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Curso_ HISTÓRIA DO BRASIL_ DA 1 REPÚBLICA ATÉ VARGAS - GR1606 2

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23/02/22, 22:37 EDU_HBCPRV_19_E_2
https://ambienteacademico.com.br/course/view.php?id=6026 1/24
Introdução
Na unidade anterior falamos sobre amontagem do sistema de poder da República
Velha. 
A partir especialmente de 1894, quando se consolida a “república oligárquica” que
durou até 1930, o Brasil teve uma estrutura bastante autoritária, com processos
democráticos apenas de fachada. Por meio da chamada “política de governadores”,
os presidentes asseguravam a reeleição sempre das mesmas oligarquias regionais e
uma constante base favorável no Legislativo, formando assim o que se chamou de
“política do café-com-leite”, já que os interesses de Minas e São Paulo, os maiores
estados cafeicultores, acabavam prevalecendo. Tudo isso funcionava porque os
“coronéis” garantiam, pelo voto de cabresto, que os eleitores escolhessem sempre os
candidatos “certos”, aqueles que interessavam às elites dominantes. 
Unidade 2 - República Velha (1889
– 1930): movimentos sociais e
crise
Pietro SantʼAnnaIniciar
23/02/22, 22:37 EDU_HBCPRV_19_E_2
https://ambienteacademico.com.br/course/view.php?id=6026 2/24
A partir especialmente de 1894, quando se consolida a “república oligárquica” que
durou até 1930, o Brasil teve uma estrutura bastante autoritária, com processos
democráticos apenas de fachada. Por meio da chamada “política de governadores”,
os presidentes asseguravam a reeleição sempre das mesmas oligarquias regionais e
uma constante base favorável no Legislativo, formando assim o que se chamou de
“política do café-com-leite”, já que os interesses de Minas e São Paulo, os maiores
estados cafeicultores, acabavam prevalecendo. Tudo isso funcionava porque os
“coronéis” garantiam, pelo voto de cabresto, que os eleitores escolhessem sempre os
candidatos “certos”, aqueles que interessavam às elites dominantes. 
Lembra-se de tudo isso? Então talvez você tenha se perguntado se esse sistema
obviamente injusto e antidemocrático não causava revolta na população. Será que
nenhuma voz se levantou contra a forma como a “república oligárquica” estava
organizada? E isso que esses são apenas os problemas políticos. Se olharmos de um
ponto de vista social mais amplo, o Brasil enfrentava muitos outros: desigualdade
social extrema, concentração de terras na mão de pouquíssimos latifundiários,
péssimas condições de trabalho nas grandes cidades, ausência completa de políticas
públicas para incorporar à sociedade e ao mercado os negros agora libertos após a
Lei Áurea (1888). Será que tudo isso passou sem questionamento? 
Claro que não. Nesta unidade veremos justamente os movimentos sociais que, cada
um à sua maneira, se opuseram às desigualdades da República Velha. Alguns
populares, outros mais elitistas, questionaram as estruturas de poder da época e
levaram, eventualmente, à queda de todo o sistema. 
Como sabemos, uma das marcas do Brasil do �nal do século XIX foi o crescimento
das cidades. Vamos começar esta unidade, portanto, analisando as transformações
que ocorriam no meio urbano. A ideia é entender como esse contexto permitiu que
surgissem alguns dos mais relevantes e duradouros movimentos sociais da época. 
Bons estudos! 
1. A metrópole e os
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https://ambienteacademico.com.br/course/view.php?id=6026 3/24
trabalhadores
Praticamente todos os lugares que passaram por processos de industrialização
seguiram uma espécie de roteiro: no início, não há qualquer tipo de lei trabalhista ou
limite para a exploração dos operários e essa situação irá exceder-se até gerar
revoltas, manifestações, greves, forçando as autoridades a intervir. Eventualmente,
com o tempo, algumas regras vão sendo introduzidas para tornar o trabalho nas
fábricas menos selvagem. Foi assim na Inglaterra, no resto da Europa, e não poderia
ser diferente no Brasil. 
Você quer ver?
Há um excelente documento de época para entender melhor como era o ambiente
urbano desse período: o �lme clássico “São Paulo, sinfonia da metrópole”, dirigido
em 1929 por Adalberto Kemeny e Rudolf Rex Lustig. A obra é uma espécie de
colagem de cenas do cotidiano da capital paulista na década, dando uma ideia de
como os novos ritmos dos bondes, das máquinas fabris, dos automóveis, do rádio,
haviam transformado o cotidiano da cidade. 
O �lme está disponível neste link: https://www.youtube.com/watch?v=0cumh-UD8GA
. 
No início do século XX, as fábricas que começavam a se multiplicar nas grandes
cidades brasileiras. As condições de trabalho eram terríveis: jornadas de até 12
horas, ausência de folga aos �ns de semana para algumas categorias, salários
miseráveis – mais miseráveis ainda para as mulheres – liberação total do trabalho
infantil, inexistência de garantias no caso de doenças ou acidentes. Isso tudo tinha
um agravante: por conta de nossa tradição escravista, qualquer trabalho braçal era
visto socialmente como degradante, como atividade menor e, portanto,
pessimamente remuneradas. 
Era evidente, claro, que essa massa de operários começaria a se organizar para exigir
melhores condições de vida. 
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E quem compunha essa “massa”? Neste período, as grandes cidades brasileiras
abrigavam uma multidão de variadas origens étnicas, geográ�cas, em situações
sociais diversas com bagagens culturais particulares. A eles se somavam ainda
imigrantes de diferentes nacionalidades, portugueses, espanhóis, italianos, mais
tarde os japoneses e muitos outros. Esses grupos, aglomerados em busca de
emprego em cidades como São Paulo de Rio de Janeiro, começaram a organizar
instituições próprias. 
