Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
OAB EXAME DE ORDEM DIREITO PROCESSUAL PENAL Capítulo 10 1 CAPÍTULOS Capítulo 1 – Sistemas Processuais. Princípios. Capítulo 2 – Aplicação da Lei Processual Penal. Capítulo 3 – Inquérito policial. Capítulo 4 – Ação penal. Capítulo 5 – Competência Criminal. Capítulo 6 – Das provas. Capítulo 7 – Das prisões. Capítulo 8 – Questões e processos incidentes. Capítulo 9 – Sujeitos e Comunicação dos atos. Capítulo 10 (você está aqui!) – Processo e Procedimentos. Capítulo 11 – Sentença e Nulidades Capítulo 12 – Recursos Capítulo 13 – Ações Autônomas 2 SOBRE ESTE CAPÍTULO E ai, OABeiro! Tudo certinho? A apostila de número 10 do nosso curso de Direito Processual Penal tratará sobre Processos e Procedimentos, matéria que é comumente cobrada no Exame de Ordem ao decorrer desses anos! De acordo com a nossa equipe de inteligência, esses assuntos estiveram presentes 11 VEZES nos últimos 3 anos, sendo considerados assuntos de altíssima recorrência! Tribunal do Júri, de acordo com o levantamento feito, este assunto foi cobrado 4 vezes nos últimos exames realizados. Por seu turno, o procedimento comum foi cobrado 5 vezes nas últimas provas! Por fim, mas não menos importante, O JECRIM foi cobrado apenas 2 vezes! Aqui, a banca costuma seguir o seu padrão: Apresentar um caso hipotético, pelo qual a resposta é respaldada na legislação vigente. Por isso, recomendamos a leitura atenta da letra seca da lei e entendimentos jurisprudenciais, e sempre em companhia de alguma doutrina à sua escolha. Lembre-se: A resolução de questões é a chave para a aprovação! Vamos juntos! 3 SUMÁRIO DIREITO PROCESSUAL PENAL ............................................................................................................... 6 Capítulo 10 ................................................................................................................................................ 6 10. Tema principal ................................................................................................................................... 6 8.1. Processo e Procedimento .................................................................................................................................. 6 8.1.1. Noções gerais ......................................................................................................................................................... 6 8.2. PROCEDIMENTO COMUM ORDINÁRIO ...................................................................................................... 8 8.2.1. Oferecimento da peça acusatória .................................................................................................................. 8 8.2.2. Rejeição da peça acusatória ............................................................................................................................. 9 8.2.3. Citação do acusado e resposta à acusação ........................................................................................... 10 8.2.4. Revelia ..................................................................................................................................................................... 11 8.2.5. Absolvição sumária ............................................................................................................................................ 12 8.2.6. Designação da audiência ................................................................................................................................ 15 8.2.7. Audiência una de instrução e julgamento .............................................................................................. 15 8.3. PROCEDIMENTO COMUM SUMÁRIO ....................................................................................................... 19 8.3.1. Noções gerais ...................................................................................................................................................... 19 8.3.2. Etapas do procedimento sumário............................................................................................................... 20 8.3.3. Distinção entre o procedimento comum ordinário e o procedimento comum sumário .. 21 8.4. PROCEDIMENTO ESPECIAL DO TRIBUNAL DO JÚRI........................................................................... 22 8.4.1. Noções gerais ...................................................................................................................................................... 22 8.4.2. Princípios constitucionais do júri ................................................................................................................ 23 8.4.3. Procedimento bifásico do Tribunal do Júri............................................................................................. 26 8.4.4. Iudicium accusationes (ou sumário da culpa) ....................................................................................... 27 8.4.5. Impronúncia.......................................................................................................................................................... 30 4 8.4.6. Desclassificação do delito .............................................................................................................................. 32 8.4.7. Absolvição sumária ............................................................................................................................................ 35 8.4.8. Pronúncia ............................................................................................................................................................... 37 8.4.9. Desaforamento .................................................................................................................................................... 43 8.4.10.Preparação do processo para julgamento pelo Tribunal do Júri ................................................. 46 8.4.11.Organização do Júri .......................................................................................................................................... 49 8.4.12.Sessão de julgamento ..................................................................................................................................... 54 8.4.13.Quesitação ............................................................................................................................................................ 64 8.4.14.Desclassificação .................................................................................................................................................. 69 8.4.15.Sentença ................................................................................................................................................................ 70 8.4.16. Execução provisória no caso de condenação pelo Júri a uma pena igual ou superior a 15 (quinze) anos de reclusão ........................................................................................................................................... 75 8.5. PROCEDIMENTO COMUM SUMARÍSSIMO ............................................................................................. 79 8.5.1. Competência dos Juizados Especiais Criminais .................................................................................... 81 8.5.2. Termo Circunstanciado .................................................................................................................................... 84 8.5.3. Situação de flagrância nas infrações de menor potencial ofensivo ............................................ 84 8.5.4. Fase preliminar dos Juizados ........................................................................................................................ 85 8.5.5. Oferecimentoda peça acusatória ............................................................................................................... 91 8.5.6. Representação nos crimes de lesões corporais leves e lesões culposas................................... 93 8.5.7. Suspensão condicional do processo ......................................................................................................... 93 QUADRO SINÓTICO .............................................................................................................................. 97 QUESTÕES COMENTADAS ................................................................................................................ 107 GABARITO ............................................................................................................................................ 119 QUESTÃO DESAFIO ............................................................................................................................. 120 GABARITO QUESTÃO DESAFIO ........................................................................................................ 121 5 LEGISLAÇÃO COMPILADA ................................................................................................................. 125 JURISPRUDÊNCIA ................................................................................................................................ 127 MAPA MENTAL ................................................................................................................................... 133 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ....................................................................................................... 