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1Panorama da AQÜICULTURA, julho/agosto, 2007 42 Panorama da AQÜICULTURA, julho/agosto, 2007 Policultivo de Tilápias e Camarões Marinhos Por: Giovanni Lemos de Mello 1,2 e-mail: giovannidemello@gmail.com Mestre em Aqüicultura Álvaro Pestana de Farias 2 e-mail: alvaropfarias@gmail.com Engenheiro de Aqüicultura 1 Associação Catarinense de Criadores de Camarão (ACCC) 2 AQUACONSULT – Aqüicultura e Meio Ambiente Os Resultados das Primeiras Experiências em Laguna - SC A safra 2004/2005 da carcinicultura catarinense prometia bater todos os recor- des de produção, produtividade, geração de empregos e receita. No ano anterior, a produção havia superado quatro mil toneladas e o setor profissionalizava-se constantemente, através de um forte apoio governamental, deixando otimistas produtores, técnicos e as comunidades adjacentes às fazendas. No início de novembro de 2004, grande parte dos 1.231,29 hectares da região Sul do Estado, distribuídos em 368 viveiros, já estavam povoados ou em fase final de preparação para povoamento. Em um sábado de primavera, dia 06 de novembro, uma ligação telefônica feita por um funcionário de uma fazenda do município de Imaruí, vizinho à Laguna, angustiou os seus proprietários: os camarões de um viveiro estavam apresentando um comportamento diferente e preocupante, nadando lentamente pela superfície da água e morrendo logo em seguida, nas margens dos viveiros. Naquele momento, iniciavam-se as primeiras mortalidades registradas no Brasil causadas pelo Vírus da Síndrome da Mancha Branca (WSSV na sigla em inglês). A partir daquele ano, a região Sul de Santa Catarina, principal área de produção de camarões marinhos do Estado, com 92 fazendas em operação, testemunhou o surpreendente colapso de sua principal indústria aqüícola. Somente no município de Laguna, cerca de 400 postos de trabalho sucumbiram. Na safra 2006/2007, que se encerrou em 31 de junho último, apenas três fazendas da região Sul obtiveram sucesso na produção de camarões, uma delas, inclusive, vitimada anteriormente pela Mancha Branca, mostrou sinais de recuperação, com ótimos resultados técnicos, e é hoje uma luz no final da comporta. No entanto, a produção da Região Sul alcançou modestíssimas 59 toneladas de camarões. Motivados pelo exemplo equatoriano, onde existem 8.000 hectares de policultivos de tilápia e camarão na região de Taura, e também por publicações anteriores da Revista Panorama da AQÜICULTURA, que relatavam expe- riências promissoras de policultivo de tilápias e camarões no Nordeste do Brasil, alguns produtores catarinenses decidiram investir nesta modalidade de produção. A AQUACONSULT assessorou tecnicamente o policultivo em três propriedades lagunenses, numa área de 64,35 hectares, em 20 viveiros. A seguir, relataremos a experiência e os resultados técnico-econômicos da Fazenda Modelo, principal propriedade assistida. 43Panorama da AQÜICULTURA, julho/agosto, 2007 A Fazenda Modelo localiza-se em Laguna, às margens da Lagoa Mirim, uma das três principais lagoas que compõem o Complexo Lagunar Sul do Estado de Santa Ca- tarina, uma área com 20.000 hectares de lagunas costeiras. A propriedade possui 24,2 hectares de lâmina de água de cultivo, distribuídos em cinco viveiros e um canal de abastecimento, também utilizado como berçário na fase de pré-engorda. Nos tempos em que a Fazenda Modelo criava camarões em monocultura, lá trabalhavam sete funcionários com carteira assinada. Após a Mancha Branca a fazenda não teve opção e demitiu-os, reempregando quatro deles um ano depois, em outu- bro de 2006. A nova rotina de manejo requer um número menor de funcionários fixos (40% menos) mas, em contrapartida, as despescas demandam uma mão-de-obra temporária de pelo menos 20 pessoas, significativamente superior às despescas da carcinicultura. Preparação dos viveiros O processo de preparação do solo consistiu em duas aplicações de calcário (1.000 kg/ha/aplicação), intercaladas por