Na década de 1910 surgiram as chamadas “associações mutualistas”, mantidas por
contribuição mensal dos próprios trabalhadores. Elas prestavam ajuda com gastos
hospitalares, funerais, pensões para viúvas de operários, bem como idosos e
inválidos. Ou seja, faziam a função de rede de assistência social que o Estado
brasileiro não fazia. Essas associações também organizavam festas e demais eventos
sociais, conseguindo assim dar um pouco de lazer aos trabalhadores e também
arrecadar fundos para suas atividades. Eram instituições, portanto, ainda não
explicitamente políticas, nada parecidas com um sindicato ou partido. Isso logo
mudaria. 
Mais ou menos no mesmo período, as ideias de emancipação do trabalhador
começaram a se difundir no Brasil. Os imigrantes europeus tiveram um papel
importante nisso, pois vinham de um continente em que as lutas socialistas já
tinham tradição. 
Nesses anos iniciais, o anarquismo foi talvez a corrente revolucionária que mais se
difundiu pelo país. Lembremos que os anarquistas acreditavam na abolição do
Estado e de qualquer forma de governo central organizado, rejeitando também o
formato tradicional dos partidos como veículo de luta. Davam importância vital,
portanto, para os sindicatos como espaços de organização autônoma, não
hierárquica, dos trabalhadores – de onde vem o nome anarco-sidicalismo, uma das
correntes mais atuantes da época. Os anarquistas também fundaram jornais e
escolas autônomas, já que a tarefa de educar os trabalhadores era considerada vital. 
Você quer ler?
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https://ambienteacademico.com.br/course/view.php?id=6026 5/24
Um dos episódios mais conhecidos da história dos anarquistas no Brasil é o da
Colônia Cecília. O espaço foi fundado no Paraná, em 1890, por um imigrante italiano,
Giovanni Rossi. Essa comuna rural foi a primeira experiência de implantação dos
ideais anarquistas no país, um espaço no qual se tentou praticar a propriedade
coletiva sobre bens e meios de produção, a autogestão e também algumas
concepções de amor livre. Há bastante material na internet sobre a Colônia Cecília,
caso você queira se aprofundar no tema. Um bom começo é este artigo acadêmico
publica em uma revista da Unicamp: h
ttps://www.ifch.unicamp.br/ojs/index.php/ael/article/view/2469 . 
O ano de 1917 foi um marco para os movimentosoperários brasileiros. Com a
Primeira Guerra Mundial (1914-1918), as importações brasileiras haviam sido
reduzidas, fazendo com que o preço de todo tipo de bem manufaturado subisse. No
entanto, os salários não foram corrigidos, o que, na prática, reduziu o poder
aquisitivo da população e piorou muito as condições de vida. 
Liderados pelos anarquistas, os operários organizaram em São Paulo uma greve
geral. A elite da República Velha nunca tinha visto este fenômeno antes: a classe
trabalhadora organizada politicamente. Pouco tempo depois uma greve também
estourou no Rio de Janeiro. O governo precisou ceder. 
Você quer ver?
Esta pequena reportagem conta um pouco mais sobre a história da Greve Geral de
1917, trazendo também várias imagens do período:
https://www.youtube.com/watch?v=9SCfzzW4jvw. 
Os trabalhadores conquistaram algumas melhorias, como férias e limitação ao
trabalho infantil. Esses direitos, embora estivessem “no papel”, só se tornaram
realidade prática anos depois. Mas o movimento grevista de 1917 deixou seu recado
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mostrando o poder da classe operária brasileira. Esse fenômeno continuaria a
crescer nos anos seguintes.
Em março de 1922, já sob in�uência do sucesso da Revolução Russa, foi criado o
Partido Comunista Brasileiro (PCB). Era a primeira organização brasileira o�cialmente
baseada nas ideias políticas marxistas-leninistas, chegando a integrar a Internacional
Comunista em 1924. Essa década, aliás, foi um momento de virada na política da
esquerda brasileira: após o exemplo de revolução bem-sucedida dado pelos
soviéticos em outubro de 1917, o anarquismo deixaria de ser corrente majoritária
nos grupos revolucionários e sindicatos, dando cada vez mais espaço para as
tendências socialistas.
Como você pôde perceber, o palco principal desses movimentos operários do início
do século foi a cidade de São Paulo, a mais industrializada do país. Vamos voltar
nossas atenções agora para o que estava acontecendo o epicentro político do país: o
Rio de Janeiro.
2. Conflitos na capital federal
Uma das cidades que mais se desenvolveu durante a República Velha foi o Rio de
Janeiro, então capital do Brasil. Com novos investimentos e o crescimento das
atividades econômicas urbanas, a população carioca aumentou muito na virada do
século XIX para o XX.
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Figura 1 - Rio de Janeiro. Fonte: Pixabay 2019
No entanto, a cidade mantinha ainda muitas características urbanísticas herdadas da
época colonial. As ruas eram estreitas e cheias de curvas, traçadas numa época em
que não existiam bondes e automóveis. Havia poucos prédios de grande porte. A
população mais pobre e operária se aglomerava em cortiços, geralmente antigos
casarões ocupados por várias famílias que transformavam cada cômodo em uma
espécie de apartamento. Boa parte dessas habitações precárias era destinada, é
claro, à população negra, que após a abolição da escravatura em 1888 precisava
ganhar a vida em todo tipo de subemprego que pudessem encontrar.