134 6 DIREITO PROCESSUAL PENAL Capítulo 10 10. Tema principal 8.1. Processo e Procedimento 8.1.1. Noções gerais Os procedimentos são divididos em duas grandes classes: os especiais e os comuns (CPP, art. 394, caput). Art. 394. O procedimento será comum ou especial. § 1º O procedimento comum será ordinário, sumário ou sumaríssimo: I - ordinário, quando tiver por objeto crime cuja sanção máxima cominada for igual ou superior a 4 (quatro) anos de pena privativa de liberdade; II - sumário, quando tiver por objeto crime cuja sanção máxima cominada seja inferior a 4 (quatro) anos de pena privativa de liberdade III - sumaríssimo, para as infrações penais de menor potencial ofensivo, na forma da lei. Procedimento especial é todo aquele previsto no âmbito do Código de Processo Penal ou de Leis Especiais para as hipóteses legais específicas, incorporando regras próprias de tramitação processual visando à apuração dos crimes que constituem o objeto de sua disciplina. Exemplos: Procedimento dos crimes de responsabilidade dos funcionários públicos (arts. 513 a 518); Procedimento dos crimes contra a honra (arts. 519 a 523); Procedimento relativo aos 7 processos de competência do tribunal do júri (arts. 406 a 497); Lei de Drogas (Lei 11.343/2006); Procedimento dos crimes de competência originária dos tribunais (Lei 8.038/1990) etc. Já o procedimento comum é o rito padrão ditado pelo Código de Processo Penal para ser aplicado residualmente, ou seja, na apuração de crimes para os quais não haja procedimento especial previsto em lei (art. 394, § 2.º). De acordo com o art. 394, § 1.º, do CPP, o procedimento comum subdivide-se em três espécies, condicionando-se a respectiva aplicação à quantidade da pena máxima cominada in abstrato e, conforme o caso, à natureza da infração. Consistem: Procedimento comum ordinário: adequado para a apuração de crimes cuja sanção máxima cominada for igual ou superior a quatro anos de pena privativa de liberdade (art. 394, § 1.º, I). Procedimento comum sumário: destinado à apuração de crimes cuja sanção máxima cominada seja inferior a quatro anos de pena privativa de liberdade (art. 394, § 1.º, II), excluindo-se, porém, as que devam ser apuradas por meio do rito sumaríssimo. Procedimento comum sumaríssimo: cabível em relação às infrações de menor potencial ofensivo, como tal definidas as contravenções penais e os crimes a que a lei comine pena máxima não superior a dois anos, cumulada ou não com multa (art. 394, § 1.º, III). Cuida- se, em verdade, do rito adequado à apuração das infrações de competência dos juizados especiais criminais, conforme dispõe o art. 61 da Lei 9.099/1995. Há, entretanto, certos delitos cuja apuração, que apesar de submeter-se ao procedimento comum, (dada à ausência de previsão de rito especial), não obedecerá aos critérios do art. 394, § 1.º, do CPP, em face da existência de previsão legal expressa determinando regras distintas. Isto ocorre, muito especialmente, nas seguintes hipóteses: Infrações penais praticadas com violência doméstica e familiar contra a mulher: ainda que a pena máxima cominada seja igual ou inferior a 2 (dois) anos, a infração penal cometida no contexto de violência doméstica e familiar contra a mulher não será submetida ao procedimento comum sumaríssimo dos Juizados Especiais Criminais. Tais infrações devem ser processadas e julgadas perante o juízo comum, ou, se houver, pela Vara especializada de Violência Doméstica e Familiar contra a mulher, sendo o 8 procedimento comum ordinário ou sumário determinado a partir do quantum de pena cominado ao delito, nos termos do art. 394, § 1º, I e II, do CPP. Crimes tipificados no Estatuto do Idoso cuja pena máxima não ultrapasse 4 (quatro) anos: de acordo com o art. 94 da Lei n° 10.741/03, o procedimento a ser adotado neste caso será o previsto na Lei n° 9.099/95, ou seja, o procedimento comum sumaríssimo. 94 da Lei n° 10.741/03 é categórico no sentido de firmar a aplicação do procedimento comum sumaríssimo. Como se trata de lei especial, este dispositivo deve prevalecer sobre o quanto disposto no CPP. Outrossim, se a pena do crime tipificado no Estatuto do Idoso ultrapassar 4 (quatro) anos, tal delito deverá ser julgado perante o juízo comum, aplicando-se, todavia, o procedimento comum ordinário. Crimes falimentares (Lei 11.101/2005): Determina o art. 185 da Lei 11.101/2005 que, uma vez recebida a denúncia ou a queixa subsidiária, observar-se-á o rito previsto nos arts. 531 a 540 do CPP (art. 185). Ora, com as alterações introduzidas ao Código de Processo Penal pela Lei 11.719/2008, os arts. 531 a 540 citados passaram a corresponder ao procedimento sumário cujos atos estão agora sequenciados nos arts. 531 a 536 do CPP. Isto quer dizer que, independentemente de o apenamento máximo previsto a tal espécie de delitos ser inferior, igual ou superior a quatro anos, será aplicável, na respectiva apuração, o procedimento sumário, nos termos disciplinados nos aludidos arts. 531 a 536 do CPP. 8.2. Procedimento Comum Ordinário 8.2.1. Oferecimento da peça acusatória A inicial acusatória deve conter os requisitos do art. 41 do CPP, instruídas, ainda, com o mínimo de lastro probatório quanto à autoria e à materialidade do fato. Neste momento, deverão ser arroladas as testemunhas da acusação, até o máximo de 08 (oito), não incluindo nesse número as testemunhas não compromissadas (art. 401), o ofendido e os peritos que tenham atuado no feito. Quanto a estas duas últimas categorias, sua desconsideração no máximo legal decorre da circunstância de que não são testemunhas no sentido técnico do termo, tanto que são tratados 9 à parte pelos arts. 400 e 531 do CPP ao disciplinarem a ordem de produção da prova oral em audiência. Em se tratando de acusado preso, a exordial deverá ser oferecida no prazo de cinco dias e, se estiver solto, em quinze dias (art. 46). 8.2.2. Rejeição da peça acusatória O art. 395 do CPP trata das causas de rejeição da denúncia ou da queixa-crime, estabelecendo que ocorrerá nos casos em que: Art. 395. A denúncia ou queixa será rejeitada quando: I -for manifestamente inepta; II - faltar pressuposto processual ou condição para o exercício da ação penal; ou III - faltar justa causa para o exercício da ação penal. For manifestamente inepta: dá-se a inépcia da inicial quando lhe faltarem os requisitos essenciais previstos no art. 41 do CPP, quais sejam, a exposição do fato criminoso com todas suas circunstâncias e a qualificação mínima do acusado ou elementos pelos quais se possa identificá-lo, além de outros exigidos pela doutrina, como o endereçamento ao juízo competente, a assinatura do membro do Ministério Público ou do advogado do querelante e redação em vernáculo. A inépcia da peça acusatória pode ser formal ou material. Inépcia formal ocorre quando a peça acusatória não preenche os requisitos obrigatórios do art. 41 do CPP. Por outro lado, a inépcia material se dá quando não há justa causa para a ação penal, ou seja, quando a peça acusatória não está respaldada por aquele lastro probatório mínimo indispensável para a instauração de um processo penal, hipótese em que a rejeição da peça acusatória terá como fundamento o inciso III do art. 395. Faltar Pressuposto Processual ou Condição para o exercício da ação penal: consideram-se como pressupostos processuais o desencadeamento da ação penal por 10 meio da denúncia ou da queixa; a competência do juízo; a existência de partes que possam estar validamente em juízo em nome próprio ou alheio; e a originalidade da demanda (inocorrência de litispendência ou coisa julgada). Já as condições para o exercício da ação penal têm pertinência não apenas em relação às condições de procedibilidade, como a representação do Ministério Público e a requisição do Ministro da Justiça nos crimes em que a ação penal estiver condicionada a tais formalidades, como também às condições gerais da ação relacionadas à existência de legitimidade ad causam ativa e passiva, possibilidade jurídica do pedido de condenação e interesse de agir. Faltar justa causa para o exercício da ação penal: respeita, em linhas gerais, à existência de um lastro probatório mínimo que torne idônea a imputação realizada na denúncia ou na queixa. Recurso cabível contra a rejeição da peça acusatória Conforme o art. 581, inciso I, do CPP, caberá recurso em sentido estrito contra a decisão que não receber a denúncia ou a queixa. Especial atenção deve ser dispensada à Lei n° 9.099/95, que prevê que caberá apelação da decisão de rejeição da denúncia ou queixa (art. 82, caput), apelação esta que deve ser interposta no prazo de 10 (dez) dias. 8.2.3. Citação do acusado e resposta à acusação O art. 396 do CPP dispõe que, nos procedimentos ordinário e sumário, oferecida a denúncia ou queixa, o juiz, se não a rejeitar liminarmente, recebê-la-á e ordenará a citação do acusado para responder à acusação, por escrito, no prazo de dez dias. Art. 396. Nos procedimentos ordinário e sumário, oferecida à denúncia ou queixa, o juiz, se não a rejeitar liminarmente, recebê-la-á e ordenará a citação do acusado para responder à acusação, por escrito, no prazo de 10 (dez) dias. Uma vez ajuizada a inicial acusatória, caberá ao juiz verificar se, eventualmente, não se perfazem as situações mencionadas no art. 395 do CPP. Concorrendo qualquer das situações referidas nos incisos I, II e III do art. 395, deverá ele rejeitar liminarmente a exordial. Caso 11 contrário, deverá receber a denúncia ou a queixa-crime e determinar a citação do acusado para apresentar resposta, em dez dias. Não localizado para citação pessoal, será o imputado citado por edital, caso em que o processo ficará suspenso e o prazo para a apresentação de resposta apenas começará a fluir a partir de seu comparecimento pessoal ou do defensor constituído, conforme dispõe o art. 396, parágrafo único, do CPP. Art. 396. Parágrafo único. No caso de citação por edital, o prazo para a defesa começará a fluir a partir do comparecimento pessoal do acusado ou do defensor constituído. Por fim, de acordo com o art. 396-A, na resposta, o acusado poderá arguir preliminares e alegar tudo o que interesse à sua defesa, oferecer documentos e justificações, especificar as provas pretendidas e arrolar testemunhas, qualificando-as e requerendo sua intimação, quando necessário. 