um gradeamento. A partir do início de setembro de 2006, a fazenda es- tava pronta para o enchimento do viveiro-berçário, processo mantido em espera por mais de 30 dias, pois a salinidade na Lagoa Mirim estava em torno de 25 ppt, considerada alta para a espécie de tilápia que seria produzida. Após um período de chuvas, a salinidade reduziu-se, chegando a 15 ppt, propician- do a captação de água. Paralelamente ao berçário, em novembro, os viveiros definitivos foram abastecidos com água para o povoamento dos camarões, fato que aconteceu em dezembro. Nenhum dos vivei- ros foi fertilizado, priorizando-se o surgimento da alimentação natural na água e principalmente no solo através de um período maior de viveiro alagado (cerca de 35 dias). Levou-se em conta, da mesma forma, que o povoamento dos camarões seria feito com uma densidade baixa: cinco pós-larvas por metro quadrado. Se é que o sucesso na produção teve algum segredo, e realmente talvez tenha tido alguns, eis o primeiro deles: o controle dos pássaros através de fios colocados sobre toda a extensão da área de lâmina de água dos viveiros. O investi- mento de pouco mais de R$ 700,00 em fios de nylon inibiu a ação de pássaros como o biguá, sendo decisivo principalmente na alta taxa de sobrevivência da pré-engorda (acima de 93%) e também na engorda. Origem dos alevinos, pós-larvas e aclimatação Os alevinos de tilápia nilótica (Oreochromis niloticus) foram adquiridos da Piscicultura Aracanguá, localizada em Santo Antônio de Aracanguá (SP), sendo transportados em um caminhão, em caixas de transporte com aeração artificial, numa viagem que durou cerca de 18 horas. Antes da expedição, o la- boratório de alevinagem incorporou sais à água doce, ajustando a salinidade em 5 ppt. O processo de aclimatação na fazenda levou cerca de duas horas, mo qual o principal parâmetro ajustado foi justamente a salinidade, de 5 para 14 ppt. As pós-larvas de Litopenaeus vannamei foram pro- duzidas pelo Laboratório de Camarões Marinhos (LCM) da Universidade Federal de Santa Catarina e o processo de aclimatação teve práticas similares às realizadas pela carcinicultura tradicional. O povoamento foi direto – nos viveiros de engorda, em 15 de dezembro de 2006, per- manecendo por 46 dias em sistema de monocultura até a transferência das tilápias. Entretanto, com 30 dias de cultivo, os camarões apresentaram mortalidade com sintomatologias da Sín- drome do Vírus da Mancha Branca, sendo a fazenda in- terditada pelo órgão oficial de defesa sanitária do Estado de Santa Catarina (CIDASC). Este processo de interdição, todavia, permitiu que a fazenda continuasse sua produção normalmente, apenas com restrições quanto às renovações de água, o que se caracterizou como uma decisão acertada do órgão, tendo em vista os resultados promissores da policultura ao final da safra. Berçários: uma pré-engorda fundamental A Fazenda Modelo utilizou seu canal de abaste- cimento de 2,8 hectares para acondicionar os 321.896 alevinos adquiridos para engorda. De 28 de novembro de 2006 a 29 de janeiro de 2007, os alevinos de 0,8 gramas transformaram-se em juvenis de 67,08 gramas de peso médio, sendo a biomassa de 20.183 kg de peixes transfe- rida para os quatro viveiros de engorda definitivos (18,3 hectares), através de um processo de seleção dos juvenis, Policultivo Povoamento da Fazenda Modelo - com alevinos de tilápia 45Panorama da AQÜICULTURA, julho/agosto, 2007 Policultivo classificados por tamanho através de dois tanques-rede, onde as tilápias eram capturadas do berçário através de uma rede (60 metros de comprimento) e com auxílio de caixas plásticas eram transportadas até a estrutura de seleção, onde se obtinha três classes de tamanho: 22, 44 e 75 gramas, sendo as malhas dos tanques-rede interno e externo de 2,5 e 3 cm entre nós, respectivamente. Engorda A fase de engorda nos viveiros definitivos iniciou-se em 29 de janeiro de 2007, com as primeiras transferências das tilápias para os viveiros definitivos, onde os