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Literatura Africana em Língua Portuguesa Material Teórico Responsável pelo Conteúdo: Prof.ª Dr.ª Vivian Steinberg Revisão Textual: Prof. Me. Claudio Brites Literatura Moçambicana • Mia Couto; • Palestra de Mia Couto; • Entrevista com Mia Couto. · Conhecer o panorama da literatura moçambicana. · Identificar perspectivas do autor moçambicano Mia Couto em seu contexto histórico e social. · Apreender temas e contextos das narrativas de Mia Couto, em seus livros e entrevistas. OBJETIVO DE APRENDIZADO Literatura Moçambicana Orientações de estudo Para que o conteúdo desta Disciplina seja bem aproveitado e haja maior aplicabilidade na sua formação acadêmica e atuação profissional, siga algumas recomendações básicas: Assim: Organize seus estudos de maneira que passem a fazer parte da sua rotina. Por exemplo, você poderá determinar um dia e horário fixos como seu “momento do estudo”; Procure se alimentar e se hidratar quando for estudar; lembre-se de que uma alimentação saudável pode proporcionar melhor aproveitamento do estudo; No material de cada Unidade, há leituras indicadas e, entre elas, artigos científicos, livros, vídeos e sites para aprofundar os conhecimentos adquiridos ao longo da Unidade. Além disso, você também encontrará sugestões de conteúdo extra no item Material Complementar, que ampliarão sua interpretação e auxiliarão no pleno entendimento dos temas abordados; Após o contato com o conteúdo proposto, participe dos debates mediados em fóruns de discus- são, pois irão auxiliar a verificar o quanto você absorveu de conhecimento, além de propiciar o contato com seus colegas e tutores, o que se apresenta como rico espaço de troca de ideias e de aprendizagem. Organize seus estudos de maneira que passem a fazer parte Mantenha o foco! Evite se distrair com as redes sociais. Mantenha o foco! Evite se distrair com as redes sociais. Determine um horário fixo para estudar. Aproveite as indicações de Material Complementar. Procure se alimentar e se hidratar quando for estudar; lembre-se de que uma Não se esqueça de se alimentar e de se manter hidratado. Aproveite as Conserve seu material e local de estudos sempre organizados. Procure manter contato com seus colegas e tutores para trocar ideias! Isso amplia a aprendizagem. Seja original! Nunca plagie trabalhos. UNIDADE Literatura Moçambicana Mia Couto Mia Couto é o pseudônimo de António Emílio Couto. Adotou Mia como primeiro nome por dois motivos: um mais familiar, seu irmão caçula assim o chamava porque não conseguia pronunciar o nome inteiro; e o segundo, mais poético, porque combi- na com seu gosto por gatos – aliás, dizia à sua mãe que queria ser um deles. Nasceu em Beira, Moçambique, em 5 de julho de 1955. Em 1971, mudou- -se para a capital, Lourenço Marques, hoje, Maputo. Depois do 25 de abril de 1974, exerceu a profissão de jornalista. Em 1983, publicou Raiz de orvalho, seu primeiro livro de poesia. Dois anos depois, demitiu-se do cargo de diretor da revista Tempo para se dedicar a seus estudos universitários em Biologia. É o escritor moçambicano mais traduzido e ganhou muitos prêmios, inclusive o Prê- mio Camões, que é o prêmio mais respeitado das literaturas lusófonas, em 2013, pelas mãos do presidente de Portugal, Cavaco Silva, e da presidente do Brasil, Dilma Rousseff. Na introdução de seu livro Estórias abensonhadas, publicado em 2004, em Portugal, pela editora Caminho, e no Brasil, em 2012, pela editora Companhia das Letras, Mia Couto escreveu: Estas estórias foram escritas depois da guerra. Por incontáveis anos as armas tinham vertido luto no chão de Moçambique. Estes textos me sur- giram entre as margens da mágoa e da esperança. Depois da guerra, pen- sava eu, restavam apenas cinzas, destroços sem íntimo. Tudo pensado, definitivo e sem reparo. Hoje sei que não é verdade. Onde restou o homem sobreviveu