8.2.4. Revelia Após a citação, o acusado fica vinculado ao processo, com todos os ônus daí decorrentes. Logo, se o acusado tiver sido citado pessoalmente e deixar de apresentar resposta à acusação, o processo correrá a sua revelia, o que também irá ocorrer caso mude de endereço sem comunicar ao juízo seu novo endereço. A propósito, o art. 367 do CPP estabelece que: Art. 367. O processo seguirá sem a presença do acusado que, citado ou intimado pessoalmente para qualquer ato, deixar de comparecer sem motivo justificado, ou, no caso de mudança de residência, não comunicar o novo endereço ao juízo. 12 A revelia também será decretada se o acusado, notificado pessoalmente para qualquer ato do processo, deixar de comparecer e não justificar sua ausência. Pelo menos em regra, essa ausência deve ser justificada antes da realização do ato processual. Se aceita, deve o magistrado determinar seu adiamento. No entanto, pode haver situações em que a escusa só possa ser apresentada após a prática do ato (v.g., acidente automobilístico no dia da audiência). Caso a justificativa seja aceita pelo juiz, nada impede que seja determinada a renovação do ato, preservando-se, assim, a autodefesa à que o acusado faz jus. 8.2.5. Absolvição sumária Oferecida a resposta pelo acusado, os autos deverão ser conclusos ao juiz, ocasião em que verificará a possibilidade de antecipar, mediante juízo de valor, o resultado final da demanda, para o fim de absolver sumariamente o acusado, com fundamento no art. 397. Ressalta-se que, nesta oportunidade, a decisão do magistrado deverá seguir o critério eminentemente pro societate, o que lhe impõe, na dúvida, não absolver o réu e determinar o prosseguimento normal do processo. Julgamento antecipado da lide no processo penal O art. 397 do CPP permite que, no limiar do processo, e antes mesmo de iniciada a instrução probatória em juízo, seja o acusado absolvido sumariamente, desde que presente uma das hipóteses ali elencadas. Trata-se, à evidência, de verdadeiro julgamento antecipado da lide, nos mesmos moldes do que já existia no procedimento originário dos Tribunais e no procedimento dos crimes funcionais. Causas de absolvição sumária no procedimento comum Segundo o art. 397 do CPP, após a apresentação da resposta à acusação, o juiz deverá absolver sumariamente o acusado quando verificar: 13 Art. 397. Após o cumprimento do disposto no art. 396-A, e parágrafos, deste Código, o juiz deverá absolver sumariamente o acusado quando verificar: I - a existência manifesta de causa excludente da ilicitude do fato; II - a existência manifesta de causa excludente da culpabilidade do agente, salvo inimputabilidade; III - que o fato narrado evidentemente não constitui crime; ou IV - extinta a punibilidade do agente. I - Existência manifesta de causa excludente da ilicitude do fato: o acusado deve ser absolvido sumariamente quando o juiz estiver convencido que o crime foi praticado sob o amparo de causa excludente da ilicitude, ou seja, em estado de necessidade, legítima defesa, estrito cumprimento de dever legal e no exercício regular de direito. Também é possível a absolvição sumária com fundamento nas causas excludentes da ilicitude (justificantes) previstas na Parte Especial do Código Penal e em leis especiais (CP, arts. 128, I e II, 142, I, II e III, 146, § 3º, 150, § 3º, I e II, etc.), assim como nas causas supralegais de exclusão da ilicitude, como, por exemplo, o consentimento do ofendido; II- Existência manifestade causa excludente da culpabilidade do agente, salvo inim- putabilidade: É necessário juízo de certeza, isto é, prova estreme de dúvidas quanto à ocorrência de excludentes de culpabilidade. Na medida em que o art. 397, II, fine, do CPP ressalva a inimputabilidade do acusado como motivo de absolvição sumária, conclui-se que as excludentes de culpabilidade que permitem tal absolvição abrangem o erro de proibição inevitável (art. 21 do CP), a coação moral irresistível e a obediência hierárquica à ordem não manifestamente ilegal (art. 22 do CP) e a embriaguez fortuita completa (art. 28, § 1.º, do CP). III – Não constituir o fato infração penal: trata-se da hipótese de atipicidade da conduta: reconhecida a atipicidade formal ou material da conduta delituosa, é possível a absolvição sumária do agente. A título de exemplo, se o juiz verificar a possibilidade de aplicação do 14 princípio da insignificância, porquanto presentes seus 4 (quatro) requisitos - mínima ofensividade da conduta do agente, nenhuma periculosidade social da ação, reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e relativa inexpressividade da lesão jurídica -, deverá absolver sumariamente o agente. IV – Encontrar-se extinta a punibilidade: dentre as causas de absolvição sumária, o legislador elencou a hipótese em que o magistrado verificar a presença de causa extintiva da punibilidade (v.g., morte do agente, prescrição, decadência, etc.). Para Renato Brasileiro houve um equívoco, porquanto prevalece o entendimento de que a sentença que declara extinta a punibilidade não é absolutória, pois o magistrado declara simplesmente que o Estado não tem mais a possibilidade de aplicar sanção penal ao acusado, ou seja, não analisa se ele é inocente ou culpado. Nesse sentido, aliás, eis o teor da súmula n° 18 do STJ: “A sentença concessiva do perdão judicial é declaratória da extinção da punibilidade, não subsistindo qualquer efeito condenatório.” Distinção entre a absolvição sumária do procedimento comum e a da 1ª fase do procedimento do júri Não se pode confundir a absolvição sumária do procedimento comum com aquela da fase do procedimento do júri. Na absolvição sumária do procedimento comum, o decreto absolutório ocorre antes mesmo de iniciada a instrução processual; no âmbito do júri, ocorre ao final da 1.ª fase do procedimento bifásico, ou seja, após a realização da instrução preliminar perante o juiz sumariante. Quanto aos fundamentos, enquanto a absolvição sumária no procedimento comum pode ocorrer nas hipóteses acima mencionadas, o art. 415 do CPP estabelece que: Art. 415. O juiz, fundamentadamente, absolverá desde logo o acusado, quando: I – provada a inexistência do fato; II – provado não ser ele autor ou partícipe do fato; III – o fato não constituir infração penal; 15 IV – demonstrada causa de isenção de pena ou de exclusão do crime. Recurso adequado O recurso cabível contra a absolvição sumária é o de apelação. Afinal, trata-se de sentença definitiva de absolvição proferida por juiz singular (CPP, art. 593, inciso I)1. 8.2.6. Designação da audiência Caso o acusado não seja absolvido sumariamente, o procedimento seguirá seu curso normal. Estabelece o art. 399 do CPP que: Art. 399. Recebida a denúncia ou queixa, o juiz designará dia e hora para a audiência, ordenando a intimação do acusado, de seu defensor, do Ministério Público e, se for o caso, do querelante e do assistente. Será necessário, todavia, notificar o ato ao ofendido (vítima), conforme o art. 201, § 2.º, do CPP, ainda que não esteja ocupando a posição de querelante ou de assistente do Ministério Público e mesmo que não tenha sido requerido seu depoimento por qualquer das partes. Isso ocorre porque, conforme consta do citado art. 201, trata-se de direito do ofendido ser comunicado da data da audiência de instrução. 8.2.7. Audiência una de instrução e julgamento Do prazo e da instrução probatória em audiência A audiência de instrução e julgamento deverá ser realizada no prazo máximo de 60 dias (art. 400, caput). Ao dispor sobre esse prazo, nada disse o art. 400 do CPP se seria referente a acusado preso ou solto. Logo, conclui-se que referido prazo aplica-se a ambos. Art. 400. Na audiência de instrução e julgamento, a ser realizada no prazo máximo de 60 (sessenta) dias, proceder-se-á à tomada de declarações do ofendido, à inquirição das testemunhas arroladas pela acusação e pela 1 Vide questão 10 desse material. 16 defesa, nesta ordem, ressalvado o disposto no art. 2222 deste Código, bem como aos esclarecimentos dos peritos, às acareações e ao reconhecimento de pessoas e coisas, interrogando-se, em seguida, o acusado. Visando agilizar a marcha processual e concentrar ao máximo a realização dos atos processuais, estabeleceu o art. 400, § 1.º, que as provas serão produzidas numa só audiência, podendo o juiz indeferir as consideradas irrelevantes, impertinentes ou protelatórias. Evidentemente, esse parágrafo está se referindo à prova oral, e não a outras provas cuja natureza exija realização a posteriori (requisição de documentos, novas perícias etc.). Prova irrelevante: é aquela que, apesar de tratar do objeto da causa, não possui aptidão de influir no julgamento da causa (v.g., acareação por precatória); Prova impertinente: é aquela que não diz respeito à questão objeto de discussão no processo. Prova protelatória: é aquela que visa apenas ao retardamento do processo. Por fim, tenha em mente que nada obsta que a audiência única seja desmembrada em várias solenidades, ou seja, que se inicie em uma determinada data, mas que, pela impossibilidade de produção de todas as provas nesse mesmo dia (v.g. pelo número excessivo de testemunhas a serem ouvidas, em razão da ausência de testemunha notificada para o ato; em face do adiantado da hora etc.), tenha seu prosseguimento em outra ou outras datas distintas. Diligências O momento para o requerimento de diligências está regulamentado pelo art. 402 do CPP, que assim dispõe: Art. 402. Produzidas as provas, ao final da audiência, o Ministério Público, o querelante e o assistente e, a seguir, o acusado poderão requerer diligências cuja necessidade se origine de circunstâncias ou fatos apurados na instrução. 