Nessas condições, a situação social do Rio de Janeiro era muito insalubre. A vida nos
cortiços, onde não havia saneamento básico, circulação adequada de ar, em que as
pessoas viviam aglomeradas, criou condições ideais para a disseminação de várias
epidemias. A cidade sofreu nos últimos anos do século XIX com surtos de febre
amarela, malária e varíola que mataram milhares de pessoas, além de níveis sempre
altíssimos de doenças como cólera e “peste negra” (peste bubônica).
Para além dessas condições sanitárias, a cidade também não estava a par da estética
em voga internacionalmente no período. Na época das belle époque, em que se
valorizavam as capitais europeias por suas grandes avenidas, cafés, teatros,
bulevares etc., o Rio de Janeiro ainda era demasiadamente parecido com uma velha
cidade colonial.
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Algo precisava ser feito, portanto, para resolver esse duplo problema e tornar a
capital do “novo Brasil” republicano atraente para investimentos estrangeiros.
No ano de 1902, chegou à presidência o paulista Rodrigues Alves. Ele indicou o
engenheiro Pereira Passos como prefeito do Rio e juntos se dedicaram à missão de
reurbanizar o centro da capital. Esse processo seria, porém, bastante violento.
Figura 2 - Rodrigues Alves, presidente do Brasil entre 1902 e 1906. Fonte: Infoescola
A grande reforma incluía, dentre outros pontos, o alargamento de várias das antigas
ruas “sinuosas” e, consequentemente, a demolição de muitos dos casarões e prédios
que serviam de moradia para a população mais pobre. Boa parte dessa população
desalojada foi para os morros nas proximidades do centro e lá construíram moradias
precárias. Isso promoveu o crescimento do que hoje são as favelas cariocas.
Você quer ler?
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A maioria dos historiadores concorda que a primeira favela carioca se formou no
Morro da Providência no ano de 1897. O local abrigou ex-escravos e também
migrantes desalojados pela guerra em Canudos, na Bahia. Na época de Pereira
Passos, o governo tentou expulsar as famílias do morro, que �ca numa região
portuária e que, portanto, era alvo das reformas urbanas. 
Leia neste link uma reportagem que conta um pouco da história do Morro da
Providência: http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/rio-450-
anos/noticia/2015/01/conheca-historia-da-1-favela-do-rio-criada-ha-quase-120-
anos.html . 
A reurbanização de Pereira Passos pretendia também, digamos assim, “reformar
culturalmente” a capital, tornando-a mais próxima do que uma cidade “moderna” –
isto é, de padrão europeu e burguês – deveria ser. Atividades como o comércio
ambulante e as brincadeiras de rua (empinar pipa, por exemplo) �caram proibidas.
As manifestações populares como o carnaval foram perseguidas e limitadas pelo
governo, assim como os espaços de culto das religiões afro-brasileiras. Na concepção
dos gestores da época, tudo isso tornava o Rio de Janeiro uma cidade mais “limpa” e
“civilizada” aos olhos do mundo.
Por �m, era preciso resolver o problema das doenças. O encarregado da tarefa foi o
respeitado médico sanitarista Oswaldo Cruz. Ele elaborou um plano que envolvia
melhorar o saneamento da cidade e investir pesado na caça aos ratos e mosquitos
que transmitiram, respectivamente, peste bubônica e febre amarela. Por �m, a cereja
do bolo do pacote apresentado por Oswaldo Cruz era promover a vacinação da
população carioca para erradicar de vez a varíola. Em 1904, as autoridades do Rio de
Janeiro começaram a pôr o plano em prática.
O que parece hoje uma simples questão de saúde pública se tornou, na época, um
problema político gigantesco. A grande maioria da população desconhecia o que era
uma vacina. O governo, por sua vez, adotando a mesma postura autoritária que
vinha praticando nos últimos anos, não fez qualquer campanha de conscientização
que informasse minimamente os objetivos da ação de vacinação. Além disso, a
vacinação era parte de um pacote de medidas sanitaristas que incluíam interditar e
demolir mais cortiços, borrifar veneno em residências, mandar doentes
compulsoriamente para hospitais. Especialmente os homens da época não toleravam
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a ideia de que, além de todas essas violências, também haveriam agentes do estado
invadindo as casas e tocando o corpo de suas �lhas e mulheres para a vacinação.
Pensemos, agora, no contexto mais amplo: a campanha de vacinação era a ponta
�nal do pacote de reurbanização do Rio de Janeiro. Portanto, ela vinha na esteira de
um processo que já durava anos de violência, expulsão e quase extermínio da
população pobre, especialmente negra,da capital. Coloque-se no lugar de um sujeito
da época. Naquele contexto, sabendo praticamente nada sobre novidades cientí�cas
como as vacinas, não é preciso ir muito longe para entender porque muitos
imaginaram que a vacina era uma transmissora da doença, não uma imunizadora.
Quando a lei de vacinação obrigatória foi publicada em 1904, estourou um protesto
popular no Rio de Janeiro que �cou conhecido como “Revolta da Vacina”. Esse é um
levante único na história da República Velha: não há líderes, reivindicações políticas,
partidos, apenas a população mais pobre da cidade que, cansada após uma
sequência de anos de violência, foi às ruas em um grande motim. Prédios foram
depredados, bondes foram tombados, ruas fechadas com barricadas. Durante dias,
especialmente ente 10 e 13 de dezembro de 1904, as forças de segurança perderam
completamente o controle sobre o Rio de Janeiro.
Os grupos de oposição a Rodrigues Alves, vários deles também críticos da forma
como o governo tinha conduzido a questão da vacinação, tentaram pegar carona no
movimento popular e derrubar o presidente. Não tiveram sucesso. No entanto, esses
grupos políticos o�ciais (partidos e militares, por exemplo) foram os coadjuvantes na
Revolta da Vacina. O “coração” do motim era mesmo a massa desorganizada.