semente, sonho a engravidar o tempo. Esse sonho se ocultou no mais inacessível de nós, lá onde a violência não podia golpear, lá onde a barbárie não ti- nha acesso. Em todo este tempo, a terra guardou, inteiras, as suas vozes. Quando se lhes impôs o silêncio elas mudaram de mundo. No escuro permaneceram lunares. Estas estórias falam desse território onde nos vamos refazendo e vamos molhando de esperança o rosto da chuva, água abensonhada. Desse terri- tório onde todo o homem é igual, assim: fingindo que está, sonhando que vai, inventando que volta. (COUTO, 2012) Estórias abensonhadas, livro escrito vinte anos após Terra sonâmbula – esse um dos mais célebres romances de Mia Couto, considerado um dos melhores ro- mances africanos do século XX – retrata a tentativa de renascimento e da pos- sibilidade de sonhar. Capta um país em transição. São histórias que traçam um retrato afetivo e mágico de Moçambique, onde o fantástico faz parte do cotidiano e a música reside na fala das ruas. Enquanto no livro mais antigo o cenário é a de- vastação do conflito que se seguiu à independência de Moçambique, em Estórias abensonhadas, trinta anos depois de uma guerra que custou milhares de vidas, o cenário é a esperança, vista como algo novo nas pessoas: “Onde restou o homem sobreviveu semente, sonho a engravidar o tempo” (COUTO, 2012). 8 9 As histórias de Mia Couto entrelaçam fantasia e realidade. O autor declarou que o homem não pode perder o sonho, assim é feita sua literatura, de fiapos, ou pequenas frestas para o sonho, para a esperança; ao mesmo tempo, resgata tradi- ções e a história de seu país. Sua escrita transforma o linguajar das ruas em poesia e carrega de magia a dura realidade. Isso não quer dizer que “ele doura a pílula”, mas que entrevê e entremos- tra o sonho que sobrevive. Em uma entrevista para o programa Roda Viva, TV Cultura, durante a FLIP de 2007, em Paraty, Mia Couto conversou sobre questões pertinentes à sua poética, disse que a oralidade é uma outra lógica que mantemos dentro de nós, mesmo que esteja subjugada à lógica da escrita, e continuou: Em certo momento, esse universo da escrita em nós ocupa um espaço quase hegemônico, e nós não permitimos que aquilo que seja o lado da abordagem poética, o lado da abordagem mais íntima das coisas, com a possibilidade de deixar conviver dentro de nós diferentes tipos de lógicas. Esta que, para mim, é a briga, não como escritor, mas como pessoa que quero ter uma relação com a vida que passa por esse partilhar de lingua- gens com as coisas, com os animais, com as plantas. (RODA VIVA, 2007) Temos duas características marcantes da poética de Mia Couto: por um lado, a possibilidade de ter esperança onde sobrevive o homem, há a possibilidade de inventar a terra depois da chuva, água abensonhada – uma mistura de abençoada e sonhada, isso em relação ao conteúdo; por outro lado, em relação à linguagem, à estrutura de suas histórias, às palavras “inventadas”, pertencentes a uma tradição oral ou, como nos esclareceu, à oralidade, essa é uma outra lógica que mantemos dentro de nós e que precisamos estar aptos, ou disponíveis, para escutar aquilo que são as formas de casamento. O escritor contou que, para a água abensonhada, tem uma memória marcante, disse que quando foi anunciado o fim da guerra pelas primeiras páginas dos jornais não houve comemorações, não houve nenhuma festa; uma semana depois, cho- veu, e aí as pessoas festejaram. Aí, Mia Couto criou a palavra abensonhada, como se a chuva estivesse trazendo as boas novas – não foram os jornais ou revistas que trouxeram a notícia, mas sim a chuva, abençoada e sonhada ao mesmo tempo. Ainda relacionado às línguas faladas em Moçambique, e à presença do portu- guês como língua oficial, esclareceu, na mesma entrevista, que: Moçambique vive uma situação muito particular, em que a maior parte das pessoas são de outra língua e