgão é subordinado ao Ministério da Justiça; • Os cargos de direção são ocupados por delegados da polícia federal; • O diretor-geral é nomeado pelo presidente da República, devendo a escolha recair, necessariamente, entre um dos delegados de polícia federal da classe especial. Sobre a competência, deve ser destacado que a polícia federal possui: • Atribuições de polícia administrativa, o que ocorre, por exemplo, quando são estabelecidas as missões de polícia marítima, aeroportuária e de fronteiras; • Atribuições de polícia judiciária, sendo que sobre essa encontramos expressas menções nos incisos I, II e IV, sendo que neste último há indicação de que esse órgão exerce com exclusividade essas atribuições no âmbito da União. A somatória dessas características faz com que a polícia federal seja o único dos órgãos policiais que possui competência para realizar isoladamente o chamado “ciclo completo de polícia”, pois atua tanto na polícia administrativa como na polícia judiciária. Ainda sobre as atribuições da polícia federal é necessário salientar a aplicação das seguintes normas: 13 UNIDADE Segurança Pública como um Direito e o Ciclo de Polícia • Código de Processo Penal, que estabelece a regência básica de como os atos de polícia judiciária no inquérito policial devem ser elaborados; • Lei de Drogas (Lei n.º 11.343/2006) que, dentre outros assuntos, trata dos cri- mes de tráfico de drogas, inclusive no âmbitointernacional; • Lei de Segurança Nacional (Lei n.º 7.170/83), que estabelece os crimes contra a ordem política e social; • Lei n.º 10.446/2002, que dispõe sobre as infrações penais com repercussão interestadual e/ou internacional que exigem repressão uniforme (mencionada no Inciso I do § 1º); • Lei n.º 12.830/2013, que trata da investigação policial conduzida pelo delegado de polícia, aplicável, igualmente aos delegados de polícia civil. Polícia Rodoviária Federal As disposições constitucionais sobre a polícia rodoviária federal são as seguintes: Art. 144. [...] § 2º. A polícia rodoviária federal, órgão permanente, organizado e man- tido pela União e estruturado em carreira, destina-se, na forma da Lei, ao patrulhamento ostensivo das rodovias federais. A polícia rodoviária federal possui atribuições de polícia administrativa delimita- das no texto constitucional e na legislação de trânsito. A carreira é regida pela Lei n.º 9.654/98, sendo que desta precisam ser destaca- dos os seguintes elementos: • A carreira é composta pelo cargo de policial rodoviário federal, estruturado em classes – terceira, segunda, primeira e especial –; dessa forma, uma carreira única estruturada em classes; • O acesso se faz por meio de concurso público, sendo que os candidatos devem possuir nível superior de ensino. Esse órgão policial é subordinado ao Ministério da Justiça. Polícia Ferroviária Federal Sobre esse órgão policial encontramos as seguintes disposições constitucionais: Art. 144. [...] § 3º. A polícia ferroviária federal, órgão permanente, organizado e man- tido pela União e estruturado em carreira, destina-se, na forma da Lei, ao patrulhamento ostensivo das ferrovias federais. 14 15 Em relação a essa instituição observamos um grande paradoxo, visto que, apesar da previsão constitucional, esse órgão, na verdade, não existe atualmente. Não há qualquer estruturação dessa organização policial e sequer qualquer tipo de concurso para provimento de vagas. Apesar de existir no passado, exercendo as funções de polícia administrativa, a desestruturação da malha ferroviária federal trouxe como consequência o total esquecimento desse órgão policial. Polícias Civis Sobre as polícias civis dos Estados e do Distrito Federal precisamos destacar as seguintes disposições constitucionais: Art. 144. [...] § 4º. Às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares. As polícias civis são órgãos policiais estaduais cuja atuação está voltada à prática de atos de polícia judiciária; contudo, não podem ser realizados para apurar: • Crimes cuja atribuição está destinada à polícia federal, conforme o contido no § 1º; e • Crimes militares, os quais estão previstos no Código Penal Militar (Decreto-Lei n.