Um dos livros mais conhecidos sobre o evento foi escrito pelo grande historiador
brasileiro Nicolau Sevcenko. Vamos ler um trecho da obra, no qual o autor deixa
clara a conexão que havia entre o modelo “ideal” de cidade pretendido pelas elites da
República Velha e as ações de violência e segregação direcionadas à população mais
pobre que estava “atrapalhando” esse projeto de modernidade:
“Essa separação ética dos corpos, corpos rebeldes, corpos doentes, corpos sãos,
preconizada e era simétrica a uma nova divisão geográ�ca da cidade. (...) A enorme
massa popular dos trabalhadores, subempregados, desempregados e vadios
compulsórios foi sendo empurrada para o alto dos morros, para as áreas pantanosas e
para os subúrbios ao longo das estradas de ferro e ao redor das estações de trem.
Nesse espaço, aproveitando as facilidades de transporte e a oferta maciça de força de
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trabalho, instalou-se também o parque fabril que circunda a cidade. O centro, por sua
vez, tornou-se o foco de toda agitação e exibicionismo da burguesia arrivista: seu
pregão, sua vitrine, seu palco (...). Evidentemente, nesse mundo em que não se deseja
ver o trabalho [dos mais pobres], também não se suporta mais a visão da doença, da
rebeldia, da loucura, da velhice, da miséria ou da morte, que são enclausuradas nos
sanatórios, prisões, hospitais, asilos, albergues e necrotérios. Entra em vigor um estilo
de vida novo e cosmopolita, que a burguesia vitoriosa implantou e de�niu ao longo de
sua trajetória consagradora, pelo século XIX afora, e que só se �xou com características
mais marcantes no Brasil no início do século XX”. (SEVCENKO, Nicolau. A revolta da
vacina. Mentes insanas em corpos rebeldes. São Paulo: Cosac Naify, 2010, p. 108-112¬)
Apesar da força da Revolta, a repressão foi ainda pior. O governo passou os
próximos meses perseguindo qualquer “suspeito” de participação no levante de
1904. Era, na verdade, uma forma de se livrar de qualquer �gura popular incômoda.
Os presos eram enviados para o Acre para povoar a região e trabalhar na extração
do látex, que começava a se tornar um produto de exportação altamente lucrativo.
A Revolta da Vacina serviu, no �mdas contas, como uma desculpa perfeita para que o
governo esmagasse qualquervoz discordante e prosseguisse nos próximos anos com
seu projeto dereurbanização da capital.
Você quer ver?
Os fotógrafos Augusto Malta (1864-1957) e Marc Ferrez (1843-1923) produziram
alguns dos melhores registros do Rio de Janeiro na época das reformas de Pereira
Passos. Ambos têm acervos digitalizados para consulta mantidos pelo Instituto
Moreira Salles. As imagens de Malta revelam principalmente estalagens, cortiços,
casarões e também as obras feias no início do século XX: https://ims.com.br/titular-
colecao/augusto-malta/> . 
Já Ferrez tem um material mais concentrado sobre o aspecto da cidade após as
reformas, como por exemplo, a Avenida Central (hoje chamada Avenida Rio Branco) e
o Teatro Municipal, inaugurado em 1909: https://ims.com.br/titular-colecao/marc-
ferrez/ . 
Outra sugestão é este pequeno vídeo sobre o fotógrafo Alberto de Sampaio, que traz
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https://ambienteacademico.com.br/course/view.php?id=6026 12/24
ótimas imagens do período e também um resumo do que signi�caram as reformas
de Pereira Passos: https://www.youtube.com/watch?v=kqzKUj5O-mU 
Algumas das mesmas questões de fundo que explicam a Revolta da Vacina de 1904 –
isto é, extrema desigualdade social, racismo e falta de políticas públicas para as
populações negras recém-libertas, autoritarismo do governo da República Velha –
iriam abalar novamente o Rio de Janeiro em 1910.
Com o �m da escravidão, uma das melhores – na verdade, uma das únicas –
alternativas que jovens negros brasileiros tinham de conseguir um emprego era
entrar na Marinha. A instituição era menos “fechada” que o exército, facilitando o
ingresso das classes baixas, e o marujo tinha a garantia de que, no mínimo, suas
refeições diárias estariam garantidas, o que, dadas as opções que de um ex-
escravizado ou �lho de escravos tinha no mercado de trabalho da época, era uma
oportunidade atraente para muitos.
No entanto, no início do século, a Marinha submetia seus recrutas a condições
degradantes. Carga de trabalho excessiva, pouca alimentação, salários baixíssimos.
Para piorar, era a única instituição do país que ainda permitia em seu regulamento o
uso de castigos físicos para disciplinar os marujos. Certamente levados por essa
herança escravista que permeava as relações de trabalho no interior da corporação,
os o�ciais puniam corriqueiramente seus subordinados com chibatadas.
Em novembro de 1910, a tripulação de um navio chamado “Minas Gerais” resolveu
dar um basta e revoltar-se contra seus comandantes. O estopim de tudo foi a
condenação de um marinheiro a receber 250 chibatadas, número absurdamente
elevado mesmo para os padrões da época. Seus colegas se revoltaram e, liderados
pelo marinheiro João Cândido, atacaram os o�ciais e tomaram controle sobre
embarcação. Com isso, outros navios de guerra brasileiros aderiram à revolta e
passaram a ser controlados pelos próprios marujos.
Os navios miraram seus canhões para a capital. O governo tentou revidar e a Baía de
Guanabara foi palco de uma pequena batalha naval, mas os encouraçados rebeldes
eram mais fortes e saíram vencedores. João Cândido e seus companheiros
ameaçaram bombardear o Rio de Janeiro caso suas reivindicações não fossem
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ouvidas. Esse evento recebeu o nome de “Revolta da Chibata”, referência aos castigos
físicos in�igidos sobre os marujos.