estão visitando o português. São de línguas banto [conjunto de línguas do grupo nigero-congolês oriental faladas na África] e têm o português como segunda língua. Isso criauma situação favorável [para o escritor]: é um privilégio conviver com essa situação em que o português está quase em flagrante nascimento. E isso é feito com uma situação de grande ausência de complexo: as pessoas estão mui- to livres para assaltarem o português, namorarem na rua, na poeira, de noite, de dia. É difícil [portanto] não ser um escritor que use esse tipo de construção e desconstrução. (RODA VIVA, 2007) 9 UNIDADE Literatura Moçambicana A questão da língua portuguesa como língua oficial, ou seja, estabelecida por questão política, a partir de questões de colonização, imposta pelas autoridades europeias, é um dado importante para pensarmos essa literatura, como já mencio- nado acima na introdução a essas literaturas. Mia Couto diz dessa língua que está em “quase flagrante nascimento” e que pos- sibilita a construção e desconstrução da linguagem. Em relação à própria poética, disse que faz uma espécie de fratura que quer fazer no muro, que quer abrir no muro, para ver se do outro lado há uma outra luz, uma outra claridade. E é essa claridade que lhe interessa: “quer dizer, o que surge dessa outra sociedade, dessas outras sociedades, como uma sugestão para apreender o mundo”. Dá um exemplo de um aspecto particular que está presente em sua poética: [...] e a relação com a morte, com os mortos, esta é uma coisa que eu acho que a África tem, embora eu resista muito à ideia de que a África tem coisas, digamos assim, que são tipicamente únicas, quer dizer, que os outros não têm. Eu acho que essa religiosidade, essa relação não com a morte, mas com os mortos, é uma coisa da África, o sentimento do tem- po, o sentimento da eternidade, a maneira como o mundo é governado por harmonias. Isso eu quero que surja nos meus textos e acho que essa é a minha grande aposta. (RODA VIVA, 2007) Ainda na entrevista que fez ao programa Roda viva, Mia Couto resumiu ques- tões históricas que marcam profundamente Moçambique e o continente africano como um todo. Disse, a partir da pergunta do jornalista, sobre seu livro Um rio chamado tempo, uma casa chamada terra (2002), e a questão que aparece a partir da personagem que volta para o enterro do avô, surge, assim, um “hiato de gerações”: Há um hiato de gerações e há um hiato que resulta de um certo golpe. Nós tivemos, de uma maneira dramática, acontecimentos que provoca- ram um desmoronar da teia de relações sociais, familiares. Nós tivemos duas guerras consecutivas (a Guerra da Libertação, entre 1964-1975, e a Guerra Civil Moçambicana, entre 1976-1992). Mais da metade da minha vida foi passada em guerra, e isso, de fato, condensou aquilo que acontece em outros países também. Este fenômeno não é exclusivo dos países que sofrem guerra. O que acontece na guerra é que isso é feito de uma maneira completamente crispada, condensada. O conflito de gera- ções, esse distanciamento daquilo que são os laços de solidariedade que eram muito presentes na sociedade rural africana, são hoje uma condição quase dramática, porque se perdeu aquele mundo e não temos um outro, vivemos em uma espécie de nuvem de um período de transição. (RODA VIVA, 2007) Generalizando, a literatura africana tem a marca de um resgate do passado mais remoto, uma profunda relação com a natureza, o sentimento do tempo, o senti- mento da eternidade e uma colocação importante é sobre a possibilidade da África contar sua própria história, assim fugindo de uma visão europeísta. Mia Couto, em um debate reproduzido parcialmente pelo jornal português Público, em setembro de 2013, chamou a atenção para esse aspecto e declarou que, “sem querer, os 10 11 africanos, nessa missão de se libertarem, incorporaram muito dos fundamentos da imagem de África criada pela visão