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Crátilo_ Ou sobre a correção dos nomes - Platão


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1. Capa
2. Rosto
3. Apresentação
4. Prefácio
5. Introdução
6. Platão – Crátilo: ou sobre a correção dos nomes
1. Texto bilingue: português - grego
1. Parte I
2. Parte II
3. Parte III
4. Parte IV
5. Parte V
6. Parte VI
7. Parte VII
8. Parte VIII
2. Texto em portugues
1. Parte I
2. Parte II
3. Texto em grego
1. Parte I
2. Parte II
7. Bibliografia
8. Coleção
9. Sinopse - Sobre o autor
10. Ficha catalográfica
11. Notas
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3
ÍNDICE
1. Capa
2. Rosto
3. Apresentação
4. Prefácio
5. Introdução
6. Platão – Crátilo: ou sobre a correção dos nomes
1. Texto bilingue: português - grego
1. Parte I
2. Parte II
3. Parte III
4. Parte IV
5. Parte V
6. Parte VI
7. Parte VII
8. Parte VIII
2. Texto em portugues
1. Parte I
2. Parte II
3. Texto em grego
1. Parte I
2. Parte II
7. Bibliografia
8. Coleção
9. Sinopse - Sobre o autor
10. Ficha catalográfica
11. Notas
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APRESENTAÇÃO
Traduzir um diálogo como o Crátilo, texto em que Platão se ocupa do
problema da adequação dos nomes às coisas e se envereda pela intricada
trama das etimologias, representa para o tradutor um duplo desafio. O
primeiro se compraz na própria consideração do estatuto da linguagem e da
sua capacidade de dizer ao nomear. O trabalho do tradutor, assim como o de
quem escreve, supõe o exercício de correlacionar ideias e palavras, e tem
subjacente o desejo de concorrer para uma comunicação mais eficaz entre o
autor e o seu leitor de outra língua. Em que medida isso se faz efetivamente
possível é questão que desde muito cedo esteve presente na história do
pensamento e da escrita. No âmago do problema da correspondência ou não
entre os nomes e as coisas, problema sobre o qual se inclina Platão ao curso
da investigação levada a termo neste diálogo, vemos de algum modo
considerado também aquele da tarefa própria ao processo de tradução. Ao
lidar com as palavras de dois registros linguísticos, o tradutor se vê às voltas
com o desafio que representa estabelecer relações não tanto entre palavras e
coisas, mas entre palavras tomando por base as coisas que se pretende
nomear. Como verter uma obra em uma língua distinta daquela do autor, de
modo a suscitar no leitor distante os efeitos provocados no leitor mais
próximo, que compartilha língua, ambiente cultural e um mínimo que seja de
referências comuns?
A tradução do Crátilo platônico com a qual aqui se confrontará o leitor, e
pela qual certamente será interpelado, tem como principal característica a
ousadia que falta à maioria das traduções modernas do diálogo, a saber,
aquela de não fugir ao desafio que representa trazer à luz o próprio
movimento subjacente à elaboração das etimologias como caminho para se
pensar o estatuto das palavras e da linguagem em sua estreita conexão com
aquele do conhecimento e do pensamento. O próprio Platão encarou
semelhante desafio ao se aventurar pela trama das etimologias e
experimentar sem subterfúgios a sua plasticidade ao escrever este diálogo.
Platão fez falar as palavras e mostrou em que efetivamente pode consistir o
pensar as palavras e o pensar com palavras tomando-as como objeto de
investigação e de reflexão ao revelar a fertilidade que nelas se esconde e que
faz com que se prestem como topos do pensamento e da linguagem, e não
5
apenas como seu instrumento ou matéria prima. Encontramo-nos, assim, em
meio a um jogo de espelhos de alteridades, signos e sentidos que, não
obstante os condicionamentos que afetam subjetivamente as partes, comporta
algum grau de objetividade. Trata-se, então, de encontrar parâmetros capazes
de estabelecer um território de comunidade, uma fronteira de abertura ao
diálogo, sem o qual se corre o risco de encapsular ideias e coisas,
impossibilitando a interatividade à qual convida a experiência da linguagem.
Como paliar as dificuldades e satisfazer a intenção onipresente no ofício
do tradutor, confrontado com o imperativo de transpor palavras por palavras,
ideias por ideias, pensamento por pensamento? Como verter para um
universo mental e cultural distinto daquele do autor todo um conjunto de
argumentos, articulações e intuições que tem lá sua terra natal? Como
entrelaçar, numa operação de diakosmesis, os felizes encontros, achados e
compreensões, de modo a suscitar no leitor de um texto vertido para outra
língua – território por vezes exótico àquele do original –, se não as mesmas,
pelo menos as mais próximas possíveis sensações que o original pretendia e
efetivamente foi capaz de provocar no leitor contemporâneo do autor?
Não nos encontramos, a esta altura, distantes do desafio inerente à
tradução de um texto antigo que, embora distante no tempo e no espaço,
mostra pouco a pouco sua inquietante e instigante proximidade. A tradução
dos diálogos platônicos constitui um campo tão rico em experiências quanto
a sua leitura. Se para Platão foi fundamental “inventar” um gênero literário
para minimizar os “perigos” da escrita, foi porque ele tinha consciência de
que os limites desta não deveriam representar um empecilho para escrever,
sobretudo em uma cultura em que a escrita contracenava cada vez mais com
a oralidade. A inteligência da empresa consistiu, então, em introduzir a
oralidade na escrita, substituindo o discurso direto por um convite a uma
investigação a ser conduzida a quatro mãos, engajando as partes no desafio
que representa pensar com palavras e escrever pensando. O sucesso do
empreendimento platônico pode ser avaliado pela posteridade de sua obra e
pela sua inesgotável capacidade de instigar, de fazer pensar, compelindo-nos
a buscar e a dar razões. E o trabalho de tradução não deve se furtar a esse
desafio.
Tarefa hercúlea, portanto, a que toma para si o tradutor! Como num
espetáculo de tauromaquia, ele deve dar provas de possuir o vigor necessário
para tomar o boi “pelos chifres”, para “submeter” o texto à inteligibilidade
de uma língua que lhe é estranha, dissecando a trama das palavras para torná-
las eloquentes sem, contudo, tomar os pés pelas mãos. Consciente da
distância que o separa do autor – não totalmente passível de ser transposta –
e do caráter de uma língua por vezes resistente a se deixar transpor para
6
outra, ele se deve conduzir sob o signo da docilidade e da força. E no tour de
force que a operação por vezes exige, fazer falar mais a alma do autor do que
suas palavras, mais o pensamento e as razões que nessas palavras se abrigam
do que a simples articulação de fonemas e sons. Como se diz em italiano,
tradurre è tradire (traduzir é trair)! Mas neste caso, tradire poderia significar
dire (dizer) o que se encontra tra le righe (entre as linhas), permitir, através
de uma interação com o texto e seu autor, que o pensamento possa seguir
adiante no ducto da escrita.
Um segundo desafio resta ainda a considerar. O leitor-tradutor deve
experimentar-se, como o aprendiz de um ofício, na oficina do pensador-
escritor. A oficina platônica exige do seu artífice que ele possua as
habilidades do pensamento, da criação de sentido e da significação, que seja
capaz de atuar mais como um coadjuvante do que como um guardião das
artes e dos ofícios, de modo a fazer com que as palavras digam o que têm a
dizer. Não se trata de produzir simplesmente um símile de letras, sílabas e
fonemas, não apenas um clone do texto, mas o sentido que por trás dele se
articula e dá a pensar.
Nestas páginas, o leitor se confrontará com palavras que não são
simplesmente a tradução direta de cada uma das palavras que foram objeto
das etimologias platônicas, mas uma experimentação que comprova a
radicalidade do empreendimento do tradutor, sua criatividade e coragem ao
verter não simplesmente uma palavra para o seu equivalente em nossa
língua, mas em encontrar na língua portuguesa palavras cuja relação entre
letras, sílabas e fonemas, entre significado e significante, pudesse se prestar a
produzir os mesmos efeitos conseguidos por Platão ao “jogar” com as letras,
sílabas e fonemas da língua grega, fazendo dançar as palavras em torno de si
mesmas, fazendo com que, em suarevolução, prevalecesse a coreografia
resultante de um corpo em movimento e não tanto o seu aspecto fixo e
estático. A título de exemplo, apresento aqui algumas das transcrições do
nosso tradutor:
τοῖς δ’ ἐπαΐουσι περὶ ὀνομάτων ἱκανῶς δηλοῖ ὃ βούλεται ὁ “Ἀτρεύς.” καὶ γὰρ
κατὰ τὸ < τειρὲς> καὶ κατὰ τὸ <ἄτρεστον> καὶ κατὰ τὸ < τηρὸν> πανταχῇ ὀρθῶς
αὐτῷ τὸ ὄνομα κεῖται. (395 b 7 – c 2).
Entretanto, para os suficientemente entendidos de nomes, fica evidente o que quer
dizer Atreu. Esse nome, correto segundo todos os pontos de vista, lhe estabelece
como atrevido, intrépido e atroz.
τοῦτον δὲ Κρόνου ὑὸν ὑβριστικὸν μὲν ἄν τις δόξειεν εἶναι κούσαντι ἐξαίφνης,
εὔλογον δὲ μεγάλης τινὸς διανοίας ἔκγονον εἶναι τὸν Δία·<κόρον> γὰρ σημαίνει
7
οὐ ¹αῖδα, ἀλλὰ τὸ <καθαρὸν> αὐτοῦ καὶ <κήρατον> τοῦ <νοῦ>. ἔστι δὲ οὗτος
Οὐρανοῦ ὑός, ὡς λόγος· ἡ δὲ αὖ ἐς τὸ ἄνω ὄψις καλῶς ἔχει τοῦτο τὸ ὄνομα
καλεῖσθαι, Òοὐρανία,ó <ὁρῶσα τὰ ἄνω>, ὅθεν δὴ καί φασιν, ὦ Ἑρμόγενες, τὸν
καθαρὸν νοῦν ¹αραγίγνεσθαι οἱ μετεωρολόγοι, καὶ τῷ οὐρανῷ ὀρθῶς τὸ ὄνομα
κεῖσθαι· (396 b 3 – c 3)
Quem escuta de repente acredita que este seja o filho insolente de Cronos, mas o
fabuloso Zeus tem que ser a progenitura de alguma grande inteligência. De modo
que Cronos não vem de crônico, que assinalaria a insolência do seu filho, mas sim
de crânio, que fala do intelecto cru do filho de Urano. Assim também o estudo do
céu tem um nome charmoso ao ser chamado uranologia, pois é rumando o olho
pra cima que, como dizem os astrônomos, é engendrado um intelecto puro.
Portanto, Hermógenes, o nome para Urano também foi estabelecido corretamente.
Essas duas passagens servem para ilustrar a perspectiva que orienta o
trabalho de Celso ao privilegiar o procedimento inerente à produção de cada
uma das etimologias e o espírito que as anima. Nisso reside a originalidade e
o mérito desta tradução, uma das únicas – até onde sabemos – que se propõe
a encontrar, na língua de destino, os jogos de palavras e as raízes
etimológicas aptas a reproduzir as intenções e a produzir os efeitos daqueles
presentes na língua de origem.
A atividade de tradução assim encarada se inscreve, portanto, no campo
de uma experiência que vai muito além de uma mera transposição de termos,
para constituir-se em si mesma num terreno fértil para a reflexão e promissor
para a indagação originária que conduziu os passos do autor.
A tradução que aqui nos apresenta Celso Vieira é resultado de uma
assídua frequentação do texto platônico e de uma intensa atenção ao
problema da linguagem e do discurso no pensamento antigo. Tendo antes
experimentado as dores e as delícias do trabalho do tradutor ao se ocupar
dos fragmentos de Heráclito de Éfeso, objeto de sua dissertação de mestrado,
Celso constatou a riqueza que pode advir da leitura de um texto em sua
língua original para a sua compreensão, interpretação e discussão. E foi
movido pelos reconhecidos ganhos dessa experiência pregressa que se
entregou, no contexto da elaboração de sua tese de doutorado, à tradução do
diálogo. Sua frequentação do texto grego do Crátilo, assim como a
recorrente consulta às muitas traduções, comentários e estudos modernos do
diálogo, fomentaram a convicção de não haver melhor via para dialogar com
um texto que tomá-lo como objeto de tradução. A intimidade proporcionada
por essa experiência lhe possibilitou examinar de modo mais agudo e crítico
a composição platônica, considerando de modo mais perspicaz seus
argumentos e a razão de ser de cada um dos procedimentos empregados na
economia da sua composição. Por vezes inusitadas e temerárias, por vezes
8
portadoras de luminosas consequências para a inteligibilidade do texto e dos
propósitos do filósofo, suas escolhas traduzem as evidências que foi
vislumbrando ao longo do caminho. Elas resultam do próprio diálogo
empreendido pelo tradutor com o autor, das perguntas dirigidas ao filósofo e
das conjecturas suscitadas no confronto das armadilhas do texto.
A seriedade com a qual Celso encarou o ofício de traduzir, deixando para
trás a atitude passiva de quem se contenta em ser um juramentado porta-voz
para se entregar à ousada e imperiosa tarefa de pensar com ele, faz de sua
tradução o registro de um diálogo com o autor. Em um país onde as
traduções de textos gregos antigos ainda caminham a passos de tartaruga,
não obstante o avançar célere dos estudos desses textos, devemos louvar as
iniciativas que emergem de um trabalho sério de pesquisa e não apenas
respondem à velocidade exigida por um mercado editorial por vezes
irresponsável ao apresentar ao grande público traduções de traduções,
traduções apressadas, que em lugar de dar espaço à compreensão de um
autor, de suas ideias, a um diálogo intenso e instigante, banalizam seu
pensamento e nos precipitam na via fácil da mera assimilação.
Esta tradução, como toda tradução possível, tem certamente os seus
limites, mas são precisamente esses limites que poderão acender outras
tantas e novas luzes no diálogo entre leitores e intérpretes da obra platônica,
assegurando aquela continuidade da mis en scène que tem lugar a cada vez
que faz falar os seus muitos personagens.
Miriam Campolina Diniz Peixoto
FAFICH - UFMG
9
PREFÁCIO
Eu só tenho paciência de ler prefácios longos se o autor é muito
interessante, por isso vou tentar ser o mais breve possível. Que eu tenha
notícia, esta é a única tradução do Crátilo em que os jogos de palavras feitos
no original grego são vertidos para a língua alvo, nesse caso o português.
