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1 
 Universidade Federal de Juiz de Fora 
Professor Renato Moreira Nunes 
Departamento de Nutrição 
Curso de Nutrição 
 
 
Evite imprimir, a Natureza agradece - http://www.ufjf.br/renato_nunes/ 
Citação: 
Fischer, C. A “McDonaldização” dos Costumes. In: Flandrin, J. L.; Montanari, M. História 
da alimentação. Estação Liberdade, São Paulo, 2007. 841-863. 
 
Nunes, R. M. Introdução à Ciência da Nutrição – Evolução da Alimentação Humana - 
Caderno Didático da Disciplina de Introdução a Nutrição - Departamento de Nutrição - Universidade 
Federal de Juiz de Fora. UFJF. Juiz de Fora – MG, 2010. Disponível em: www.ufjf.br/renato_nunes 
 
INTRODUÇÃO Á NUTRIÇÃINTRODUÇÃO Á NUTRIÇÃINTRODUÇÃO Á NUTRIÇÃINTRODUÇÃO Á NUTRIÇÃO O O O –––– NUT 001NUT 001NUT 001NUT 001 Capítulo I 
 
 
 
“Se não encontramos beleza e felicidade em 
nosso próprio jardim, jamais as encontraremos 
em outras paisagens”.. 
Ditado popular 
Capítulo 47 
A “McDonaldização” dos Costumes 
Por Claude Fischer 
Em 1932, um autor originário de Nova York imaginava com entusiasmo o que seria uma cidade 
50 anos depois, em 1982: Nova York contaria com 50 milhões de habitantes, Hudson e East River 
ficariam lotados, a circulação se efetuaria silenciosamente através de vias suspensas nas laterais de 
imensos espigões... e “os habitantes se alimentariam de pílulas concentradas1. 
Para o autor e defensores entusiasmados do progresso tecnológico e científico, a perspectiva de 
uma alimentação total e exclusivamente funcional não suscitava qualquer espécie de temor. A despeito 
da grande crise (08 em seu favor) manifestava-se assim uma confiança profunda nas promessas da 
tecnologia, garantia do progresso. 
Cinquenta anos depois, do outro lado do Atlântico, essa perspectiva de uma pílula nutricional 
substituindo as refeições era percebida como uma eventualidade angustiante. Uma boa parte dos 
consumidores considerava a industrialização e a transformação crescente da alimentação o início de 
um processo que, inelutavelmente, chegaria a esse resultado. Com efeito, em 1982, as pesquisas 
mostravam que, para muitos franceses, como para outros habitantes do mundo desenvolvido, a pílula 
alimentar, com tudo o que a acompanhava ou a precedia em termos de funcionalidade, era a derradeira 
encarnação do “melhor dos mundos” à maneira de Aldous Huxley. Eis, por exemplo, como uma 
jornalista francesa descrevia, nesse ano, a maneira como uma “dona de casa do ano 2001” faria suas 
compras2: 
“Nove horas da manhã, no ano 2000. Com uma cesta na mão, a senhora Lespinguette faz 
suas compras no mercado da Rua Lepic. Ao longo dos passeios, desapareceram os carros com 
frutas e legumes da estação: hoje, só é possível encontrar tais produtos – que permaneceram frescos 
durante semanas – em embalagens plastificadas nos supermercados. 
A senhora Lespinguette entra num açougue e avalia com o olhar um soberbo rosbife que se 
destaca na prateleira. “carne verdadeira”, sublinha a etiqueta afixada na carne macia. A corajosa 
senhora suspira: no preço atual, carne de origem animal tornou-se um luxo que ela só pode ter no 
domingo, de vez em quando. Assim, resigna-se a comprar o bife do lado 100% vegetal. 
 
1. W. Parker Chase, New Yoirk. The WSonder City (1932), Nova York, New Bound, 1083. Citado in: J. Gleick, Genius. The Life 
and Sciences of Richard Feynman, Nova Yoirk, Pantheon Books, 1992. 
2. A. Oger, “La préparent nos menus de Pan 2000”, in: VSD, nº 223, 18 de fevereiro de 1982, PP. 25-27. 
NNNNNNNNNNNNUUUUUUUUUUUUTTTTTTTTTTTT 
 2 
 Universidade Federal de Juiz de Fora 
Professor Renato Moreira Nunes 
Departamento de Nutrição 
Curso de Nutrição 
 
 
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A senhora Lespnguette continua seu caminho até chegar ao estabelecimento bem espaçoso 
de alimentação que acaba de abrir no boulevard Clichy. Coloca na cesta um salsichão de ovos 
(cortado em fatias, ele será o hours-d´ouvre da semana – antepasto), uma omelete em tubo, um 
pacote de batatas fritas calibradas (todas elas medem 7 cm de comprimento) e algumas embalagens 
de peixe anônimo, sem cabeça nem rabo, embalado sob vácuo. Ainda alguns tabletes-refeição, e 
nossa dona de casa do ano 2000 volta par o lar onde, em poucos minutos, poderá prepara o almoço 
e o jantar.” 
Na época em que essas linhas foram escritas uma boa parte do que era apresentado como 
futurista pela jornalista já fazia parte da realidade cotidiana. Os filés de peixe congelados, as batatas 
fritas com 7 cm, as proteínas de soja texturizadas acrescentadas à carne moída, o desaparecimento dos 
vendedores de frutas e legumes da estação em benefício dos supermercados: tudo isso já existia em 
1982. A omelete em tubo, o salsichão de ovos não tinham entrado nos costumes do consumidor 
individual (atualmente, ainda não o são), mas são utilizados, às vezes, nas cantinas. Em compensação, 
nessa antecipação alimentar, as verdadeiras mudanças não eram percebidas de modo algum pela 
jornalista: os produtos mudam, mas as estruturas permanecem. Com exceção dos arcaicos carros de 
frutas e legumes de estação, propícios à nostalgia, a distribuição continua sendo feita da mesma forma 
(estabelecimentos comerciais especializados em vez de supermercados generalistas). Além disso, a 
senhora Lespinguette é uma dona de casa, uma doméstica, o que mostra que não é levada em 
consideração a entrada maciça das mulheres na vida profissional3. E a tecnologia agro alimentar não 
chegou ao ponto de substituir a tradicional cesta, essa sacola de provisões de tela encerada ou de palha 
entrançada que a dona de casa parisiense utilizava para fazer compras no mercado, antes da chegada 
dos supermercados. 
Portanto, por que motivo nos mostrar o presente se a intenção suposta era o futuro? A primeira 
razão tem a ver, provavelmente, com o fato de que, como dizia um humorista, “a previsão é uma arte 
difícil, sobretudo quando se trata do futuro.” É provavelmente por que a prospectiva consiste, 
geralmente, em extrapolar para o presente algumas tendências bem caracterizadas. Mas, sobretudo essa 
descrição pseudofuturista traduzia em sua autora (e, sem dúvida nos seus leitores) uma ansiedade, um 
temor, em todo caso um julgamento negativo formulado a respeito da evolução da alimentação 
cotidiana (e do modo de vida): a mudança já presente no cotidiano suscitava e justificava, 
simultaneamente, a angústia em relação ao futuro e a nostalgia do passado. 
 