Você sabia?
João Cândido é uma �gura relativamente conhecida hoje, em parte porque foi
imortalizado em 1975 na canção Mestre-Sala dos Mares, de João Bosco e Aldir Blac. A
música, que chegou a ser censurada pelo regime militar, foi gravada por nomes
como Elis Regina e fez grande sucesso, ajudando a �xar a importância da luta do
“almirante negro” no imaginário nacional. 
Os primeiros versos dizem: “Há muito tempo nas águas da Guanabara / O dragão no
mar reapareceu / Na �gura de um bravo feiticeiro / A quem a história não esqueceu /
Conhecido como navegante negro / Tinha a dignidade de um mestre-sala / E ao
acenar pelo mar na alegria das regatas / Foi saudado no porto pelas mocinhas
francesas”. 
A Revolta da Chibata exigia melhores condições salariais e de trabalho, além de,
principalmente, o �m dos castigos físicos na Marinha. Diante da ameaça de um
bombardeio na capital, o governoprecisou negociar. Os rebeldes concordaram em
se render após terem a promessa de que receberiam anistia, mas foram traídos.
3. O messianismo contra as
oligarquias
Até agora falamos bastante das transformações vividas pelo Brasil urbano. Mas não
podemos nos esquecer de que durante toda a República Velha – e muito depois dela,
até as décadas de 1960 e 1970 – a maior parte da nossa população estava nas áreas
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rurais. O que ocorria nessas regiões? Como esses brasileiros reagiram às injustiças
do sistema político oligárquico dos cafeicultores?
Comecemos analisando a religiosidade popular dos sertões brasileiros. Até a
proclamação da República o Brasil era um país o�cialmente católico. A partir de 1889
ocorreu a separação entre Estado e Igreja. Isso signi�cava, por exemplo, que um
casamento religioso não tinha mais validade como registro civil. As escolas
paroquiais também começaram a ser substituídas pelas escolas públicas laicas.
Resumindo, o Estado republicano assumiu uma série de funções que antes eram
atribuição da Igreja católica.
Em algumas regiões do país, especialmente no Nordeste, isso gerou
descontentamento, o que ajuda a explicar, por exemplo, os con�itos que ocorreram
no povoado de Canudos, interior da Bahia, no �nal da década de 1890.
A região era uma encruzilhada de problemas naturais e sociais. Por um lado, a seca,
velho �agelo do Nordeste, afetava milhares de famílias sertanejas e as expulsavam
de suas terras. Por outro, os grandes latifundiários, os “coronéis” do local, detinham a
maior parte das terras e impunham ritmos de trabalho extenuantes a seus
empregados. Numa época em que os produtos nordestinos como a cana estavam
em declínio, a exploração e o desemprego cresciam.
Naquele duro contexto social surgiu a �gura de Antonio Vicente Mendes Maciel, ou,
como era mais conhecido, Antônio Conselheiro. Ele andava pelo sertão nordestino
fazendo pregações e começou a arrebatar um grupo de �eis. Na década de 1870,
formaram um arraial (isto é, uma vila improvisada) na região de Canudos, às
margens de um rio, e passaram a viver de forma autônoma.
A comunidade liderada por Antônio Conselheiro oferecia tudo aquilo que não se
encontrava no interior da Bahia: comida, moradia, terra para plantar, água, proteção
(os moradores de Canudos organizavam uma guarda própria para proteger a
comunidade). Em meio à miséria degradante que afetava o sertanejo baiano, a
comunidade atraiu muitas pessoas e cresceu em ritmo impressionante. Em alguns
anos, Canudos tinha entre 20 e 30 mil pessoas.
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Uma comunidade mais ou menos independente tão grande assim no meio do
território nacional começou a incomodar o governo federal. A personalidade do
chefe do arraial não ajudava: Antônio Conselheiro era um líder messiânico.
Autodenominava-se “Pastor” e, embora não se apresentasse como profeta ou
alguém capaz de fazer milagres, era seguido como um guia espiritual católico por
milhares de habitantes em Canudos.
O verdadeiro problema, no entanto, eram suas visões políticas: Conselheiro era
monarquista e considerava a República ilegítima, pois havia destronado o rei, único
líder brasileiro verdadeiro investido do poder de Deus. Portanto, embora o beato não
estivesse tramando nada do tipo, os líderes da República Velha começaram a
suspeitar que o arraial de Canudos poderia ser o embrião de um levante separatista
ou uma comunidade que tentaria �car independente politicamente do resto do país.
Era preciso agir.
Desde 1896, o povoado já tinha entrado em dois con�itos contra tropas locais. O
governo baiano chegou a enviar mais de 500 soldados para a região, mas nas duas
ocasiões os moradores do arraial venceram.
Essas notícias con�rmavam a especulação no Rio de Janeiro de que Antônio
Conselheiro estava organizando uma “tropa monarquista” para derrubar a república.
Forças federais foram enviadas pela primeira vez para a região, mais de mil homens,
e novamente os defensores de Canudos saíram vencedores.
O basta veio em 1897. O governo Republicano percebeu a seriedade do evento e
decidiu esmagar o povoado com uma impressionante expedição de 10 mil homens.
Dessa vez o arraial não teve chance: foi destruído. Antônio Conselheiro e seus
seguidores foram massacrados, inclusive os que se renderam, para que servissem de
exemplo.
Você sabia?
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O relato mais conhecido da Guerra de Canudos vem, na verdade, da literatura. É a
obra prima “Os sertões”, de Euclides da Cunha (1866-1909). O escritor que
presenciou momentos da guerra como correspondente do jornal O Estado de São
Paulo criou este livro-reportagem, o primeiro do gênero no Brasil, no qual pinta um
panorama amplo da geogra�a, da história e dos costumes dos habitantes de
Canudos. 