Esta “originalidade” é mais consequência do tradutor ter se aventurado a
fazê-lo do que a realização de uma tarefa considerada impossível de
antemão. Minha motivação foi a de permitir que o leitor sem intimidade com
o grego antigo pudesse experimentar o texto sem recorrer a um número
exagerado de notas de rodapé explicativas. Em alguns casos a tradução dos
jogos de palavras deu muito certo, em outros, soou bastante forçada. A meu
favor tenho o fato de que, também no original, a personagem de Sócrates
apresenta jogos de palavras bem artificiais. Isso seria inclusive uma
estratégia para expor o absurdo de certos malabarismos retóricos feitos pelos
sofistas, mas aqui não é o lugar para propor interpretações. Meu ponto é
outro. Espero que o leitor da tradução alterne entre sorrisos admirados e risos
sarcásticos diante das explicações etimológicas. Se isso acontecer eu me
sentirei satisfeito com o resultado da aventura de traduzir a complexidade do
texto de Platão. Como a maioria dos antigos, este diálogo apresenta a virtude
de alternar, sem fazer distinção, entre ingenuidade e sofisticação. Sem
perdão do trocadilho, desejo a todos uma boa leitura deste que é considerado
o tratado sobre a linguagem mais antigo da cultura ocidental.
O autor
Celso Vieira
10
INTRODUÇÃO
Escrito por volta de 390-385 a.C., o Crátilo é tido como um dos diálogos
mais “atuais” de Platão (427-347 a.C.), na medida em que é o texto
“fundador” da tradição filosófica de reflexão sobre a língua e a linguagem.
Contemporaneamente, por estarmos inseridos numa cultura em que o
paradigma que determina o horizonte de nossas reflexões é a “linguagem”
(por oposição ao paradigma antigo do “ser” e moderno da “consciência”),
somos especialmente sensíveis e atentos a tudo o que concerne à linguagem.
Por isso, o Crátilo nos é particularmente interessante, e as primeiras
reflexões sobre as palavras, nem sempre explícitas, feitas pelos antigos
poetas, despertam-nos uma peculiar curiosidade. Do mesmo modo, as
investigações mais explícitas, feitas pelos filósofos da natureza,
questionando as relações entre as palavras e as coisas, tocam-nos
especialmente. E ainda interessam-nos também as discussões dos primeiros
retóricos e educadores sobre se as palavras têm origens misteriosas na
natureza ou se são meras convenções estabelecidas pelos costumes e pelo
uso.
Na cidade antiga, diferentes personagens, nos âmbitos diferentes de suas
práticas, formulam e explicitam uma complexidade de questões que,
articuladas de diferentes maneiras, poderiam ser descritas de um pontode
vista contemporâneo como “etimologias”, “gramáticas” ou “filosofias da
linguagem”. De maneiras diversas, em diferentes “camadas” do texto, todas
estão presentes no diálogo de Platão. Vejamos algumas delas:
Há uma linguagem na natureza? É possível ao ser humano falar a língua da
natureza? Como explicar as palavras? O que são as línguas? Quais são os
elementos da linguagem? O que é uma fala correta? Qual é a fonte de explicação
das falas e das fórmulas verdadeiras? Como diferenciar e classificar modos e
estilos diferentes de falar? De onde as falas e os discursos retiram sua força ou sua
fraqueza? É possível falar errado? É possível equivocar-se ao se nomear uma
coisa? Por que seria impossível dizer algo falso? O que é a medida do nome ou da
fala verdadeira? É possível haver nomes vazios, nomes que não são capazes de
designar nada? Para que servem os nomes? Como diferenciar os tipos de nomes?
Há sinônimos? Qual a relação entre nomes e coisas? Que coisas não são ou não
podem ser nomeadas? Como se reconhece o nome das coisas que podem ser
nomeadas? Como surgiram os nomes dos deuses, dos seres naturais, das coisas,
11
dos seres humanos e de suas ações? Há uma ciência das letras e dos nomes? É
possível decompor os nomes e as falas em partes ou elementos que os constituem?
E se não houvesse as línguas? Quem tem conhecimento verdadeiro, aquele que
fabrica os nomes ou aquele que os usa?
Ao compor o Crátilo com a estrutura que conhecemos, Platão elabora
uma ressonância reflexiva inteligente do confronto implícito na cultura de
sua época entre diferentes tendências de interpretação das diversas produções
sígnicas, simbólicas, linguísticas e discursivas, propostas por diferentes
representantes das variadas tendências religiosas, poéticas, gramaticais e
propriamente filosóficas. No campo complexo que as questões sobre a
linguagem acabam por constituir, a autoridade intelectual de Platão foi logo
reconhecida, principalmente a partir de e em torno do Crátilo, e isso por,
pelo menos, três razões principais: em primeiro lugar, pela construção
dramática do diálogo, que contrapõe as posições “naturalista” e
“convencionalista” relativas às determinações da linguagem; em segundo
lugar, pela seção das “etimologias”, construída com grande maestria tanto
literária como crítica, suscitando interpretações diversas e polêmicas; em
terceiro lugar, por apontar e exigir uma terceira solução que não se reduz a
nenhuma das duas primeiras.
O comentário mais antigo que nos chegou do Crátilo é o do filósofo
neoplatônico Proclo (séc. V d.C.), que, mesmo recorrendo fortemente à
categorização aristotélica, tanto aponta para as diferenças básicas entre as
abordagens de Platão e Aristóteles como adota as posições do primeiro. Para
Proclo, usa corretamente os nomes aquele que conhece as coisas através das
formas inteligíveis, seguindo mais suas determinações naturais do que as
convenções estabelecidas.
Atualmente, há uma profusão de dissertações, teses, comentários e artigos
científicos que continuam renovando a interpretação dessa verdadeira obra
prima da literatura filosófica ocidental. A Bibliografia Platônica disponível
no site da International Plato Society (<http://www.platosociety.org>) nos dá
uma mostra da erudição e da vitalidade da pesquisa atual sobre o Crátilo.
Podemos dizer que a singularidade do nosso diálogo reside no fato de
Platão, diferentemente de seus predecessores, preocupar-se de partida com a
atribuição incorreta dos nomes às coisas, ou seja, para ele, o modo de nomear
deve estar relacionado às diferenças nos seres, o que significa que o uso
cotidiano das palavras não é uma referência confiável para se estabelecer a
correção dos nomes. Outro aspecto dessa curiosa singularidade emerge ao
examinarmos os critérios classificatórios antigos utilizados pelos primeiros
editores dos diálogos platônicos. Pelo critério “estilístico”, o Crátilo estaria
classificado entre os diálogos da maturidade, mas pelo critério “temático” ele
12
http://www.platosociety.org
faria parte dos diálogos da velhice. Trata-se de um diálogo cujo interlocutor
principal é Sócrates, tal como a República e o Fédon, nos quais se postula
fortemente a teoria das formas inteligíveis; mas seu caráter é reconhecido
como teorético e lógico, tal como os diálogos nos quais a condução da
discussão passa a ser feita pelo Estrangeiro de Eleia, como o Sofista e o
Político, que supostamente poriam em questão a hipótese das ideias. Ou seja,
o tratamento dramático e dialético concebido por Platão para lidar com os
problemas filosóficos da linguagem nos obriga a ir além dos esquemas
redutores, exigindo do tradutor-intérprete algumas qualidades básicas que
possibilitem uma compreensão razoável do texto: coragem para enfrentar a
profundidade vertiginosa das minúcias linguísticas postas em jogo; agilidade
para transitar permanentemente entre as dimensões filológica e filosófica,
sem perder nem uma nem outra de vista; abertura de espírito para se deixar
surpreender por um texto que ainda nos reserva preciosidades literárias e
sutilezas teóricas inusitadas.
Em suas linhas gerais, a divisão temática do Crátilo é a seguinte:
383a-384e – introdução
385a-391b – perspectiva naturalista
(naturalismo, nome como instrumento, tékhne, referência objetiva à idéa, dialética)
391b-396d – distância crítica em relação ao naturalismo
(sabedoria poética, referência ao eídos, nomes próprios)
396d-421c – etimologias
(homens e deuses, nomes dos deuses, temas cosmológicos, conhecimento e valores)
421c-427d – os elementos dos nomes
(unidades de significação, negação da linguagem, mimese)
427d-435d – perspectiva convencionalista
(o nomear errado, referência ao týpos)
435d-439b – nomear e conhecer
(perspectiva crítica, conhecer os nomes e conhecer as coisas, possibilidade do erro)
439-440e – conclusão
Dentre esses grandes temas, destaco, em primeiro lugar, a reflexão crítica
sobre as teorias da correção do uso dos nomes (onómata), o uso do
discurso (lógos) sendo pensado como a capacidade de apreensão de termos
ou nomes “segundo a natureza” por oposição à produção de nomes “por
convenção”. A noção de “correção” ou “retidão” dos nomes estabelece quais
termos da linguagem devem ser utilizados em relação a quais seres
particulares, suscitando a oposição entre natureza e cultura como definidora
dos critérios para tal uso. Em segundo lugar, é preciso apontar para a
interpretação da seção etimológica na qual Sócrates desenvolve com grande
desenvoltura uma impressionante quantidade de etimologias ou de
explicações dos significados dos termos da língua grega, dando mostra do
quanto o texto platônico é um testemunho surpreendentemente eloquente da
13
milenar cultura “etimológica”.
A noção de nomeação merece algum comentário. Na seção 387d-391b, a
discussão concentra-se no nome como instrumento e o nomear como um
fazer objetivo, conferindo à produção da linguagem toda a racionalidade
própria da técnica. É nessa perspectiva que, mais adiante, o nome será
concebido como imagem (fabricada) da coisa nomeada. Assim como o
instrumento é adaptado à natureza da coisa sobre a qual atua, o nome deve
ser apropriado à natureza da coisa que nomeia.
Na verdade, a argumentação socrática sustenta a adequação natural do
nome, mas num contexto cultural e artificial, de modo que a noção de
“natural” vai aos poucos sendo ressignificada como “racional”. Tanto que
quem tem a prerrogativa para julgar a obra do fabricador é o dialético – o
que sabe usar bem, o que sabe interrogar e responder. O encaminhamento da
discussão aponta para a fusão das perspectivas naturalista e convencionalista:
se há um nome por natureza (racional), esse nome não é menos estabelecido
(racionalmente) pelo técnico. Quanto à atribuição de nomes, algumas
variáveis são discutidas (391d-394b), tais como o sujeito responsável pela
atribuição (deuses ou homens; homens ou mulheres) ou o poder que tem o
nome de mostrar, tornar evidente (delôo) a coisa nomeada, o trabalho da
matéria fonética em favor (ou não) da significação sendo pensadopor
analogia com os remédios (ta phármaka).
É no contexto da postulação dos primeiros nomes (a partir de 421c) que
será desenvolvida a teoria da nomeação como imitação (mímesis) e do nome
como imagem da coisa nomeada. A busca por um nome que não fosse
composto por outros nomes indica elementos da linguagem que devessem ir
além (ou aquém) da linguagem; se os primeiros nomes não têm outros nomes
sobre os quais repousar, como podem significar ou esclarecer os seres que
nomeiam (422e)?
As coisas têm sons, formas e cores, mas o nomear não opera do mesmo
modo que a música ou a pintura; o nomear visa a ousía da coisa: o imitar
com letras e sílabas deve visar o (ser) em si de cada coisa, para fazer ver, a
cada vez, o que é e o que não é; a diferença do nomear é que ele tem a
pretensão mais elevada em termos de apreender e mostrar. É assim que, para
se compreender o modo próprio de imitar pelo nome, é preciso reconhecer
sua especificidade.
A atribuição de nomes passa a ser então uma relação calcada na
semelhança (mas sobre um fundo de diferenciação): atribuir cada nome
segundo a semelhança do ser nomeado; atribuir um único nome ou misturar
muitos. Nomear é uma operação análoga à da pintura, trata-se de distinguir e
misturar tinturas (phármaka), mas cada imagem fabricada exige sua tintura
14
própria (424e). De um único elemento relativo a uma única coisa a muitos
elementos juntos (constituindo sílabas), à reunião de sílabas (compondo-se
nomes), à reunião de nomes (compondo-se expressões ou locuções
predicativas); finalmente, reunindo tudo, nomes e expressões, configura-se
algo de grande, belo e total, como a pintura. Tal é a técnica onomástica (ou
retórica? tanto faz o nome!), através da qual se constitui o discurso (lógos)
(425a).
Assim é retomada em detalhe a analogia com a técnica, esboçada em
termos gerais nas primeiras seções do diálogo. Seguem discussões sobre o
nomear correto ou incorreto (falso/verdadeiro), a diferenciação entre o nome
e a coisa de que ele é nome etc.
Vou me deter ainda no problema da negação da linguagem, cuja
interpretação, a meu ver, exige que tenhamos uma compreensão integrada
das duas dimensões do diálogo referidas acima, por ser um tema nuclear ao
movimento dialético do Crátilo. Essa questão põe em jogo os limites e as
possibilidades da linguagem no pensamento de Platão, sendo evocada ou
retomada em outros textos importantes, como a Carta VII e o Fedro, em
contextos dialógicos diferentes.
Na passagem 423b do Crátilo, um exercício de pensamento que se tornou
clássico faz a argumentação convergir para a negação da linguagem: sem voz
e sem língua, como mostraríamos as coisas uns aos outros? Fazendo sinais
com o corpo? Mimetizando a natureza da coisa, ou seja, tornando os corpos
tão semelhantes quanto possível a ela? O que diferencia a linguagem da
mímica? O que diferencia a linguagem da música? Qual a especificidade do
nomear, esse poder que pretende fazer ver algo através da voz (do som)?
Como fazer a imitação da essência da coisa, através de letras e sílabas
(sons)? É a partir dos nomes, mas não nos nomes enquanto tais, que se pode
“ver” os seres mesmos (423d-424d).
Ao final da seção etimológica (421c), ao tratar de certos termos
fundamentais como verdade (alétheia), mentira (pseudós), ser (ón) e mesmo
do próprio nome (ónoma), Sócrates desmembra os termos em seus elementos
constitutivos, levantando o problema do “nome do nome”, ou dos “primeiros
nomes”. Os elementos tomados de modo fragmentado parecem não remeter a
nenhuma retidão (ou significação), incapacidade cognitiva que poderia ser
atribuída ao suposto caráter bárbaro desses termos ou fragmentos de termos.