Do mito da pílula ao mito do invasor 
 
Atualmente, estamos apenas a quatro anos do tão evocado ano 2000. A fé ingênua na tecnologia 
e suas promessas de futuro radioso foram, no mínimo, abaladas. As inquietações e as desconfianças em 
relação ao futuro tecnológico continuam a se expressar sob outras formas. O temor manifestado, em 
particular entre os europeus do sul, já não é em relação à pílula. A anedota seguinte é reveladora: um 
grande chef francês, Marc Meneau, aperfeiçoou para os astronautas uma gama de produtos cozinhados 
liofilizados de elevadíssima qualidade. Seríamos levados a julgar que ninguém, além dos viajantes do 
espaço, teria necessidade de um concentrado nutricional puramente funcional. Ora em sua utilização 
foram concebidos, pelo contrário, produtos de uma qualidade gustativa tão elevada quanto possível: o 
prazer alimentar revelou-se importante para o equilíbrio daqueles submetidos a condições de vida 
extremas, mais importante até, em certo sentido, do que nas situações cotidianas habituais. 
Surgiram, então, duas preocupações – Saúde e identidade cultural – que foram abordadas, com 
mais ou menos ênfase, de acordo com a sensibilidade das diferentes populações. 
 
3. Na França, os dados mais recentes do institul national de La statístique et des études êconomiques indicam que, atualmente, 
apenas cerca de três milhões de mulheres permanecem em casa. 
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A primeira inquietação – ou um fantasma, como se queira – mais particularmente espalhado na 
Grã-Bretanha, nos países escandinavos e no norte da Europa, e, sobretudo nos Estados Unidos, incide 
sobre a saúde. A expectativa de vida alongou-se em todos os países desenvolvidos; duplicou 
praticamente em um século. Multiplicou-se o número de pessoas que chegaram há atingir cem anos. 
Aumentou consideravelmente a altura média. Apesar desses sinais de melhoria da saúde pública, uma 
inquietação geral, médica e profana difundiu-se entre uma grande parte da população (em especial, a 
parcela que, mais culta e ao corrente das regras de higiene e da boa nutrição, corre menos riscos), 
relativamente à alimentação. Foram designadas “doenças de civilização” as patologias 
cardiovasculares, em particular coronárias, e numerosos cânceres, tendo ficado esquecido que tais 
doenças não se manifestam antes de uma certa idade e que é graças ao prolongamento da duração de 
vida que nossos contemporâneos acabam sofrendo por causa delas. Dito por outras palavras, 
envelhecer é ruim para a saúde; muito mais, pelo menos, do que comer bem4. 
Na França, Itália, Espanha, assim como em outras regiões de tradição católica, as pessoas 
passaram a temer também pela identidade cultural sempre que ameaças pesaram sobre a tradição 
culinária. Receiam que a relação privilegiada mantida com a alimentação cotidiana, com fonte de 
prazer, ato de sociabilidade e comunicação, acabe sendo letamente corroída, invadida, desagregada por 
um inexorável processo que tem o nome de “americanização” e cujo vetor já não é a fantasmática 
pílula, mas o onipresente hambúrguer. Observamos, de passagem – mais adiante, voltaremos ao 
assunto – que, procedendo dessa forma, não se presta qualquer atenção à inofensiva pizza, que, no 
entanto, está conquistando o planeta inteiro. O temor do “melhor dos mundos” da alimentação deu 
lugar ao dos “invasores” e da perda de identidade. As pessoas se interrogam, angustiadas, sobre a 
progressão aparentemente implacável do “imperialismo alimentar” oriundo da América do Norte. A 
questão que se coloca a propósito dessa suposta “McDonaldização” dos costumes é a seguinte: será 
que se trata verdadeiramente do coroamento de um processo histórico de racionalização, 
industrialização e funcionalização da alimentação? Ou então estaremos obcecados por fantasmas, 
projeções e “racionalizações” (desta vez, no sentido psicanalítico) que nos impeliram a atribuir mais 
importância a uma parte do fenômeno em detrimento de outros aspectos que estariam sendo 
subestimados ou minimizados por nós? 
Industrialização, racionalização, funcionalização crescentes: desde o final do século XIX essa 
tripla dimensão aparece, sem qualquer dúvida, de maneira ofuscante nas modificações que perturbaram 
nossa alimentação. Da produção ao consumo, passando pelo abastecimento, sua realidade é 
incontestável. Mas as realidades ofuscantes não devem nos confundir, isto é, nos conduzir a mutilar 
sua complexidade. Ora, para aprender toda a complexidade das mudanças em ação na civilização 
moderna e no mundo desenvolvido, convém levar em consideração alguns de seus aspectos 
paradoxais. Com toda a certeza, nossa alimentação situa-se hoje, dentro de uma corrente tecnológica, 
industrial e funcional. Mas reveste-se também de outras dimensões, sem as quais a primeira não 
poderia desenvolver se plenamente. A mais importante, à primeira vista, é paradoxal: a do prazer. Para 
compreender os processos que estão em ação atualmente, devemos apreender as relações estreitas entre 
esses dois pólos aparentemente opostos da alimentação moderna: a funcionalidade e o prazer. 
 