camarõessobreviventes já se encontravam. A partir deste ponto, teve início o policultivo. Um quinto viveiro da fazenda (viveiro 2) foi povoado diretamente com 47.197 juvenis adquiridos de uma outra propriedade. Somente as tilápias foram alimentadas com ração artificial, fornecida duas vezes ao dia, de acordo com indicações do fabri- cante e com ajustes nas tabelas realizados pela AQUACONSULT. Os tipos de ração utilizados, de acordo com o tamanho dos péletes e porcentagem de proteína, encontram-se na tabela 1. Após a retirada de 50% do volume da água dos viveiros, os camarões iniciam seu percurso rumo à comporta sem que as tilápias apareçam na rede de despesca (bagnet). Aliás, as tilápias só iniciam sua caminhada em direção à comporta quando restam menos de 5% de água no viveiro e, como diz um produtor, “é preciso tirar a água da tilápia, e não a tilápia da água”. No início é um pouco assustador “jogar um viveiro no chão”, com 30 ou 40 toneladas de tilápia e esperar que elas saiam com tão pouca água, mas é exatamente o que ocorre. Isto vale tanto para viveiros construídos em solos arenosos quanto orgânicos. Podem ser utilizadas redes de arrasto para o auxílio na condução dos peixes para a proximidade da comporta de despesca, especialmente em viveiros com característica de solo arenoso, construídos com tratores de esteira, os quais não possuem canais laterais para a condução da água. Na Fazenda Modelo, os 153.000 quilos de tilápia foram despescados em 85 dias, entre 07 de maio e 30 de julho. Em alguns dias, a fazenda chegou a despescar 25.000 quilos em 8 horas de trabalho, com a participação de 25 funcionários. Considerando-se o alto custo de uma despesca (cerca de R$ 800,00, incluindo diaristas e refeições), é preciso aproveitar ao máximo o dia, retirando-se a maior quantidade de peixes possível, dentro de um fluxo de despesca organizado. Tabela 1 – Tabela de alimentação utilizada no policultivo da Fazenda Modelo - Laguna - SC O crescimento médio diário dos peixes pode ser conside- rado excelente, tendo em vista que no início de maio, passados 90 dias nesta segunda fase, o peso médio dos cinco viveiros da propriedade era superior a 500 gramas. Partindo-se de 67,8 gramas de peso médio inicial nesta segunda fase, tem-se 4,89 gramas/dia de incremento médio. O viveiro 3, onde foram alojados os peixes pequenos do processo de seleção, também apresentou ótimos resultados de crescimento, chegando a um peso médio final de 421,51 gramas. No início de maio, porém, as primeiras massas de ar polar chegaram à Santa Catarina, reduzindo as temperaturas da água para valores inferiores a 20º C, chegando a um mínimo de 10,5º C em algumas manhãs. O peso médio final das tilápias despes- cadas ao longo dos meses de maio, junho e julho é idêntico aos valores das biometrias do início de maio, tendo em vista a ausência de crescimento a partir daquele período. Despescas Não existe dificuldade na despesca dos camarões e das tilápias em policultivo. Pode-se despescar as duas espécies em dias distintos, próximos ou não, e a decisão fica a critério do produtor. Uso intensivo de mão-de-obra na despesca de tilápias em policultivo Resultado da despesca na Fazenda Modelo 46 Panorama da AQÜICULTURA, julho/agosto, 2007 Resultados zootécnicos Um dado interessante para ser observado na tabela 2 é a densidade final dos camarões sobrevi- ventes, que é muito similar entre todos os viveiros, mesmo com densidades iniciais de povoamento distintas. Avaliando as outras duas fazendas acompa- nhadas, onde existiram densidades de povoamento de até 15 camarões por metro quadrado, fica evi- dente que a densidade de camarões sobreviventes independe da quantidade inicial povoada. Este dado é importante para a tomada de decisão na hora da escolha da densidade de camarões a ser utilizada no policultivo, uma vez que a maior taxa de sobrevivência da Fazenda Modelo (viveiro 1 – 19,6%), foi obtida a partir da menor densidade de povoamento inicial: 3,33 camarões por