Talvez por sua antiguidade os primeiros nomes sejam inacessíveis. O
antigo modo de falar seria bárbaro, pelo fato de os falantes torcerem (ou
distorcerem) os nomes em todas as direções, não chegando a nada que fosse
comparável à língua de hoje (421d). A remissão de uma parte do nome às
suas partes e assim sucessivamente aparece como a possibilidade (e o risco)
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de os interlocutores se lançarem numa regressão ao infinito (421e).
Sócrates: Se sempre que alguém fala o porquê de um nome, sua resposta vem através de uma
verbalização, o porquê desta, mais uma vez, só será falado através de outra verbalização. Desse modo,
iniciada uma pesquisa, não há como pausar o que está sendo feito. Portanto, não seria obrigatória
alguma abstenção na declaração de uma resposta para se chegar a um final?
Hermógenes: Na minha opinião, sim.
Sócrates: Mas quando seria justo para quem se abstém de declarar reclamar? (421e-422a. Trad. Celso
Vieira)
Ou seja, Sócrates pede que reflitam sobre a possibilidade de, a cada vez,
um interlocutor levantar questões e problemas sem cessar, buscando os
termos ou locuções de que é formado cada um dos nomes, e assim por
diante; o outro interlocutor acabaria por desistir de falar (421d-422a)! Esse
interlocutor, forçado cada vez mais a enfrentar a impossibilidade de falar,
teria que parar em algum momento (422a), ou seja, quando chegasse aos
nomes que são os elementos dos outros nomes. Se esses primeiros nomes são
mesmo elementos primeiros, eles não podem ser compostos por outros
nomes. Se os nomes que estão investigando agora são elementos, é preciso
mudar de registro, é preciso examinar sua correção de outro modo.
Se todos os nomes analisados antes remetem aos nomes-elementos, é
assim que deve ser feito. Ou seja, para aquém ou para além dos nomes-
elementos, o estudo da linguagem deve ir além da linguagem. Se os
primeiros nomes não têm outros nomes sobre os quais se sustentarem, como
poderiam jogar alguma luz sobre os seres que nomeiam?
Por um lado, esse pensamento do limite ou da fronteira parece ser um
delírio, para o qual Sócrates sugere que o remédio é o diálogo, ou seja, o
exame compartilhado; o interlocutor será o limitador, dando retorno ao que
investiga, indicando sua sensatez ou loucura. Por outro lado, pensar que
chegaram ao limite além do qual não há mais nomes funciona também como
um “exercício de pensamento” que lhes permite avançar na pesquisa. E se
não houvesse mais nomes?
Sócrates: Responda-me o seguinte: se não tivéssemos voz nem língua, mas quiséssemos evidenciar as
coisas aos outros, não nos proporíamos, assim como os mudos de agora, a sinalizar com as mãos, a
cabeça e o resto do corpo? (422e. Trad. Celso Vieira)
Ou seja, Sócrates pede que seu interlocutor retire as consequências de
uma eventual negação da linguagem (ausência de voz, de língua) para nosso
persistente desejo de querer mostrar e fazer ver as coisas uns aos outros:
teríamos que agir como aqueles que estão atualmente sem voz, fazendo
sinais com o corpo.
É desse modo e nesse momento preciso da argumentação que é
16
introduzido o vocabulário da mímesis, lançando o recurso teórico de se
pensar o nome como um tipo de imagem.
Na verdade, há uma primeira passagem que aborda os nomes como
imagens de maneira francamente negativa. No início do diálogo, ao criticar a
perspectiva relativista adotada por Hermógenes, a partir de um viés
protagórico Sócrates questiona a redução de todas as diferenças ao “mesmo”
de uma identidade aleatória. Se tudo é semelhante a tudo, para todo mundo,
ao mesmo tempo e sempre, não poderia haver diferença entre bons e maus,
virtude e vício. Por isso, não se pode aceitar o fluxo extremo decorrente do
relativismo, pois “as coisas não são jogadas para cima e para baixo por
nossas imagens” (phantásmati) (386d9-e1), ou seja, as coisas não podem ser
compreendidas apenas pelo fluxo de imagens que fabricamos delas.
Essa crítica da representação imagética vem associada ao fluxo radical e à
pretensão cognitiva da percepção sensível, por ela mesma. A refutação, que é
mais uma simples contraposição, é de fundo ético-político: se não se pode
diferenciar quem sabe de quem não sabe, não se pode estabelecer quem é
justo e quem não é; ora, a phrónesis e sua negação são alguma coisa (386b-
d). Para além das imagens, é preciso levar em conta a natureza em si e
estável das coisas.
Alguns estudiososcontemporâneos reconhecem uma diferenciação sutil
mas efetiva na ontologia implícita às etimologias: até 411, no contexto dos
nomes divinos, há uma afirmação da relação entre movimento e repouso,
alguma estabilidade é reconhecida como limite para o fluxo (como, por
exemplo, o estudo etimológico do nome de Héstia, associado a ousía, a
essência tomada como referência estável e firme); a partir de 411, ao
contrário, prevalece o mobilismo radical; mas a exploração do mobilismo é
pontuada por críticas à sua falta de limites, como, por exemplo, em 414d6-9,
quando Sócrates diz que se for permitido acrescentar e retirar dos nomes o
que se quiser, qualquer nome poderá significar qualquer coisa.
Trata-se, nesse contexto, de descartar a aleatoriedade de nossas
representações, como se qualquer imagem valesse para qualquer coisa, sem
critérios. Por outro lado, há ainda uma dimensão construtiva na
argumentação, que não é mais meramente crítica ou negativa. Poderíamos
dizer que há mesmo uma valorização do mesmo ou da semelhança, ainda que
dentro de certos limites.
Para mostrarmos o que está no alto seria preciso levantar as mãos,
“mimetizando a natureza mesma da coisa”. O significar ficaria reduzido ao
registro mínimo do assemelhar-se; para “fazer ver” um animal “tornaríamos
nossos corpos e nossas posturas tão semelhantes quanto possível aos deles”
(423a). Através do corpo, seria obtido um recurso para fazer ver (mostrar)
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alguma coisa; desse modo, “o corpo imitaria de modo verossímil o que
quisesse fazer ver” (423b).
O nome é, portanto, um tipo de imitação (mímema) da coisa. Tal como as
pinturas, deve-se distribuir os nomes como fazemos com as imagens, ou seja,
atribuir a imagem do homem ao homem e a da mulher à mulher (430b-c).
Mas existe uma especificidade no nome-imagem: não se deve conferir à
imagem todos os detalhes da coisa imitada, sob pena de não se ter mais uma
imagem, mas duas coisas iguais (dois Crátilos, e não Crátilo e uma imagem
de Crátilo); a correção própria à semelhança da imagem-nome é a que
comporta a diferença (432b). A especificidade do signo é que ele não deve
ser totalmente assimilável à coisa significada (ou ele perderia sua eficácia
significante), o que abre a possibilidade do erro, da incorreção. Por outro
lado, a variabilidade do signo (nome-imagem) exige que ele possa ser um
signo falso (incorreto), para poder ser um verdadeiro signo. Essa dificuldade
exigirá finalmente a referência ao týpos (que nesse contexto retoma as
formulações anteriores, feitas em termos de phýsis e eídos).
Ao final, fica claro como Sócrates articula os dois critérios, as duas
perspectivas em uma terceira via: a noção de semelhança vai sendo
conduzida do plano visual (pintura) para o plano do inteligível (significação
pela nomeação); o assemelhar-se pode ser físico ou sígnico, mas a exigência
é que não haja supressão do outro pelo mesmo, mas composição entre os
dois, tornando-os permeáveis a ponto de o conjunto final ser um amálgama
intricado de identidade e diferença, condição para o lógos significante. É
assim que, nessa terceira direção, que é a posição construída pelo
personagem Sócrates, aos poucos se explicita a pretensão epistêmica da
filosofia platônica, formulada em perspectiva ontológica: um caminho
original entre as duas possibilidades contrapostas desde o início; a exigência
de posição das formas inteligíveis orienta a pesquisa entre o nome natural e a
convenção linguística.
Edições e traduções do Crátilo
Platonis Opera – T.I tetralogias I-II continens [insunt Euthyphro, Apologia, Crito,
Phaedo, Cratylus, Theaetetus, Sophista, Politicus], recognoverunt brevique
adnotatione critica instruxerunt W.A. Duke, W.F. Hicken, W.S.M. Nicoll, D.B.
Robinson et J.C.G. Strachan. Oxford: Oxford Claredon Press, 1995.
PLATÃO. Teeteto e Crátilo. Trad. Carlos Alberto Nunes. Belém: UFPA, 1988.
PLATÃO. Crátilo. Trad. Pe. Dias Palmeira. Lisboa: Livraria Sá da Costa
Editora, 1994.
PLATÃO. Crátilo. Trad. Maria José Figueiredo. Lisboa: Instituto Piaget, 2001.
PLATÓN. Cratilo. Trad. Francisco Samaranch. Madrid: Aguilar, 1966.
18
PLATÓN. Cratilo. Trad. Ute Schmidt Osmanczik. Ciudad de México: UNAM,
1988.
PLATONE. Cratilo. Trad. M. Luisa Gatti. Roma: Rusconi, 1991.
PLATONE. Cratilo. Trad. Francesco Aronadio. Roma: Editori Laterza, 1996.
PLATON. Cratyle. Trad. Louis Méridier. Paris: Les Belles Lettres, 1950.
PLATON. Cratyle. Trad. Émile Chambry. Paris: GF-Flammarion, 1967.
PLATON. Cratyle. Trad. Catherine Dalimier. Paris: GF-Flammarion, 1998.
PLATO. Cratylus. Trad. H. N. Fowler. Cambridge: Harvard University Press,
1996.
PLATO. Cratylus. Trad. C. D. C. Reeve. Indianapolis/Cambridge: Hackett,
1997.
Marcelo P. Marques
FAFICH/UFMG
Agosto 2013
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Texto bilíngue: português-grego
Texto em português
Texto em grego
CRÁTILO
OU SOBRE A CORREÇÃO DOS NOMES[1]
Personagens: Hermógenes (H) {EPM}, Crátilo (C) {KP} e Sócrates (S) {ΣΩ.}.
H. Você quer compartilhar a nossa fala com o Sócrates aqui?
{ΕΡΜ.} Βούλει οὖν καὶ Σωκράτει τῷδε ἀνακοινωσώμεθα τὸν λόγον;
C. Se for essa a sua opinião…
{ΚΡ.} Εἴ σοι δοκεῖ.
H. Sócrates, o Crátilo diz existir uma correção dos nomes inerente à natureza de cada
um dos seres. Um nome não seria isto que alguns, pronunciando partes de seu idioma,
convencionaram usar para chamar. Haveria sim uma correção inerente aos nomes, a
mesma para todos, gregos ou estrangeiros.[2] Diante disso, eu lhe pergunto se
“Crátilo” é mesmo o seu nome verdadeiro. Ele confirma. “E qual seria o de
Sócrates?”, eu digo. “Sócrates”, segundo ele. “Logo, para todos os outros seres
humanos, o nome com o qual chamamos cada um é o nome de cada um deles?” Aí
ele me vem com essa: “O nome ‘Hermógenes’ não é o seu, nem se todos os seres
humanos lhe chamam com ele”. Mas quando eu, apetecido por alguma especificação,
pergunto-lhe o porquê da sua fala, ele nada me esclarece. E mais, ainda me ironiza,
sugerindo ter no intelecto uma especificação através da qual, caso quisesse me
declarar claramente, faria-me confirmar e falar o mesmo que ele fala.[3] Por isso, se
você tiver como completar a lição de Crátilo, eu o ouviria com prazer. Ainda mais
prazeroso seria pesquisar consigo a sua própria opinião acerca da correção dos
nomes, se assim você quiser.
{ΕΡΜ.} Κρατύλος φησὶν ὅδε, ὦ Σώκρατες, ὀνόματος 383.a.5 ὀρθότητα εἶναι ἑκάστῳ
τῶν ὄντων φύσει πεφυκυῖαν, καὶ οὐ τοῦτο εἶναι ὄνομα ὃ ἄν τινες συνθέμενοι καλεῖν
καλῶσι, τῆς αὑτῶν φωνῆς μόριον ἐπιφθεγγόμενοι, ἀλλὰ ὀρθότητά τινα τῶν 383.b.1
ὀνομάτων πεφυκέναι καὶ Ἕλλησι καὶ βαρβάροις τὴν αὐτὴν ἅπασιν. ἐρωτῶ οὖν αὐτὸν
ἐγὼ εἰ αὐτῷ Κρατύλος τῇ ἀληθείᾳ ὄνομα [ἐστὶν ἢ οὔ]· ὁ δὲ ὁμολογεῖ. “Τί δὲ
Σωκράτει;” ἔφην. “Σωκράτης,” ἦ δ’ ὅς. “Οὐκοῦν καὶ τοῖς ἄλλοις 383.b.5 ἀνθρώποις
πᾶσιν, ὅπερ καλοῦμεν ὄνομα ἕκαστον, τοῦτό ἐστιν ἑκάστῳ ὄνομα;” ὁ δέ, “Οὔκουν
σοί γε,” ἦ δ’ ὅς, “ὄνομα Ἑρμογένης, οὐδὲ ἂν πάντες καλῶσιν ἄνθρωποι.” καὶ ἐμοῦ
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ἐρωτῶντος καὶ προθυμουμένου εἰδέναι ὅτι ποτὲ 384.a.1 λέγει, οὔτε ἀποσαφεῖ οὐδὲν
εἰρωνεύεταί τε πρός με, προςποιούμενός τι αὐτὸς ἐν ἑαυτῷ διανοεῖσθαι ὡς εἰδὼς περὶ
αὐτοῦ, ὃ εἰ βούλοιτο σαφῶς εἰπεῖν, ποιήσειεν ἂν καὶ ἐμὲ ὁμολογεῖν καὶ λέγειν ἅπερ
αὐτὸς λέγει. εἰ οὖν πῃ ἔχεις 384.a.5 συμβαλεῖν τὴν Κρατύλου μαντείαν, ἡδέως ἂν
ἀκούσαιμι· μᾶλλον δὲ αὐτῷ σοι ὅπῃ δοκεῖ [ἔχειν] περὶ ὀνομάτων ὀρθότητος ἔτι ἂν
ἥδιον πυθοίμην, εἴ σοι βουλομένῳ [ἐστίν].