º 1.001/69), cuja apuração cabe aos órgãos militares da União (forças arma- das) ou estaduais (polícias militares e corpos de bombeiros militares). As normas de regência de cada uma dessas instituições policiais são elaboradas pelo respectivo Estado; contudo, é obrigatório que a direção delas se realize por de- legados de polícia de carreira. Além dessas normas, merece destaque a aplicação no exercício da atividade: • Do Código de Processo Penal; • Da Lei n.º 12.830/2013, que trata da investigação policial conduzida pelo de- legado de polícia. Polícias Militares e Corpos de Bombeiros Militares Sobre as polícias militares e corpos de bombeiros militares encontramos as se- guintes normas constitucionais: Art. 144. [...] § 5º. Às polícias militares cabem a polícia ostensiva e a preservação da ordem pública; aos corpos de bombeiros militares, além das atribuições definidas em Lei, incumbe a execução de atividades de defesa civil. 15 UNIDADE Segurança Pública como um Direito e o Ciclo de Polícia Como fica claramente apontado pelo texto constitucional, as polícias militares atuam nas atividades de polícia administrativa, buscando a prevenção da ocorrência de infrações penais, bem como para a preservação da ordem pública. No Decreto n.º 88.777, de 30 de setembro de 1983 (R-200), encontramos a se- guinte definição para a ordem pública: Art. 2º. Para efeito do Decreto-Lei n.º 667, de 2 de julho de 1969 mo- dificado pelo Decreto-Lei n.º 1.406, de 24 de junho de 1975, e pelo Decreto-Lei n.º 2.010, de 12 de janeiro de 1983, e deste Regulamento, são estabelecidos os seguintes conceitos: [...] 21) Ordem Pública. Conjunto de regras formais, que emanam do orde- namento jurídico da Nação, tendo por escopo regular as relações sociais de todos os níveis, do interesse público, estabelecendo um clima de con- vivência harmoniosa e pacífica, fiscalizado pelo poder de polícia, e cons- tituindo uma situação ou condição que conduza ao bem comum. A normatização aplicável às polícias militares e corpos de bombeiros militares deve ser elaborada pelo respectivo Estado-Membro, contudo, devem ser observadas a competência da União. Constituição Federal Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: [...] XXI. normas gerais de organização, efetivos, material bélico, garantias, convocação, mobilização, inatividades e pensões das polícias militares e dos corpos de bombeiros militares; Em parte, essa competência é tratada por meio do Decreto-Lei n.º 667/69, que foi inicialmente criado para reorganizar as polícias militares e corpos de bombeiros militares, sendo que essa norma é regulamentada pelo mencionado R-200; em rela- ção a este é necessário destacar o seguinte dispositivo: R-200 Art. 2º. Para efeito do Decreto-Lei n.º 667, de 2 de julho de 1969 mo- dificado pelo Decreto-Lei n.º 1.406, de 24 de junho de 1975, e pelo Decreto-Lei n.º 2.010, de 12 de janeiro de 1983, e deste Regulamento, são estabelecidos os seguintes conceitos: [...] 27) Policiamento Ostensivo. Ação policial, exclusiva das Polícias Mili- tares em cujo emprego o homem ou a fração de tropa engajados sejam identificados de relance, quer pela farda quer pelo equipamento, ou via- tura, objetivando a manutenção da ordem pública. São tipos desse policiamento, a cargo das Polícias Militares ressalvadas as missões peculiares das Forças Armadas, os seguintes: 16 17 • ostensivo geral, urbano e rural; • de trânsito; • florestal e de mananciais; • rodoviária e ferroviário, nas estradas estaduais; • portuário; • fluvial e lacustre; • de radiopatrulha terrestre e aérea; • de segurança externa dos estabelecimentos penais do Estado; • outros, fixados em legislação da Unidade Federativa, ouvido o Estado- -Maior do Exército através da Inspetoria-Geral das Polícias Militares. É certo que nesta última norma encontramos disposições que não foram recepcio- nadas pela Constituição Federal (CF) – tal como o exercício de atividades de polícia portuária, que foram destinadas à Polícia Federal (Inciso III do § 1º do Artigo 144 da CF), contudo, em grande parte essas disposições continuam vigentes e mostram as diversas atribuições desses órgãos. Polícias Penais Criadas em razão das alterações promovidas pela Emenda Constitucional n.