metro quadrado (Tabela 3). Tabela 3 - Resultados zootécnicos da Fazenda Modelo - Laguna - SC Po lic ul ti vo Resultados econômicos Após duas safras de perdas totais da produção, a Fazenda Modelo, a partir de um modelo de produção inovador para a Re- gião Sul do Brasil, conquistou resultados econômicos positivos e promissores. O custo total de produção dos peixes ficou em R$ 2,00 por quilo, o que significa que todo camarão despescado resultou em lucro líquido para a propriedade. Tabela 2 - Densidade de povoamento e sobrevivência das Fazendas Modelo, Rollin e, Lima e Duarte 47Panorama da AQÜICULTURA, julho/agosto, 2007 Perspectivas futuras O uso das tilápias no cultivo do camarão gerou um benefício imediato relacionado à sobrevivência de parte da população de cama- rões, diferentemente do que ocorreu até então na monocultura, onde os índices de sobrevivência continuam insignificantes em 97% das fazendas da Região Sul de Santa Catarina. Devido ao seu hábito alimentar e ao possível controle da transmissão horizontal do vírus da Mancha Branca realizado pelas tilápias, aliado a melhoria na qualidade de água e solo devido à po- licultura, esta modalidade de cultivo parece desempenhar um papel positivo e benéfico para o aumento da sobrevivência dos camarões nos viveiros. A perspectiva é que este aumento seja gradativo no tempo, ou seja, espera-se já para esta próxima safra índices de sobrevivência em torno de 20%. Com relação à comercialização, é necessário o desenvolvimento de um mercado para as tilápias marinhas, salientando as vantagens dos peixes serem cultivados em água salobra, que confere aos filés características diferenciadas quando comparandos com filés de água doce. Alguns restaurantes de Laguna e região já estão incorporando aos seus cardápios os filés de “tilápia marinha”. Apesar das dificuldades na produção e manutenção de estoques de peixes durante o inverno catarinense, é preciso pensar na possibi- lidade das fazendas funcionarem o ano todo, o que além da sustenta- bilidade social do ponto de vista dos empregos fixos, fica garantido também o fornecimento dos filés de peixes por todo o ano, o que é condicionante para a abertura de mercados como supermercados, bares, restaurantes e hotéis. Para o aumento do peso médio final dos peixes, é preciso pensar na produção de juvenis de tilápia durante o inverno, para que em outubro os produtores catarinenses possam dispor de juvenis de até 50 gramas para o início dos seus cultivos, o que pode garantir a produção de peixes acima de 700 gramas de peso médio, obtendo-se filés com peso superior a 120 gramas por unidade, atingindo outro patamar de padrão e preço. Importância da MP do Bem A aqüicultura brasileira obteve um importante incentivo, relacionado à redução nas suas contas de energia elétrica, através da MP do Bem, com a resolução da ANEEL no 207, de 09 de janeiro de 2006. Em Santa Catarina, o custo do kWh para os horários entre 21:30 e 06:00 h é de R$ 0,09, e durante o período restante, de R$ 0,27. O uso da energia noturna mostrou-se fundamental para o sucesso econômico do negócio, tendo em vista que o uso de aeradores (6 HP/ha) e renovação de água é indispensável durante as noites, diferentemente do que foi inicialmente previsto. Licenciamento Ambiental As primeiras experiências com policultivo em Santa Catarina foram autorizadas pela Fundação Estadual do Meio Ambiente – FATMA, sendo os cultivos experimentais rea- lizados em cinco fazendas, nos municípios Laguna e Imaruí. Atualmente, a Associação Catarinense de Cria- dores de Camarão (ACCC), numa ação conjunta com a EPAGRI, está pleiteando junto ao Conselho Estadual de Meio Ambiente (CONSEMA) a criação de uma Instrução Normativa (IN) específica para os policultivos em água salobra, uma vez que a FATMA – órgão licenciador esta- dual de Santa Catarina somente licenciará os policultivos após a aprovação do CONSEMA. Policultivo A perspectiva para a próxima safraé a redução do custo de produção para R$ 1,90/kg, e