2 Vide questão 03 desse material 17 Esse requerimento de diligências deverá ser feito na própria audiência. Todavia, se porventura o interrogatório for feito mediante carta precatória, cuja possibilidade tem sido admitida pela doutrina e pela jurisprudência, uma vez apensado aos autos a carta precatória com o interrogatório, deverá o juiz abrir vista dos autos às partes no prazo de 5 (cinco) dias para que se manifestem quanto ao interesse na realização de diligências. Nesta fase que se segue à produção da prova oral em audiência, duas situações distintas poderão ocorrer: 1. As partes não requerem qualquer diligência ou são indeferidas pelo juiz as diligências postuladas. Em tal situação, o juiz oportunizará, imediatamente, às partes, a apresentação de alegações finais orais, concedendo, primeiro à acusação e, após, à defesa, o prazo de vinte minutos, prorrogáveis por mais dez (art. 403). Havendo mais de um acusado, o tempo previsto para a defesa de cada um será individual (§ 1.º). Se houver assistente de acusação habilitado nos autos, este, após o tempo do Ministério Público, terá dez minutos para suas alegações. Nesse caso, o tempo destinado às alegações da defesa, a serem oferecidas logo depois, também será acrescido desse quantitativo. Art. 403. Não havendo requerimento de diligências, ou sendo indeferido, serão oferecidas alegações finais orais por 20 (vinte) minutos, respectivamente, pela acusação e peladefesa, prorrogáveis por mais 10 (dez), proferindo o juiz, a seguir, sentença. § 1º Havendo mais de um acusado, o tempo previsto para a defesa de cada um será individual. Vencida esta etapa, proferirá o juiz, em audiência, sentença, sem embargo da possibilidade a ele conferida pelo art. 403, § 3.º, no sentido de, em vista da complexidade do caso ou do número de acusados, conceder às partes o prazo de cinco dias, sucessivamente, para apresentação de memoriais escritos, caso em que ele, magistrado, terá o prazo de dez dias após a conclusão dos autos para proferir sentença (art. 403, § 3.º). § 3º O juiz poderá, considerada a complexidade do caso ou o número de acusados, conceder às partes o prazo de 5 (cinco) dias sucessivamente para 18 a apresentação de memoriais. Nesse caso, terá o prazo de 10 (dez) dias para proferir a sentença. 2. O juiz determina diligências ex officio ou defere as que tenham sido requeridas pelas partes: nessa hipótese, a audiência será concluída sem as alegações finais orais (art. 404, caput). Cumpridas as diligências requeridas ou as que tiverem sido determinadas oficiosamente, serão acusação e defesa notificadas para a apresentação de memoriais escritos no prazo de cinco dias, sucessivamente, proferindo o juiz, depois, sentença em dez dias (art. 404, parágrafo único). Art. 404. Ordenado diligência considerada imprescindível, de ofício ou a requerimento da parte, a audiência será concluída sem as alegações finais. Parágrafo único. Realizada, em seguida, a diligência determinada, as partes apresentarão, no prazo sucessivo de 5 (cinco) dias, suas alegações finais, por memorial, e, no prazo de 10 (dez) dias, o juiz proferirá a sentença. Sentença Se realizadas as alegações finais em audiência, de forma oral, poderá o juiz, na própria solenidade judicial, proferir a decisão (art. 403, caput). O magistrado poderá substituir as alegações orais por memoriais escritos em face da complexidade do caso, do número de acusados (art. 403, § 3.º) ou da necessidade de serem realizadas diligências (art. 404, parágrafo único). Caso as alegações orais sejam substituídas por memoriais, o juiz terá o prazo de 10 (dez) dias para proferir a sentença (CPP, art. 403, § 3º). Neste caso, como a sentença não será proferida na própria audiência, é importante lembrar que, por força da introdução do princípio da identidade física do juiz, cabe ao magistrado que chamou os autos à conclusão proferir a sentença, o que não acontecia antes da Lei n° 11.719/08, onde havia uma desvinculação absoluta entre a colheita da prova e a figura do julgador. Registro da audiência 19 Estabelece o art. 405 do CPP que, do ocorrido em audiência, será lavrado termo assinado pelo juiz e pelas partes, contendo breve resumo dos fatos relevantes ocorridos no curso da solenidade. Art. 405. Do ocorrido em audiência será lavrado termo em livro próprio, assinado pelo juiz e pelas partes, contendo breve resumo dos fatos relevantes nela ocorridos. § 1º Sempre que possível, o registro dos depoimentos do investigado, indiciado, ofendido e testemunhas será feito pelos meios ou recursos de gravação magnética, estenotipia, digital ou técnica similar, inclusive audiovisual, destinada a obter maior fidelidade das informações. § 2º No caso de registro por meio audiovisual, será encaminhado às partes cópia do registro original, sem necessidade de transcrição. 8.3. Procedimento Comum Sumário 8.3.1. Noções gerais O procedimento comum sumário será utilizado quando tiver por objeto crime cuja sanção máxima cominada seja inferior a 4 (quatro) e superior a 2 (dois) anos de pena privativa de liberdade. É o que acontece, a título de exemplo, com o crime de homicídio culposo previsto no art. 121, § 3º, do Código Penal, cuja pena é de detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos. Necessário, porém, excluir da abrangência desse rito as infrações de menor potencial ofensivo (as contravenções penais e os crimes cuja pena máxima não ultrapasse dois anos, cumulada ou não com multa) quando em tramitação perante o juizado especial criminal, pois, de acordo com o art. 394, § 1.º, III, do CPP, nesses casos, o procedimento aplicável será o sumaríssimo. Contudo, se as infrações de competência do JECRIM forem encaminhadas ao juízo comum, v.g., em razão da necessidade de citação editalícia ou da complexidade dos fatos, deverão ser apuradas por meio do procedimento sumário, ex vi do que estabelece o art. 538 do CPP. 20 Art. 538. Nas infrações penais de menor potencial ofensivo, quando o juizado especial criminal encaminhar ao juízo comum às peças existentes para a adoção de outro procedimento, observar-se-á o procedimento sumário previsto neste Capítulo. 8.3.2. Etapas do procedimento sumário Será o procedimento comum sumário constituído das seguintes etapas: Oferecimento de denúncia ou queixa-crime: observa os requisitos do art. 41 do CPP. Poderão ser arroladas até 05 testemunhas, não computadas as que não forem sujeitas a compromisso, nos termos do art. 401, § 1.º, aplicável por força do art. 394, § 5.º. Observância, pelo juiz, das regras dos arts. 395 a 397, aplicáveis a qualquer rito em razão do que prevê o art. 394, § 4.º. Audiência de instrução, interrogatório e julgamento (art. 531): vencidas essas etapas e não tendo ocorrido a absolvição sumária prevista no art. 397 do CPP, segue- se a audiência para colheita de prova oral, que deverá ser aprazada para daí a, no máximo, 30 dias. Anote-se que o art. 533 determina que se apliquem ao rito comum sumário as regras do art. 400, pertinentes à audiência do rito comum ordinário. Reza esse dispositivo que as provas orais (depoimentos do ofendido, testemunhas, peritos e réus) serão produzidas em uma só audiência, podendo o juiz indeferir as consideradas irrelevantes, impertinentes ou protelatórias (§ 1.º). Dispõe, ainda, que a prestação de esclarecimentos pelos peritos dependerá de requerimento prévio das partes (§ 2.º). Outro aspecto a ser considerado é que, segundo estabelece o art. 535, neste procedimento, nenhum ato será adiado, salvo quando imprescindível à prova faltante, devendo o magistrado determinar a condução coercitiva de quem, notificado, injustificadamente, deixar de fazer-se presente. 21 Alegações orais: produzida em audiência a prova oral, concederá o juiz às partes, em seguida, a palavra para alegações finais orais. Nesse momento, acusação e defesa terão vinte minutos, prorrogáveis por mais dez, para sustentação. Havendo mais de um acusado, o prazo para a defesa de cada um será individual (art. 534, § 1.º). Caso exista assistente de acusação habilitado, este poderá se manifestar em dez minutos após o Ministério Público, caso em que o tempo a este concedido será acrescido ao tempo da defesa (art. 534, § 2.º). No rito comum sumário, inexiste a previsão de oportunidade para que as partes requeiram diligências complementares ao juiz, ao contrário do que ocorre no rito comum ordinário. Não há, também, a previsão de que possa os debates ser substituídos por memoriais escritos, impondo-se, pelo regramento legal, que em seguida às alegações orais, o juiz profira sentença em audiência (art. 534). Essa regra, entretanto, pode ser flexibilizada em dadas situações, por exemplo, o número elevado de acusados – mesmo porque o art. 394, § 5.º, estabelece a possibilidade de aplicação subsidiária das regras do procedimento ordinário ao sumário. Sentença: no rito comum sumário, devendo a sentença ser proferida em audiência, o princípio da identidade física do juiz (art. 399, § 2.