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Yaqub havia esticado alguns palmos. E à medida que se aproximava do cais, o pai comparava o corpo do filho recém-chegado com a imagem que construíra durante os anos da separação. Ele carregava um farnel de lona cinza, surrado, e debaixo do boné verde os olhos graúdos arregalaram com os vivas e a choradeira dos militares da Força Expedicionária Brasileira. Halim acenou com as duas mãos, mas o filho demorou a reconhecer aquele homem vestido de bran- co, um pouco mais baixo do que ele. Por pouco não esquecera o rosto do pai, os olhos do pai e o pai por inteiro. Apreensivo, ele se aproximou do moço, os dois se entreolharam e ele, o filho, perguntou: “Baba?”. E depois os quatro beijos no rosto, o abraço demorado, as saudações em árabe. Saíram da praça Mauá abraçados e foram até a Cinelândia. O filho falou da viagem e o pai lamentou a penúria em Manaus, a penúria e a fome durante os anos da guerra. […] HATOUM, Milton. Dois irmãos. São Paulo: Companhia das Letras, 2000. p. 13-14. Milton Hatoum nasceu em Manaus, em 1952. É professor universitário, romancista, contista e tradutor. B I O G R A F I A O primeiro parágrafo do trecho permite-nos identificar a origem libanesa da família, assim como o local e o tempo cronológico em que ocorre a cena: o cais na praça Mauá, no Rio de Janeiro, por ocasião do retorno dos militares brasileiros enviados à Itália durante a Segunda Guerra Mundial. Também conhecemos algumas das características de Yaqub e notamos a comparação entre esse filho e o outro, o Caçula. A descrição do recém-chegado é mais detalhada no parágrafo seguinte. No terceiro parágrafo, ocorre o encontro entre o pai e o filho que volta do Líbano. Então temos ideia de que a família vive em Manaus e de que a guerra provocou problemas na região. A relação entre Yaqub e o Caçula (Omar) é o centro da narrativa, que tem outros personagens ligados à família e a Manaus. Ao longo da história, acompanhamos o desenvolvimento do drama familiar e as mudanças ocorridas na capital do Amazonas. SITUAÇÃO-PROBLEMA Veja, no Manual do Professor, o gabarito comentado das questões sinalizadas com asterisco. Observe esta tirinha do gato Garfield. DAVIS, Jim. Garfield. Disponível em: <http://4.bp.blogspot.com/-7yc728uELbA/T5ijBIC73_I/AAAAAAAAAg8/ ed3AJCmvf1Y/s640/aranha3.png>. Acesso em: 7 ago. 2017. � Identifique o referente do pronome utilizado na fala do gato no segundo quadrinho. O referente do pronome o é “Seu marido”. Explique por que, nessa fala, a escolha do pronome o respeita as regras gramaticais da língua por- tuguesa. Em seguida, explique por que, nesse contexto, o uso do pronome ele seria inadequado. O uso do pronome o, nesse contexto, respeita as regras gramaticais porque se empregam pronomes oblíquos na função de objeto. Por outro lado, o uso do pronome ele seria inadequado porque os pronomes retos não devem atuar como objeto, mas como sujeito. Glossário Farnel: recipiente com comida para uma viagem. Força Expedicionária Brasileira: delegação militar organizada em 1943, durante a Segunda Guerra Mundial, e enviada à Europa para integrar as tropas dos países Aliados (Estados Unidos, Reino Unido e outros) contra as potências do Eixo (cujos principais países eram Alemanha, Itália e Japão). G a rf ie ld , J im D a v is © 2 0 0 2 P a w s , In c . A ll R ig h ts R e s e rv e d /D is t. b y A n d re w s M c M e e l S y n d ic a ti o n 76 L ÍN G U A P O R T U G U E S A � M Ó D U L O 1 4 PH7_EF2_POR_C2_070a080_M14.indd 76 11/21/17 5:25 PM PRATICANDO O APRENDIZADO 1 Reescreva as frases substituindo os segmentos em destaque pelos pronomes retos adequados. Ao fazer a substituição, atente para o número e a pessoa do pronome escolhido. a) Eu e vovó íamos juntos à feira. Nós íamos juntos à feira. b) Tu e Laura pretendeis voltar hoje? Vós pretendeis voltar hoje? c) Depois do cancelamento do evento, doutor Felipe e sua esposa foram jantar. Depois do cancelamento do evento, eles foram jantar. d) Com as chuvas fortes, a funcionária ficou presa na empresa. Com as chuvas fortes, ela ficou presa na empresa. 