a venda de peixes acima de 600 gramas a R$ 2,20, o que signifi- cará R$ 0,30/kg de lucro líquido, além da produção de camarões. A taxa interna de retorno (TIR) do negócio deverá ficar em 25%. Tabela 4 - Principais classes de custo com suas respectivas porcentagens de incidência no custo total Camarões despescados na Fazenda Modelo com peso médio de 27gramas 49Panorama da AQÜICULTURA, julho/agosto, 2007 Uma Realidade Equatoriana em 2007 Por: Rodolfo Luis Petersen - PhD Coordenador do Projeto TILAG-UNISUL e-mail: rodolfopetersen@hotmail.com Policultivo de Tilápia + Camarão Marinho Das 23.100 toneladas de filés frescos de tilápia importados pelos EUA em 2006, 10.900 toneladas (47%) foram provenientes do Equador. Curiosamen- te, a quase totalidade desse peixe, foi cultivada em viveiros onde também são cultivados camarões, num sistema de policultivo que permitiu ao Equador liderar as remessas de filés frescos para os EUA, o maior mercado consumidor deste produto. O êxito do sistema praticado pelos produtores equatorianos é um dos focos do Projeto TILAG-UNISUL, recente- mente aprovado pela FINEP, SEBRAE e SEAP, e que visa promover ações para reativar a aqüicultura na região de Laguna, em Santa Catarina, devastada pela presença do vírus da mancha branca, o mesmo que também devastou a carcinicultura equatoriana, anos atrás. Uma viagem de prospecção tecnológica ao Equador acaba de ser realizada pelo biólogo Rodolfo Luis Petersen, Coordenador do TILAG –UNISUL, que faz, a seguir, um breve relato da sua experência. N o Equador, o cultivo da tilápia como um negócio rentável nasceu a partir da surgimento do Vírus da Mancha Branca, que afetou a produção de camarões marinhos e paralisou grande parte da infra-estrutura existente - viveiros, laboratórios e fábricas de alimentos balanceados. Atualmente a tilapicultura equatoriana está limitada ao policultivo com o camarão branco (Litopenaeus vannamei), utilizando a infra-estrutura existente e décadas de experiência em aqüicultura industrial. Sistema trifásico Atualmente existe no Equador um forte interesse em linhagens de nilótica (linhagens negras como são chamadas por lá) como a Chitralada e a GIFT. O fato é que a tilápia vermelha resiste muito bem a ataques bacterianos e parasitos, já que é mais resistente a salinidades acima de 20‰. Entretanto, a sua taxa de crescimento é marcadamente inferior. Todas as empresas visitadas estão cruzando as linhagens vermelhas com linhagens negras para tentar incrementar a baixa taxa de crescimento das tilápias vermelhas. O sistema praticamente comum de cultivo consiste em um sistema trifásico, utilizando alevinos com peso médio entre 1 e 2 gramas, não sendo usada energia para aeração nas fases 2 e 3 (Tabela 1). As três empresas visitadas trabalhavam com o sistema trifásico. Uma delas, entretanto, estava revendo a possibilidade de trabalhar com linhagens negras (Chitralada ou GIFT) em áreas de baixa salinidade, utilizando um sistema de duas fases: a primeira até 150 gramas e a segunda até o tamanho de abate. Isto se deve ao fato das linhagens negras serem bem mais susceptíveis nas transferências de indivíduos maiores, na média de 300 gramas. A premissa principal do policultivo da tilápia com o camarão é conseguir um equilibro entre a quantidade de tilápia e a quantidade de camarão a povoar. No sistema de cultivo com muita tilápia (2/ m2) e pouco camarão (2-4/m2) existe o risco de não alimentar bem a tilápia e aumentar consideravelmente a probabilidade de perder o camarão por causa da predação. Todos os produtores entrevistados no Equador me asseguraram que a tilápia come o camarão vivo, dependendo de sua disponibilidade de alimento de fácil captura, ou seja, a ração. Por outro lado, quando existe pouca tilápia (menos de 1/m2) e muito camarão (10/m2) é desencadeado um retardo na taxa de crescimento do camarão, por falta de ração. Outro fato muito importante é que, para obterem resultados econômicos satisfatórios, os produtores não se descuidam