De Henry Ford ao McDonald’s 
A industrialização da alimentação e o surgimento, no nosso século, da distribuição em grande 
escala constituem fenômenos recentes deste lado do Atlântico. Datam, sobretudo dos anos 60. Em 
compensação, nos Estados Unidos alguns produtos alimentares industrializados – entre os quais a Coca 
Cola – encontram-se no mercado há 100 anos ou mais. 
 
4. P. Skrabanek e J. McCormick, Idées folles, idées fausses em médecine, Paris, Odile Jacob, 1992. C Fischler, L’Homnivore, Paris, Odile Jacob, 
“Points”, 1993 (1990); id. (Ed.), Manger magique, Paris, Autrement, 1994. 
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Heniz, Nabisco, Kellog, Campbell figuram já entre as maiores empresas americanas na década 
de 1880 ou 1890, e a indústria agroalimentar revela-se, no final do século XIX, a primeira do país. A 
descoberta das bactérias e a obsessão subseqüente em relação aos germes favorecem, paradoxalmente, 
uma concentração da indústria de laticínios. No início do século XX impõe-se a obrigação de 
pasteurizar o leite e só conseguem sobreviver às empresas capazes de fazer investimentos 
consideráveis, que, em decorrência de tal operação, se tinham tornado necessários. Desde os 30 
desenvolve-se no país a distribuição em grande escala5. Nesse sentido, a América antecipa tendências 
surgidas, mas tardiamente em outras partes. Assim, a compreensão dessa realidade americana deveria 
permitir apreender melhor os fenômenos que, em matéria de alimentação, estão se processando há 
cerca de 30 anos no Velho Mundo. 
Na maioria das regiões desenvolvidas, a mudança dos hábitos alimentares parece, em parte, 
orientada segundo as mesmas tendências: sem dúvida, porque estas surgiram e se desenvolveram mais 
cedo e muito mais nos Estados unidos do que em qualquer outro país. Assim, como vimos, a 
individualização e a desestruturação das práticas alimentares, consideradas hoje, por unanimidade, os 
principais processos em curso na Europa ocidental, já tinham sido detectadas na América do Norte no 
decorrer dos anos 606. Observam-se, atualmente, em menor grau, em diversos países europeus, no 
meio urbano, certas características originárias da alimentação nos Estados Unidos. Traço dominante 
dessa evolução: está a impor-se de forma segura a transformação crescente dos produtos, de um 
extremo ao outro da cadeia de produção, tanto agrícola como industriais. 
Sobretudo a partir da segunda metade do século XX, a produção agrícola não cessa de se 
concentrar e se intensificar. As zonas de produção especializam-se. A policultura acompanhada de um 
forte autoconsumo tende a ceder lugar à monocultura em vastos espaços. Trocas comerciais 
mundializam-se e diminui a autoprodução. Os produtos da agricultura são cada vez mais 
transformados pela indústria. 
A distribuição passa, igualmente, por profundas mudanças. Na Europa ocidental, sobretudo a 
partir dos anos 60, espalham-se os supermercados, assim como o carro, a televisão, o lazer, a elevação 
do nível de vida e de educação. Essa revolução da distribuição em grande escala tem conseqüências 
pelo menos tão importantes quanto a industrialização da produção agroalimentar, que, por isso, acaba 
passando por uma considerável inflexão. Com efeito, a alimentação torna-se, propriamente falando, 
um mercado de consumo de massa; a partir de então se processa com produto altamente transformado 
por procedimentos industriais de vanguarda. Concebidos e comercializados com o apoio das mais 
modernas técnicas do marketing, packaging (Ferramenta de Empacotamento Avançada ) e publicidade, 
são distribuídos por redes comerciais que não cessam de aperfeiçoar seu poder e complexidade, 
colocando em ação uma logística extremamente elaborada. Trata-se, com uma freqüência cada vez 
maior, de produtos de marca (pelo menos, num primeiro tempo, porque os distribuidores colocam logo 
em destaque sua própria marca) que têm necessidade de consideráveis investimentos publicitários. 
Em duas ou três décadas, uma parte crescente do trabalho culinário, tanto em casa como no 
restaurante, deslocou-se da cozinha para a fábrica. Esses alimentos transformados,“marketeados”, 
divulgados pela publicidade são também produtos que incorporam um valor agregado cada vez mais 
elevado, já presente no nível da preparação: a indústria torna á sua conta o essencial do trabalho 
doméstico, uma vez transformados pela indústria, os alimentos tornam-se “alimentos sérico”7. 
 