2 Sublinhe os pronomes pessoais que atuem como sujeito e circule os que não forem sujeito. a) Tu sabes que eu faço tudo por ti. b) Nós contamos para elas a verdade que as incomodava. c) Ele vem criando intrigas sobre mim. d) Eu tenho percebido que alguns colegas não falam contigo. 3 Reescreva as frases substituindo os segmentos em negrito pelos pronomes oblíquos adequados. Ao fazer a substitui- ção, considere o número e a pessoa do pronome escolhido. a) Os feirantes cumprimentavam a mim e vovó na feira. Os feirantes nos cumprimentavam na feira./Os feirantes cumprimentavam-nos na feira. b) Devo encontrar a ti e Laura mais tarde? Devo encontrar-vos mais tarde? c) No restaurante, eu vi doutor Felipe e sua esposa. No restaurante, eu os vi. d) Por não ter conseguido voltar para casa, a chefe deu para a funcionária dois dias de descanso. Por não ter conseguido voltar para casa, a chefe lhe deu dois dias de descanso./Por não ter conseguido voltar para casa, a chefe deu-lhe dois dias de descanso. 4 Classifique, nos contextos a seguir, os pronomes n ós, vós e ele(s)/ela(s) em reto ou oblíquo tônico. a) Nós não temos nada a favor dela. Nós: reto; ela: pronome oblíquo tônico. b) Nos últimos meses, ele tem feito muito por nós. Ele: reto; nós: pronome oblíquo tônico. c) Mesmo com os últimos incidentes, elas ainda con- fiam muito em vós. Elas: reto; vós: pronome oblíquo tônico. d) Vós ainda desejais contar com a confiança delas? Vós: reto; elas: pronome oblíquo tônico. 5 Preencha as lacunas com os pronomes pessoais eu ou mim, de acordo com as regras gramaticais de uso des- ses pronomes. a) Está complicado para mim perceber os aproveitadores. b) Meus pais se esforçaram para eu ter a chance de estudar. c) Para eu fazer a prova com segurança, fiz todos os exercícios. d) Trará bastante tranquilidade para mim fazer a prova agora. 6 Indique se os pronomes oblíquos destacados assumem valor de posse, de reciprocidade ou de reflexividade. a) Abraçaram-se após o desentendimento. recíproco b) Nós nos perguntamos se essa dúvida será resolvida. reflexivo c) Os candidatos ofenderam-se durante o debate. recíproco d) Pai e filho barbearam-se para comparecer ao casamento. reflexivo e) Peguei-lhe o braço e constatei estar com febre. posse 77 L ÍN G U A P O R T U G U E S A � M Ó D U L O 1 4 PH7_EF2_POR_C2_070a080_M14.indd 77 11/21/17 5:25 PM Glossário Órion: nome de uma constelação. Leia o texto reproduzido a seguir para responder às questões 3 a 6. […] Fiquei reparando... tirar as camisetas foi como que uma libertação para os meninos. Comecei a perceber que até mesmo sua movimentação tinha ficado diferente — seria “viagem” minha? Eles, num instante, tinham “virado” moleques de quintal, como os dos quintais da minha infância: subiam na amoreira, exibiam os “muques”, se mostravam fortes e pulavam feito cabri- tos. Organizaram uma brincadeira de luta na qual eu tive que intervir, com medo de que se machucassem! Mas eles tinham se transformado em homenzinhos valentes e saíram chutando a terra, reclamando que eu era chata. Morri de rir. Nessa altura, a cara deles estava uma meleira e as das meninas não estava muito atrás, não. Foi então que tive a ideia de pedir emprestada ao Nilton, da manutenção, a mangueira da escola. Minha intenção era ape- nas lavar os pés, os rostos e as mãos das crianças antes de entrarmos, mas qual o quê!! “Molha eu! Molha eu!” eles gritavam, e acabaram se molhando muito mais do que eu queria. Até as