e nem esquecem por um só momento que a tilápia é o animal principal do policultivo. Sistema de recirculação com área de oxigenação 51Panorama da AQÜICULTURA, julho/agosto, 2007 Policultivo Os camarões As pós-larvas de camarão são recebidas nas fazendas no estádio variando de PL12 a PL18 e é realizado um cultivo intensivo com densidades variando entre 150 e 500 m/2, até o camarão atingir um peso médio entre 1,0 e 1,5 gramas, momento que é povoado o tanque de policultivo. De forma geral, os juvenis de camarão são povoados antes da tilápia mais não é regra absoluta e vai depender da logística de despescas e povoamentos. Se tiver que povoar o camarão na seqüência do peixe, se recomenda realizar a atividade em horário noturno e em locais do tanque que a tilápia não acostuma freqüentar. Nas transferências de todas as fases se realiza o trabalho de separação de tamanhos através do uso de malhas de rede de diferente abertura. Dependendo da empresa, em grandes viveiros, a tilápia é cercada com o auxilio de tratores que puxam as redes pelos taludes laterais. Outro sistema muito curioso consiste em “arrear” as tilápias batendo tocos de madeira na superfície da água sendo acurraladas em um dos cantos do tanques. Esta operação é realizada por um número que varia de 6 a 8 operários, os quais entram na água independentemente do nível do viveiro. Um viveiro de 17 hectares, por exemplo, é despescado completamente em uma semana. O camarão é despescado pela comporta durante o período noturno geralmente na fase final da despesca da tilápia. É importante ressaltar que no Equador o peso médio da tilápia despescada é de 900 gramas. menor peso médio. Após as larvas passarem pelo período de 28 dias de reversão sexual, são engordadas em sistemas intensivos com fortes trocas de água, ou, dependendo da empresa, em sistemas heterotróficos em flocos bacterianos. Todas, porém, povoam seus alevinos na Fase 1 de pré-cria da engorda com pesos médios entre 1 e 2 gramas. Manejo e qualidade de água Uma das grandes tendências observadas é o uso de bactérias probióticas e sistemas heterotróficos com flocos bacterianos (usada pelo Grupo Modicorp), e de sistemas de recirculação com ou sem uso de probióticos. Neste aspecto temos que destacar que a qualidade da água do Golfo de Guayaquil está muito comprometida, tanto pelo impacto da cidade, como pela aqüicultura na região. De forma geral ficou muito claro que o uso de probióticos supera imensamente ao sistema aberto, fundamentalmente na prevenção ao ataque de bactérias patogênicas. Outro fator em comum enfatizado pelas empresas é a variação estacional da salinidade como fator de estresse nas etapas tanto de engorda como de produção de alevinos, o que justifica os sistemas de recirculação. As vantagens e desvantagens dos sistemas utilizados são apontadas pelos técnicos na tabela 2. Produção de alevinos Das três empresas visitadas uma possuía o sistema de produção de alevinos com o uso de incubação artificial e duas com o sistema de captura de nuvens. A densidade de manutenção de reprodutores é de um indivíduo por metro quadrado, com uma relação fêmea macho de 3: 1. No caso da empresa que utiliza a incubação artificial os reprodutores eram colocados em tanques de terra de 200 m2. Já as empresas que utilizam o sistema de captura de larvas, os tanques de reprodutores possuem uma área variando entre 500 e 1000 m2. O sistema de reversão sexual é realizado em duas fases de 14 dias cada, em tanques de concreto redondos e retangulares variando entre 15 e 30 toneladas. A densidade de cultivo na Fase 1 varia entre 60 e 100 larvas/litro e na Fase 2 entre 50 e 60 larvas por litro. Entre uma fase e outra, é realizada a separação de classes de tamanho eliminando a de No Brasil, o projeto TILAG-UNISUL contempla um estudo do desempenho zootécnico de diferentes linhagens, entre elas a GIFT,Nilótica não selecionada e uma linhagem de tilápia vermelha mantida durante varias gerações na Piscicultura Panamá, no sul de