º, do CPP) terá aplicação natural. Contudo, ainda que situações excepcionais obriguem à prolação de sentença em momento posterior, tal princípio deverá ser observado, pois não haveria sentido algum de sua imposição existir apenas em relação ao rito comum ordinário.8.3.3. Distinção entre o procedimento comum ordinário e o procedimento comum sumário Trata-se de procedimentos penais semelhantes, sendo apenas as seguintes as diferenças existentes entre eles: PROCEDIMENTO COMUM ORDINÁRIO PROCEDIMENTO COMUM SUMÁRIO Apuração de infrações penais com pena máxima cominada igual ou superior a 04 anos. Apuração de infrações penais com pena máxima cominada inferior a quatro anos, ressalvadas as 22 infrações de competência do Juizado Especial Criminal, que obedecem ao rito sumaríssimo. Poderão ser arroladas pela acusação e defesa até 08 testemunhas, ressalvadas as não compromissadas e as referidas (art. 400). Poderão ser arroladas pela acusação e defesa até 05 testemunhas, ressalvadas as não compromissadas e as referidas (art. 532). A audiência para produção da prova oral deve ser aprazada em até 60 dias (art. 400), iniciando-se esta contagem, a nosso ver, da data em que o magistrado receber os autos para esse fim. A audiência deverá ser aprazada em até 30 dias (art. 531), sendo, igualmente, dies a quo a data da conclusão do processo ao juiz. Encerrada a produção da prova ora, será facultado pelo juiz às partes requererem diligências (art. 402). Deve o magistrado, logo após a produção da prova oral, oportunizar às partes o oferecimento de alegações orais, proferindo, depois, sentença em audiência (art. 534). Não obstante, em casos excepcionais, mostrando-se imprescindível ao desfecho do processo a realização de diligências, reputamos que o juiz pode e deve deferi-las, a fim de evitar nulidade processual por cerceamento de acusação ou de defesa. 8.4. Procedimento Especial Do Tribunal Do Júri 8.4.1. Noções gerais O Tribunal do Júri é um órgão especial do Poder Judiciário de primeira instância, pertencente à Justiça Comum Estadual ou Federal, colegiado e heterogêneo, formado por um juiz togado, que é seu presidente, e por 25 (vinte e cinco) jurados, 7 (sete) dos quais compõem o Conselho de Sentença, que tem competência mínima para o processo e julgamento dos crimes dolosos contra a vida. É temporário, porquanto constituído para sessões periódicas, sendo depois dissolvido, dotado de soberania quanto às decisões, tomadas de maneira sigilosa e com base no sistema da íntima convicção, sem fundamentação, de seus integrantes leigos. 23 8.4.2. Princípios constitucionais do júri Está previsto na Constituição Federal, no rol dos Direitos e Garantias Individuais e Coletivos, com natureza jurídica de órgão especial da Justiça Comum (Estadual ou Federal). De acordo com o art. 5º, inciso XXXVIII, da Constituição Federal, é reconhecida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, assegurados: a) a plenitude de defesa; b) o sigilo das votações; c) a soberania dos veredictos; d) a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida. Plenitude de defesa A plenitude de defesa é prevista especificamente como garantia do Júri. É bem mais “ampla” do que a ampla defesa garantida a todos os litigantes em processo judicial ou administrativo, compreendendo dois aspectos distintos: Plenitude da defesa técnica: o advogado de defesa não precisa se restringir a uma atuação exclusivamente técnica, ou seja, é perfeitamente possível que o defensor também utilize argumentação extrajurídica, valendo-se de razões de ordem social, emocional, de política criminal, etc. Plenitude da autodefesa: é assegurado ao acusado é assegurado o direito de apresentar sua tese pessoal por ocasião do interrogatório, a qual também não precisa ser exclusivamente técnica, oportunidade em que poderá relatar aos jurados a versão que entender ser a mais conveniente a seus interesses. Daí o motivo pelo qual o juiz- presidente é obrigado a incluir na quesitação a tese pessoal apresentada pelo acusado, mesmo que haja divergência entre sua versão e aquela apresentada pelo defensor, sob pena de nulidade absoluta por violação à garantia constitucional da plenitude de defesa. Sigilo das votações A ninguém é dado saber o sentido do voto do jurado. Por esse motivo, aliás, é que o próprio Código de Processo Penal prevê que a votação ocorra em uma sala especial, onde serão distribuídos aos jurados pequenas cédulas, feitas de papel opaco e facilmente dobráveis, 24 contendo 7 (sete) delas a palavra sim, 7 (sete) a palavra não, sendo que o Oficial de Justiça deve recolher em umas separadas as cédulas correspondentes aos votos e as não utilizadas. Art. 485. Não havendo dúvida a ser esclarecida, o juiz presidente, os jurados, o Ministério Público, o assistente, o querelante, o defensor do acusado, o escrivão e o oficial de justiça dirigir-se-ão à sala especial a fim de ser procedida a votação. A votação em sala especial não é incompatível com o princípio da publicidade. Isso porque a própria Constituição Federal permite que a lei possa limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos em que haja interesse social (CF, art. 93, IX, c/c art. 5o, LX). Ainda, em decorrência do sigilo das votações, adota-se o sistema da incomunicabilidade dos jurados, cuja violação é causa de nulidade absoluta. Uma vez sorteados, os jurados serão advertidos que não poderão comunicar-se entre si e com outrem, nem manifestar sua opinião sobre o processo, sob pena de exclusão do Conselho e multa, no valor de 1 (um) a 10 (dez) salários mínimos, a critério do juiz, de acordo com a condição econômica do jurado (CPP, art. 466, § 1º). § 1º O juiz presidente também advertirá os jurados de que, uma vez sorteados, não poderão comunicar-se entre si e com outrem, nem manifestar sua opinião sobre o processo, sob pena de exclusão do Conselho e multa, na forma do § 2º do art. 436 deste Código. Por fim, atenta à proteção do sigilo das votações, a Lei n° 11.689/08 corrigiu antiga falha da situação no júri nos casos de votação unânime. De acordo com a nova redação do art. 483, § 1º, do CPP, a resposta negativa de mais de 3 (três) jurados aos quesitos atinentes à materialidade do fato e autoria ou participação encerra a votação e implica a absolvição do acusado, sem que seja necessário se proceder à colheita dos demais votos. 25 § 1º A resposta negativa, de mais de 3 (três) jurados, a qualquer dos quesitos referidos nos incisos I e II do caput deste artigo encerra a votação e implica a absolvição do acusado. Soberania dos veredictos A decisão coletiva dos jurados, isto é veredicto, é soberana. Desse modo, um tribunal formado por juízes togados não pode modificar, no mérito, a decisão proferida pelo Conselho de Sentença. Por determinação constitucional, incumbe aos jurados decidir pela procedência ou não da imputação de crime doloso contra a vida, sendo inviável que juízes togados se substituam a eles na decisão da causa. Calibri Importa dizer que, a impossibilidade de revisão do mérito das decisões do Júri não afasta a recorribilidade de suas decisões, sendo plenamente possível que o Tribunal determine a cassação de tal decisum, para que o acusado seja submetido a novo julgamento perante o Tribunal do Júri. Competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida O Tribunal do Júri possui uma competência mínima, isto é, a de processar e julgar os crimes dolosos contra a vida, aí incluídos o homicídio (CP, art. 121), induzimento, instigação ou auxílio a suicídio (CP, art. 122), infanticídio (CP, art. 123) e abortos (CP, arts. 124, 125 e 126). Trata-se de uma cláusula pétrea. No entanto, isso não significa que o legislador ordinário não possa ampliar o âmbito de competência do Tribunal do Júri. É o que já ocorre com os crimes conexos e/ou continentes. Com efeito, por força do art. 78, inciso I, do CPP, além dos crimes dolosos contra a vida, também compete ao Tribunal do Júri o julgamento dos crimesconexos, salvo em se tratando de crimes militares ou eleitorais, hipótese em que deverá se dar a obrigatória separação dos processos. Importante mencionar que, isoladamente considerados, as infrações penais a seguir enumeradas não são da competência do tribunal do júri: 26 Latrocínio: o roubo qualificado pelo resultado morte, previsto no art. 157, §3°, II, do Código Penal, incluído pela Lei n. 13.654/18, não é considerado um crime contra a vida, mas sim um crime contra o patrimônio. Ato infracional: de acordo com o art. 103 do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei n° 8.069/90), ao Juizado da Infância e da Juventude o processamento. Genocídio: previsto na Lei n° 2.889/56, o genocídio não é considerado um crime contra a vida, pois tutela, na verdade, a existência de grupo nacional, étnico, racial ou religioso, daí por que deve ser processado e julgado perante um juiz singular. Militar da ativa das Forças Armadas que comete homicídio doloso contra militar da ativa das Forças Armadas: este delito deve ser processado e julgado perante a Justiça Militar da União, ainda que ambos os militares não estejam em serviço. Civil que comete crime de homicídio doloso contra militar das Forças Armadas em serviço em lugar sujeito à administração militar: deve ser processado e julgado perante a Justiça Militar da União. Foro por prerrogativa de função previsto na Constituição Federal: diante do princípio da especialidade, caso determinado agente possua foro por prerrogativa de função previsto na Constituição Federal, deverá ser processado e julgado perante o respectivo Tribunal, em detrimento da competência do Tribunal do Júri. Todavia, se o foro por prerrogativa de função do agente estiver previsto exclusivamente na Constituição Estadual (v.g., Secretários de Estado), deve prevalecer a Constituição Federal, com a consequente sujeição do agente a julgamento perante o júri, nos termos da Súmula n° 721 do STF (súmula vinculante n° 45); Crime político de matar o Presidente da República, do Senado Federal, da Câmara dos Deputados ou do Supremo Tribunal Federal: cuidando-se de crime político previsto no art. 29 da Lei n° 7.170/83, não há falar em crime doloso contra a vida. Logo, a competência para o processo e julgamento desses delitos é de um juiz singular federal, nos termos do art. 109, IV, da Constituição Federal. 