S. Hermógenes, filho de Hipônico, você tem que aprender com o antigo provérbio: “o
charmoso é custoso”. Acontece que um aprendizado sobre os nomes não é coisa
pequena. Se eu já tivesse ouvido a apresentação de 50 Dracmas de Pródico com a
qual, segundo ele, o ouvinte começa sua instrução, nada o distanciaria de uma
especificação imediata da verdade acerca da correção dos nomes. Porém, como até
agora eu só ouvi a de 1 Dracma, ainda não posso especificar aonde está essa verdade.
Mesmo assim, eu me prontifico a partilhar de uma investigação com você e o Crátilo.
Quando ele diz que “Hermógenes”, na verdade, não é o seu nome, eu suspeito que
seja um deboche. Talvez ele ache que se você tivesse os genes de Hermes, o deus do
comércio,jamais perderia posses na aquisição de bens. Já especificar aquilo que você
falava antes é mais custoso. Para estabelecermos uma posição comum é preciso
averiguar se é do jeito que você ou o Crátilo fala.
{ΣΩ.} Ὦ παῖ Ἱππονίκου Ἑρμόγενες, παλαιὰ παροιμία ὅτι 384.b. χαλεπὰ τὰ καλά
ἐστιν ὅπῃ ἔχει μαθεῖν· καὶ δὴ καὶ τὸ περὶ τῶν ὀνομάτων οὐ σμικρὸν τυγχάνει ὂν
μάθημα. εἰ μὲν οὖν ἐγὼ ἤδη ἠκηκόη παρὰ Προδίκου τὴν πεντηκοντάδραχμον
ἐπίδειξιν, ἣν ἀκούσαντι ὑπάρχει περὶ τοῦτο πεπαιδεῦσθαι, ὥς 384.b.5 φησιν ἐκεῖνος,
οὐδὲν ἂν ἐκώλυέν σε αὐτίκα μάλα εἰδέναι τὴν ἀλήθειαν περὶ ὀνομάτων ὀρθότητος·
νῦν δὲ οὐκ ἀκήκοα, 384.c.1 ἀλλὰ τὴν δραχμιαίαν. οὔκουν οἶδα πῇ ποτε τὸ ἀληθὲς
ἔχει περὶ τῶν τοιούτων· συζητεῖν μέντοι ἕτοιμός εἰμι καὶ σοὶ καὶ Κρατύλῳ κοινῇ. ὅτι
δὲ οὔ φησί σοι Ἑρμογένη ὄνομα εἶναι τῇ ἀληθείᾳ, ὥσπερ ὑποπτεύω αὐτὸν σκώπτειν·
384.c.5 οἴεται γὰρ ἴσως σε χρημάτων ἐφιέμενον κτήσεως ἀποτυγχάνειν ἑκάστοτε.
ἀλλ’, ὃ νυνδὴ ἔλεγον, εἰδέναι μὲν τὰ τοιαῦτα χαλεπόν, εἰς τὸ κοινὸν δὲ καταθέντας
χρὴ σκοπεῖν εἴτε ὡς σὺ λέγεις ἔχει εἴτε ὡς Κρατύλος.
H. Sócrates, para mim, após ter discutido várias vezes sobre isso com muitos outros,
não consigo ser persuadido de que haja uma outra correção para um nome além de
uma convenção confirmada. Na minha opinião, se alguém coloca um nome numa
coisa, este está correto. Depois disso, se for mudado para um outro, e ninguém mais
chamar pelo primeiro, o novo não vai ser menos correto do que o anterior. É o mesmo
caso de quando mudamos o nome de algum serviçal: o posterior à mudança não é
menos correto do que aquele que foi estabelecido primeiro. Nenhum nome é inerente
à natureza de nada, ele apenas segue as normas e hábitos de quem o habilitou ao
chamar. No entanto, se não for assim, eu me prontifico a aprender dando ouvidos ao
Crátilo ou a qualquer outro.
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{ΕΡΜ.} Καὶ μὴν ἔγωγε, ὦ Σώκρατες, πολλάκις δὴ καὶ 384.c.10 τούτῳ διαλεχθεὶς καὶ
ἄλλοις πολλοῖς, οὐ δύναμαι πεισθῆναι 384.d.1 ὡς ἄλλη τις ὀρθότης ὀνόματος ἢ
συνθήκη καὶ ὁμολογία. ἐμοὶ γὰρ δοκεῖ ὅτι ἄν τίς τῳ θῆται ὄνομα, τοῦτο εἶναι τὸ
ὀρθόν· καὶ ἂν αὖθίς γε ἕτερον μεταθῆται, ἐκεῖνο δὲ μηκέτι καλῇ, οὐδὲν ἧττον τὸ
ὕστερον ὀρθῶς ἔχειν τοῦ προτέρου, 384.d.5 ὥσπερ τοῖς οἰκέταις ἡμεῖς μετατιθέμεθα
[οὐδὲν ἧττον τοῦτ’ εἶναι ὀρθὸν τὸ μετατεθὲν τοῦ πρότερον κειμένου]· οὐ γὰρ φύσει
ἑκάστῳ πεφυκέναι ὄνομα οὐδὲν οὐδενί, ἀλλὰ νόμῳ καὶ ἔθει τῶν ἐθισάντων τε καὶ
καλούντων. εἰ δέ πῃ ἄλλῃ 384.e.1ἔχει, ἕτοιμος ἔγωγε καὶ μανθάνειν καὶ ἀκούειν οὐ
μόνον παρὰ Κρατύλου, ἀλλὰ καὶ παρ’ ἄλλου ὁτουοῦν.
S. Talvez seja como você está falando, Hermógenes, mas vamos verificar. Você diz
que o nome de cada um é aquele pelo qual alguém o chama?
{ΣΩ.} Ἴσως μέντοι τὶ λέγεις, ὦ Ἑρμόγενες· σκεψώμεθα δέ. ὃ ἂν φῂς καλῇ τις
ἕκαστον, τοῦθ’ ἑκάστῳ ὄνομα;
H. É a minha opinião.
{ΕΡΜ.} Ἔμοιγε δοκεῖ.
S. Ainda se quem chama for uma pessoa em particular ou toda a cidade?
{ΣΩ.} Καὶ ἐὰν ἰδιώτης καλῇ καὶ ἐὰν πόλις; 385.a.5
H. Tenho dito.
{ΕΡΜ.} Φημί.
S. O quê? Se eu chamo um ser, por exemplo, o que agora chamamos de humano: se
eu proclamo tratar-se de um cavalo, e ao cavalo proclamo humano, então, para o
povo, seu nome vai ser “humano” enquanto que para mim, em particular, vai ser
“cavalo”? E, ao contrário, o que para mim, em particular, tem o nome de “humano”
vai ser, para o povo, “cavalo”? É isso que você está falando?[4]
{ΣΩ.} Τί οὖν; ἐὰν ἐγὼ καλῶ ὁτιοῦν τῶν ὄντων, οἷον ὃ νῦν καλοῦμεν ἄνθρωπον, ἐὰν
ἐγὼ τοῦτο ἵππον προςαγορεύω, ὃ δὲ νῦν ἵππον, ἄνθρωπον, ἔσται δημοσίᾳ μὲν ὄνομα
ἄνθρωπος τῷ αὐτῷ, ἰδίᾳ δὲ ἵππος; καὶ ἰδίᾳ μὲν αὖ 385.a.10 ἄνθρωπος, δημοσίᾳ δὲ
ἵππος; οὕτω λέγεις;
H. É a minha opinião.
{ΕΡΜ.} Ἔμοιγε δοκεῖ.
S. Venha cá, declare-me o seguinte. Existe algo que se chama de falar a verdade ou
falsidade?
{ΣΩ.} Φέρε δή μοι τόδε εἰπέ· καλεῖς τι ἀληθῆ λέγειν καὶ ψευδῆ;
H. Sim.
{ΕΡΜ.} Ἔγωγε. 385.b.5
S. Portanto, haveria algumas falas verdadeiras e outras falsas?
22
{ΣΩ.} Οὐκοῦν εἴη ἂν λόγος ἀληθής, ὁ δὲ ψευδής;
H. Exato.
{ΕΡΜ.} Πάνυ γε.
S. Nesse caso, verdadeiro seria falar o que existe assim como é, e falso, como não é?
{ΣΩ.} Ἆρ’ οὖν οὗτος ὃς ἂν τὰ ὄντα λέγῃ ὡς ἔστιν, ἀληθής· ὃς δ’ ἂν ὡς οὐκ ἔστιν,
ψευδής;
H. Isso.
{ΕΡΜ.} Ναί. 385.b.10
S. Logo, numa fala, é possível falar aquilo que existe tanto como é quanto como não
é?
{ΣΩ.} Ἔστιν ἄρα τοῦτο, λόγῳ λέγειν τὰ ὄντα τε καὶ μή;
H. Exatamente.
{ΕΡΜ.} Πάνυ γε. 385.c.1
S. Uma fala verdadeira é verdadeira no todo, mas suas partes não seriam verdadeiras?
{ΣΩ.} Ὁ λόγος δ’ ἐστὶν ὁ ἀληθὴς πότερον μὲν ὅλος ἀληθής, τὰ μόρια δ’ αὐτοῦ οὐκ
ἀληθῆ;
H: Não, também as partes o são.
{ΕΡΜ.} Οὔκ, ἀλλὰ καὶ τὰ μόρια.
S: Apenas as partes grandes são verdadeiras e as pequenas não, ou todas elas o são?
{ΣΩ.} Πότερον δὲ τὰ μὲν μεγάλα μόρια ἀληθῆ, τὰ δὲ 385.c.5σμικρὰ οὔ· ἢ πάντα;
H: Acho que todas elas.
{ΕΡΜ.} Πάντα, οἶμαι ἔγωγε.
S: Você pode me falar uma parte menor de uma fala do que o nome?
{ΣΩ.} Ἔστιν οὖν ὅτι λέγεις λόγου σμικρότερον μόριον ἄλλο ἢ ὄνομα;
H: Não, ele é a menor.
{ΕΡΜ.} Οὔκ, ἀλλὰ τοῦτο σμικρότατον.
S: Então, podemos falar que um nome faz parte de uma fala verdadeira?
{ΣΩ.} Καὶ τοῦτο [ὄνομα] ἄρα τὸ τοῦ ἀληθοῦς λόγου λέγεται;
H: Isso.
{ΕΡΜ.} Ναί.
S: Uma parte verdadeira, como você disse?
{ΣΩ.} Ἀληθές γε, ὡς φῄς.
H: Isso.
23
{ΕΡΜ.} Ναί.
S: E a parte de uma fala falsa não seria falsa?
{ΣΩ.} Τὸ δὲ τοῦ ψεύδους μόριον οὐ ψεῦδος;
H: Seria.
{ΕΡΜ.} Φημί.
S: Logo, como numa fala, também seria possível falar um nome falso ou verdadeiro?
[5]
{ΣΩ.} Ἔστιν ἄρα ὄνομα ψεῦδος καὶ ἀληθὲς λέγειν, εἴπερ καὶ λόγον; 385.d.1
H. Como não?
{ΕΡΜ.} Πῶς γὰρ οὔ;
S. E o que cada um diz ser o nome de cada um seria o seu nome?
{ΣΩ.} Ὃ ἂν ἄρα ἕκαστος φῇ τῳ ὄνομα εἶναι, τοῦτό ἐστιν ἑκάστῳ ὄνομα;
H. Sim.
{ΕΡΜ.} Ναί. 385.d.5
S. Quais sejam os nomes que qualquer um disser para cada um, assim que forem
ditos, eles o serão?
{ΣΩ.} Ἦ καὶ ὁπόσα ἂν φῇ τις ἑκάστῳ ὀνόματα εἶναι, τοσαῦτα ἔσται καὶ τότε ὁπόταν
φῇ;
H. Eu não defendo outra senão esta correção dos nomes, Sócrates. Para mim, um
nome que eu coloquei me serve para chamar algo, enquanto, para você, serve-lhe um
outro nome colocado por você. Do mesmo modo que em cada cidade eu vejo um
estabelecimento particular de nomes diferentes para as mesmas coisas, tanto entre
gregos e outros gregos quanto entre gregos e estrangeiros.
{ΕΡΜ.} Οὐ γὰρ ἔχω ἔγωγε, ὦ Σώκρατες, ὀνόματος ἄλλην ὀρθότητα ἢ ταύτην, ἐμοὶ
μὲν ἕτερον εἶναι καλεῖν ἑκάστῳ ὄνομα, ὃ ἐγὼ ἐθέμην, σοὶ δὲ ἕτερον, ὃ αὖ σύ. οὕτω
δὲ καὶ. 385.e.1 ταῖς πόλεσιν ὁρῶ ἰδίᾳ [ἑκάσταις] ἐνίοις ἐπὶ τοῖς αὐτοῖς κείμενα
ὀνόματα, καὶ Ἕλλησι παρὰ τοὺς ἄλλους Ἕλληνας, καὶ Ἕλλησι παρὰ βαρβάρους.
S. Vamos ver, Hermógenes. Os seres lhe parecem ter uma existência particular para
cada um de nós? Tal qual falou Protágoras quando falava que o ser humano seria “a
medida de tudo que há”?[6] Nesse caso, as coisas são para mim assim como elas me
parecem ser e são para você assim como elas lhe parecem. Ou, na sua opinião, elas
possuem alguma estabilidade própria na existência?
{ΣΩ.} Φέρε δὴ ἴδωμεν, ὦ Ἑρμόγενες, πότερον καὶ τὰ ὄντα 385.e.5 οὕτως ἔχειν σοι
φαίνεται, ἰδίᾳ αὐτῶν ἡ οὐσία εἶναι ἑκάστῳ, ὥσπερ Πρωταγόρας ἔλεγεν λέγων
“πάντων χρημάτων 386.a.1 μέτρον” εἶναι ἄνθρωπον – ὡς ἄρα οἷα μὲν ἂν ἐμοὶ
φαίνηται τὰ πράγματα [εἶναι], τοιαῦτα μὲν ἔστιν ἐμοί· οἷα δ’ ἂν σοί, τοιαῦτα δὲ σοί –
24
ἢ ἔχειν δοκεῖ σοι αὐτὰ αὑτῶν τινα βεβαιότητα τῆς οὐσίας;
H. Sócrates, num outro momento, desorientado, eu me deixei levar pelo que
Protágoras falava. No entanto, esta já não é a minha opinião.
{ΕΡΜ.} Ἤδη ποτὲ ἔγωγε, ὦ Σώκρατες, ἀπορῶν καὶ ἐνταῦθα ἐξηνέχθην εἰς ἅπερ
Πρωταγόρας λέγει· οὐ πάνυ τι μέντοι μοι δοκεῖ οὕτως ἔχειν.