º 104/2019, as disposições constitucionais sobre as polícias penais são as seguintes: Art. 144. [...] § 5º–A. Às polícias penais, vinculadas ao órgão administrador do siste- ma penal da unidade federativa a que pertencem, cabe a segurança dos estabelecimentos penais. A criação das polícias penais (órgão policial de criação mais recente) representa a transformação de carreiras e cargos que anteriormente já existiam e que atuavam na segurança de estabelecimentos penais para um novo modelo institucional, baseado na doutrina e organização policial. Nesse particular, devemos observar o contido no Artigo 4º da Emenda Constitucional n.º 104/2019: Art. 4º. O preenchimento do quadro de servidores das polícias penais será feito, exclusivamente, por meio de concurso público e por meio da transformação dos cargos isolados, dos cargosde carreira dos atuais agentes penitenciários e dos cargos públicos equivalentes. Esses órgãos existem no âmbito: • Da União: sendo que ela se subordina ao Departamento Penitenciário Nacio- nal (Depen); 17 UNIDADE Segurança Pública como um Direito e o Ciclo de Polícia • No âmbito estadual e distrital: com subordinação às secretarias de assuntos penitenciários, secretarias de Justiça, secretarias de segurança pública, ou no- menclatura semelhante, conforme a organização local. O que se observa é que a transformação dos órgãos existentes para esta nova re- alidade constitucional poderá, em alguns Estados, demorar algum tempo, visto que, em geral, é isso que ocorre. Disposições Complementares sobre os Órgãos Policiais Estaduais Depois de estabelecer as premissas de atuação dos órgãos policiais, o § 6º do Ar- tigo 144 da Constituição Federal apresenta disposição complementar cuja redação é a seguinte: Art. 144. [...] § 6º. As polícias militares e os corpos de bombeiros militares, forças auxiliares e reserva do Exército subordinam-se, juntamente com as polí- cias civis e as polícias penais estaduais e distrital, aos Governadores dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios. Essas disposições possuem um duplo direcionamento: • Estabelece que as polícias militares e os corpos de bombeiros militares são for- ças auxiliares e reserva do Exército; • Estabelece que esses órgãos policiais, bem como as polícias civis e as polícias penais estaduais e distritais são subordinadas aos governadores dos respectivos Estados e do Distrito Federal. Essa disposição, de importância mais histórica do que prática, destina-se a afastar qualquer dúvida sobre a subordinação dos órgãos policiais estaduais ao chefe do Poder Executivo desses entes federativos. Articulação dos Órgãos Policiais da Segurança Pública O § 7º do Artigo 144 da Constituição Federal reconhece que as disposições con- tidas nesse artigo não são suficientes para estabelecer uma boa articulação entre os trabalhos dos diversos órgãos policiais, de forma a garantir essencial cooperação e maior eficiência no desempenho de suas tarefas; estabeleceu, então, a necessidade de ser criada uma lei com esse objetivo. Apesar de esse assunto ser de inegável importância, somente em 2018 foi promul- gada a Lei n.º 13.675, que criou a Política Nacional de Segurança Pública e Defesa Social (PNSPDS), bem como instituiu o Sistema Único de Segurança Pública (Susp). Sistema Remuneratório dos Servidores Policiais Integrantes dos Órgãos da Segurança Pública A Emenda Constitucional n.º 19/98 estabeleceu uma forma específica de remune- ração para algumas categorias de agentes públicos (tais como os magistrados, mem- bros do Ministério Público, dentre diversas outras), o chamado sistema de subsídios. 