meninas entraram na brincadeira. Fiz um grande arco com o esguicho d'água que eles tinham que atravessar por baixo… fiz cobrinhas de água rente ao chão, que eles tinham que pular sem encostar — mas que é claro que, de propósito, terminavam pulando bem em cima, espirrandoágua para todos os lados, inclusive nas meninas, que davam puli- nhos e gritinhos de “Para!”, mas que eu percebia, estavam adoran- do, pela correria e pelos risinhos. [...] CADERNOS da Rede: formação de professores. São Paulo: Secretaria Municipal de Educação, 2010. p. 17. Disponível em: <http://portal.sme.prefeitura.sp.gov.br/Portals/1/Files/15088.pdf>. Acesso em: 8 ago. 2017. APLICANDO O CONHECIMENTO Leia o poema abaixo para responder às questões 1 e 2. Órion A primeira namorada, tão alta que o beijo não a alcançava, o pescoço não a alcançava, nem mesmo a voz a alcançava. Eram quilômetros de silêncio. Luzia na janela do sobradão. ANDRADE, Carlos Drummond de. Boitempo: menino antigo. São Paulo: Companhia das Letras, 2017. p. 284. Carlos Drummond de Andrade nasceu em Itabira, em Minas Gerais, em 1902. Foi poeta, cronista, contista, tradutor e funcionário público. Faleceu no Rio de Janeiro em 1987. B I O G R A F I A 1 A poesia costuma explorar a duplicidade de significados das palavras a ponto de, muitas vezes, produzir ambi- guidade. Evidencie os dois sentidos que o vocábulo Luzia assume no último verso. A seguir, indique a classe gramatical de cada uma dessas interpretações. O vocábulo Luzia pode ser interpretado como um verbo (o ato de luzir, ou seja, de brilhar) e também como um substantivo próprio, que denomina, no contexto, a amada do eu lírico. 2 Aponte o referente do pronome a, que se repete ao longo do poema. Classifique, de forma completa, esse pronome. O pronome oblíquo átono a refere-se a “A primeira namorada”. Il u s tr a C a rt o o n /A rq u iv o d a e d it o ra 78 L ÍN G U A P O R T U G U E S A � M Ó D U L O 1 4 PH7_EF2_POR_C2_070a080_M14.indd 78 11/21/17 5:25 PM Apesar de ser um pronome pessoal, o vocábulo eles assume classificações distintas nos trechos citados. Dê essas classificações e ofereça um argumento que sirva para diferenciá-los. No primeiro caso, eles é pronome pessoal reto; no segundo, é pronome pessoal oblíquo tônico. Isso ocorre porque apenas o primeiro ocupa a função sintática de sujeito da oração. 6 A frase “Até as meninas entraram na brincadeira” de- monstra que o narrador se surpreende com a atitude tomada pelas meninas. Explique, com suas palavras, em que consiste essa surpresa. Não era esperado pela narradora que meninas apreciassem a brincadeira com água; a narradora supôs que fosse uma diversão comum aos meninos, mas não a elas. 3 Explique por que o uso do pronome em “Molha eu!” desrespeita as regras gramaticais do português. Como fica essa frase quando o falante deseja obedecer à nor- ma-padrão? A frase está incorreta porque o pronome reto foi usado na função de objeto direto. Construção adequada: “Molha-me”. 4 Releia: “eu tive que intervir, com medo de que se ma- chucassem!”. O uso do pronome oblíquo se nessa pas- sagem apresenta ambiguidade. Aponte os dois valores que ele manifesta nesse contexto de uso. O se pode ser reflexivo ou recíproco. 5 Releia estes trechos: [...] eles tinham se transformado em homenzinhos va- lentes [...]. [...] a cara deles estava uma meleira [...]. A seguir, leia o trecho de um romance e responda às questões sobre ele. DESENVOLVENDO HABILIDADES O Guarani […] — Tu, senhora, zangada com Peri! Por quê? — Porque Peri é mau e ingrato; em vez de ficar perto de sua senhora, vai caçar em risco de morrer! disse a moça ressentida. — Ceci desejou ver uma onça viva! — Então não posso gracejar? Basta que eu deseje uma coisa para que tu corras atrás dela como um louco? — Quando Ceci acha bonita uma flor, Peri não vai bus- car? perguntou o índio. — Vai, sim. — Quando Ceci ouve cantar o sofrer, Peri não o vai procurar? — Que tem isso? — Pois Ceci desejou ver uma onça, Peri a foi buscar. 