Santa Catarina, bem como dos híbridos intra-específicos, caracterizados geneticamente e zootecnicamente. Espera-se que dessa forma seja possível em breve colocar a disposição do produtor um produto diferenciado e competitivo tecnicamente. Tabela 2 - Vantagens e desvantagens apontadas pelos técnicos na discussão do uso de cada sistema na produção de alevinos Tabela 1 - Sistema trifásico de policultivo tilápia-camarão 53Panorama da AQÜICULTURA, julho/agosto, 2007 Policultivo Controle de predação por pássaros Todas as empresas, e independentemente de linha genética (vermelha ou preta), utilizam redes anti-pássaros para a Fase 1 de pré-cria, até os 70 gramas. O custo desse “sistema de telhado” no Equador é de US$ 3.500/hectare. Comercialização As despescas da tilápia são realizadas de forma parcial e as tilápias são levadas vivas até a processadora em veículos-tanque com capacidade para transportar 4,5 toneladas por viagem. Chegando na processadora, as tilápias são descarregadas e mantidas vivas em tanques de concreto, abastecidos com aeração suplementar. As despescas são realizadas de forma parcial com grandes arrastos com redes puxadas por tratores da beira dos viveiros. Os peixes são divididos em grupos de cinco toneladas, para serem colocados nos veículos-tanque e levados para a empresa processadora. De modo geral o processamento da tilápia no Equador consiste nos seguintes passos: descabeçamento e sangria (máquina); retirada das escamas (máquina); lavagem e filetagem (pessoal especializado remunerado por peso processado); retirada da pele (máquina); toalete e controle de qualidade - retirada final de espinhos e cortes no dorso posterior do filé; resfriamento rápido a –20 C (sem congelar); embalagem em caixas próprias para a comercialização e, transporte para o aeroporto. Na ocasião da viagem, visitei uma planta processadora com capacidade de 30 toneladas dia, quando trabalham 24 horas por dia. Lá vão recebendo o que chamam de “cápsula”, que consiste em uma carga de 4,5 toneladas viva. A logística com a fazenda tem que ser quase perfeita entre uma remessa e outra e, de forma geral, as tilápias ficam cercadas na fazenda na espera do transporte. O controle de qualidade é extremadamente rigoroso: se a tilápia chegar “baleada” em Guayaquil, será filetada para o mercado interno. Para o mercado norte-americano, os peixes têm que chegar à processadora em excelente estado e totalmente vivos. O rendimento médio do processamento é de 30 %, com pouca variação entre 29 e 31 %. Maiores rendimentos podem ser obtidos, mas com perda significativa de qualidade. A maior parte da tilápia equatoriana é comercializada por um grande grupo do setor, com a marca “Tropical”. Este grupo possui escritórios em Miami e distribui diretamente a tilápia a supermercados e restaurantes americanos, evitando o custo de distribuição e terceirização desse serviço. Sanidade Todas as empresas possuem laboratório de controle sanitário para a observação de doenças bacterianas e parasitarias com possibilidade de realizar observações microscópicas de diferentes tecidos como brânquias e intestino. Alem disso, têm a possibilidade de realizar cultivos dos principais grupos de bactérias patogênicas como Pseudomonas, Flexibacter e Streptococus para sua identificação e tratamento. O autor agradece a empresa Guabi, especialmente ao Sr. João Manoel Cordeiro Alves por acreditar no potencial do Projeto Tilag e à empresa Prilabsa Ltda, acreditando que as parcerias entre empresas, governo, universidades e produtores, podem tornar realidade o desafio de reativar a economia da região de Laguna, SC. Redes anti-pássaros utilizadas para a Fase 1 de pré-cria Tilápia em espera para ser transportada á planta de processamento A c i m a : s i s t e m a s he t e r o t r ó f i c o s d e flocos bacterianos para alevinos Ao lado: tanques de probióticos em fase final de repicagem para serem inoculados nos tanques de cultivo.
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