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MUNDIALIZAÇÃO E CAPITAL FINANCEIRO

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São Luís – MA, 23 a 26 de agosto 2005 
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MUNDIALIZAÇÃO E CAPITAL FINANCEIRO: 
a perspectiva de François Chesnais 
 
Cristiano Vieira Montenegro* 
 
RESUMO 
 
 
O presente trabalho objetiva caracterizar, a partir das análises desenvolvidas 
por François Chesnais, as configurações de um capitalismo que transita entre 
os séculos XX e XXI, destacando a “mundialização do capital” como uma 
nova e mais recente fase no curso histórico de desenvolvimento do 
capitalismo; sublinhando as formas e configurações que esse processo 
imprime aos grandes grupos industriais, ao comércio e ao sistema financeiro 
internacionais; e, destacando a centralidade do capital financeiro no movi- 
mento geral da acumulação e valorização do capital na contemporaneidade. 
 
Palavras-Chave: mundialização, capital, capitalismo, finanças. 
 
 
ABSTRACT 
 
 
This present framework has a propose to expose, by the ideas of François 
Chesnais, how the capitalism has been becoming within XX and XXI century, 
showing a “globalization capital” as a new and earliest moment in the history 
of capitalism development; by the way it shows another aspects that this 
process works into big industrial companies, trade and financial international 
system around the world; and, even though it emphasizing the centralization 
of the financial capital in the new movement of save and overwealth of the 
capital at the moment. 
 
Keywords: world-wide, capital, capitalism, finances. 
 
 
1 INTRODUÇÃO 
 
O capital, como fenômeno de abrangência mundial e tema recorrente de 
investigação nas ciências sociais e humanas. As análises sobre esse fenômeno histórico 
revelam, em produções teóricas das mais diversas correntes e matizes do pensamento 
social, uma fonte inesgotável de perspectivas teórico-metodológicas e posicionamentos 
práticos-políticos. 
Neste sentido, a produção teórica do economista francês François Chesnais no 
que concerne o movimento do capital e as configurações do capitalismo na 
contemporaneidade desfrutam de notório destaque. Pautando sua reflexão sobre o 
capitalismo no contexto do que denomina por Mundialização do Capital, Chesnais aborda 
questões como os processos de internacionalização de capitais (produtivo, comercial e 
 
* Bacharel em Serviço Social, Mestrando em Serviço Social da Universidade Federal de Alagoas. 
 
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financeiro), o triunfo do capital financeiro e especulativo sobre o capital produtivo, a 
centralidade do capital financeiro no processo de acumulação, as configurações do mercado 
e da economia mundial, bem como a crise contemporânea do capital como expressão e 
resultado de sua mundialização. 
O conteúdo abordado no presente trabalho remete a temática da Mundialização 
do Capital, conforme a análise de Chesnais. Aqui, nosso objetivo é destacar, sumariamente, 
os aspectos que identificamos como relevantes na produção teórica deste autor, no que 
concerne às configurações do capitalismo na contemporaneidade, sobretudo a destacada 
centralidade que o capital financeiro vem ocupando nos processos de valorização e 
acumulação capitalistas atualmente. 
 
2 A MUNDIALIZAÇÃO DO CAPITAL: uma nova fase do Capitalismo 
 
Conforme Chesnais, necessário se faz distinguir, no curso histórico do 
capitalismo, 
 
[...] certos momentos em que numerosos fatores desembocam num novo conjunto 
de relações internacionais e internas, que ‘formam um sistema’ e que modelam a 
vida social, não apenas no plano econômico, mas em todas as suas dimensões. 
(CHESNAIS, 1996, p. 14). 
 
Para o autor, tais fatores consubstanciam, num determinado período histórico, as 
formas da acumulação capitalista, seus impasses e contradições e as estratégias políticas e 
econômicas de reestruturação do capital, para a superação de suas crises. 
No contexto histórico de desenvolvimento do capitalismo, identificamos, a partir 
de Chesnais, particularmente, três períodos onde os fatores anteriormente citados se 
articulam, conformando fases especificas do modo de produção do capital. São eles: o 
período compreendido entre os anos de 1880 e 1913, o qual convencionou-se designar de 
capitalismo monopolista; o período que se inicia após a segunda grande guerra e que teve 
seu crepúsculo entre os anos 1974-1979 - período conhecido como os "trinta anos 
gloriosos", onde imperaram o fordismo e a regulação keynesiana (Welfare State); e, por fim, 
encontramos o período atual, emergido com o ocaso dos "anos de ouro", no final da década 
dos anos de 1970 e que aqui se denomina de fase de mundialização do capital. 
Logo, ao tratarmos da mundialização do capital, estamos nos referindo a uma 
"nova configuração do capitalismo mundial e nos mecanismos que comandam seu 
desempenho e sua regulação.” (CHESNAIS, 1996, p.13). Para Chesnais (1996, p.15), o que 
qualifica a mundialização como nova e mais recente fase de desenvolvimento capitalista é 
que, apesar de persistirem aspectos das fases anteriores, "o sentido e o conteúdo da 
 