dos europeus”1. Caminhar pelas páginas dos livros narrativos poéticos de Mia Couto também nos resgata de um olhar padronizado para a língua portuguesa e para a visão europeísta da linguagem. Temos que repensar, além da língua, além da sonoridade, além da visão de literatura e de história partilhada e divulgada pelo ocidente. Há necessidade de uma quebra de valores estagnados, para podermos adentrar em outra escritura. Citaremos duas epígrafes que Mia Couto usou em Terra Sonâmbula: Se dizia daquela terra que era sonâmbula. Porque enquanto os homens dormiam, a terra se movia espaços e tempos afora. Quando despertavam, os habitantes olhavam o novo rosto da paisagem e sabiam que, naquela noite, eles tinham sido visitados pela fantasia do sonho. Crença dos habitantes de Matimati O que faz andar a estrada? É o sonho. Enquanto a gente sonhar a estrada permanecerá viva. É para isso que servem os caminhos, para nos fazerem parentes do futuro. Fala de Tuahir (COUTO, 2017). Mia Couto ouve as vozes que lhe veem além do estar acordado, consciente; assim como os habitantes de Matimati, povo que ele emprega à epígrafe para um de seus mais conhecidos romances, o sonho apresenta fiapos de narrativas desconhecidas, porém, possíveis e herdadas; como se através dos sonhos se pudesse vislumbrar ou escutar outras vozes, de outras eras. O sonho representa mais esse escutar de traços de antepassados do que o desejo de algum porvir diferente. Por outro lado, a segun- da epígrafe, a fala de Tuahir, liga o passado ao futuro, justamente pelo sonho, essa estrada que vem do passado, atravessa o presente e caminha para o futuro. Nessa única palavra, o tempo e suas possibilidades se encontram, numa via única, porém equívoca, ou seja, não com uma leitura única, ou unívoca, mas muitas encruzilhadas. Sugerimos como acesso à literatura de Mia Couto o romance Terra Sonâmbula, é im- portante ler o texto na íntegra. Só a leitura individual provocará as próprias questões. Indicamos ainda o já citado Estórias abensonhadas, o livro de contos do autor cuja apresentação é: Estas estórias foram escritas depois da guerra. Por incontáveis anos as armas tinham vertido luto no chão de Moçambique. Estes textos me surgiram entre as margens da mágoa e da esperança. Depois da guerra, pensava eu, restavam apenas cinzas, destroços sem íntimo. Tudo pesando, defi nitivo e sem reparo. 1 Disponível em: <https://goo.gl/xA97rd>. 11 UNIDADE Literatura Moçambicana Hoje sei que não é verdade. Onde restou o homem sobreviveu se- mente, sonho a engravidar o tempo. Esse sonho se ocultou no mais inacessível de nós, lá onde a violência não podia golpear, lá onde a barbárie não tinha acesso. Em todo este tempo, a terra guardou, in- teiras, as suas vozes. Quando se lhes impôs o silêncio elas mudaram de mundo. No escuro permaneceram lunares. Estas estórias falam desse território onde nos vamos refazendo e va- mos molhando de esperança o rosto da chuva, água abensonhada. Desse território onde todo homem é igual, assim: fingindo que está, sonhando que vai, inventando que volta. Disponível em: https://goo.gl/NjWTcS. Ou ainda pode ler O Fio das miçangas, também de contos poéticos do autor. Sugerimos como acesso à literatura de Mia Couto o romance Terra Sonâmbula, é importante ler o texto na íntegra. Só a leitura individual provocará as próprias questões. Palestra de Mia Couto OS SETE SAPATOS SUJOS Começo pela confissão de um sentimento conflituoso: é um prazer e uma honra ter recebido este convite e estar aqui convosco. Mas, ao mesmo tempo, não sei lidar com este nome pomposo: “oração de sapiência”. De propósito, escolhi um tema sobre o qual tenho apenas algumas, mal contidas, ignorâncias. Todos os dias somos confrontados com o apelo exaltante de combater a pobreza. E todos nós, de modo generoso e pa- triótico, queremos participar nessa batalha. Existem, no entanto, várias formas de