Outro líder messiânico surgiria alguns anos depois, dessa vez no Sul do país, numa
região de fronteira entre Paraná e Santa Catarina chamada Contestado. Foi naquela
área que o beato José Maria começou a reunir alguns seguidores no começo da
década de 1910 e formou uma comunidade religiosa que abrigava famílias excluídas.
Os motivos que levavam muitos a buscar abrigo na comunidade do Contestado eram
diferentes daqueles que atingiam o Nordeste. Poucos anos antes fora iniciada a
construção de uma ferrovia na região, ligando São Paulo ao extremo sul. O contrato
autorizava que a empresa dona da obra, a Brazil Railway Company, �casse com uma
faixa de 15km de terra de cada lado da estrada de ferro. Consequentemente,
inúmeras famílias camponesas catarinenses e paranaenses foram desabrigadas e
precisaram buscar abrigo na vila messiânica do Contestado.
O beato José Maria também era monarquista, mas, à diferença de Antônio
Conselheiro, falava mais abertamente sobre suas posições políticas. Isso, somado à
experiência acumulada de Canudos, fez com que o governo procurasse se livrar do
problema o mais rapidamente possível: em 1912, as tropas atacaram e destruíram a
comunidade, matando José Maria. Alguns dos sobreviventes até refundaram um
vilarejo similar em outra região, mas foram esmagados de�nitivamente em 1916.
Você sabia?
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O descontentamento de certas lideranças religiosas com o governo laico republicano
também está na raiz, embora de uma forma um pouco diferente, do caso do famoso
Padre Cícero. 
Cícero Romão Baptista era clérigo em uma paróquia em Juazeiro do Norte, no Ceará.
Em 1889, teria praticado um milagre: no momento da eucaristia, uma �el recebeu a
hóstia das mãos do Padre Cícero e a hóstia se transformou em sangue. As
autoridades eclesiásticas julgaram o caso e consideraram o milagre fraudulento, mas
já era tarde: o Padre Cícero havia se tornado alvo de devoção popular. Seus trabalhos
iam desde acolher doentes e criminosos arrependidos até dar conselhos sobre
relacionamentos e higiene pessoal para a população de Juazeiro. O Padre Cícero teve
na virada do século mais prestígio que a alta hierarquia da Igreja. 
Quando na década de 1890 uma comissão clerical decretou o�cialmente a falsidade
do milagre e impediu Cícero de comandar missas, um movimento popular se formou
em defesa do “Padim”. O padre passou os anos �nais de sua vida “brigado” com a
hierarquia católica o�cial, mas cada vez mais in�uente em Juazeiro: foi prefeito da
cidade, era �gura procurada por todos os coronéis locais e a devoção popular à sua
�gura só cresceu. 
As experiências de Canudos e do Contestado mostram essa con�uência entre a fé
popular, encarnada pelo messianismo dos líderes, e os problemas sociais que
afetavam a população mais pobre da república, fazendo surgir essas formas de
resistência únicas. 
4. O banditismo social
Também no sertão nordestinooutro movimento social ganhou bastante importância
durante a República Velha: o Cangaço. Esses grupos existiam desde a metade do
século XIX e continuaram existindo no século XX até pelo menos a década de 1940,
mas é seguro dizer que um dos seus picos tenha sido o período da República Velha.
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Os grupos de cangaceiros são um fenômeno à parte na política nacional. Não eram
movimentos messiânicos, tampouco movimentos sociais convencionais – como
partidos, sindicatos, comunas independentes e quaisquer outras formas de
resistência à opressão, seja no meio urbano ou rural.
O Cangaço é uma modalidade do que se convencionou chamar de “banditismo
social”. Os cangaceiros eram criminosos armados que andavam em bandos pela
região da caatinga e cometiam crimes como, por exemplo, o saque de comida. Sua
atuação é complicada de de�nir: se, por um lado, de fato cometiam crimes violentos,
por outro o faziam para buscar um mínimo de conforto material e proteção social
que o Estado não lhes garantia. Boa parte dos homens e mulheres que entraram
originalmente no cangaço eram trabalhadores despejados pelos latifundiários
nordestinos. Sem o cangaço, seu destino seria a mendicância – o que, numa zona de
aguda seca e pobreza, é o mesmo que a morte.
Eric Hobsbawm escreveu um livro clássico sobre esse tema do “banditismo social” e
dedica várias páginas aos cangaceiros nordestinos. No trecho abaixo, o autor parece
sintetizar bem o aspecto altamente contraditório do fenômeno:
“São heróis, não apesar do medo e horror que inspiram suas ações, mas, de certa
forma, por causa delas. São menos desagravadores de ofensas do que vingadores e
executores de poder; não são vistos como agentes da justiça – mas a vingança e a
retaliação são inseparáveis em sociedades em que sangue se paga com sangue –, e sim
como homens que provam que até mesmo os fracos e pobres podem ser terríveis. Não
é fácil dizer se devemos considerar esses monstros públicos como uma variedade
especial do banditismo social. O universo ético a que pertencem (ou seja, aquele que é
expresso nas canções, poemas e nos folhetos das feiras) contém tanto os valores do
‘ladrão nobre’, quanto os do monstro. Como escreveu um cantador a respeito do
famoso Lampião: ‘Ele matava de brincadeira / Por pura perversidade / E alimentava os
famintos / Com amor e caridade’”. (HOBSBAWM, Eric. Bandidos. 4ªed. São Paulo, Paz e
Terra, 2010, p. 85-86)Block Quote
Portanto, seja qual for o julgamento “moral” sobre o fenômeno do Cangaço, há dois
temas evidentes aqui que não podem nos escapar: em primeiro lugar, o fato de que
a violência do cangaceiro era também uma forma de “revide” contra a violência
praticada pelas forças o�ciais; em segundo, o reconhecimento popular de que algum
tipo de altruísmo social estava contido nas suas ações, mesmo as mais terríveis – e
por isso mesmo a sua maior aceitação.