S. O quê? Em algum momento você tendeu para a opinião de que não existia algo
como um ser humano imprestável?
{ΣΩ.} Τί δέ; ἐς τόδε ἤδη ἐξηνέχθης, ὥστε μὴπάνυ σοι 386.b.1δοκεῖν εἶναί τινα
ἄνθρωπον πονηρόν;
H. Por Zeus, nunca! Já sofri o bastante para poder opinar que alguns humanos não
prestam, aliás, a maioria deles.
{ΕΡΜ.} Οὐ μὰ τὸν Δία, ἀλλὰ πολλάκις δὴ αὐτὸ πέπονθα, ὥστε μοι δοκεῖν πάνυ
πονηροὺς εἶναί τινας ἀνθρώπους, καὶ μάλα συχνούς.
S. O quê? Na suaopinião, não existem seres humanos muito competentes?
{ΣΩ.} Τί δέ; πάνυ χρηστοὶ οὔπω σοι ἔδοξαν εἶναι [ἄνθρω-ποι];
H. É claro, mas apenas alguns.
{ΕΡΜ.} Καὶ μάλα ὀλίγοι.
S. Na sua opinião?
{ΣΩ.} Ἔδοξαν δ’ οὖν;
H. Na minha.
{ΕΡΜ.} Ἔμοιγε. 386.b.10
S. Nesse caso, poderíamos estabelecer que os muito competentes são muito sensatos e
os muito imprestáveis são muito insensatos?
{ΣΩ.} Πῶς οὖν τοῦτο τίθεσαι; ἆρ’ ὧδε· τοὺς μὲν πάνυ χρηστοὺς πάνυ φρονίμους,
τοὺς δὲ πάνυ πονηροὺς πάνυ ἄφρονας; 386.c.1
H. Na minha opinião, seria assim.
{ΕΡΜ.} Ἔμοιγε δοκεῖ οὕτως.
S. Por outro lado, se Protágoras falava a verdade, e a verdade dele é que as coisas
existem segundo a opinião de cada um, alguns de nós seriam sensatos e outros,
insensatos?
{ΣΩ.} Οἷόν τε οὖν [ἐστιν], εἰ Πρωταγόρας ἀληθῆ ἔλεγεν καὶ ἔστιν αὕτη ἡ ἀλήθεια, τὸ
οἷα ἂν δοκῇ ἑκάστῳ τοιαῦτα καὶ εἶναι, τοὺς μὲν ἡμῶν φρονίμους εἶναι, τοὺς δὲ
ἄφρονας; 386.c.5
H. De jeito nenhum.
{ΕΡΜ.} Οὐ δῆτα.
25
S. Portanto, uma vez que existem os sensatos e os insensatos, eu acho que também na
sua opinião aquilo que Protágoras falava ser a verdade não serve de princípio. Nesse
tipo de verdade ninguém seria mais sensato do que o outro, já que a opinião de cada
um vai ser a verdadeira para si.
{ΣΩ.} Καὶ ταῦτά γε, ὡς ἐγᾦμαι, σοὶ πάνυ δοκεῖ, φρονήσεως οὔσης καὶ ἀφροσύνης μὴ
πάνυ δυνατὸν εἶναι Πρωταγόραν ἀληθῆ λέγειν· οὐδὲν γὰρ ἄν που τῇ ἀληθείᾳ ὁ
ἕτερος τοῦ ἑτέρου φρονιμώτερος εἴη, εἴπερ ἃ ἂν ἑκάστῳ 386.d.1 δοκῇ ἑκάστῳ ἀληθῆ
ἔσται.
H. Isso mesmo.
{ΕΡΜ.} Ἔστι ταῦτα.
S. Mas também não acho que a sua opinião seja como a de Eutidemo, segundo a qual
tudo existe para todos do mesmo jeito, ao mesmo tempo e para sempre. Pois
tampouco haveria humanos competentes ou imprestáveis se virtude e maldade
existissem sempre do mesmo jeito para todos.
{ΣΩ.} Ἀλλὰ μὴν οὐδὲ κατ’ Εὐθύδημόν γε οἶμαι σοὶ δοκεῖ πᾶσι πάντα ὁμοίως εἶναι
ἅμα καὶ ἀεί· οὐδὲ γὰρ ἂν οὕτως 386.d.5 εἶεν οἱ μὲν χρηστοί, οἱ δὲ πονηροί, εἰ ὁμοίως
ἅπασι καὶ ἀεὶ ἀρετή τε καὶ κακία εἴη.
H. É verdade.
{ΕΡΜ.} Ἀληθῆ λέγεις.
S. Então, se os seres não estão sempre do mesmo jeito, ao mesmo tempo e para todos,
nem cada um está para cada um, fica evidente que eles têm alguma existência estável,
própria a si mesmos, que não é relativa a nós, nem vai, arrastada por nós, para cima e
para baixo, com a nossa imaginação. Eles mesmos possuem uma existência própria
que lhes é inerente.[7]
{ΣΩ.} Οὐκοῦν εἰ μήτε πᾶσι πάντα ἐστὶν ὁμοίως ἅμα καὶ ἀεί, μήτε ἑκάστῳ ἰδίᾳ
ἕκαστον [τῶν ὄντων ἐστίν], δῆλον δὴ 386.e.1ὅτι αὐτὰ αὑτῶν οὐσίαν ἔχοντά τινα
βέβαιόν ἐστι τὰ πράγματα, οὐ πρὸς ἡμᾶς οὐδὲ ὑφ’ ἡμῶν ἑλκόμενα ἄνω καὶ κάτω τῷ
ἡμετέρῳ φαντάσματι, ἀλλὰ καθ’ αὑτὰ πρὸς τὴν αὑτῶν οὐσίαν ἔχοντα ᾗπερ πέφυκεν.
386.e.5
H. Sou dessa opinião, Sócrates.
{ΕΡΜ.} Δοκεῖ μοι, ὦ Σώκρατες, οὕτω.
S. Isso lhes seria inerente, enquanto que com as ações não seria da mesma maneira?
Ou as ações não têm, elas mesmas, uma espécie de existência?
{ΣΩ.} Πότερον οὖν αὐτὰ μὲν ἂν εἴη οὕτω πεφυκότα, αἱ δὲ πράξεις αὐτῶν οὐ κατὰ
τὸν αὐτὸν τρόπον; ἢ οὐ καὶ αὗται ἕν τι εἶδος τῶν ὄντων εἰσίν, αἱ πράξεις;
H. Têm mesmo.
26
{ΕΡΜ.} Πάνυ γε καὶ αὗται. 387.a.1
S. Portanto, também as ações atuam conforme sua própria natureza e não segundo a
nossa opinião. Se nos propusermos a cortar algo que existe, por exemplo, convém
cortarmos cada qual como quisermos e com aquilo que quisermos ou convém
querermos cortar segundo a natureza inerente ao cortar e ao ser cortado? Desse modo,
agindo corretamente, cortaremos algo de pleno para nós enquanto que, errando,
contra a natureza, sequer agiremos.
{ΣΩ.} Κατὰ τὴν αὑτῶν ἄρα φύσιν καὶ αἱ πράξεις πράττονται, οὐ κατὰ τὴν ἡμετέραν
δόξαν. οἷον ἐάν τι ἐπιχειρήσωμεν ἡμεῖς τῶν ὄντων τέμνειν, πότερον ἡμῖν τμητέον
[ἐστὶν] ἕκαστον ὡς ἂν ἡμεῖς βουλώμεθα καὶ ᾧ ἂν βουληθῶμεν, ἢ ἐὰν μὲν κατὰ τὴν
φύσιν βουληθῶμεν ἕκαστον τέμνειν τοῦ τέμνειν τε καὶ τέμνεσθαι καὶ ᾧ πέφυκε,
τεμοῦμέν τε καὶ πλέον τι ἡμῖν ἔσται καὶ ὀρθῶς πράξομεν τοῦτο, ἐὰν δὲ παρὰ φύσιν,
ἐξαμαρτησόμεθά τε καὶ οὐδὲν πράξομεν; 387.b.1
H. Essa é a minha opinião.
{ΕΡΜ.} Ἔμοιγε δοκεῖ οὕτω.
S. Então, se nos propusermos a queimar algo, deve-se queimar, não segundo a
opinião de todos, mas da maneira correta? E ainda, deve-se queimar como for
inerente a cada um e ser queimado com o que lhe for inerente?
{ΣΩ.} Οὐκοῦν καὶ ἐὰν κάειν τι ἐπιχειρήσωμεν, οὐ κατὰ πᾶσαν δόξαν δεῖ κάειν, ἀλλὰ
κατὰ τὴν ὀρθήν; αὕτη δ’ ἐστὶν ᾗ ἐπεφύκει ἕκαστον κάεσθαί τε καὶ κάειν καὶ ᾧ
ἐπεφύκει; 387.b.5
H. Isso mesmo.
{ΕΡΜ.} Ἔστι ταῦτα.
S. Assim também nos outros casos?
{ΣΩ.} Οὐκοῦν καὶ τἆλλα οὕτω;
H. Exatamente.
{ΕΡΜ.} Πάνυ γε.
S. E o falar não é mais uma dentre as ações?
{ΣΩ.} Ἆρ’ οὖν οὐ καὶ τὸ λέγειν μία τις τῶν πράξεών ἐστιν; 387.b.10
H. É.
{ΕΡΜ.} Ναί.
S. Então, quem fala seguindo sua própria opinião sobre como convém falar vai falar
corretamente ou estará errado e sequer vai fazer algo? E quem fala conforme a
natureza de como falar e com o que se fala vai fazer algo de pleno ao se expressar?
{ΣΩ.} Πότερον οὖν ᾗ ἄν τῳ δοκῇ λεκτέον εἶναι, ταύτῃ 387.c.1λέγων ὀρθῶς λέξει, ἢ
ἐὰν μὲν ᾗ πέφυκε τὰ πράγματα λέγειν τε καὶ λέγεσθαι καὶ ᾧ, ταύτῃ καὶ τούτῳ λέγῃ,
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πλέον τέ τι ποιήσει καὶ ἐρεῖ· ἂν δὲ μή, ἐξαμαρτήσεταί τε καὶ οὐδὲν ποιήσει;
H. Na minha opinião, é como você fala.
{ΕΡΜ.} Οὕτω μοι δοκεῖ ὡς λέγεις.
S. E o nomear não é uma parte do falar? Pois as falas são faladas através de nomes.
{ΣΩ.} Οὐκοῦν τοῦ λέγειν μόριον τὸ ὀνομάζειν; διονομάζοντες γάρ που λέγουσι τοὺς
λόγους.
H. Exatamente.
{ΕΡΜ.} Πάνυ γε.
S. Portanto, como o falar, também o nomear é uma ação, uma ação relativa às coisas.
{ΣΩ.} Οὐκοῦν καὶ τὸ ὀνομάζειν πρᾶξίς [τίς] ἐστιν, εἴπερ 387.c.10 καὶ τὸ λέγειν
πρᾶξίς τις ἦν περὶ τὰ πράγματα;
H. Isso.
{ΕΡΜ.} Ναί. 387.d.1
S. E as ações parecem existir não para nós, mas tendo alguma natureza particular a si
mesmas?
{ΣΩ.} Αἱ δὲ πράξεις ἐφάνησαν ἡμῖν οὐ πρὸς ἡμᾶς οὖσαι, ἀλλ’ αὑτῶν τινα ἰδίαν
φύσιν ἔχουσαι;
H. Isso mesmo.
{ΕΡΜ.} Ἔστι ταῦτα.
S. Logo, caso se almeje confirmar o que foi dito antes, convém nomear, não como
quisermos, mas sim seguindo a natureza de como nomear e com o que devem ser
nomeadas as coisas. Desse modo, e não de outro, faríamos algo de pleno ao
nomearmos?
{ΣΩ.} Οὐκοῦν καὶ ὀνομαστέον [ἐστὶν] ᾗ πέφυκε τὰ πρά387.d.5 γματα ὀνομάζειν τε
καὶ ὀνομάζεσθαι καὶ ᾧ, ἀλλ’ οὐχ ᾗ ἂν ἡμεῖς βουληθῶμεν, εἴπερ τι τοῖς ἔμπροσθεν
μέλλει ὁμολογούμενον εἶναι; καὶ οὕτω μὲν ἂν πλέον τι ποιοῖμεν καὶ ὀνομάζοιμεν,
ἄλλως δὲ οὔ;
H. Parece-me que sim.
{ΕΡΜ.} Φαίνεταί μοι. 387.d.10
S. Mas, venha cá, dizemos que quem deve cortar, deve cortar com algo?
{ΣΩ.} Φέρε δή, ὃ ἔδει τέμνειν, ἔδει τῳ, φαμέν, τέμνειν;
H. Isso.
{ΕΡΜ.} Ναί. 387.e.1
S. E quem deve cardar, deve cardar com algo? Assim como quem deve furar, deve
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furar com algo?
{ΣΩ.} Καὶ ὃ ἔδει κερκίζειν, ἔδει τῳ κερκίζειν; καὶ ὃ ἔδει τρυπᾶν, ἔδει τῳ τρυπᾶν;
H. Exatamente.
{ΕΡΜ.} Πάνυ γε.
S. Então, também quem deve nomear, deve nomear com algo?
{ΣΩ.} Καὶ ὃ ἔδει δὴ ὀνομάζειν, ἔδει τῳ ὀνομάζειν;
H. Isso mesmo.
{ΕΡΜ.} Ἔστι ταῦτα.
S. Mas o que seria aquilo com o que se deve furar?
{ΣΩ.} Τί δὲ ἦν ἐκεῖνο ᾧ ἔδει τρυπᾶν;
H. Uma furadeira.
{ΕΡΜ.} Τρύπανον.
S. E com o que cardar?
{ΣΩ.} Τί δὲ ᾧ κερκίζειν; 388.a.5
H. Uma carda.
{ΕΡΜ.} Κερκίς.
S. E com o que nomear?
{ΣΩ.} Τί δὲ ᾧ ὀνομάζειν;
H. Um nome.
{ΕΡΜ.} Ὄνομα.
S. Bem falado! Portanto, o nome é também um instrumento.
{ΣΩ.} Εὖ λέγεις. ὄργανον ἄρα τί ἐστι καὶ τὸ ὄνομα.
H. Exatamente.
{ΕΡΜ.} Πάνυ γε. 388.a.10
S. Mas se eu perguntasse: “Que instrumento é uma carda?”. Não seria aquele com o
qual cardamos?