8.4.3. Procedimento bifásico do Tribunal do Júri O rito do júri é escalonado, bipartido, estruturado em duas fases distintas: a primeira, denominada judicium accusatione ou sumário da culpa, abrangendo os atos praticados desde 27 o recebimento da denúncia até a pronúncia; e a segunda, chamada judicium causae, compreendendo os atos situados entre a pronúncia e o julgamento pelo Tribunal do Júri. 8.4.4. Iudicium accusationes (ou sumário da culpa) Esta primeira fase do procedimento de apuração dos crimes dolosos contra a vida está disciplinada nos arts. 406 a 421 do CPP, constituindo-se dos seguintes atos processuais: Oferecimento da denúncia ou queixa-crime subsidiária: Em regra, o procedimento do júri tem início com o oferecimento da denúncia pelo Ministério Público. Isso porque todos os crimes dolosos contra a vida - homicídio, participação em suicídio, infanticídio e abortos - são de ação penal pública incondicionada. Esta denúncia deve ser elaborada com fiel observância dos requisitos do art. 41 do CPP, atentando-se o Promotor de Justiça para a explicitação do elemento subjetivo do agente, obrigatoriamente doloso, além de substituição do tradicional pedido de condenação pelo pedido de pronúncia. Rejeição liminar ou recebimento da inicial: constatando a ocorrência de qualquer das hipóteses mencionadas no art. 395 do CPP – inépcia da inicial, falta de pressuposto processual ou de condição para o exercício da ação penal e falta de justa causa para a ação penal, poderá o juiz rejeitar liminarmente a denúncia ou a queixa. Não sendo este o caso, procederá ao seu recebimento, ordenando a citação do acusado para resposta. Citação do acusado: poderá ser realizada por qualquer dos critérios previstos em lei. Como regra, deverá ele ser citado pessoalmente. Não localizado, será cabível a sua citação por edital (arts. 361 e 363, § 1.º). Verificando o oficial de justiça que o réu está se ocultando para evitar a citação, esta poderá ser feita por hora certa (art. 362). Resposta do acusado: o acusado terá o prazo de dez dias para responder à acusação, que será contado a partir do efetivo cumprimento do mandado ou do comparecimento, em juízo, do acusado ou de defensor constituído, no caso de citação inválida ou por edital (art. 406, § 2.º). Art. 406. O juiz, ao receber a denúncia ou a queixa, ordenará a citação do acusado para responder a acusação, por escrito, no prazo de 10 (dez) dias. 28 § 1º O prazo previsto no caput deste artigo será contado a partir do efetivo cumprimento do mandado ou do comparecimento, em juízo, do acusado ou de defensor constituído, no caso de citação inválida ou por edital. § 2º A acusação deverá arrolar testemunhas, até o máximo de 8 (oito), na denúncia ou na queixa. Oitiva da acusação: apresentada a defesa, o juiz deverá notificar o Ministério Público ou o querelante para se manifestarem sobre eventuais preliminares arguidas na resposta do réu ou sobre documentos que, com ela, tenham sido acostados, no prazo de cinco dias (art. 409). § 3º Na resposta, o acusado poderá arguir preliminares e alegar tudo que interesse a sua defesa, oferecer documentos e justificações, especificar as provas pretendidas e arrolar testemunhas, até o máximo de 8 (oito), qualificando-as e requerendo sua intimação, quando necessário. Art. 409. Apresentada a defesa, o juiz ouvirá o Ministério Público ou o querelante sobre preliminares e documentos, em 5 (cinco) dias. Aprazamento de audiência de instrução, interrogatório, debates e decisão: após ter sido oportunizada à acusação falar sobre a resposta apresentada pelo réu, designará o magistrado, para daí até o máximo de dez dias, audiência para inquirição das testemunhas arroladas no processo e realização das diligências que tenham sido requeridas pelas partes (art. 410). As diligências a que se refere o Código são aquelas que podem ser realizadas em audiência, como esclarecimentos de peritos, acareações e reconhecimentos. Art. 410. O juiz determinará a inquirição das testemunhas e a realização das diligências requeridas pelas partes, no prazo máximo de 10 (dez) dias. Ficou estabelecido que todas as provas (orais) serão produzidas em uma só audiência, podendo o juiz indeferir aquelas que considerar irrelevantes, impertinentes ou protelatórias (art. 411, § 2.º), bem como ordenar a condução coercitiva à audiência de quem, regularmente notificado, a ela deva comparecer (art. 411, § 7.º). 29 Art. 411. § 2º As provas serão produzidas em uma só audiência, podendo o juiz indeferir as consideradas irrelevantes, impertinentes ou protelatórias. Em audiência, a prova oral será produzida na seguinte ordem: 1. Declarações do ofendido, se possível; 2. Declarações das testemunhas de acusação e defesa, nessa ordem; 3. Esclarecimentos dos peritos, acareações e reconhecimento de pessoas ou coisas; 4. Interrogatório do acusado. Art. 411. Na audiência de instrução, proceder-se-á à tomada de declarações do ofendido, se possível, à inquirição das testemunhas arroladas pela acusação e pela defesa, nesta ordem, bem como aos esclarecimentos dos peritos, às acareações e ao reconhecimento de pessoas e coisas, interrogando-se, em seguida, o acusado e procedendo-se o debate. Esgotada a instrução probatória e não sendo o caso de aplicação da regra pertinente à mutatio libelli estabelecida no art. 384 do CPP (art. 411, § 3.º), passar-se-á à fase de debates orais, concedendo-se a palavra primeiroà acusação e, depois, à defesa, pelo prazo de 20 minutos, prorrogáveis por mais dez (art. 411, § 4.º). Art. 411. § 3º Encerrada a instrução probatória, observar-se-á, se for o caso, o disposto no art. 384 deste Código. § 4º As alegações serão orais, concedendo-se a palavra, respectivamente, à acusação e à defesa, pelo prazo de 20 (vinte) minutos, prorrogáveis por mais 10 (dez). Havendo assistente de acusação habilitado nos autos, a este será facultado se pronunciar em dez minutos, logo após a manifestação do promotor de justiça, caso em que esse tempo 30 será acrescido ao previsto para a defesa manifestar-se (art. 411, § 6.º). Se houver mais de um acusado, o tempo para a acusação e a defesa de cada um deles será individual (art. 411, § 5.º). Art. 411. § 5º Havendo mais de 1 (um) acusado, o tempo previsto para a acusação e a defesa de cada um deles será individual. § 6º Ao assistente do Ministério Público, após a manifestação deste, serão concedidos 10 (dez) minutos, prorrogando-se por igual período o tempo de manifestação da defesa. Encerrados, pois, os debates orais, o juiz proferirá sua decisão quanto à admissibilidade da acusação inserta na denúncia ou na queixa, ou, então, o fará em dez dias, ordenando, para tanto, que os autos lhe sejam conclusos (art. 411, § 9.º). Neste momento, faculta-se ao magistrado pronunciar o réu, impronunciá-lo, absolvê-lo sumariamente ou desclassificar a infração penal. Art. 411 § 9º Encerrados os debates, o juiz proferirá a sua decisão, ou o fará em 10 (dez) dias, ordenando que os autos para isso lhe sejam conclusos. Prazo para conclusão do sumário da culpa: art. 412 do CPP, a primeira fase do procedimento do júri deverá ser concluída no prazo máximo de 90 dias. Art. 412. O procedimento será concluído no prazo máximo de 90 (noventa) dias. 8.4.5. Impronúncia A impronúncia está prevista no art. 414 do CPP: 31 Art. 414. Não se convencendo da materialidade do fato ou da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação, o juiz, fundamentadamente, impronunciará o acusado. Não obstante, “enquanto não ocorrer à extinção da punibilidade, poderá ser formulada nova denúncia ou queixa se houver prova nova” (Art. 414, Parágrafo único). Em regra, a decisão de impronúncia é proferida após a apresentação das alegações orais pelas partes. Não obstante, é plenamente possível que referida decisão seja proferida em sede de juízo de retratação de RESE interposto contra a decisão de pronúncia (CPP, art. 581, IV), ou, ainda, em julgamento pela 2º instância, quando o juízo ad quem der provimento a RESE interposto contra anterior decisão de pronúncia. Natureza jurídica e coisa julgada. Trata-se de decisão interlocutória mista terminativa. É decisão interlocutória, porque não aprecia o mérito para dizer se o acusado é culpado ou inocente; mista, porque põe fim a uma fase procedimental; e terminativa, porquanto acarreta a extinção do processo antes do final do procedimento. Logo, se não há análise do mérito, forçoso é concluir que referida decisão só produz coisa julgada formal. Isso significa dizer que, enquanto não ocorrer à extinção da punibilidade, poderá ser formulada nova denúncia ou queixa se houver prova nova. Infração conexa Ao proferir a decisão de impronúncia em relação ao crime doloso contra a vida, o magistrado não pode se manifestar, desde logo, com referência ao crime conexo que não possua essa natureza. Relativamente a este, deverá aguardar o trânsito em julgado da sentença de impronúncia para somente depois julgá-lo, se for o competente, ou remetê-lo à apreciação do juiz que o seja. Nessa hipótese, portanto, o delito conexo não será julgado pelo Tribunal Popular, mas sim pelo juiz singular. Recurso cabível Contra a decisão de impronúncia é cabível apelação, conforme dispõe o art. 416 do CPP. De fato, segundo a nova redação do art. 416 do CPP: 32 Art. 416. Contra a sentença de impronúncia ou de absolvição sumária caberá apelação. Impronúncia e despronúncia São conceitos que não se confundem. Ocorre a impronúncia na hipótese em que o juiz que conduz o processo, na fase da admissibilidade da acusação, conclui pela inexistência de indicativos de autoria ou de prova de materialidade do fato. Por essa razão, deixa de submeter o acusado ao Tribunal do Júri, determinando o arquivamento do processo criminal. Já a despronúncia ocorre quando uma anterior decisão de pronúncia é transformada em impronúncia em virtude da interposição de um recurso em sentido. É decisão que tem lugar em duas situações: primeira, quando, diante de recurso em sentido estrito interposto contra a pronúncia, o próprio juiz prolator daquela decisão, utilizando-se do juízo de retratação que é inerente ao RSE (art. 589 do CPP), reconsidera sua decisão anterior, não submetendo o acusado a júri popular; segunda, na hipótese em que o juiz não se retrata da pronúncia, mas o tribunal, julgando o recurso em sentido estrito interposto, revoga tal pronunciamento e determina o arquivamento do processo criminal. 