 
5. H. Levenstein, Revolution at the table. The transformation of the American Diet, Nova York, Oxford Universidaty press, 1988; id., Paradoxo f 
Plenty. A Social History of Eating in Modern America, Nova York, Oxford University Press, 1993. 
6. C. Fischler, i.’Homonivore, op. Cit. 
7. B. Sylvander, I.’Alimentation-service. Résultais d’onquiles,Ttouloure, INRA, “Êconomie et sociologie ruralea”, 1988. 
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 O Crescente acesso das mulheres, nos países mais desenvolvidos do Ocidente, à atividade 
profissional, torna precioso o tempo doméstico, tanto mais que os homens não têm, de modo algum, 
uma participação maior do que anteriormente nas tarefas da casa. Os produtos distribuídos nos 
supermercados da Europa ocidental desde os anos 60 visam, portanto, economizar esse tempo. Com os 
produtos light, a parte de valor agregado aumenta ainda mais, com a integração do regime ao produto. 
A indústria já cozinhava no lugar do consumidor; agora, propõe-lhe encarregar-se também do regime. 
As modificações introduzidas nos gêneros alimentícios não correspondem somente a uma 
demanda dos consumidores. Nesse aspecto, desde os anos 60, a distribuição desempenha um papel 
determinante. Com efeito, ela obedece a diversos imperativos – logísticos, tecnológicos, econômicos. 
É também sob a pressão dos distribuidores que se desenvolvem e se generalizam mercadorias mais 
fáceis de estocar, transportar, exibir e conservar nas prateleiras. A agricultura seleciona produtos por 
sua aparência e duração de vida nas lojas. Das frutas aos queijos, os alimentos cotidianos passam por 
profundas transformações. Do mesmo modo, é sob a pressão dos supermercados que , nos anos 60, 
aparecem e depois se impõem as embalagens plásticas, em particular para a água mineral e óleo. As 
garrafas de PVC implantam-se rapidamente por que são mais fáceis de transportar em paletes, mais 
leves, menos frágeis, além de serem descartáveis. Somente muito mais tarde as pessoas se deram conta 
de seus inconvenientes para o meio ambiente. Alguns consumidores começam a se queixar: seu queijo 
favorito é quase sempre, pasteurizado, as maçãs são apenas da variedade insípida dita Golden delicius, 
as frutas chegam aos supermercados sem o devido grau de maturação, o pão já não tem as 
características gustativas às quais estavam acostumados. Em contrapartida, os supermercados oferecem 
preços vantajosos ao conseguirem consideráveis economias pelas compras em alta escala. 
Além disso, permitem um certo número de inovações. Com efeito, são os únicos capazes de 
colocar em ação os meios logísticos e tecnológicos necessários para comercializar novas variedades de 
produtos, cujo consumo passa a ter um rápido sucesso. Na França, é o caso, por exemplo, não só dos 
iogurtes e laticínios ditos “frescos”, mas também da água mineral em garrafas plásticas: duas 
categorias de alimentos dos quais os franceses são os maiores consumidores no mundo. 
A alimentação, já modificada há duas ou três décadas pelos efeitos conjugados da distribuição e 
da indústria, passa atualmente por novas transformações. O nível de vida continua a crescer; as 
necessidades energéticas dos consumidores têm diminuído; a concorrência tornou-se cada vez mais 
viva para conseguir a preferência dos distribuidores e consumidores. Portanto, os mercados foram se 
“segmentando”, segundo a terminologia em vigor no marketing – isto é, fragmentaram-se e 
especializaram-se – e é o valor agregado que, daí em diante, aparece como crucial mais do que a 
economia obtida pelas compras em alta escala. Assim, acentuam-se ainda mais o processo de 
transformação dos produtos. O valor agregado passa por um crescente grau de elaboração técnica ou 
pela busca da qualidade. 
A título de exemplo, a segmentação dos mercados não é em nenhum setor mais manifesta do que 
no comércio dos uísques. Num primeiro tempo, nos anos 50, sob a influência particularmente do 
cinema e dos romances norte americanos, o scotch tornou-se, na Europa, uma bebida carregada de 
conotações viris e prestigiosas. Os uísques oferecidos nessa época aos consumidores eram Blended 
(misturas) de base. Em seguida, foram se diversificando consideravelmente: os “doze anos” e depois, 
no período mais recente, os purê malt e os single malt (além de não serem blended, estes últimos 
provêm de uma única destilaria). Essa evolução foi acompanhada, evidentemente, por um aumento 
considerável dos preços e da margem de lucros. 
Outro exemplo: o dos queijos camembert da Normandia (são menos vendidos no mundo do que 
os camemberts made in Denmark, mas os franceses têm a fraqueza de considerá-los mais autênticos). 
Nos anos 60, com a generalização dos supermercados, anunciava-se o fim do camembert à base de 
leite fresco e “moldado com concha” por operários que eram os únicos a possuírem tal habilidade. 
Previa-se o fim inelutável dos queijos tradicionais em benefício de produtos indiferenciados fabricados 
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com leite pasteurizado. Ora, com a segmentação dos mercados, alguns camemberts confeccionados à 
base de leite fresco acabaram por se aperfeiçoar. Tiraram partidos das contribuições da tecnologia mais 
moderna. Os operários foram substituídos por robôs e o camembert tradicional – em média, de 
qualidade bastante superior a de outrora – tornou-se um dos setores mais florescentes e rentáveis do 
mercado8. 
 