{ΣΩ.} Εἰ οὖν ἐγὼ ἐροίμην “Τί ἦν ὄργανον ἡ κερκίς;” οὐχᾧ κερκίζομεν;
H. Seria.
{ΕΡΜ.} Ναί. 388.b.1
S. E o que executamos enquanto cardamos? Não distinguimos a trama e as urdiduras
emaranhadas?
{ΣΩ.} Κερκίζοντες δὲ τί δρῶμεν; οὐ τὴν κρόκην καὶ τοὺς στήμονας συγκεχυμένους
διακρίνομεν;
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H. Isso.
{ΕΡΜ.} Ναί.
S. E você também não teria algo a declarar acerca da furadeira e dos outros
instrumentos?
{ΣΩ.} Οὐκοῦν καὶ περὶ τρυπάνου ἕξεις οὕτως εἰπεῖν καὶ περὶ τῶν ἄλλων;
H. Com certeza.
{ΕΡΜ.} Πάνυ γε.
S. Logo, vocêtambém teria algo a declarar acerca do nome? Sendo o nome um
instrumento, quando nomeamos, o que fazemos?
{ΣΩ.} Ἔχεις δὴ καὶ περὶ ὀνόματος οὕτως εἰπεῖν; ὀργάνῳ ὄντι τῷ ὀνόματι
ὀνομάζοντες τί ποιοῦμεν;
H. Isso eu não tenho como falar.
{ΕΡΜ.} Οὐκ ἔχω λέγειν. 388.b.10
S. Não informamos algo aos outros e distinguimos as coisas como são?[8]
{Σ.} Ἆρ’ οὐ διδάσκομέν τι ἀλλήλους καὶ τὰ πράγματα διακρίνομεν ᾗ ἔχει;
H. Isso.
{ΕΡΜ.} Πάνυ γε.
S. Portanto, o nome é um tipo de instrumento informativo e distintivo da existência
assim como a carda do tecido.
{ΣΩ.} Ὄνομα ἄρα διδασκαλικόν τί ἐστιν ὄργανον καὶ 388.c.1διακριτικὸν τῆς οὐσίας
ὥσπερ κερκὶς ὑφάσματος.
H. Sim.
{ΕΡΜ.} Ναί.
S. E a carda é do tecelão?
{ΣΩ.} Ὑφαντικὸν δέ γε ἡ κερκίς;
H. Como não?
{ΕΡΜ.} Πῶς δ’ οὔ; 388.c.5
S. Para um tecelão usar com charme uma carda, “com charme” seria a moda da
tecelagem. E no caso de quem informa com um nome, “com charme” seria de
maneira informativa.[9]
{ΣΩ.} Ὑφαντικὸς μὲν ἄρα κερκίδι καλῶς χρήσεται, καλῶς δ’ ἐστὶν ὑφαντικῶς·
διδασκαλικὸς δὲ ὀνόματι, καλῶς δ’ ἐστὶ διδασκαλικῶς.
H. Isso.
{ΕΡΜ.} Ναί.
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S. Mas, ao usar a carda, um tecelão há de usar com charme o produto de quem?
{ΣΩ.} Τῷ τίνος οὖν ἔργῳ ὁ ὑφάντης καλῶς χρήσεται ὅταν τῇ κερκίδι χρῆται;
H. Do carpinteiro.
{ΕΡΜ.} Τῷ τοῦ τέκτονος.
S. De todo carpinteiro ou daquele que tem a técnica?
{ΣΩ.} Πᾶς δὲ τέκτων ἢ ὁ τὴν τέχνην ἔχων;
H. Daquele que tem a técnica.
{ΕΡΜ.} Ὁ τὴν τέχνην. 388.d.1
S. E, ao usar a furadeira, o furador há de usar com charme o produto de quem?
{ΣΩ.} Τῷ τίνος δὲ ἔργῳ ὁ τρυπητὴς καλῶς χρήσεται ὅταν τῷ τρυπάνῳ χρῆται;
H. Do ferreiro.
{ΕΡΜ.} Τῷ τοῦ χαλκέως.
S. De todo ferreiro ou daquele que tem a técnica?
{ΣΩ.} Ἆρ’ οὖν πᾶς χαλκεὺς ἢ ὁ τὴν τέχνην ἔχων;
H. Daquele que tem a técnica.
{ΕΡΜ.} Ὁ τὴν τέχνην.
S. Certo. Mas e quem informa, quando usa o nome, há de usar o produto de quem?
{ΣΩ.} Εἶεν. τῷ δὲ τίνος ἔργῳ ὁ διδασκαλικὸς χρήσεται ὅταν τῷ ὀνόματι χρῆται;
H. Para esse caso não tenho ninguém.
{ΕΡΜ.} Οὐδὲ τοῦτ’ ἔχω.
S. Não tem nada a declarar sobre aqueles que nos fornecem os nomes que usamos?
{ΣΩ.} Οὐδὲ τοῦτό γ’ ἔχεις εἰπεῖν, τίς παραδίδωσιν ἡμῖν τὰ ὀνόματα οἷς χρώμεθα;
H. Não mesmo.
{ΕΡΜ.} Οὐ δῆτα.
S. Você não é da opinião de que a normatização nos fornece isso?
{ΣΩ.} Ἆρ’ οὐχὶ ὁ νόμος δοκεῖ σοι [εἶναι] ὁ παραδιδοὺς αὐτά;
H. Aparentemente.
{ΕΡΜ.} Ἔοικεν. 388.e.1
S. Então, quem informa há de usar o produto do normatizador quando usa um nome?
{ΣΩ.} Νομοθέτου ἄρα ἔργῳ χρήσεται ὁ διδασκαλικὸς ὅταν ὀνόματι χρῆται;
H. Na minha opinião, sim.
{ΕΡΜ.} Δοκεῖ μοι.
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S. Na sua opinião, todo homem é um normatizador ou apenas quem tem a técnica?
{ΣΩ.} Νομοθέτης δέ σοι δοκεῖ πᾶς εἶναι ἀνὴρ ἢ ὁ τὴν τέχνην ἔχων;
H. Apenas quem tem a técnica.
{ΕΡΜ.} Ὁ τὴν τέχνην.
S. Então, Hermógenes, um nome não pode ser colocado por um humano qualquer,
mas apenas pelo nomeador dentre eles. E, aparentemente, este seria o normatizador, o
produtor mais difícil de se gerar entre os humanos.
{ΣΩ.} Οὐκ ἄρα παντὸς ἀνδρός, ὦ Ἑρμόγενες, ὄνομα θέσθαι 389.a.1 [ἐστὶν] ἀλλά
τινος ὀνοματουργοῦ· οὗτος δ’ ἐστίν, ὡς ἔοικεν, ὁ νομοθέτης, ὃς δὴ τῶν δημιουργῶν
σπανιώτατος ἐν ἀνθρώποις γίγνεται.
H. Aparentemente.
{ΕΡΜ.} Ἔοικεν. 389.a.5
S. Em frente! Vamos verificar para que olha o normatizador quando coloca os nomes.
Convém rever os exemplos anteriores. Um carpinteiro cria uma carda olhando para
quê? Ora, não seria para aquilo que é, por natureza, para cardar?
{ΣΩ.} Ἴθι δή, ἐπίσκεψαι ποῖ βλέπων ὁ νομοθέτης τὰ ὀνόματα τίθεται· ἐκ τῶν
ἔμπροσθεν δὲ ἀνάσκεψαι. ποῖ βλέπων ὁ τέκτων τὴν κερκίδα ποιεῖ; ἆρ’ οὐ πρὸς
τοιοῦτόν τι ὃ ἐπεφύκει κερκίζειν;
H. Exatamente.
{ΕΡΜ.} Πάνυ γε. 389.b.1
S. Mas como? Se ao fazer uma carda ela se quebrar, de que jeito ele vai fazer outra?
Olhando para a carda quebrada ou para aquela especificação para a qual ele também
olhava enquanto fazia a que se quebrou?
{ΣΩ.} Τί δέ; ἂν καταγῇ αὐτῷ ἡ κερκὶς ποιοῦντι, πότερον πάλιν ποιήσει ἄλλην πρὸς
τὴν κατεαγυῖαν βλέπων, ἢ πρὸς ἐκεῖνο τὸ εἶδος πρὸς ὅπερ καὶ ἣν κατέαξεν ἐποίει;
H. Para a última, na minha opinião.
{ΕΡΜ.} Πρὸς ἐκεῖνο, ἔμοιγε δοκεῖ. 389.b.5
S. Portanto, seria mais justo que chamássemos a esta mesma de “carda”?[10]
{ΣΩ.} Οὐκοῦν ἐκεῖνο δικαιότατ’ ἂν αὐτὸ ὃ ἔστιν κερκὶς καλέσαιμεν;
H. Na minha opinião, sim.
{ΕΡΜ.} Ἔμοιγε δοκεῖ.
S. Então, caso se devesse fazer uma carda para um tecido suave ou grosso, de linho
ou lã ou qualquer outro, todas elas deveriam ter a especificação da carda? Elas
seguem melhor sua natureza quando é aplicada uma mesma natureza a cada produto?
{ΣΩ.} Οὐκοῦν ἐπειδὰν δέῃ λεπτῷ ἱματίῳ ἢ παχεῖ ἢ λινῷ ἢ ἐρεῷ ἢ ὁποιῳοῦν τινι
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κερκίδα ποιεῖν, πάσας μὲν δεῖ τὸ 389.b.10 τῆς κερκίδος ἔχειν εἶδος, οἵα δ’ ἑκάστῳ
καλλίστη ἐπεφύκει, 389.c.1 ταύτην ἀποδιδόναι τὴν φύσιν εἰς τὸ ἔργον ἕκαστον;
H. Sim.
{ΕΡΜ.} Ναί.
S. E seria da mesma maneira com os outros instrumentos. Descoberta a natureza de
cada instrumento, deve-se aplicá-la naturalmente naquilo de que ele é feito. Não
como cada um queira, mas como for natural. Aparentemente, deve-se ter a
consciência de colocar uma natureza, por exemplo, de um furador em cada ferro,
segundo a natureza.
{ΣΩ.} Καὶ περὶ τῶν ἄλλων δὴ ὀργάνων ὁ αὐτὸς τρόπος· τὸ φύσει ἑκάστῳ πεφυκὸς
ὄργανον ἐξευρόντα δεῖ ἀποδοῦναι 389.c.5 εἰς ἐκεῖνο ἐξ οὗ ἂν ποιῇ [τὸ ἔργον], οὐχ
οἷον ἂν αὐτὸς βουληθῇ, ἀλλ’ οἷον ἐπεφύκει. τὸ φύσει γὰρ ἑκάστῳ, ὡς ἔοικε,
τρύπανον πεφυκὸς εἰς τὸν σίδηρον δεῖ ἐπίστασθαι τιθέναι.
H. Exato.
{ΕΡΜ.} Πάνυ γε.
S. E também, para cada carda por natureza, uma natureza na madeira.
{ΣΩ.} Καὶ τὴν φύσει κερκίδα ἑκάστῳ πεφυκυῖαν εἰς ξύλον. 389.c.10
H. Isso mesmo.
{ΕΡΜ.} Ἔστι ταῦτα. 389.d.1
S. Portanto, aparentemente, há uma especificação da natureza do tecido em cada
carda, bem como nos outros casos.
{ΣΩ.} Φύσει γὰρ ἦν ἑκάστῳ εἴδει ὑφάσματος, ὡς ἔοικεν, ἑκάστη κερκίς, καὶ τἆλλα
οὕτως.
H. Isso.
{ΕΡΜ.} Ναί.
S. Então, meu caro, o normatizador deve também ter a consciência de colocar uma
natureza inerente a cada nome através dos sons e sílabas. E, caso almeje ser um perito
na colocação de nomes, ele deve fazer e colocar todos os nomes olhando para aquilo
mesmo de que este é um nome. Além disso, não devemos sequer questionar por que
cada normatizador não usa as mesmas sílabas já que tampouco todo ferreiro usa o
mesmo ferro só porque está fazendo um mesmo instrumento. Ainda que seja num
outro ferro, tudo vai ficar igual se ele aplicar uma mesma especificação. Portanto, vai
ser feito um instrumento igualmente correto seja no nosso idioma ou em um
estrangeiro.[11]
{ΣΩ.} Ἆρ’ οὖν, ὦ βέλτιστε, καὶ τὸ ἑκάστῳ φύσει πεφυκὸς 389.d.5ὄνομα τὸν
νομοθέτην ἐκεῖνον εἰς τοὺς φθόγγους καὶ τὰς συλλαβὰς δεῖ ἐπίστασθαι τιθέναι, καὶ
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βλέποντα πρὸς αὐτὸ ἐκεῖνο ὃ ἔστιν ὄνομα, πάντα τὰ ὀνόματα ποιεῖν τε καὶ τίθεσθαι,
εἰ μέλλει κύριος εἶναι ὀνομάτων θέτης; εἰ δὲ μὴ εἰς τὰς αὐτὰς συλλαβὰς ἕκαστος ὁ
νομοθέτης τίθησιν, οὐδὲν 389.e.1δεῖ τοῦτο ἀ<μφι>γνοεῖν· οὐδὲ γὰρ εἰς τὸν αὐτὸν
σίδηρον ἅπας χαλκεὺς τίθησιν, τοῦ αὐτοῦ ἕνεκα ποιῶν τὸ αὐτὸ ὄργανον· ἀλλ’ ὅμως,
ἕως ἂν τὴν αὐτὴν ἰδέαν ἀποδιδῷ, ἐάντε 390.a.1 ἐν ἄλλῳ σιδήρῳ, ὅμως ὀρθῶς ἔχει τὸ
ὄργανον, ἐάντε ἐνθάδε ἐάντε ἐν βαρβάροις τις ποιῇ. ἦ γάρ;
H. Exatamente.
{ΕΡΜ.} Πάνυ γε.
S. Logo, você vai valorizar um normatizador, daqui ou estrangeiro, caso ele aplique a
especificação correspondente a cada nome usando qualquer tipo de sílaba? Um
normatizador não é inferior por ser daqui ou de qualquer outro lugar.