1 5 Glossário Ressentido: magoado. Sofrer: pássaro de corpo avermelhado e asas pretas. Il u s tr a C a rt o o n /A rq u iv o d a e d it o ra A seguir, leia o trecho de um romance e responda às questões sobre ele. Il u s tr a C a rt o o n /A rq u iv o d a e d it o ra 79 L ÍN G U A P O R T U G U E S A � M Ó D U L O 1 4 PH7_EF2_POR_C2_070a080_M14.indd 79 11/21/17 5:25 PM 1 Em “Pois Ceci desejou ver uma onça, Peri a foi buscar”, o termo em destaque é um pronome. Em qual das frases a seguir, o termo destacado também é um pronome? a) “Quando Ceci acha bonita uma flor, Peri não vai bus- car? perguntou o índio.” (5º parágrafo) b) “Quando Ceci ouve cantar o sofrer, Peri não o vai procurar?” (7º parágrafo) c) “Mas estava resolvida a conservar a sua severidade [...].” (11º parágrafo) d) “Mas então, exclamou a menina com um assomo de impaciência [...].” (14º parágrafo) 2 Releia: “— Quando Ceci acha bonita uma flor, Peri não vai buscar? perguntou o índio” (5º parágrafo). O uso dos substantivos Ceci e Peri chama a atenção no con- texto. O estranhamento é decorrente do fato de esses substantivos: a) nomearem seres desnecessariamente, pois já se conhecem. b) serem de 3ª pessoa apesar de marcarem os interlo- cutores. c) mostrarem confusão do índio na referência às pes- soas do discurso. d) estabelecerem distanciamento de Peri em relação à Ceci. 3 Na frase “Tudo é o mesmo, desde que te causa prazer, senhora” (13º parágrafo), o pronome te classifica-se como: a) pessoal reto. b) pessoal oblíquo tônico. c) pessoal oblíquo átono. d) pessoal reflexivo. 4 Com base no contexto, o pronome do trecho “[...] o ho- mem não pode tocá-la [...]” (20º parágrafo) refere-se a: a) nuvem. b) terra. c) Ceci. d) noite. José de Alencar nasceu em Messejana, no Ceará, em 1829. Foi romancista, contista, político. Trata-se de um dos grandes nomes da literatura brasileira. Faleceu no Rio de Janeiro, em 1877. B I O G R A F I A Cecília não pôde reprimir um sorriso ouvindo esse silo- gismo rude, a que a linguagem singela e concisa do índio dava uma certa poesia e originalidade. Mas estava resolvida a conservar a sua severidade, e ralhar com Peri por causa do susto que lhe havia feito na véspera. — Isto não é razão, continuou ela; porventura um animal feroz é a mesma coisa que um pássaro, e apanha-se como uma flor? — Tudo é o mesmo, desde que te causa prazer, senhora. — Mas então, exclamou a menina com um assomo de impaciência, se eu te pedisse aquela nuvem?... E apontou para os brancos vapores que passavam ainda envolvidos nas sombras pálidas da noite. — Peri ia buscar. — A nuvem? perguntou a moça admirada. — Sim, a nuvem. Cecília pensou que o índio tinha perdido a cabeça; ele continuou: — Somente como a nuvem não é da terra e o homem não pode tocá-la, Peri morria e ia pedir ao Senhor do céu a nuvem para dar a Ceci. Estas palavras foram ditas com a simplicidade com que fala o coração. A menina que um momento duvida- ra da razão de Peri, compreendeu toda a sublime abnegação, toda a delicadeza de sentimento dessa alma inculta. A sua fingida severidade não pôde mais resistir; deixou pairar nos seus lá- bios um sorriso divino. […] ALENCAR, José de. O Guarani. São Paulo: Ática, 1996. Disponível em: <www.dominiopublico.gov.br/download/texto/bv000135.pdf>. Acesso em: 6 set. 2017. 10 15 20 Glossário Silogismo: raciocínio. Singelo: delicado. Conciso: resumido. Severidade: rigor. Ralhar: repreender. Assomo: ímpeto, ação inesperada. Abnegação: superação do egoísmo. 80 L ÍN G U A P O R T U G U E S A � M Ó D U L O 1 4 PH7_EF2_POR_C2_070a080_M14.indd 80 11/21/17 5:25 PM