pobreza. E há, entre todas, uma que escapa às estatísticas e aos indicadores numéricos: é a penúria da nossa reflexão sobre nós mesmos. Falo da dificuldade de nós pensarmos como sujeitos históricos, como lu- gar de partida e como destino de um sonho. [...] O primeiro sapato: a ideia que os culpados são sempre os outros e nóssomos sempre vítimas Nós já conhecemos este discurso. A culpa já foi da guerra, do colonia- lismo, do imperialismo, do apartheid, enfim, de tudo e de todos. Menos nossa. É verdade que os outros tiveram a sua dose de culpa no nosso sofrimento. Mas parte da responsabilidade sempre morou dentro de casa. [...] Segundo sapato: a ideia de que o sucesso não nasce do trabalho Ainda hoje despertei com a notícia que refere que um presidente africano vai mandar exorcizar o seu palácio de 300 quartos porque ele escuta ruí- 12 13 dos “estranhos” durante a noite. O palácio é tão desproporcionado para a riqueza do país que demorou 20 anos a ser terminado. As insônias do presidente poderão nascer não de maus espíritos, mas de uma certa má consciência. [...] Infelizmente olhamo-nos mais como consumidores do que produtores. A ideia de que África pode produzir arte, ciência e pensamento é estranha mesmo para muitos africanos. Ate aqui o continente produziu recursos naturais e força laboral. Produziu futebolistas, dançarinos, escultores. Tudo isso se aceita, tudo isso reside no domínio daquilo eu se entende como natureza”. Mas já poucos aceitarão que os africanos possam ser produtores de ideias, de ética e de modernidade. Não é preciso que os outros desacreditem. Nós próprios nos encarregamos dessa descrença. [...] Terceiro sapato- O preconceito de quem critica é um inimigo Muitas acreditam que, com o fim do monopartidarismo, terminaria a in- tolerância para com os que pensavam diferente. Mas a intolerância não é apenas fruto de regimes. É fruto de culturas, é o resultado da História. Herdamos da sociedade rural uma noção de lealdade que é demasiado paroquial. Esse desencorajar do espírito crítico é ainda mais grave quando se trata da juventude. O universo rural é fundado na autoridade da idade. Aquele que é jovem, aquele que não casou nem teve filhos, esse não tem direitos, não tem voz nem visibilidade. A mesma marginalização pesa so- bre a mulher. [...] Quarto sapato: a ideia que mudar as palavras muda a realidade Uma vez em Nova Iorque um compatriota nosso fazia uma exposição so- bre a situação da nossa economia e, a certo momento, falou de mercado negro. Foi o fim do mundo. Vozes indignadas de protesto se ergueram e o meu pobre amigo teve que interromper sem entender bem o que se estava a passar. No dia seguinte recebíamos uma espécie de pequeno dicionário dos termos politicamente incorrectos. Estavam banidos da língua termos como cego, surdo, gordo, magro, etc. Quinto sapato A vergonha de ser pobre e o culto das aparências A pressa em mostrar que não se é pobre é, em si mesma, um atestado de pobreza. A nossa pobreza não pode ser motivo de ocultação. Quem deve sentir vergonha não é o pobre mas quem cria pobreza. Vivemos hoje uma atabalhoada preocupação em exibirmos falsos sinais de riqueza. Criou-se a ideia que o estatuto do cidadão nasce dos sinais que o diferenciam dos mais pobres. [...] 13 UNIDADE Literatura Moçambicana Sexto Sapato A passividade perante a injustiça Estarmos dispostos a denunciar injustiças quando são cometidas contra a nossa pessoa, o nosso grupo, a nossa etnia, a nossa religião. Estamos menos dispostos quando a injustiça é praticada contra os outros. Persis- tem em Moçambique zonas silenciosas de injustiça, áreas onde o crime permanece invisível. Refiro-me em particular à: [...] Sétimo sapato – A ideia de que para sermos modernos temos que imitar os outros Todos os dias recebemos estranhas visitas em nossa casa. Entram por uma caixa mágica chamada televisão. Criam uma relação de virtual fa- miliaridade. Aos poucos passamos a ser nós quem acredita estar vivendo fora, dançando nos braços de JanetJackson. O que os vídeos e toda a sub-indústria televisiva nos vem dizer não é apenas “comprem”. Há todo um outro convite que é este: “sejam como nós”. Este apelo à imitação cai como ouro sobre azul: a vergonha em sermos quem somos é um trampo- lim para vestirmos esta outra máscara. [...]