{ΣΩ.} Οὐκοῦν οὕτως ἀξιώσεις καὶ τὸν νομοθέτην τόν τεἐνθάδε καὶ τὸν ἐν τοῖς
βαρβάροις, ἕως ἂν τὸ τοῦ ὀνόματος εἶδος ἀποδιδῷ τὸ προσῆκον ἑκάστῳ ἐν
ὁποιαισοῦν συλλαβαῖς, οὐδὲν χείρω νομοθέτην εἶναι τὸν ἐνθάδε ἢ τὸν ὁπουοῦν
ἄλλοθι;
H. Exato.
{ΕΡΜ.} Πάνυ γε. 390.b.1
S. Mas quem vai reconhecer se a especificação correspondente a uma carda foi
estabelecida em uma madeira qualquer? O carpinteiro que faz ou o costureiro que há
de usá-la?
{ΣΩ.} Τίς οὖν ὁ γνωσόμενος εἰ τὸ προσῆκον εἶδος κερκίδος ἐν ὁποιῳοῦν ξύλῳ
κεῖται; ὁ ποιήσας, ὁ τέκτων, ἢ ὁ χρησόμενος [ὁ] ὑφάντης;
H: É mais aceitável que seja quem há de usar, Sócrates.
{ΕΡΜ.}Εἰκὸς μὲν μᾶλλον, ὦ Σώκρατες, τὸν χρησόμενον. 390.b.5
S. E quem há de usar o produto do fazedor de liras não seria também o melhor para
nos conscientizar acerca da sua produção e, uma vez produzido, ter a consciência de
que ela foi boa ou não?
{ΣΩ.} Τίς οὖν ὁ τῷ τοῦ λυροποιοῦ ἔργῳ χρησόμενος; ἆρ’ οὐχ οὗτος ὃς ἐπίσταιτο ἂν
ἐργαζομένῳ κάλλιστα ἐπιστατεῖν καὶ εἰργασμένον γνοίη εἴτ’ εὖ εἴργασται εἴτε μή;
H. Exato.
{ΕΡΜ.} Πάνυ γε.
S. Mas quem?
{ΣΩ.} Τίς; 390.b.10
H. O citarista.
{ΕΡΜ.} Ὁ κιθαριστής.
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S. E quem, no caso do fabricante de navios?
{ΣΩ.} Τίς δὲ ὁ τῷ τοῦ ναυπηγοῦ; 390.c.1
H. O piloto.
{ΕΡΜ.} Κυβερνήτης.
S. Então quem, de nós e dos estrangeiros, seria melhor para nos conscientizar acerca
da produção do normatizador e, uma vez produzida, de ponderar sobre ela? Não seria
quem há de usá-la?
{ΣΩ.} Τίς δὲ τῷ τοῦ νομοθέτου ἔργῳ ἐπιστατήσειέ τ’ ἂν κάλλιστα καὶ εἰργασμένον
κρίνειε καὶ ἐνθάδε καὶ ἐν τοῖς βαρβάροις; ἆρ’ οὐχ ὅσπερ χρήσεται; 390.c.5
H. Seria.
{ΕΡΜ.} Ναί.
S. Ora, e este não seria quem toma consciência perguntando?
{ΣΩ.} Ἆρ’ οὖν οὐχ ὁ ἐρωτᾶν ἐπιστάμενος οὗτός ἐστιν;
H: Exatamente.
{ΕΡΜ.} Πάνυ γε.
S. E respondendo também?
{ΣΩ.} Ὁ δὲ αὐτὸς καὶ ἀποκρίνεσθαι;
H. Isso.
{ΕΡΜ.} Ναί. 390.c.10
S. E quem toma consciência perguntando e respondendo você chama por outro nome
que não “dialético”?
{ΣΩ.} Τὸν δὲ ἐρωτᾶν καὶ ἀποκρίνεσθαι ἐπιστάμενον ἄλλο τι σὺ καλεῖς ἢ
διαλεκτικόν;
H. Não, esse mesmo.
{ΕΡΜ.} Οὔκ, ἀλλὰ τοῦτο. 390.d.1
S. Então, é trabalho do carpinteiro fazer um timão, conscientizado pelo piloto, caso
almeje que este seja um bom timão.
{ΣΩ.} Τέκτονος μὲν ἄρα ἔργον ἐστὶν ποιῆσαι πηδάλιον ἐπιστατοῦντος κυβερνήτου,
εἰ μέλλει καλὸν εἶναι τὸ πηδάλιον.
H. Parece que sim.
{ΕΡΜ.} Φαίνεται.
S. Logo, parece que, no caso do normatizador, seria um nome, e sob a
conscientização do dialético, se ele almeja que os nomes sejam colocados com
charme.
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{ΣΩ.} Νομοθέτου δέ γε, ὡς ἔοικεν, ὄνομα, ἐπιστάτην ἔχοντος διαλεκτικὸν ἄνδρα, εἰ
μέλλει καλῶς ὀνόματα θήσεσθαι.
H. É assim.[12]
{ΕΡΜ.} Ἔστι ταῦτα.
S. Hermógenes, então periga que a colocação de nomes não seja, como você acha,
algo vulgar, nem feita por homens vulgares sorteados ao acaso. Já o Crátilo fala a
verdade ao falar que os nomes existem por natureza para as coisas e que nem todos
são produtores de nomes, mas apenas aqueles que, olhando para o nome por natureza
de cada ser, segue o princípio de colocar sua especificação em letras e sílabas.
{ΣΩ.} Κινδυνεύει ἄρα, ὦ Ἑρμόγενες, εἶναι οὐ φαῦλον, ὡς σὺ οἴει, ἡ τοῦ ὀνόματος
θέσις, οὐδὲ φαύλων ἀνδρῶν οὐδὲ τῶν ἐπιτυχόντων. καὶ Κρατύλος ἀληθῆ λέγει λέγων
φύσει τὰ ὀνόματα εἶναι τοῖς πράγμασι, καὶ οὐ πάντα δημιουργὸν ὀνομάτων εἶναι,
ἀλλὰ μόνον ἐκεῖνον τὸν ἀποβλέποντα εἰς τὸ τῇ φύσει ὄνομα ὂν ἑκάστῳ καὶ
δυνάμενον αὐτοῦ τὸ εἶδος τιθέναι εἴς τε τὰ γράμματα καὶ τὰς συλλαβάς.
H. Sócrates, não preciso me contrapor ao que você fala. Ainda assim não é fácil ser
persuadido desse modo repentino. Na minha opinião, vai ser mais persuasivo se você
me apresentar o que diz ser a correção por natureza de um nome.
{ΕΡΜ.} Οὐκ ἔχω, ὦ Σώκρατες, ὅπως χρὴ πρὸς ἃ λέγεις ἐναντιοῦσθαι. ἴσως μέντοι οὐ
ῥᾴδιόν ἐστιν οὕτως ἐξαίφνης πεισθῆναι, ἀλλὰ δοκῶ μοι ὧδε ἂν μᾶλλον πιθέσθαι σοι,
εἴ μοι δείξειας ἥντινα φῂς εἶναι τὴν φύσει ὀρθότητα ὀνόματος.
S. Prezado Hermógenes, não falo nada por mim. Você se esqueceu! Há pouco eu falei
que não podia especificar, mas que verificaria consigo. Mas agora, enquanto eu e
você averiguávamos, pareceu, contrariando o início, que há de existir alguma
correção por natureza para um nome e que nem todo homem tem consciência da sua
colocação em uma coisa, ou não?
{ΣΩ.} Ἐγὼ μέν, ὦ μακάριε Ἑρμόγενες, οὐδεμίαν λέγω, ἀλλ’ ἐπελάθου γε ὧν ὀλίγον
πρότερον ἔλεγον, ὅτι οὐκ εἰδείην ἀλλὰ σκεψοίμην μετὰ σοῦ. νῦν δὲ σκοπουμένοις
ἡμῖν, ἐμοί τε καὶ σοί, τοσοῦτον μὲν ἤδη φαίνεται παρὰ τὰ πρότερα, φύσει τέ τινα
ὀρθότητα ἔχον εἶναι τὸ ὄνομα καὶ οὐ παντὸς ἀνδρὸς ἐπίστασθαι [καλῶς] αὐτὸ
πράγματι ὁτῳοῦν θέσθαι· ἢ οὔ;
H. Exato.
{ΕΡΜ.} Πάνυ γε.
S. E é assim que é preciso investigar, caso lhe apeteça especificar qual e como é a sua
correção.
{ΣΩ.} Οὐκοῦν τὸ μετὰ τοῦτο χρὴ ζητεῖν, εἴπερ ἐπιθυμεῖς 391.b.5 εἰδέναι, ἥτις ποτ’
αὖ ἐστιν αὐτοῦ ἡ ὀρθότης.
H. Especificar me apetece.
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{ΕΡΜ.} Ἀλλὰ μὴν ἐπιθυμῶ γε εἰδέναι.
S. Então averígue.
{ΣΩ.} Σκόπει τοίνυν.
H. Como é preciso averiguar?
{ΕΡΜ.} Πῶς οὖν χρὴ σκοπεῖν;
S. Meu companheiro, a verificação mais correta é junto dos conscientizadores,
financiando-lhes bens e oferecendo agradecimentos. Estes são os sofistas, a quem o
seu irmão Cálias financiou muitos bens antes de ser da opinião de que ele mesmo era
um sábio. Porém, uma vez que a herança paterna não se caracteriza como sua, é
preciso insistir com seu irmão sobre o dever dele de informar sobre a correção disso
que ele aprendeu com Protágoras.
{ΣΩ.} Ὀρθοτάτη μὲν τῆς σκέψεως, ὦ ἑταῖρε, μετὰ τῶν ἐπισταμένων, χρήματα
ἐκείνοις τελοῦντα καὶ χάριτας κατατιθέμενον. εἰσὶ δὲ οὗτοι οἱ σοφισταί, οἷσπερ καὶ ὁ
ἀδελφός 391.c.1σου Καλλίας πολλὰ τελέσας χρήματα σοφὸς δοκεῖ εἶναι. ἐπειδὴ δὲ
οὐκ ἐγκρατὴς εἶ τῶν πατρῴων, λιπαρεῖν χρὴ τὸν ἀδελφὸν καὶ δεῖσθαι αὐτοῦ διδάξαι
σε τὴν ὀρθότητα περὶ τῶν τοιούτων ἣν ἔμαθεν παρὰ Πρωταγόρου.
H. Esse dever seria para mim uma extravagância, Sócrates. Se no todo eu não aceito a
verdade de Protágoras, como os valores verbalizados numa tal verdade me
satisfariam?
{ΕΡΜ.} Ἄτοπος μεντἂν εἴη μου, ὦ Σώκρατες, ἡ δέησις, εἰ τὴν μὲν Ἀλήθειαν τὴν
Πρωταγόρου ὅλως οὐκ ἀποδέχομαι, τὰ δὲ τῇ τοιαύτῃ ἀληθείᾳ ῥηθέντα ἀγαπῴην ὥς
του ἄξια.
S. Se essa não lhe agrada, é preciso aprender com Homero e com os outros poetas.
{ΣΩ.} Ἀλλ’ εἰ μὴ αὖ σε ταῦτα ἀρέσκει, παρ’ Ὁμήρου χρὴ 391.d.1 μανθάνειν καὶ
παρὰ τῶν ἄλλων ποιητῶν.
H. O que e onde Homero fala sobre os nomes, Sócrates?
{ΕΡΜ.} Καὶ τί λέγει, ὦ Σώκρατες, Ὅμηρος περὶ ὀνομάτων, καὶ ποῦ;
S. Por todo lado! Melhor e maior é quando ele discerne os nomes pelos quais os
humanos e os deuses chamam. Você não acha espantoso falar isto sobre a correção
dos nomes? Pois é evidente que os deuses chamam mais corretamente e seguem a
natureza dos nomes. Ou você não acha?
{ΣΩ.} Πολλαχοῦ· μέγιστα δὲ καὶ κάλλιστα ἐν οἷς διορίζει ἐπὶ τοῖς αὐτοῖς ἅ τε οἱ
ἄνθρωποι ὀνόματα καλοῦσι καὶ οἱ θεοί. ἢ οὐκ οἴει αὐτὸν μέγα τι καὶ θαυμάσιον
λέγειν ἐν τούτοις περὶ ὀνομάτων ὀρθότητος; δῆλον γὰρ δὴ ὅτι οἵ γε θεοὶ αὐτὰ
καλοῦσιν πρὸς ὀρθότητα ἅπερ ἔστι φύσει ὀνόματα·ἢ σὺ οὐκ οἴει;
H. Eu posso especificar que, se eles chamam, chamam corretamente. Mas onde
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estaria isso de que você fala?
{ΕΡΜ.} Εὖ οἶδα μὲν οὖν ἔγωγε, εἴπερ καλοῦσιν, ὅτι ὀρθῶς καλοῦσιν. ἀλλὰ ποῖα
ταῦτα λέγεις;
S. Você não é capaz de especificar? Sobre o rio de Troia que sozinho combateu
Efesto[13] ele diz: “Xantos chamam-no os deuses, mas os homens, Escamandro”.[14]
{ΣΩ.}Οὐκ οἶσθα ὅτι περὶ τοῦ ποταμοῦ τοῦ ἐν τῇ Τροίᾳ, ὃς ἐμονομάχει τῷ Ἡφαίστῳ,
“ὃν Ξάνθον,” φησί, “καλέουσι θεοί, ἄνδρες δὲ Σκάμανδρον;”
H. É mesmo.
{ΕΡΜ.} Ἔγωγε. 392.a.1
S: Pois então! Não acha que isso é um sinal de conhecimento? Há mais correção em
se chamar aquele rio de Xantos do que de Escamandro? Se você quiser mais, tem
também o caso das aves, quando ele diz que: “por Falcão evocam-no os deuses, mas
os homens por Águia”.[15] Seria vulgar um tal aprendizado segundo o qual é mais
correto a mesma ave ser chamada de falcão do que de águia? E no caso de Batieia e
Mirina[16] ou de tantos outros deste e dos outros poetas? Porém, talvez isso seja muito
grande para eu e você desvelarmos. Já o caso mais humano de Escamândrio e
Astíanax, na minha opinião, é mais fácil de passar por uma verificação. Ambos são
ditos ser nomes do filho de Heitor, e deles se fala que um é o mais correto. Por certo
você pode especificar onde estão essas palavras das quais eu falo.