A Modernidade a Domicílio: Microondas e Congelados 
No decorrer dos últimos dez anos o forno de microondas e os congelados impuseram-se de forma 
maciça. Assim, no que diz respeito à França, uma pesquisa permanente do CRÉDOC (Centre de 
recherche et d´études sur lês conditions de vie) mostrava que, na primavera de 1989, 19,9% das 
pessoas interrogadas declaravam dispor de um desses aparelhos; na primavera de 1990, já eram 
24,9%. Segundo uma estimativa9 do final de 1990, cerca de um terço das famílias francesas possuíam 
tal equipamento. Em 1995, a mesma fonte indicava-nos que a proporção era de 50,31%10. 
Ainda na frança, a expansão do microondas entre as famílias foi acompanhada pela adoção cada 
vez mais nítida e sem reticências do congelado, que daí em diante, seria utilizado por 95% das 
famílias, pelo menos uma vez por ano, segundo as pesquisas do setor industrial. No início dos anos 70 
os críticos gastronômicos Gaut e Millau revistavam as latas de lixo dos restaurantes, denunciando 
aqueles cujo lixo continha embalagens de congelados. Depois de ter encarnado o derradeiro artifício, a 
abominação da desolação industrial, o congelado tornou-se cada vez mais, na percepção dos 
consumidores franceses, uma forma superlativa do fresco, em suma, mais fresco do que o fresco. 
Outras tecnologias deram origem a novos mercados, tais como as saladas pré-lavadas, os legumes pré-
cozidos, etc. 
Além do preço, três dimensões essenciais dos produtos oferecidos aos consumidores permitem 
predizer seu sucesso: em primeiro lugar, é claro, o sabor e as qualidades organolépticas (valor do 
prazer); mas também o valor saúde e a comodidade de utilização. 
Os dois primeiros fatores estão sujeitos a fortes variações culturais. A noção de saúde assume 
uma acepção diferente na Inglaterra e na França. Enquanto uma grande parte dos ingleses pensam que 
o queijo está carregado de gorduras saturadas que ameaçam suas artérias, a maioria dos franceses 
consideramo queijo e os laticínios alimentos ricos em cálcio e indispensáveis ao equilíbrio alimentar. 
Nossas pesquisas mostram que, no conjunto, os conhecimentos nutricionais dos franceses são bem 
inferiores aos dos americanos ou escandinavos. No entanto, os estudos epidemiológicos confirmam 
que os franceses são menos atingidos pela obesidade e que seu índice de mortalidade em decorrência 
de doenças coronárias é o mais baixo entre todos os países desenvolvidos, com exceção do Japão12. 
A comodidade da utilização desempenha um papel determinante. Assim, no que diz respeito aos 
legumes frescos e frutas, observa-se este paradoxo aparente: de maneira quase unânime, na maioria 
dos países desenvolvidos – mas, particularmente, na França – são atribuídas aos legumes virtudes 
nutricionais consideráveis. Todavia, continua a cair o consumo de legumes frescos. Em compensação, 
desenvolvem-se as versões prontas a serem utilizadas. 
 
 
 
8. Ver P. Boisard, Le Camembert, Mythe national, Paris, Calmann-Lévy, 1992. 
9. Points de vente, Paris, nº 393, 1990. 
10. CRÉDOC, Aspirations et modes de vie des Français, pesquisa permanente. 
12. Cf., por exemplo, M. Affelbaum, “La diète prudente ester-elle bien raisonnable?”, in: C. Fischler, manger magique, op. Cit., pp. 179-183 
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A alimentação deixa o lar 
No momento em que a alimentação torna-se um mercado de consumo de massa, as refeições 
servidas em restaurantes passam por uma evolução, em parte, comparável. Enquanto ao longo da 
evolução histórica a casa foi assimilada ao lar – isto é, à cozinha -, na proximidade do terceiro milênio 
a alimentação se identifica cada vez menos necessariamente com o universo doméstico. 
Os modos de vida foram modificados profundamente pela urbanização, pela industrialização dos 
anos 1950-1960, pela profissionalização das mulheres, pela elevação do nível de vida e de educação ao 
lazer, férias e viagens. Aumentar regularmente o número de refeições tomadas fora de casa. 82% dos 
franceses declaram comer fora, pelo menos ocasionalmente; além disso, o número médio de refeições 
tomadas fora de casa é de cinco por semana13. Aumenta o número de refeições tomadas na empresa, 
escola e coletividades. Em primeiro lugar, desde os anos 50 na Europa, aparecem as diversas fórmulas 
de self-service. Em seguida, nos anos 60, implantam-se diferentes formas de servir refeições oriundas 
do além-Atlântico, por intermédio da Grã-Bretanha, país no qual se desenvolve, antes de se estabelecer 
no continente, a rede Wimpy, especializada em hambúrgueres. 
 
O Fast-Food ou a Cozinha Compartimentada 
Mas o fast-food de inspiração norte-americana não aparece na Europa ocidental antes do final 
dos anos 70, inclusive no início dos anos 80. Tinha-se difundido nos Estados Unidos, dede os anos 50, 
sob a forma de grandes redes em sistema de franchising, ao longo dos eixos rodoviários, na periferia 
das cidades, centros comerciais, e depois, cada vez mais, nos malls, que se tornam o âmago da vida 
comercial das grandes conurbações americanas, sob forma de food courts. Trata-se de verdadeiros 
centros comerciais de alimentação: num espaço único, é proposta toda espécie de fórmulas rápidas – 
pizzas e hambúrgueres, tortillas ou tacos mexicanos, fast-foods chineses, japoneses, gregos, pittas, 
falafels, croissants e outros sanduíches variados. 
Ora, o termo fast-food não evoca, atualmente, na Europa, esse conjunto de cozinhas 
cosmopolitas e heteróclitas. Designa antes a trilogia ketchup-hamburguer-batatas fritas (mesmo no 
inglês norte-americano, as batatas fritas são camadas de French Fries) e o inevitável McDonald’s. 
Tendo partido da América para conquistar o mundo, o fast-food é a aplicação do taylorismo, ou seja, 
da divisão e racionalização do trabalho, à preparação de refeições servidas em restaurante. Como 
observa Harvey leventein em sua dupla obra sobre a história da alimentação na América do Norte14, 
em que país seria possível procurar, como fez Burger King, servir “uma refeição completa em 15 
segundos”? 
Já a muito tempo, no decorrer de suas visitas aos Estados Unidos, os viajantes identificaram duas 
características estranhas: por um lado, os americanos dão provas de um feroz apetite; por outro, 
obstinam-se a comer o mais rápido possível, em particular os businessmen de Chicago ou de Nova 
York. Desde o início do século, nessas duas cidades, alguns self-services servem refeições para 
“colarinhos brancos” que as encomendam num balcão e as consome a mesa, tudo isso num ritmo tão 
rápido que são conhecidos pelo apelido de smash-and-grab places (algo como “lugares de esmaga e 
agarra”)15. 
Assim, o jornalista Paul de Rousiers, no final do século XIX16, ou ainda Paul Morand, no início 
do século XX, já descreve com certo espanto restaurante situados nos bairros de negócios e nos quais é 
possível tomar refeições em alguns minutos. 
 