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acumulação de capital e dos seus resultados são bem diferentes”. Neste sentido, atua como 
fator preponderante na distinção da mundialização como uma nova fase, a posição de 
centralidade ocupada pelo capital financeiro no que concerne à acumulação capitalista. 
Segundo o autor, na fase de mundialização, "o estilo da acumulação é dado pelas novas 
formas de centralização de gigantescos capitais financeiros” (CHESNAIS,1996, p.14). São 
os fundos (mútuos e de pensão) cujo objetivo fundamental é reproduzir-se no interior da 
esfera financeira. 
O que marca, consideravelmente, a mundialização, demarcando-a como uma 
nova fase é, sobremaneira, a dinâmica especifica do capital financeiro. O crescimento da 
esfera financeira foi tamanho que, nos últimos anos, deu-se "em ritmos qualitativamente 
superiores aos dos índices de crescimento do investimento, ou do PIB (inclusive nos paises 
da OCDE), ou do comércio exterior” (CHESNAIS, 1996, p. 15). 
Portanto, conforme Chesnais, ao tratarmos da mundialização capitalista estamos 
designando um novo contexto histórico, marcado por profundas e significativas 
transformações que, apesar de marcadas pelo complexo das contradições do capital, e, 
portanto, não apontarem para a constituição de uma sociedade pós-capitalista ou pós-
industrial – como declararam alguns – abrem uma nova fase no curso histórico de 
desenvolvimento do sistema produtor de mercadorias. 
 
3 AS FORMAS ASSUMIDAS PELA MUNDIALIZAÇÃO DO CAPITAL NAS ESFERAS 
PRODUTIVA, COMERCIAL E FINANCEIRA 
 
Ao pautarmos nossa reflexão no que concerne a mundialização do capital, 
percebemos como suas dimensões fundamentais a indústria, o intercâmbio comercial e o 
sistema financeiro. Trata-se aqui, de pensar as configurações atualmente assumidas pela 
economia capitalista, em nível mundial, com resultante, principalmente, dos movimentos de 
internacionalização dos capitais produtivo, comercial e financeiro na contemporaneidade. 
No que se refere às formas assumidas pela mundialização na esfera produtiva, 
primeiramente identificamos a empresa "multinacional" ou "transnacional" como o suporte 
organizacional dos grandes grupos industriais mundializados. Em Chesnais, as 
multinacionais ou transnacionais são empresas ou grupos capitalistas, de grande 
envergadura que, com consolidada base nacional, expandiram filiais internacionalmente, 
conforme estratégias e organização implementadas mundialmente, objetivando a 
reprodução e valorização de seus capitais. 
Os processos de concentração e aquisição/fusão de capitais aparecem na 
análise de Chesnais como um aspecto importante inerente aos grandes grupos capitalistas 
 
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mundializados, notadamente no que concerne à expansão e as dimensões que esses 
grupos atingiram na fase de mundialização. Foram estes processos que se configuraram 
comoa principal forma e força motriz da expansão dos grandes grupos multinacionais, tal 
como se verificou a partir da década de 1980. 
Em Chesnais, a questão dos processos de concentração e aquisição/fusão de 
capitais na fase de mundialização, coloca outra questão importante, que é referente à 
natureza da concorrência e as formas de mercado que resultam da concentração de 
capitais. 
A natureza da concorrência e as formas de mercado que resultam dos processos 
de concentração do capital colocam as estruturas oligopolistas como elementos centrais da 
discussão. O oligopólio, na fase de mundialização é a "forma de oferta mais característica 
no mundo” (CHESNAIS,1996, p.92), conformando um espaço de acirrada concorrência e 
rivalidade, mas também de "interdependência entre companhias” (CHESNAIS,1996, p.92). 
O oligopólio mundial configura-se, assim, como um ambiente de rivalidade 
 
[...] delimitado pelas relações de dependência mútua de mercado, que interligam um 
pequeno número de grandes grupos que, numa dada indústria [...] chega a adquirir e 
conservar a posição de concorrente efetivo no plano mundial. (CHESNAIS, 1996, p. 
93). 
 