18 19 Esse sistema remuneratório é tratado especificamente no § 4º do Artigo 39 de nossa Carta. Art. 39. [...] § 4º. O membro de Poder, o detentor de mandato eletivo, os Ministros de Estado e os Secretários Estaduais e Municipais serão remunerados exclu- sivamente por subsídio fixado em parcela única, vedado o acréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de representação ou outra espécie remuneratória, obedecido, em qualquer caso, o disposto no Art. 37, X e XI. Dessa forma, para as categorias de agentes públicos submetidos a esse regime re- muneratório há apenas uma parcela única, sendo vedado estabelecer qualquer outra forma remuneratória (tais como abonos, gratificações, adicionais etc.). A mesma emenda que estabeleceu essa sistemática criou o § 9º do Artigo 144 no texto constitucional e mandou aplicá-la aos servidores policiais de todos os órgãos policiais apresentados. Guardas Municipais No âmbito dos municípios a Constituição Federal estipulou a possibilidade de criação das guardas municipais, cuja previsão é a seguinte: Art. 144. [...] § 8º. Os Municípios poderão constituir guardas municipais destinadas à proteção de seus bens, serviços e instalações, conforme dispuser a Lei. O texto constitucional indicou a necessidade de criação de Lei para regular esses ór- gãos, sendo essa tarefa realizada pela Lei n.º 13.022/2014, que instituiu o Estatuto Geral das Guardas Municipais, sendo que nesta precisamos destacar o seguinte dispositivo: Art. 2º. Incumbe às guardas municipais, instituições de caráter civil, uni- formizadas e armadas conforme previsto em Lei, a função de proteção municipal preventiva, ressalvadas as competências da União, dos Estados e do Distrito Federal. Com clara missão preventiva, esses órgãos possuem a importante missão de atu- arem na realização de uma série de tarefas ligadas ao exercício do poder de polícia no âmbito municipal. Órgãos de Trânsito Entendendo a importância social que a segurança viária representa, a Emenda Constitucional n.º 82/2014 firmou, especificamente, que os órgãos que nessa atuam integram as atividades de segurança pública no viés da polícia administrativa. 19 UNIDADE Segurança Pública como um Direito e o Ciclo de Polícia Constituição Federal Art. 144. [...] § 10. A segurança viária, exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do seu patrimônio nas vias públicas: I – compreende a educação, engenharia e fiscalização de trânsito, além de outras atividades previstas em Lei, que assegurem ao cidadão o direito à mobilidade urbana eficiente; e II – compete, no âmbito dos Estados, do Distrito Federal e dos Municí- pios, aos respectivos órgãos ou entidades executivos e seus agentes de trânsito, estruturados em carreira, na forma da Lei. Estão inseridas nas atividades ligadas à segurança viária ações de educação, en- genharia e fiscalização de trânsito, sendo necessário que no âmbito dos Estados e do Distrito Federal haja organização das entidades e dos órgãos estipulados em Lei, devendo prever, igualmente, a estruturação das carreiras que atuam nessa área. 20 21 Material Complementar Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade: Leitura Decreto-Lei n.º 667/69 Decreto-Lei que reorganiza as polícias militares e corpos de bombeiros militares. https://bit.ly/3cqvlqD Lei n.º 10.446/2002 Lei que dispõe sobre as infrações penais com repercussão interestadual e ou internacional que exigem repressão uniforme. https://bit.ly/3cnSpGt Lei n.º 12.830/2013 Lei que trata da investigação policial conduzida pelo delegado de polícia. https://bit.ly/2P8dny2 Lei n.º 13.022/2014 Lei que instituiu o Estatuto Geral das Guardas Municipais, https://bit.ly/3kUEquT Lei n.º 13.675/2018 Lei que criou a Política Nacional de Segurança Pública e Defesa Social (PNSPDS) e instituiu o Sistema Único de Segurança Pública (Susp). https://bit.ly/32Unn5K 21 UNIDADE Segurança Pública como um Direito e o Ciclo de Polícia Referências MORAES, A. de. Direito Constitucional. 35. ed. São Paulo: Atlas, 2019. NERY JUNIOR, N. Direito Constitucional brasileiro. 2. ed. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2019. NUCCI, G. de S. Curso de Direito Processual Penal. 17. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020. 22
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