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Você que ler?
Se quiser se aprofundar sobre o tema do Cangaço, con�ra essa reportagem:
https://www.nexojornal.com.br/explicado/2018/09/02/A-hist%C3%B3ria-do-
canga%C3%A7o-mito-est%C3%A9tica-e-banditismo-no-sert%C3%A3o . 
5. A crise chega aos quartéis
O sistema da República Velha começou a falir de verdade na década de 1920.
Durante décadas o arranjo da política dos governadores tinha conseguido manter
todas as oligarquias regionais mais ou menos satisfeitas enquanto os “barões do
café” reinavam absolutos, mas isso tinha um limite.
Vamos ler este trecho do historiador Caio Prado Júnior para começar a entender o
que estava dando tão errado assim na segunda década do século:
“A economia brasileira estava assim presa num círculo vicioso de que somente
transformações futuras de vulto a poderiam livrar: ela se fundava e hauria [extraia]
suas forças precisamente naquilo que constituía sua fraqueza orgânica, a grande
lavoura produtora de gêneros de exportação. Se era nesta que se baseavam a riqueza
e a produtividade nacionais, era ela também, em última análise, a responsável pelas
acanhadas perspectivas do país. Disfarçava-se momentaneamente essa profunda
contradição graças ao virtual monopólio, de que gozava o Brasil, da produção de um
gênero cuja procura nos mercados internacionais não cessava de se expandir: o café.
(...) Base econômica, como se vê, muito precária, e dependendo de conjunturas
incertas e inteiramente fora de nosso alcance, o que o correr do tempo, aliás, se
incumbiria de dolorosamente mostrar”. (PRADO JUNIOR, Caio. História econômica do
Brasil. São Paulo: Brasiliense, 2008, p. 199)
Se você leu com atenção o trecho, percebeu duas coisas. Em primeiro lugar, que o
sucesso do café brasileiro dependia da demanda no mercado europeu, o que puxava
positivamente os preços do produto. Em segundo, o que está dito bem no �nal do
trecho: essas condições que permitiam à economia do país se apoiar sobre a
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agroexportação cafeeira estavam completamente fora do nosso controle. A situação
internacional poderia mudar a qualquer momento e o Brasil seria impotente para
reverter um eventual quadro econômico desfavorável. Na década de 1920, a
tempestade perfeita chegou.
O mundo havia passado pela Primeira Guerra Mundial (1914-1918), período de baixa
procura pelo café. Isso forçou o governo a novamente aprovar suas políticas de
“valorização do café”, gastando quantias enormes do orçamento público para salvar
o balanço dos cafeicultores.
Esse descontentamento foi temperado com alguns novos elementos. A Grande
Guerra havia abalado a crença no liberalismo econômico. A Europa começaria a �car
cada vez mais dividida entre grupos socialistas e, por outro lado, as teorias mais
nacionalistas, dentre as quais, inclusive, o fascismo, que poucos anos depois
começaria a ganhar força na Itália.
Esse pensamento crítico ao liberalismo chegou ao Brasil e começou a conquistar
intelectuais e membros das forças armadas, especialmente dos escalões mais baixos.
Sua postura nacionalista batia de frente com a República Velha em dois grandes
temas.
Todos perceberam que a região amazônica, Acre em especial, era riquíssima em
seringueiras, as árvores de onde se extrai o látex para fabricação de borracha.
Houve, portanto, uma espécie de “corrida” até a região e começaram os con�itos
violentos entre brasileiros e bolivianos, ambos os lados reivindicando exclusividade
sobre a atividade extrativista. O Tratado de Petrópolis veio em 1907 para apaziguar
essa situação e o�cializar a posse brasileira sobre aquela terra.
Por um lado, eles criticavam a apropriação do Estado por parte de interesses
privados. Oligarquias, coronéis, barões do café, todos estes estariam corroendo o
caráter público das instituições quando levavam o governo a agir de acordo com
interesses econômicos particulares. Os “amigos do rei” não eram atingidos pela lei de
forma igualitária na República Velha. Em suma, era preciso recuperar a ideia de um
projeto nacionalista de desenvolvimento e modernização do Brasil, o que seria
impossível enquanto existissem aberrações como, por exemplo, as políticas de
queima do café
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Complementarmente, os nacionalistas criticavam o aspecto fraudulento das eleições
no Brasil. Essa foi a pauta que mais ganhou força, talvez porque fosse também a
mais concreta: era preciso, antes de mais nada, instituir o voto secreto para acabar
com o poder dos coronéis sobre seus currais eleitorais.
Assim se esboçava uma concepção mais nacionalista e centralizada de estado, o que
eventualmente agradaria muitas das oligarquias regionais que não estavam incluídas
no clube privilegiado dos barões do café. No entanto, essas ideias encontrariam eco
primeiro entre baixos emédios o�ciais do exército. Estes formariam um movimento
chamado Tenentismo.
Ecoando o velho positivismo ainda muito presente na mentalidade militar, esse
grupo se sentia incumbido da missão de “moralizar” a política nacional, considerada
liberal demais. Defendiam um Estado centralizado e forte, o voto secreto, a
modernização do país, incluindo universalização da educação, e um maior
protagonismo do Exército no processo político. Eram adeptos, portanto, de uma
posição política nacionalista e um tanto autoritária, pois se imaginavam como
reformadores “de cima para baixo” dos males sociais.