No que concerne às formas assumidas pela mundialização na esfera comercial 
podemos sublinhar, a partir de Chesnais, três séries de fatores dos quais resulta a atual 
configuração do sistema internacional de intercâmbio. Os primeiros fatores são os 
processos de concentração e centralização do capital nas economias do centro do 
capitalismo internacional, associados aos movimentos do IED, bem como às estratégias dos 
grandes grupos. Os segundos fatores são as mudanças tecnológicas e científicas, 
principalmente no que se refere à inserção de tais mudanças nos processos produtivos com 
influência nos níveis, organização e localização da produção, bem como da demanda na 
produção por mão-de-obra e insumos. Os terceiros fatores são os de conotação política, 
aludindo aos papéis assumidos pelos Estados tanto no que concerne à constituição dos 
blocos econômicos regionais, como no que tange à postura assumida por esses países em 
relação à dívida das nações do terceiro mundo. 
Atentemos agora para as formas assumidas pela mundialização na esfera 
financeira. Segundo Chesnais (1996, p. 239), "a esfera financeira representa o posto mais 
avançado do movimento de mundialização do capital, onde as operações atingem o mais 
alto grau de mobilidade." A dinâmica das finanças na fase de mundialização é tamanha, a 
ponto de o capital financeiro vir demonstrando uma capacidade intrínseca de delinear um 
movimento próprio de valorização – em relação à produção - de forma autônoma e com 
 
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características muito específicas, como em nenhum outro estágio de desenvolvimento do 
capitalismo. 
Articularam-se, no atual estágio de internacionalização do capital financeiro e de 
expansão do sistema financeiro internacional, tanto as medidas de liberalização e 
desregulamentação, quanto às inovações financeiras. 
Essa verdadeira hipertrofia da esfera financeira se expressa tanto no peso que 
as atividades puramente financeiras vêm desempenhando para o capital na fase de 
mundialização, quanto nas atuais taxas de crescimento dos ativos financeiros. Nos dois 
casos, a dimensão alcançada pelo capital financeiro se sobrepõe ao crescimento das 
atividades do intercâmbio comercial, dos fluxos do investimento externo direto e até mesmo 
do PIB dos países capitalistas mais desenvolvidos. 
Contudo, apesar de ser notória a expansão das finanças e cada vez mais central 
a posição ocupada pela fração financeira do capital no movimento de acumulação e 
valorização capitalistas na fase de mundialização, é importante registrar que não há uma 
clivagem absoluta entre as esferas produtiva e financeira, e que, ao contrário, tais esferas 
encontram-se imbricadas. 
 Se for verdadeiro o fato que na fase de mundialização as operações do capital 
financeiro se expandiram como em nenhum outro momento histórico e que atualmente esta 
fração do capital tenta empreender um movimento de valorização autônomo em relação à 
esfera da produção, não menos verídico é o fato de haver uma imbricação entre as esferas 
produtiva e financeira, bem como que a pretensa autonomia do capital financeiro em relação 
ao capital produtivo só poder ser admitida como absolutamente relativa, pois "os capitais 
que se valorizam na esfera financeira nasceram – e continuam nascendo – no setor 
produtivo"(CHESNAIS, 1996, p.241). 
Esses são, em linhas gerais, os aspectos e elementos mais relevantes sob os 
quais se configuram, na fase de mundialização, as esferas produtiva, comercial e financeira. 
 
4 A FINANCEIRIZAÇÃO DA ACUMULAÇÃO CAPITALISTA: uma inflexão no pensamento 
de chesnais 
 
Nos interessará aqui sumariar as linhas gerais da discussão mais recente 
levantada por Chesnais1 no conjunto de sua análise sobre a mundialização do capital, 
particularmente no que se refere à autonomia e centralidade do capital financeiro nos 
movimentos de valorização e acumulação capitalistas na contemporaneidade. Trata-se da 
 
1 Aqui nos referimos às edições nacionais de livros do autor, publicados posteriormente à Mundialização do 
Capital. Ver as Referências. 
 