13. P. Hébel e C. Renault, La Restauration hors foyer em 1994, Paris, CRÉDOC, 1994, 2 vols. 
14. H. Levenstein, op.cit. 
15. Ibid., p. 227 
16. P. de Rousiers, La Vie américaine, Paris, Fimin Didot, 1892. 
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“É hora de almoçar. De novo, as ruas ficam repletas. Em nova York, ninguém volta para casa ao 
meio dia: as pessoas comem no lugar onde se encontram, seja nos escritórios, ao mesmo tempo em que 
trabalham, seja nos clubes ou nas lanchonetes [...]. Nas cantinas populares, milhares de seres alinhados 
devoram, com o chapéu na cabeça, numa fila única, como no estábulo, alimentos frescos e apetitosos 
por preços inferiores aos nossos. Avançam para seus pratos repletos de pedaços de carne, atrás deles, 
outras pessoas esperam a sua vez17. 
Vejamos o que deixa surpreso o observador francês: por um lado, o fato de que as pessoas 
comem nos escritórios “ao mesmo tempo em que trabalham” e, por outro, que alimentos “frescos e 
apetitosos” sejam absorvidos “com, o chapéu na cabeça”, rapidamente, “como no estábulo” (isto é de 
maneira muito pouco humana e convival). 
A forma como os americanos se relacionam com a alimentação constitui uma fonte de espanto 
constante para os europeus: o tempo de comer não é isolado, delimitado; não existe necessariamente 
por si mesmo, como tal. É possível trabalhar e comer ao mesmo tempo, comer e empreender; 
aparentemente, qualquer outra atividade. Na velha Europa, a refeição é (era) um tempo e um espaço 
ritualizados, protegidos contra a desordem e as intrusões: o decoro proibia telefonar na hora das 
refeições ou, mais ainda, fazer uma visita. Era (em grande parte, continua sendo) impensável comer na 
rua, dirigindo, ou um elevador. 
Os espiões iraquianos em Washington teriam sido mais eficazes se tivessem prestado mais 
atenção às atividades alimentares dos militares americanos. Assim, estaria em condições de anunciar a 
Saddam Hussein, com algumas horas de antecedência, a iminência do bombardeio americano a Bagdá: 
com efeito, na manhã de 16 de janeiro de 1991, oito horas antes da ofensiva, a Domino’s Pizza tinha 
entregado na Casa Branca 55 pizzas (contra cinco, em média) e 101 no Pentágono (em vez de três, em 
média)18. Na América da eficácia, do pragmatismo anglo-saxão, a alimentação serve também, 
inclusive antes de tudo, para a reprodução da força de trabalho, sem interrupção – ou quase – do 
processo produtivo. 
O sucesso das novas redes de fast-food em franchisiing, nos anos 60, explica-se em grande parte, 
segundo Levenstein, pela obsessão americana com relação à higiene. Desde o final do Século XIX e a 
partir das descobertas de Pasteur sobre a origem bacteriana das doenças infecciosas, os micróbios 
encontravam-se no centro das preocupações de todos os restaurantese da indústria alimentar. As 
primeiras redes de hambúrgueres, nos anos 20, chamavam-se White Tower e White Castle, utilizando 
tanto quanto possível a cor branca em suas instalações; além disso, para tranqüilizar os consumidores 
inquietos com os perigos inerentes à carne de boi moída, a segunda declarava ter escolhido chamar-se 
“White, for purity”19. 
Em geral a paternidade do fast-food e do primeiro McDonald’s é atribuída a Ray Kroc. Na 
realidade, o mérito cabe aos dois irmãos Dick e McDonald’s quer criaram o “conceito”. Todavia, é 
Ray Kroc quem, na seqüência, o desenvolve e lhe dá o impulso que o leva à sua atual dimensão 
mundial. Em 1937 Dick e Mac McDonald abre seu primeiro drive-in restaurante perto de Pasadena, 
tirando partido assim da crescente dependência dos californianos em relação ao Carro. Começam por 
vender hot-dogs, e não hambúrgueres. Tendo feito fortuna nos anos 40 com um novo restaurante, 
muito maior, instalado em San Bernardino, vêem a rentabilidade de seu estabelecimento afetada pela 
presença de jovens – os teenagers – que afugentam uma clientela mais familiar. Em 1948 os dois 
irmãos renovam totalmente a empresa, centralizando-a no hambúrguer, no preço mais baixo possível, 
na máxima rapidez e no self-service. Eliminam os talheres e os pratos, substituindo-os por embalagens 
de papelão e sacos de papel. O preço do hambúrguer é, então fixado na irrisória soma de 15 cents20. 
 