A primeira vez que os jovens Tenentistas apareceram com evidência na cena nacional
foi em 1922. Naquela data, organizaram um levante para tomar o Forte de
Copacabana, onde havia um grande arsenal que poderia ser usado para derrubar o
governo central. As autoridades bombardearam o Forte e a maioria dos rebeldes
desistiu da luta, mas 17 deles ainda marcharam com seus fuzis em mãos numa
demonstração de resistência. Um civil se juntou à passeata, fazendo com que o
evento �casse conhecido como “Revolta dos 18 do Forte”.
Todos acabaram presos ou mortos, mas o exemplo estava dado. Em 1924, eclodiu
uma revolta Tenentista similar em São Paulo e depois em algumas províncias do Rio
Grande do Sul. O governo federal conseguiu esmagar todos esses levantes, mas
acabou gerando um fenômeno novo na política nacional.
O capitão tenentista Luís Carlos Prestes, em 1925, estava acuado na pequena cidade
de Santo Ângelo, no Rio Grande do Sul. Decidiu reunir seus homens e marchar pelo
interior do estado para fugir das tropas federais. Começava aí a chamada Coluna
Prestes.
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O grupo se encontrou com outros foragidos tenentistas em Foz do Iguaçu, estes
vindos da perseguição em São Paulo. Juntaram-se e empreenderam uma marcha
pelos sertões do país com objetivo duplo. Por um lado, fugir e despistar as forças do
governo. Por outro, fazer contato com as populações do interior e tentar angariar
apoio popular contra o governo.
Prestes não conseguiu cumprir esse segundo objetivo e a Coluna Prestes nunca
desembocou num levante popular revolucionário. Porém, o grupo conseguiu de fato
passar anos sem ser capturado pelas forças federais. A marcha percorreu cerca de
25 mil quilômetros e terminou na Bolívia, onde os membros da Coluna conseguiram
asilo.
Você sabia?
A Coluna Prestes não teve um resultado político concreto, mas exerceu grande
in�uência sobre líderes revolucionários internacionais. Prestes ingressou anos depois
no Partido Comunista Brasileiro, onde se tornou liderança. Com isso, a história do
“Cavaleiro da esperança”, como �cou conhecido, circulou nos meios comunistas
internacionais. 
Mao Tse Tung se inspirou na experiência da Coluna para organizar a “Grande Marcha”
na China dos anos 1930. Por tabela, os guerrilheiros de Fidel Castro em Sierra
Maestra, em Cuba, também foram inspirados pela estratégia. A inovação de Prestes
consistia em, ao invés de combater de frente as forças nacionais, situação na qual
um grupo guerrilheiro quase sempre estará em desvantagem, apenas resistir
(mesmo fugindo) e angariar apoio popular pelo interior do território até ter força
su�ciente e oportunidade concreta de tomar o poder. 
No �nal dos anos 1930 o Tenentismo já era uma das forças políticas mais notáveis do
cenário nacional. Por isso, os líderes do movimento passariam a ser cortejados pelas
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elites regionais que queriam destronar os cafeicultores da presidência. Assim, os
tenentistas teriam passariam central na derrubada da República Velha em 1930 e na
instauração de Getúlio Vargas no poder – mas isso será assunto de uma próxima
unidade.
Síntese
Chegamos ao �nal dessa unidade. Aprofundamos
nossos conhecimentos acerca da conjuntura
política e social que se instaurava junto ao
processo republicano no Brasil. Observamos os
desa�os, impasses e disputas em torno da
modernização do país. Conhecemos alguns
processos de resistência popular em reivindicação
de melhorias das condições de vida. Fomos
percebendo como resquícios da questão colonial
permaneciam presentes na vida brasileira,
centralmente na lógica oligárquica da política, na
segregação urbano-rural, nas condições sociais da
população negra que recentemente havia se
libertado do sistema escravagista. Finalizamos
enumerando uma série de revoltas contra o poder
republicano até chegarmos ao momento decisivo
da crise do projeto político estabelecido pelos
barões do café e coronéis. 
Nesta unidade você teve a oportunidade de:
Adentrar na situação social que a metrópole
reservava aos trabalhadores e o inicio de seus
movimentos de protesto;
Observar os con�itos ocorridos à época na capital
federal decorrente dos processos de
modernização da cidade;
Reconhecer movimentos e �guras de caráter
messianismo que se punham contra as oligarquias
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e a favor do retorno da monarquia;
Situar-se quanto a movimentos que foram
caracterizados como banditismo social por suas
ações violentas de revide quanto à situação social
lhes imputada;
Compreender de que maneira a crise de
legitimidade política da república chega aos
quartéis e as diferenças políticas dos movimentos
daí oriundos.
Download do PDF da unidade
Bibliografia
HOBSBAWM, Eric. Bandidos . 4ªed. São Paulo, Paz e Terra, 2010. 
NAPOLITANO, Marcos. História do Brasil república: da queda da Monarquia ao
�m do Estado Novo . São Paulo: Contexto, 2016. Disponível na Biblioteca Virtual
Universitária 
PRADO JUNIOR, Caio. História econômica do Brasil . São Paulo: Brasiliense, 2008. 
SEVCENKO, Nicolau. A revolta da vacina. Mentes insanas em corpos rebeldes .
São Paulo: Cosac Naify, 2010. 
Figura 1 – Pixabay. Disponível em https://pixabay.com/pt/photos/rio-de-janeiro-
brasil-montanha-809756/. Acessado em 26/04/2019 às 00h04 
Figura 2 – Infoescola. Disponível em https://www.infoescola.com/historia-do-
brasil/governo-de-rodrigues-alves/ Acessado em 26/04/2019 às 00h04

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