8.4.6. Desclassificação do delito Cabimento Conforme o Art. 419 do CPP, quando o juiz se convencer, em discordância com a acusação, da existência de crime diverso dos referidos no § 1º do art. 74 do CPP (homicídio, induzimento, instigação ou auxílio a suicídio, infanticídio e aborto, em suas diversas modalidades), e não for competente para seu julgamento, remeterá os autos ao juiz que o seja. A desclassificação a que se refere o art. 419 do CPP é para delito não doloso contra a vida, ou seja, para um crime que não seja da competência do próprio Tribunal do Júri - homicídio culposo, lesões corporais seguidas de morte, rixa qualificada pelo resultado morte, abandono de recém-nascido etc. 33 A desclassificação não importa em acréscimo de circunstância ou elemento novo ao fato descrito na inicial acusatória. Exemplo: Inicialmente ao imputar crime de homicídio, Juiz da vara do júri entende que não houve o dolo de matar, sendo caso de lesão corporal, aplicando-lhe ao art. 419 do CPP. Assim, quando o processo é remetido ao juízo criminal comum, este juízo poderá, imediatamente, proferir sentença absolvendo ou condenando o réu pelo crime de lesão corporal seguida de morte, independentemente de qualquer manifestação prévia das partes. Isso porque, ao defender-se do homicídio imputado nas condições narradas, implicitamente já se defendeu o acusado do crime de lesão corporal seguida de morte, não havendo, na desclassificação, nenhuma inovação em termos de acréscimo de circunstância ou elemento ao fato originalmente constante da inicial. Por outro lado, há casos em que a desclassificação importará em acréscimo de circunstância ou elemento novo ao fato descrito na inicial acusatória, a exemplo do crime da tentativa de homicídio. Imagine que houve uma denúncia em que o acusado desferiu contra a vítima, com uso de uma pistola, um tiro que lhe atingiu o braço direito, não consumando o resultado morte por circunstâncias alheias à sua vontade. Todavia, se na fase de admissibilidade da acusação, entender o juiz da vara do júri que o fato não se caracteriza um crime doloso contra a vida, deverá, tal como no caso anterior, proceder ao encaminhamento do processo ao juízo criminal comum. Se, contudo, nessa outra sede, constatar o magistrado que a hipótese reclama o reconhecimento de lesões corporais de natureza grave, eis que, comprovada a debilidade permanente do membro atingido, não poderá ele proferir sentença condenatória sem antes adotar as providências a que alude o art. 384 do CPP, que disciplina as regras da mutatio libelli. Infração conexa Quanto à infração conexa, preceitua o parágrafo único do art. 81 do CPP que se o juiz vier a desclassificar a infração ou impronunciar ou absolver sumariamente o acusado, de maneiraque exclua a competência do júri, remeterá o processo ao juízo competente. Nesse caso, deve o juiz aguardar o julgamento do recurso voluntário que possivelmente será interposto contra a desclassificação (RESE). Isso porque é possível que o Tribunal de Justiça 34 (ou TRF) dê provimento ao recurso, pronunciando o réu. Ora, nesse caso, a competência para julgamento de ambos os delitos (homicídio doloso e crime conexo) será do Tribunal do Júri. Por outro lado, mantida a decisão de desclassificação pelo juízo ad quem, deve o juiz sumariante aplicar o disposto no art. 419, caput, do CPP, remetendo os autos ao juiz singular competente para conhecer a infração conexa. Situação do acusado preso Conforme o art. 419, parágrafo único, do CPP, uma vez remetidos os autos do processo a outro juiz, à disposição deste ficará o acusado preso. A desclassificação não é causa de soltura de acusado que permaneceu preso durante o iudicium accusationis. Art. 419. Parágrafo único. Remetidos os autos do processo a outro juiz, à disposição deste ficará o acusado preso. Ao receber os autos do processo, o juízo singular competente para julgar a imputação desclassificada deverá, obrigatoriamente, reavaliar a necessidade da manutenção da prisão. Caso entenda que a prisão preventiva deva ser mantida, é obrigado a proferir decisão fundamentada nesse sentido. Do contrário, caso não haja necessidade de subsistência do cárcere ad cautelam, poderá o magistrado conceder liberdade provisória ao agente, com ou sem fiança, cumulada ou não com as medidas cautelares diversas da prisão listadas no art. 319 e 320 do CPP. Recurso cabível É cabível o recurso em sentido estrito (RESE) fulcrado no art. 581, II, do CPP. Afinal, trata- se, a desclassificação, de decisão que concluiu pela incompetência do juízo. Esse recurso em sentido estrito poderá ser interposto pelo Ministério Público, pelo querelante, pelo acusado e por seu defensor. Conflito de competência 35 É possível que um juiz da Vara do Júri, diante de processo criminal por homicídio, desclassifique o crime para outro não doloso contra a vida, determinando o encaminhamento do processo ao juízo comum. Redistribuído o feito à Vara Criminal Comum, imagine-se que o respectivo juiz entenda que se trata sim de crime doloso contra a vida. Nesse caso, para uma primeira corrente, não poderá o Juiz de a Vara Criminal Comum suscitar conflito de competência. Isso porque o efetivo encaminhamento do processo à sua apreciação ocorreu apenas depois do trânsito em julgado da decisão desclassificatória. Ora, se o Ministério Público e a defesa não discordaram dessa decisão, deixando de recorrer, não será lícito ao juiz da Vara Comum, agora, insistir em restabelecer a imputação anterior. Há, contudo, uma segunda posição, que parece prevalente, aduzindo o oposto, vale dizer, no sentido de que é sim possível ao magistrado do juízo comum suscitar conflito nesse caso, pois se trata de questão que envolve competência ratione materiae, competência esta de natureza absoluta e, portanto, inatingível pela preclusão. 8.4.7. Absolvição sumária A Lei n° 11.689/08 trouxe uma ampliação nas hipóteses de cabimento da absolvição sumária, não sendo apenas possível na 1ª fase do Júri, quando verificada a presença incontroversa de causa excludente da ilicitude ou da culpabilidade. Muito pelo contrário, além das excludentes da ilicitude e da culpabilidade (CPP, art. 415, IV), que continuam autorizando a absolvição sumária, tal decisão também passa a ser cabível quando provada a inexistência do fato, provada a negativa de autoria ou de participação, ou quando o juiz entender que o fato não constitui infração penal (CPP, art. 415,1º, II e III). Assim, o juiz sumariante deverá, fundamentadamente, absolver o acusado quando: I – provada a inexistência do fato; II – provado não ser ele autor ou partícipe do fato; 36 Não se confunde com a impronúncia. Na absolvição sumária, o juiz está plenamente convencido de que o acusado não é o autor do fato delituoso, ao passo que, na impronúncia, não há indícios suficientes de autoria ou de participação; III – o fato não constituir infração penal; IV – demonstrada causa de isenção de pena ou de exclusão do crime. Existir circunstância que isente o réu de pena (art. 415, IV, 1.ª parte): abrangem-se, neste caso, as descriminantes putativas (art. 20, § 1.º, 1.ª parte, do Código Penal) e as excludentes de culpabilidade propriamente ditas, quais sejam, o erro de proibição inevitável (art. 21 do CP), a coação moral irresistível e a obediência hierárquica à ordem não manifestamente ilegal (art. 22 do CP) e a embriaguez fortuita completa (art. 28, § 1.º, do CP). Existir circunstância que exclua o crime (art. 415, IV, 2.ª parte): trata-se, neste caso, das excludentes de ilicitude ou de antijuridicidade previstas no art. 23 do Código Penal, quais sejam, legítima defesa, estado de necessidade, exercício regular de direito ou estrito cumprimento do dever legal. Parágrafo único. Não se aplica o disposto no inciso IV do caput deste artigo ao caso de inimputabilidade prevista no caput do art. 26 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, salvo quando esta for a única tese defensiva. Causa de isenção de pena consubstanciada na inimputabilidade por doença mental, quando esta se tratar da única tese defensiva (art. 415, IV, 1.