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tese apresentada pelo autor da ocorrência de um "regime de acumulação com dominância 
financeira"(CHESNAIS,1997), tese esta objeto de nossa pesquisa no mestrado. 
Se em "A Mundialização do Capital"2, nosso autor, apesar de reconhecer a 
hipertrofia das finanças e a relativa autonomia do capital financeiro, partia 
metodologicamente das operações do capital produtivo para interpretar o movimento de 
conjunto do capitalismo em nível mundial, em publicações mais recentes3, a partir do 
aprofundamento de suas análises em torno dos "fenômenos financeiros", Chesnais (1998) 
nos diz que "é da esfera financeira que é necessário partir se desejamos compreender o 
movimento em seu conjunto.". Conforme o próprio autor, foi um deslocamento qualitativo 
que se impôs. 
Esse "novo regime de acumulação", predominantemente financeiro, surgiu a 
partir dos anos de 1980, tendo por berço os EUA e o Reino Unido, face à iniciativa desses 
paises de implementarem políticas de liberalização e desregulamentação. 
Nesse deslocamento analítico Chesnais não descarta a tese de Marx, segundo a 
qual é na base material da sociedade capitalista que se cria a riqueza mediante o emprego 
do trabalho humano. Ao contrário, o autor ratifica que os capitais que os agentes financeiros 
valorizam no circuito fechado das finanças nasceram no setor produtivo, na grande indústria, 
a partir de onde assumem as formas de rendimentos formados na produção e no 
intercâmbio. O que ocorre atualmente é que uma parcela cada vez mais elevada desses 
rendimentos é direcionada para a esfera financeira, sendo somente a partir desse momento 
que "podem se dar, dentro do campo fechado da esfera financeira, vários processos, em 
boa parte fictícios, de valorização, que fazem inchar ainda mais o montante nominal dos 
ativos financeiros"(CHESNAIS, 1998, p.15). Em linhas gerais esta é, para Chesnais, a base 
do funcionamento do capitalismo na contemporaneidade. Nas palavras do autor, essa é a 
"pedra angular" de edificação de um novo regime de acumulação, com dominância 
financeira. 
 
5 CONCLUSÃO 
 
Procuramos caracterizar, a partir de Chesnais, as configurações de um 
capitalismo que transita entre os séculos XX e XXI, destacando a mundialização como uma 
nova e mais recente fase no curso histórico de desenvolvimento do capitalismo, sublinhando 
igualmente as formas e configurações que esse processo assumi nas esferas produtiva, 
 
2 Publicado pela Xamã em 1996. 
3 Notadamente em A Mundialização Financeira – gênese, custos e riscos. Xamã. 1998. 
 
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comercial e financeira, destacando a centralidade do capital financeiro para o movimento 
geral da acumulação e valorização do capital. 
Mas, mais que isso, nos interessamos em apresentar – introdutoriamente - 
aquilo que identificamos como sendo um deslocamento analítico no enfoque que até então 
vinha sendo dado por Chesnais em sua apreensão da mundialização capitalista e que 
qualificamos como sendo um momento de inflexão na produção teórica deste autor, cujas 
hipóteses e tese nos serve de objeto de pesquisa. 
Aqui, o que fica cada vez mais cristalina é a certeza de que em tempos onde a 
barbárie caminha a passos largos, todo esforço critico de análise e compreensão que ajude 
a desvelar os nexos contraditórios que articulam o real, mais que válido, é urgente e 
necessário. 
 
REFERÊNCIAS 
 
CHESNAIS, F. A mundialização do capital. São Paulo: Xamã, 1996. 
 
______. (Coord.). A mundialização financeira: gênese, custos e riscos. São Paulo: 
Xamã, 1998. 
 
______. (et. al.). Uma nova fase do capitalismo?. São Paulo: Xamã, 2003. 
 
______.Capitalismo de fim de século. In: COGGIOLA, O. (org.). Globalização e 
socialismo. São Paulo: Xamã, 1997. 
 
______. A globalização e o curso do capital de fim de século. Economia e Sociedade, 
Campinas: Revista do Instituto de Economia da Unicamp, n. 5., data. 
 
HUSSON, M. A miséria do capital: uma critica do neoliberalismo. Portugal: Terramar, 1998. 
 
MANDEL, E. A crise do capital: os fatos e a interpretação marxista. São Paulo: Editora 
Ensaio, 1990. 
 
______. O capitalismo tardio. São Paulo: Abril Cultural, 1982. (Coleção os economistas).

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