17. P. Morand, New York, Paris, Flammarion, 1988 (1930). 
18. F. Tonello, “Undici Millardi di fette”, in: la Gola, Millo, nº 90-92, p. 26. 
19. H. Levenstein, op. Ett, p. 228. 
20. J. F. Love. McDonald’s Robimed the arebos, Nova York Bantam Biolea, 1986. 
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O triunfo é rápido: em vez de ser um lugar onde os jovens passam a noite, o McDonald’s torna-
se o único restaurante em que as famílias de operários podem vir com os filhos. Ainda aí a limpeza e a 
higiene revelam-se determinantes: os clientes estão em condições de verificar o estado impecável da 
cozinha e do aço inoxidável que brilha por todo o lado. As crianças tornam-se, logo os clientes mais 
assíduos e motivados, arrastando atrás de si os adultos. 
É então que os irmãos McDonald levam o seu termo a lógica do taylorismo ou, mais exatamente, 
a de Henry Ford: introduz na preparação das refeições o sistema da produção em cadeia. Com uma 
equipe reduzida, sem grande qualificação, portanto com baixo salário, equipamentos adaptados e 
procedimentos cada vez mais padronizados, eles conseguem em breve servir as encomendas em alguns 
segundos. O sucesso leva a imitações e demandas de franchising. 
Os irmãos McDonald nunca souberam administrar bem o franchising. Um vendedor de utensílios 
e equipamento de cozinha (fornecia batedeiras aos McDonald), Ray Kroc, teve um encontro com os 
fundadores em 1954 e comprou-lhes o direito de vender e administrar as franquias de restaurantes 
MacDonald’s, fundando a companhia com sede em Chicago que deveria ter esse nome. Trouxe para 
essa tarefa um savoir-faire e rigor que os fundadores não tinham, procurando garantir que seus clientes 
(os franqueados) obtivessem o maior sucesso e exercendo um controle impiedoso sobre a qualidade e o 
comprimento das regras estabelecidas pelos irmãos McDonald. 
Nos anos 1950-1960, redes análogas – em particular, Kentucky Fried Chicken – Desenvolvem-se 
nos Estados Unidos e depois, em número cada vez maior, no exterior. É então que entra em jogo a 
temática etbinic21. Já nos anos 50, um vizinho dos McDonald em San Bernardino tinha imitado uma 
parte de suas técnicas, aplicando-as a pratos mexicanos, os tacos, e criado a rede Taco Bell. 
A partir do final dos anos 50, chega a vez da pizza. No final dos anos 60, os americanos, que 
consomem por ano dois bilhões de pizzas, resolvem á sua maneira os problemas de produção 
levantados por essa especialidade napolitana, ainda amplamente desconhecida no norte da Itália. Desde 
o início dos anos 50, o mercado da pizza na costa oeste é sobretudo, um negócio de Greco-americanos. 
Eles desenvolvem uma nova tecnologia, que racionaliza a produção da pizza: em vez de enrolar e 
trabalhar a massa, esta é preparada com antecedência, colocada em recipientes metálicos e, em seguida 
, refrigerada; depois, basta introduzi-la no forno no momento da encomenda. A rede Pizza Ht, com 
sede em Wichita e, atualmente, controlada pela Pepsico, aperfeiçoa o procedimento, transformando-o 
em verdadeiramente em fast-food22. Ainda que os napolitanos não tirem nenhum proveito disso, a 
hegemonia da pizza – pelo viés de sua americanização e, em seguida, de sua mundialização – está 
garantida. 
 
O Hambúrguer e a Pizza 
Depois de se ter imposto nos Estados Unidos, o fast-food começou sua expansão mundial, com 
uma aceitação diferenciada. Do mesmo modo que, nos anos 50, a Coca-Cola tinha sido descoberta pela 
Europa convalescente da guerra dando uma mistura de delícia e horror ideológico, assim também o 
fast-food esbarrou em obstáculos políticos consideráveis. Na Suécia, no início dos anos 70, na época 
da Guerra do Vietnã, ergueram-se vozes veementes para criticar os americanos que pretendiam forçar 
a saudável juventude sueca a engolir “alimentos plásticos” estranhos à tradição local. Muito mais 
tarde, na Itália , quando a rede McDonald’s desejou abrir um discreto restaurante na Piazza di Spagna, 
em Roma, alguns milhares de pessoas manifestaram seu protesto. Tratava-se de defender a tradição 
culinária local contra a invasão dos americanismos bárbaros. Criou-se um movimento intitulado slow 
food, que ainda existe. 
 
21. Para um quadro interessante – embora por vezes contestado – da recuperação da onda étnica contracultural pelo big busines, cf. W. Belasco, 
Appetite for Chango. How the Counterculture Took on the Food Industry, 1966-1988, Nova York, Pantheon Books, 1989. 
22. H. Levenstein, op. ett., p. 230. 
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As desventuras iniciais da McDonald’s na frança merecem ser contadas. Um empresário local, 
Raymond Dayan, tinha obtido desde o final dos anos 70 a franquia da McDonald’s em condições, ao 
que parece, bastante vantajosas. Segundo certas informações, a empresa americana julgava-se bastante 
satisfeita em poder assim introduzir seu produto num país cujas tradições gastronômicas, exigências 
culinárias e reputação (nem sempre justificada) de anti-americanismo tornariam difíceis a implantação 
e a difusão de seus restaurantes. Raymond Dayan tinha instalado o primeiro McDonald’s num centro 
comercial da periferia parisiense. De forma bastante rápida acabou multiplicando, com sucesso 
crescente, o número de novos restaurantes. Em 1982, a McDonald’s tentou recuperar a franquia 
concedida dessa forma. Segundo a empresa de Chicago, Dayan não estava cumprindo as normas 
impostas aos franqueados, principalmente em matéria de higiene e qualidade. Após uma dura batalha 
judicial ela acabou ganhando a causa diante de um tribunal de Chicago. Da noite para o dia, os 
restaurantes McDonald’s mudaram suas placas para O´Kitch. Em seguida, essa rede foi vendida à 
marca européia Hambúrguer Quick. Desde então, a rede McDonald’s retomou uma política de 
desenvolvimento regular e progressivo. Atualmente, no mercado francês, ocupa uma posição 
comparável ao lugar conseguido em todos os mercados europeus, para não dizer mundiais. A 
gastronomia francesa permaneceu igual a si mesma, mas os franceses não deixaram de aprovar o 
Hambúrguer. 
Em compensação, no plano ideológico as objeções revelam-se mais virulentas do que nunca. É 
interessante notar que as mesmas criticas formuladas contra o hambúrguer, em geral, e a McDonald’s, 
em particular, não se dirigem do mesmomodo a todas as formas de fast-food. É que a empresa 
McDonald’s encarna superlativamente o “imperialismo americano” que, para um grande número de 
europeus, em particular do sul, ameaça as tradições culinárias, às quais as pessoas estão apegadas, 
tanto mais que a mudança de civilização faz com que tais tradições evoluam muito rapidamente. Em 
suma, ao ler o que tem sido escrito sobre o assunto e ao interpretar as pesquisas, o hambúrguer tem a 
aparência do diabo. É uma ameaça para os jovens. É responsabilizado por toda espécie de defeitos, de 
ordem nutricional ou simbólica, quer se trate de gorduras saturadas ou de perda de identidade. 
Todavia, é notável constatar que, até o presente, a pizza tem escapado da maioria dessas criticas. 
Ora, este entende sobre o planeta um império que está se tornando mais importante do que o do 
hambúrguer. Não são somente as grandes redes que a difundem, mas praticamente todos os 
estabelecimentos ligados de perto ou de longe à distribuição de alimentação. Na França e nos países da 
Europa ocidental, a pizza encontra-se nas padarias, mercearias e vendedores ambulantes. É possível 
pedir para que seja entregue em casa ou consumi-la em todos os tipos de restaurantes, desde o 
botequim de bairro até a lanchonete de batatas fritas junto das pistas de esqui. Daqui em diante, a pizza 
está disponível de Paris a Cuba e de Berlim a Calcutá, sem que o imperialismo italiano suscite 
inquietações identitárias ou nutricionais por parte dos gastrônomos ortodoxos, nem por parte dos 
nutricionistas (a despeito das espessas camadas de queijo, ricas em gordura saturada, que compõem as 
pizzas americanizadas). 
[...] 
 