ª parte, e parágrafo único). Embora seja a inimputabilidade por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado uma causa de exclusão de pena, estabelece o art. 415, parágrafo único, que, com base nela, o juiz apenas poderá absolver sumariamente o réu quando for à única tese da defesa. Assim, havendo outra tese defensiva, deve-se submeter o acusado a júri popular, já que nessa sede sempre haverá a possibilidade de ser ele absolvido sem imposição de medida de segurança, caso acolhida a outra tese absolutória pelo Conselho de Sentença. Lembre-se, por fim, que o inimputável por doença mental é isento de pena, não podendo, desta forma, ser condenado. Portanto, se, submetido a júri, não acolherem os jurados a tese 37 absolutória, restará ao juiz, com fundamento no art. 26, caput, do CP, após votação dos quesitos, proferir sentença de absolvição com a imposição de medida de segurança. Natureza jurídica e coisa julgada A sentença de absolvição sumária é uma decisão de mérito. Além de encerrar a primeira fase do procedimento bifásico do júri, também põe fim ao processo. Faz coisa julgada formal e material, porquanto o magistrado ingressa na análise do mérito. Isso significa dizer que, ainda que surjam provas novas após o trânsito em julgado da decisão de absolvição sumária, o acusado não poderá ser novamente processado pela mesma imputação. Recurso cabível Contra a decisão de absolvição sumária, é cabível apelação, conforme dispõe o art. 416 do CPP. 8.4.8. Pronúncia A pronúncia encerra um juízo de admissibilidade da acusação de crime doloso contra a vida, permitindo o julgamento pelo Tribunal do Júri apenas quando houver alguma viabilidade de haver a condenação do acusado. Sobre ela, o art. 413, caput, do CPP, dispõe que, estando convencido da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação, deve o juiz sumariante pronunciar o acusado fundamentadamente. Art. 413. O juiz, fundamentadamente, pronunciará o acusado, se convencido da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação. Há necessidade de um juízo de certeza. Assim, se o juiz sumariante estiver convencido da existência do crime e da presença de indícios suficientes de autoria ou de participação, deve pronunciar o acusado, de maneira fundamentada. 38 Essa decisão deve estar condicionada à existência de indícios suficientes de autoria eprova da materialidade do fato. Na ausência destes elementos, a hipótese será de impronúncia. Art. 414. Não se convencendo da materialidade do fato ou da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação, o juiz, fundamentadamente, impronunciará o acusado. Por outro lado, apesar do art. 413 do CPP exigir o convencimento do juiz sumariante quanto à materialidade do fato, raciocínio distinto se aplica à autoria e participação, em relação aos quais há necessidade de indícios suficientes. Em relação à autoria ou participação, não se exige que o juiz tenha certeza, bastando que conste dos autos elementos informativos ou de prova que permitam afirmar, no momento da decisão, a existência de indício suficiente, isto é, a probabilidade de autoria. Natureza jurídica A pronúncia é tratada pela doutrina como uma decisão interlocutória mista não terminativa. É decisão interlocutória porque não julga o mérito, ou seja, não condena nem absolve o acusado; mista, porque põe fim a uma fase procedimental; e não terminativa, porque não encerra o processo. Regra probatória: in dubio pro societate (ou in dubio pro reo) Existindo qualquer dúvida quanto à ocorrência das causas que implicam o afastamento da competência do júri, cabe ao juiz pronunciar o réu. Neste momento processual, vigora o princípio in dubio pro societate. Nesse sentido: A pronúncia do réu para o julgamento pelo Tribunal do Júri não exige a existência de prova cabal da autoria do delito, sendo suficiente, nessa fase processual, a mera existência de indícios da autoria, devendo estar comprovada, apenas, a materialidade do crime, uma vez que vigora o princípio in dubio pro societate. STJ. 5ª Turma. AgRg no AREsp 1193119/BA, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 05/06/2018. STJ. 5ª Turma. AgRg no REsp 1730559/RS, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, julgado em 02/04/2019. 39 A etapa atinente à pronúncia é regida pelo princípio in dubio pro societate e, por via de consequência, estando presentes indícios de materialidade e autoria do delito - no caso, homicídio tentado - o feito deve ser submetido ao Tribunal do Júri, sob pena de usurpação de competência. STJ. 6ª Turma. HC 471.414/PE, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 06/12/2018. Na sentença de pronúncia deve prevalecer o princípio in dubio pro societate, não existindo nesse ato qualquer ofensa ao princípio da presunção de inocência, porquanto tem por objetivo a garantia da competência constitucional do Tribunal do Júri. STF. 2ª Turma. ARE 986566 AgR, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 21/08/2017. Nos crimes dolosos contra a vida, o princípio in dubio pro societate é amparado pela Constituição Federal, de modo que não há qualquer inconstitucionalidade no seu postulado. STF. 2ª Turma. ARE 1082664 ED-AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 26/10/2018. Contudo, na primeira fase do procedimento do Júri consolida um filtro processual, que busca impedir o envio de casos sem um lastro probatório mínimo da acusação, de modo a se limitar o poder punitivo estatal em respeito aos direitos fundamentais. Assim, a pronúncia é uma forma de garantir que o acusado seja submetido a um julgamento injusto. (STF. 2ª Turma. ARE 1067392/CE, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 26/3/2019 (Info 935).) Na fase de pronúncia deve-se adotar a teoria racionalista da prova, na qual não deve haver critérios de valoração das provas rigidamente definidos na lei, no entanto, por outro lado, o juízo sobre os fatos deve ser pautado por critérios de lógica e racionalidade, podendo ser controlado em âmbito recursal ordinário. Para a pronúncia, não se exige uma certeza além da dúvida razoável, necessária para a condenação. Contudo, a submissão de um acusado ao julgamento pelo Tribunal do Júri pressupõe a existência de um lastro probatório consistente no sentido da tese acusatória. Ou seja, requer-se um 40 standard probatório um pouco inferior, mas ainda assim dependente de uma preponderância de provas incriminatórias. Emendatio e mutatio libelli No âmbito do procedimento do júri, precisamente no Art. 418 do CPP, trata quanto à possibilidade de se fazer emendatio libelli no momento da pronúncia. Art. 418. O juiz poderá dar ao fato definição jurídica diversa da constante da acusação, embora o acusado fique sujeito a pena mais grave. Já a mutatio libelli está prevista no art. 384 do CPP e ocorre quando, no curso da instrução processual, surge prova de elementar ou circunstância não contida na peça acusatória. Neste caso, o Ministério Público deve aditar a inicial, permitindo-se o exercício do contraditório e da ampla defesa. Segue prevista no Art. 411, § 3º, do CPP: Art. 411. § 3º Encerrada a instrução probatória, observar-se-á, se for o caso, o disposto no art. 384 deste Código. Por fim, não se admite a mutatio libelli na segunda fase do procedimento bifásico do Júri. Conteúdo da pronúncia A fundamentação da pronúncia limitar-se-á à indicação da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação, devendo o juiz declarar o dispositivo legal em que julgar incurso o acusado e especificar as circunstâncias qualificadoras e as causas de aumento de pena (Art. 413, §1.º). Não podem ser incluídas as causas especiais de diminuição de pena, bem como as circunstâncias agravantes e atenuantes. Art. 413. § 1º A fundamentação da pronúncia limitar-se-á à indicação da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação, devendo o juiz declarar o dispositivo legal em que julgar 41 incurso o acusado e especificar as circunstâncias qualificadoras e as causas de aumento de pena. A não inclusão de uma qualificadora ou causa de aumento de pena implica no julgamento do acusado apenas por homicídio simples, já que os quesitos serão elaborados no plenário do júri levando-se em consideração os termos da pronúncia (CPP, art. 482, parágrafo único). Presente uma qualificadora, e desde que ela tenha constado da peça acusatória, deve o magistrado não só declarar qual seria o dispositivo legal, como também especificar em que teria consistido. Exemplificando, não basta apontar a qualificadora do art. 121, § 2º, II, do CP, sendo necessário que o magistrado descreva qual teria sido o motivo fútil que levou o agente à prática do delito. A pronúncia também deve fazer menção às causas de aumento de pena. É dominante o entendimento na doutrina e na jurisprudência que só devem constar da pronúncia aquelas inseridas na parte especial do Código Penal, já que aquelas constantes da parte geral não fazem parte do tipo básico ou derivado da conduta delituosa imputada, tendo como objetivo precípuo apenas auxiliar o juiz por ocasião da fixação da pena. Infrações conexas Se o magistrado entender que há prova da existência de crime doloso contra a vida e indícios suficientes de autoria, deverá pronunciar o acusado pela prática do referido delito, situação em que a infração conexa será automaticamente remetida à análise do Júri, haja ou não prova da materialidade, presentes (ou não) indícios suficientes de autoria ou de participação. Não lhe é permitido pronunciar o acusado pelo crime doloso contra a vida e absolvê-lo ou impronunciá-lo pelo crime conexo, ou proceder à desclassificação da infração conexa. Constatação do envolvimento de outras pessoas como coautores ou partícipes Ao proferir a decisão de pronúncia, é possível que o juiz verifique a presença de indícios de autoria ou participação de outras pessoas não incluídas na peça acusatória. Nesse caso, entende o art. 417 do CPP: 42 Art. 417. Se houver indícios de autoria ou de participação de outras pessoas não incluídas na acusação, o juiz, ao pronunciar ou impronunciar o acusado, determinará o retorno dos autos ao Ministério Público, por 15 (quinze) dias, aplicável, no que couber,
Compartilhar