{ΣΩ.} Τί οὖν δή; οὐκ οἴει τοῦτο σεμνόν τι εἶναι γνῶναι, ὅπῃ ποτὲ ὀρθῶς ἔχει ἐκεῖνον
τὸν ποταμὸν Ξάνθον καλεῖν μᾶλλον ἢ Σκάμανδρον; εἰ δὲ βούλει, περὶ τῆς ὄρνιθος ἣν
λέγει ὅτι – χαλκίδα κικλῄσκουσι θεοί, ἄνδρες δὲ κύμινδιν, 392.a.5 φαῦλον ἡγῇ τὸ
μάθημα ὅσῳ ὀρθότερόν ἐστι καλεῖσθαι χαλκὶς κυμίνδιδος τῷ αὐτῷὀρνέῳ; ἢ τὴν
Βατίειάν τε καὶ Μυρίνην, 392.b.1καὶ ἄλλα πολλὰ καὶ τούτου τοῦ ποιητοῦ καὶ ἄλλων;
ἀλλὰ ταῦτα μὲν ἴσως μείζω ἐστὶν ἢ κατ’ ἐμὲ καὶ σὲ ἐξευρεῖν· ὁ δὲ Σκαμάνδριός τε καὶ
ὁ Ἀστυάναξ ἀνθρωπινώτερον διασκέψασθαι, ὡς ἐμοὶ δοκεῖ, καὶ ῥᾷον, ἅ φησιν
ὀνόματα εἶναι 392.b.5 τῷ τοῦ Ἕκτορος ὑεῖ, τίνα ποτὲ λέγει τὴν ὀρθότητα αὐτῶν.
οἶσθα γὰρ δήπου ταῦτα τὰ ἔπη ἐν οἷς ἔνεστιν ἃ ἐγὼ λέγω.
H. Claro.
{ΕΡΜ.} Πάνυ γε.
S. Então, qual dos nomes você acha que Homero supunha ter sido estabelecido mais
corretamente para a criança? Astíanax ou Escamândrio?
{ΣΩ.} Πότερον οὖν οἴει Ὅμηρον ὀρθότερον ἡγεῖσθαι τῶν 392.b.10 ὀνομάτων
κεῖσθαι τῷ παιδί, τὸν “Ἀστυάνακτα” ἢ τὸν “Σκαμάνδριον”;
H. Não tenho como falar.
{ΕΡΜ.} Οὐκ ἔχω λέγειν.
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S. Averígue o seguinte. Se alguém lhe perguntasse quem você acha que chama pelos
nomes mais corretos, seriam os mais sensatos ou insensatos?
{ΣΩ.} Ὧδε δὴ σκόπει. εἴ τις ἔροιτό σε πότερον οἴει ὀρθότερον καλεῖν τὰ ὀνόματα
τοὺς φρονιμωτέρους ἢ τοὺς ἀφρονεστέρους; 392.c.5
H. É evidente que eu diria ser os mais sensatos.
{ΕΡΜ.} Δῆλον δὴ ὅτι τοὺς φρονιμωτέρους, φαίην ἄν.
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S. Na sua opinião, para declarar o gênero num todo, quais seriam os mais sensatos
nas cidades, os homens ou as mulheres?
{ΣΩ.} Πότερον οὖν αἱ γυναῖκες ἐν ταῖς πόλεσιν φρονιμώτεραί σοι δοκοῦσιν εἶναι ἢ
οἱ ἄνδρες, ὡς τὸ ὅλον εἰπεῖν γένος;
H. Os homens.
{ΕΡΜ.} Οἱ ἄνδρες. 392.c.10
S. E, quando Homero diz que o filho de Heitor é chamado Astíanax pelos troianos
enquanto evidencia que é Escamândrio para as mulheres, você não pode especificar
que os homens lhe chamavam Astíanax?
{ΣΩ.} Οὐκοῦν οἶσθα ὅτι Ὅμηρος τὸ παιδίον τὸ τοῦ Ἕκτορος 392.d.1 ὑπὸ τῶν
Τρώων φησὶν καλεῖσθαι Ἀστυάνακτα, Σκαμάνδριον δὲ δῆλον ὅτι ὑπὸ τῶν γυναικῶν,
ἐπειδὴ οἵ γε ἄνδρες αὐτὸν Ἀστυάνακτα ἐκάλουν;
H. É aceitável.
{ΕΡΜ.} Ἔοικέ γε. 392.d.5
S. Mas também Homero não supunha os troianos serem mais sábios do que suas
mulheres?
{ΣΩ.} Οὐκοῦν καὶ Ὅμηρος τοὺς Τρῶας σοφωτέρους ἡγεῖτο ἢ τὰς γυναῖκας αὐτῶν;
H. Acho que sim.
{ΕΡΜ.} Οἶμαι ἔγωγε.
S. Logo, ele achava que Astíanax era mais correto estabelecer para a criança do que
Escamândrio?
{ΣΩ.} Τὸν “Ἀστυάνακτα” ἄρα ὀρθότερον ᾤετο κεῖσθαι τῷ παιδὶ ἢ τὸν
“Σκαμάνδριον”; 392.d.10
H. Parece que sim.
{ΕΡΜ.} Φαίνεται.
S. Averiguemos se tem por quê. Ele mesmo pressupõe para nós o porquê deste ser o
melhor quando diz “pois sozinho ele protegeu a cidade e suas grandes muralhas”.[17]
Por isso, aparentemente, haveria correção ao chamar o filho de um tal protetor de
Astíanax já que, como diz Homero, seu pai protegia a cidade.
{ΣΩ.} Σκοπῶμεν δὴ διὰ τί ποτε. ἢ αὐτὸς ἡμῖν κάλλιστα ὑφηγεῖται τὸ διότι; φησὶν γάρ
– οἶος γάρ σφιν ἔρυτο πόλιν καὶ τείχεα μακρά. 392.e.1 διὰ ταῦτα δή, ὡς ἔοικεν,
ὀρθῶς ἔχει καλεῖν τὸν τοῦ σωτῆρος ὑὸν Ἀστυάνακτα τούτου ὃ ἔσῳζεν ὁ πατὴρ
αὐτοῦ, ὥς φησιν Ὅμηρος. 392.e.5
H. Parece-me que sim.
{ΕΡΜ.} Φαίνεταί μοι.
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S. Como pode, Hermógenes? Eu mesmo não aprendi nada com isso; e você,
aprendeu?
{ΣΩ.} Τί δή ποτε; οὐ γάρ πω οὐδ’ αὐτὸς ἔγωγε μανθάνω· ὦ Ἑρμόγενες, σὺ δὲ
μανθάνεις;
H. Por Zeus, eu não!
{ΕΡΜ.} Μὰ Δί’ οὐκ ἔγωγε.
S. Ora, meu caro, mas também foi Homero que colocou em Heitor o mesmo nome?
{ΣΩ.} Ἀλλ’ ἆρα, ὠγαθέ, καὶ τῷ Ἕκτορι αὐτὸς ἔθετο τὸ ὄνομα Ὅμηρος;
H. Por quê?
{ΕΡΜ.} Τί δή;
S. Porque, na minha opinião, esse nome é bem congruente com Astíanax. Os dois, aos
gregos, aparentam ser o mesmo. Um Reitor também é quem tem a estima máxima.
Ambos são nomes da realeza, uma vez que quem rege o faz com o máximo de estima,
evidenciando seu caráter na retenção de suas posses. Ou, na sua opinião, não te falei
nada e escapei enquanto achava ter tocado numa pista sobre a opinião de Homero
acerca da correção dos nomes?
{ΣΩ.} Ὅτι μοι δοκεῖ καὶ τοῦτο παραπλήσιόν τι εἶναι τῷ Ἀστυάνακτι, καὶ ἔοικεν
Ἑλληνικοῖς ταῦτα [τὰ ὀνόματα]. ὁ γὰρ “ἄναξ” καὶ ὁ “ἕκτωρ” σχεδόν τι ταὐτὸν
σημαίνει, βασιλικὰ ἀμφότερα εἶναι τὰ ὀνόματα· οὗ γὰρ ἄν τις “ἄναξ” ᾖ, καὶ “ἕκτωρ”
δήπου ἐστὶν τούτου· δῆλον γὰρ ὅτι κρατεῖ τε αὐτοῦ καὶ κέκτηται καὶ <ἔχει> αὐτό. ἢ
οὐδέν σοι δοκῶ λέγειν, ἀλλὰ λανθάνω καὶ ἐμαυτὸν οἰόμενός τινος ὥσπερ ἴχνους
ἐφάπτεσθαι τῆς Ὁμήρου δόξης περὶ ὀνομάτων ὀρθότητος; 393.b.5
H. Não, por Zeus, sou da opinião de que talvez você tenha tocado algo.
{ΕΡΜ.} Μὰ Δί’ οὐ σύ γε, ὡς ἐμοὶ δοκεῖς, ἀλλὰ ἴσως τοῦ ἐφάπτῃ.
S. E não lhe parece, como a mim, que seja justo chamar de leão a progenitura de um
leão e cavalo a progenitura de um cavalo? Não falo de algum caso excepcional, como
se um cavalo gerasse algo diferente de um cavalo. Qual seria a progenitura natural do
progenitor, é disso que falo. Se um cavalo engendra, contra a natureza, um bezerro,
progenitura bovina por natureza, não convém chamá-lo “potro”, mas sim “bezerro”.
Tampouco acho que convenha chamar uma progenitura de “humana”, caso um
humano não gere um humano. O mesmo também para as plantas e tudo mais, ou você
não concorda?
{ΣΩ.} Δίκαιόν γέ τοί ἐστιν, ὡς ἐμοὶ φαίνεται, τὸν λέοντος ἔκγονον λέοντα καλεῖν καὶ
τὸν ἵππου ἔκγονον ἵππον. οὔ τι λέγω ἐὰν ὥσπερ τέρας γένηται ἐξ ἵππου ἄλλο τι ἢ
ἵππος, 393.c.1 ἀλλ’ οὗ ἂν ᾖ τοῦ γένους ἔκγονον τὴν φύσιν, τοῦτο λέγω· ἐὰν βοὸς
ἔκγονον φύσει ἵππος παρὰ φύσιν τέκῃ μόσχον, οὐ πῶλον κλητέον ἀλλὰ μόσχον· οὐδ’
ἂν ἐξ ἀνθρώπου οἶμαι μὴ τὸ ἀνθρώπου ἔκγονον γένηται, [ἀλλ’ ὃ ἂν] τὸ ἔκγονον
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393.c.5 ἄνθρωπος κλητέος· καὶ τὰ δένδρα ὡσαύτως καὶ τἆλλα ἅπαντα· ἢ οὐ
συνδοκεῖ;
H. Concordo.
{ΕΡΜ.} Συνδοκεῖ.
S. Falou com charme! Mas me vigie para que eu não o desencaminhe. Seguindo na
mesma fala convém ainda chamar de rei a progenitura gerada de um rei. Se o mesmo
vem assinalado com estas ou aquelas sílabas, não é nada, nem se há adição ou
subtração de alguma letra. Tudo isso não é nada se a existência característica da coisa
vem evidenciada no nome.
{ΣΩ.} Καλῶς λέγεις· φύλαττε γάρ με μή πῃ παρακρούσωμαί σε. κατὰ γὰρ τὸν αὐτὸν
λόγον κἂν ἐκ βασιλέως γίγνηταί τι ἔκγονον, βασιλεὺς κλητέος· εἰ δὲ ἐν ἑτέραις
συλλαβαῖς ἢ ἐν ἑτέραις τὸ αὐτὸ σημαίνει, οὐδὲν πρᾶγμα· οὐδ’ εἰ πρόσκειταί τι
γράμμα ἢ ἀφῄρηται, οὐδὲν οὐδὲ τοῦτο, ἕως ἂν ἐγκρατὴς ᾖ ἡ οὐσία τοῦ πράγματος
δηλουμένη ἐν τῷ ὀνόματι. 393.d.5
H. O que você está falando?
{ΕΡΜ.} Πῶς τοῦτο λέγεις;
S. Nada muito floreado. Num caso elementar fica ainda mais fácil de especificar. Nós
falamos os nomes das letras e não as letras elas mesmas. As exceções são cinco: “a”,
“e”, “i”, “o” e “u”. Para as outras, sonoras ou surdas, você pode especificar que
usamos seus nomes pois as pronunciamos envoltas em mais letras. Um nome será
correto para chamar uma letra desde que enloquemos nele algum princípio capaz de
evidenciar aquilo que evidenciamos. Um exemplo é o nome da letra jota. Veja que
não faz mal algum ter-lhe acrescentado “o”, “t” e “a”, como quis o normatizador, uma
vez que a natureza desse elemento não vai ser evidenciada pelo nome todo. Por
conseguinte, alguém foi consciencioso ao colocar com charme os nomes nas letras.
{ΣΩ.} Οὐδὲν ποικίλον, ἀλλ’ ὥσπερ τῶν στοιχείων οἶσθα ὅτι ὀνόματα λέγομεν ἀλλ’
οὐκ αὐτὰ τὰ στοιχεῖα, πλὴν τεττάρων, τοῦ Ε καὶ τοῦ Υ καὶ τοῦ Ο καὶ τοῦ Ω· τοῖς δ’
ἄλλοις φωνήεσί τε καὶ ἀφώνοις οἶσθα ὅτι περιτιθέντες ἄλλα γράμματα λέγομεν,
ὀνόματα ποιοῦντες· ἀλλ’ ἕως ἂν αὐτοῦ δηλουμένην τὴν δύναμιν ἐντιθῶμεν, ὀρθῶς
ἔχει ἐκεῖνο τὸ ὄνομα καλεῖν ὃ αὐτὸ ἡμῖν δηλώσει. οἷον τὸ “βῆτα”· ὁρᾷς ὅτι τοῦ ἦτα
καὶ τοῦ ταῦ καὶ τοῦ ἄλφα προστεθέντων οὐδὲν ἐλύπησεν, ὥστε μὴ οὐχὶ τὴν ἐκείνου
τοῦ στοιχείου φύσιν δηλῶσαι ὅλῳ τῷ ὀνόματι οὗ ἐβούλετο ὁ νομοθέτης· οὕτως
ἠπιστήθη καλῶς θέσθαι τοῖς γράμμασι τὰ ὀνόματα.
H. Na minha opinião, você fala a verdade.
{ΕΡΜ.} Ἀληθῆ μοι δοκεῖς λέγειν. 394.a.1
S. E não se pode falar o mesmo no caso do rei? Pois, em geral, de um rei virá outro
rei, de um excelente, outro excelente e de um charmoso, outro charmoso. Assim será
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para todo resto, de cada gênero virá uma mesma progenitura, caso não seja gerado
algo excepcional. Portanto, convém chamar a todos esses pelos mesmos nomes.
Porém, é possível floreá-los com sílabas até surgir uma opinião de que, pela sua
particularidade, os mesmos seres são diferentes uns dos outros. Como no caso de
remédios iguais, floreados