Racionalização, Regressão e Prazer 
A grande questão que se coloca constantemente quando se evoca o fast-food, em particular o da 
McDonald’s é a de seu sucesso universal. Até o dia de hoje, parece que a empresa de Chicago nunca 
conheceu, propriamente falando, qualquer fracasso. Com toda a certeza, um certo número de fatores 
materiais, comerciais e financeiros contribuem para explicar esse sucesso. O sistema de franquia, 
aperfeiçoado inicialmente por Ray Kroc, estava baseado no princípio segundo o qual era necessário 
garantir o enriquecimento dos franqueados, velando reciprocamente para que eles não prejudicassem a 
boa reputação e a aplicação rigorosa dos princípios da marca. Nos anos 80, cerca de um quarto dos 
franqueados americanos eram milionários. 
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Todavia, na exportação há outros problemas. É necessário superar o antiamericanismo e, ao 
mesmo tempo, dominar o que garante inicialmente o sucesso, a saber: o atrativo exercido pelos 
McDonald’s sobre os jovens e, em particular os teen-agers. Como vimos, por motivos de rentabilidade, 
a rede prefere atrair as famílias aos adolescentes em bandos. 
A esse fator convém acrescentar a dificuldade, mais importante do que se propala, de ajustar 
finalmente a oferta da McDonald’s à cultura alimentar do país. Em primeiro lugar, os produtos são so 
mesmos por toda parte: hambúrguer, cheeseburger, chicken McNuggets, etc. Na realidade, existem 
sutis variações. Em particular, foi necessário modificar os molhos para França, por que estes eram 
aparentemente doces demais. Em outros países, alguns produtos não são comercializados. Não é em 
toda parte que se pode fazer uma escolha entre os diversos ingredientes. Além disso, os horários das 
refeições levantam problemas na Europa. Embora a McDonald’s não esteja em causa nesse caso 
particular, pode-se citar o exemplo de Disneyland Europe, perto de Paris. Segundo estudos 
americanos, esperava-se que 50 a 60% dos visitantes consumissem fast-food durante a visita. Seja qual 
for a pertinência desse número, um imponderável tipicamente europeu infiltrou-se nessa operação. Os 
franceses, italianos e inclusive alguns europeus não estão dispostos a consumir, como os americanos, 
hambúrgueres ás 10 ou as 17h. É a razão pela qual, as 12h30 em ponto, formaram-se filas diante dos 
restaurantes, com o esvaziamento das atrações. Fora das horas de refeição, o movimento invertia-se, 
perturbando a regularidade das filas de espera. Os organizadores tinham superestimado a flexibilidade 
e a “desestruturação” dos hábitos alimentares dos europeus. 
Sem dúvida, o sucesso planetário da McDonald’s, do fast-food em geral e da pizza em particular, 
deve-se ao certo número de “universais” alimentares. O fast-food não é puramente funcional, e o 
cliente não o consome unicamente por motivos de comodidade, preço e tempo. De fato, o repertório de 
sabores e texturas ao qual ele faz apelo reduz-se a uma espécie de menor denominador comum das 
preferências. Assim, na maciez dos pãezinhos do hambúrguer, na carne moída, nos molhos doces, e 
ketchups agridoces confluem sensações infantis, regressões e transgressões. Na presença dos pais e 
com sua enternecida aprovação, as crianças podem manifestar pela primeira vez, em idade bastante 
precoce, uma independência suficiente para encomendar no balcão, com algumas moedas na mão, um 
hambúrguer e uma Coca-Cola. Podem comer com os dedos, sem se preocuparem com restrições 
formalistas que pesam sobre a refeição familiar. Seus dentinhos enterram-se na espessura mole dos 
buns, da carne moída, e se deleitam com o alimento que, segundo é demonstrado por todas as 
pesquisas, lhes desperta mais a gulodice: batatas fritas, bem torradinhas por fora e macias por dentro, 
salgadas e gordurosas ao mesmo tempo. 
Sabores de base, textura gratificantes, liberdades transgressoras, consenso familiar, comodidade, 
preço, higiene, regularidade do serviço: diante de bem sucedida fórmula da rede McDonald’s, a única 
resposta encontrada até agora foi a imitação. 
 
Pense nisso: 
“alimentação, Nutrição e inteligência = PODER”!

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