. (COUTO, 2005). É possível ainda escutar essa fala e ver o autor em: https://youtu.be/0RfbeUVUlr4 Ex pl or Entrevista com Mia Couto Há muitas entrevistas e programas com o escritor Mia Couto, o primeiro é um Programa da TV Cultura, em 2012, em que ele conversa sobre as línguas que há em Moçambique, a questão de ser filho de imigrantes portugueses, e branco, num país de maioria negra e sobre a guerra civil, posterior à guerra de libertação, e a “obrigação de ser um escritor moçambicano”, visto com estereótipos vindos do mundo europeu: questões fundadoras para as literaturas africanas. Importante assistir com atenção porque ele conversa sobre questões fundamentais da Língua Portuguesa e da literatura moçambicana, assim como aspectos históricos e experi- ências da vida dele como gente e como escritor. Assista ao programa Roda Viva com o escritor, gravação de 2012: https://youtu.be/6v3buePuzbU Ex pl or Para saber mais, escute o Encontro de Maria Bethânia com Mia Couto, orga- nizado pela editora do autor no Brasil, a Companhia das Letras, quando o autor lançou aqui o livro Sombras da água. Nesse encontro, ele afirma que temos vários passados e não temos uma única versão, a dos vencedores, precisando dar voz a essas vozes mais silenciadas. Um resumo do encontro: 14 15 No dia 26 de setembro, o Rio de Janeiro recebeu um grande encontro: Maria Bethânia e Mia Couto encantaram o público com a leitura de tre- chos de Sombras da água, novo livro do autor moçambicano. O encontro fez parte da comemoração dos 30 anos da Companhia das Letras. Som- bras da água dá continuidade à história iniciada em Mulheres de cinzas, romance histórico encenado à época em que o sul de Moçambique era dominado por Ngungunyane, o último grande líder do Estado de Gaza, no fim do século XIX. Alternando as vozes da africana Imani e do sargento português Germano de Melo, Mia Couto apresenta duas visões de mundo muito diferentes, porém profundamente interligadas nesta trama. Encontro de Maria Bethânia com Mia Couto: https://youtu.be/4ryBAE7aJok Saiba mais: https://goo.gl/1CwXSSE xp lo r Outros vídeos importantes: • Mia Couto – Repensar o pensamento Mia Couto, romancista moçambicano, defende em sua conferência um pensa- mento que crie pontes e não fortalezas. Vivemos em um tempo de acesso a tudo, mas confundimos ideias novas e informação recente: “Cada vez mais repetimos o que já fomos.” Conferencista do Fronteiras do Pensamento 2012. Sobre a alterida- de, o autor afirma que, para quem viaja para se perder de si mesmo e reencontrar- -se nos outros, o Brasil é o melhor destino que ele conhece. Mia Couto - Repensar o pensamento, disponível em: https://youtu.be/ahb9bEoNZaU Ex pl or • Palestra no programa Café filosófico, em 2017 Mia é biólogo, jornalista e autor de mais de trinta obras, entre elas Terra Sonâm- bula, um dos dez melhores livros africanos do século XX. O escritor moçambicano é vencedor de diversos prêmios literários, como o Camões, de 2013, e o Neusradt Pri- ze, de 2014. O programa Café Filosófico Especial foi gravado no dia 26/06/2017, no Teatro Iguatemi Shopping (Campinas), com mediação da jornalista Fernanda Mena. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=3BbruWdNhf8>. Fronteiras do Pensamento, com Mia Couto, disponível em: https://youtu.be/3BbruWdNhf8 Ex pl or • Mia Couto lê Levantado do Chão, de José Saramago. Texto trada sobre a guerra, a ajuda de Saramago. Mia Couto lê “Levantado do Chão”, disponível em: https://youtu.be/JPjvtOPF1rU Ex pl or 15 UNIDADE Literatura Moçambicana Material Complementar Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade: Sites Carta Capital O premiado autor moçambicano Ungulani Ba Ka Khosa fala sobre a importância das artes, especialmente a literatura, na identidade cultural do seu país, de inde- pendência recente https://goo.gl/42e6WH Kapulana O regresso do morto – contos https://goo.gl/v92cjH Ba Ka Khosa apresenta Orgia dos Loucos no Brasil https://goo.gl/E6CXApLivros Ungulani Ba Ka Khosa O premiado autor moçambicano fala sobre a importância das artes, especialmente a literatura, na identidade cultural do seu país, de independência recente. Vídeos Entrelinhas - Ungulani Ba Ka Khosa O programa Entrelinhas entrevista um dos mais importantes escritores surgidos em Moçambique após a independência do país. Ungulani Ba Ka Khosa esteve em São Paulo para participar de um encontro na Casa das Áfricas, onde conversou com Allan da Rosa. https://youtu.be/X9K6H5qRXzo Grande Prémio Sonangol de Literatura 2015 Grande Prémio Sonangol de Literatura 2015: escritor Suleiman Cassamo homenage- ado em Maputo. https://youtu.be/LZ3IB_baKLk Leitura Ungulani Ba Ka Khosa: a África que o Brasil não conhece https://goo.gl/V8XRgx Suleiman Cassamo: a viva voz do conto Outro escritor moçambicano relevante que pode ser conhecido por meio do prefácio de sua edição brasileira escrito por Rita Chaves: https://goo.gl/a5EFBv 16 17 A vida ancestral em conflito com os processos históricos de Moçambique: uma possível leitura do conto “O Regresso do Morto”, de Suleiman Cassamo https://goo.gl/vQFRqc Ungulani ba ka Khosa: a literatura tem que transportar os valores das culturas e das línguas locais. https://goo.gl/vswgZ4 Escrita e performance na literatura moçambicana. https://goo.gl/MVn2t2 17 UNIDADE Literatura Moçambicana Referências CAFÉ FILOSÓFICO ESPECIAL. Fronteiras do pensamento, com Mia Cou- to. (1h32m42s). 2016. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?- v=3BbruWdNhf8>. Acesso: 4 jul. 2018. CATRACA LIVRE. Mia Couto lê “Levantado do Chão” de José Saramago (sobre a guerra, a ajuda de Saramago). (11m39s). 2013. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=JPjvtOPF1rU>. Acesso: 4 jul. 2018. COMPANHIA DAS LETRAS. Encontro de Maria Bethânia com Mia Couto. (1h13m44s). 2016. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?- v=4ryBAE7aJok>. Acesso: 4 jul. 2018. COUTO, Mia. Terra sonâmbula. São Paulo: Companhia das letras, 2017. (edição de bolso). ______. O Fio das miçangas. São Paulo: Companhia das Letras, 2016a. ______. As Areias do Imperador – 1: Mulheres de Cinza. São Paulo: Companhia das Letras, 2016b. ______. Estórias abensonhadas. São Paulo: Companhia das Letras, 2012. ______. Os sete sapatos sujos. Oração de Sapiência na abertura do ano lectivo no ISCTEM. Vertical, n. 781, 782 e 783. Mar. 2005. Disponível em: <http:// www.pordentrodaafrica.com/cultura/mia-couto-a-porta-da-modernidade-ha-sete- sapatos-sujos-que-necessitamos-descalcar>. (último acesso em 3/07/2018) ______. Mar me quer. Lisboa: Caminho, 2001. FRONTEIRAS DO PENSAMENTO. Mia Couto – Repensar o pensamen- to. (18M45S). 2013. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?- v=ahb9bEoNZaU>. Acesso: 4 jul. 2018. RODA VIDA. Memória Roda Viva. Mia Couto – a literatura e a cultura africanas são objetos desta entrevista com o escritor moçambicano, um dos destaques da Festa Literária Internacional de Paraty (Flip) de 2007. 2007. Disponível em: < http://www.rodaviva.fapesp.br/materia_busca/531/leitura/entrevistados/mia_ couto_2007.htm>. Acesso: 4 jul. 2018. RODA VIDA. Programa Roda Viva com o escritor Mia Couto. (1h23m10s). 2012. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=6v3buePuzbU>. Acesso: 4 jul. 2018. STEINBERG, Vivian. Literatura estrangeira em língua portuguesa. Curitiba: Intersaberes, 2015. 18
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