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50 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 Unidade II Unidade II Embora o entendimento das propriedades biomecânicas dos tecidos biológicos seja de fundamental importância para a compreensão do movimento humano, tal conhecimento não é suficiente. Complementarmente, faz-se necessário conhecer como a Biomecânica contribui para o entendimento do movimento humano realizado pelo aparelho locomotor como um todo. Esse será o foco de discussão deste tópico. Isso significa que é também necessário compreender, sob a ótica da Biomecânica, como a estrutura anatômica interfere na capacidade do aparelho locomotor de realizar movimento. Adicionalmente, significa buscar entender e descrever os fatores biomecânicos que contribuem para o movimento, bem como para a ocorrência de lesões, em determinadas estruturas. De forma a facilitar o estudo, o aparelho locomotor foi didaticamente dividido em: extremidade superior, extremidade inferior e coluna vertebral. A seguir, com base nos aspectos anatômicos, discutiremos os aspectos biomecânicos de cada uma dessas partes que compõem o aparelho locomotor. Em seguida, a estrutura muscular e os fatores que interferem na produção de força do movimento serão discutidos. 5 FISIOLOGIA ARTICULAR: BIOMECÂNICA DAS ARTICULAÇÕES SINOVIAIS 5.1 Extremidade superior A extremidade superior apresenta ampla variedade e interessantes possibilidades de realização de tarefas motoras, com incríveis capacidades de realização de movimento. A caráter de exemplo, arremessadores de beisebol são capazes de lançar uma bola a 40 m/s, enquanto ginastas conseguem executar o complexo “crucifixo” nas argolas. Quais são as características anatômicas e biomecânicas da extremidade superior que a permite ser dotada de tais capacidades e obter tamanha capacidade de movimentos? Primeiramente, devemos lembrar que a extremidade superior é composta de algumas articulações/estruturas importantes, como: ombro, cotovelo, punho e mão/dedos. Cada uma dessas estruturas apresenta diferentes características biomecânicas que interferem em suas capacidades de realizarem movimento. Embora o movimento da extremidade superior seja resultado da atuação dessas estruturas em conjunto, cada articulação merece ser analisada separadamente. 51 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 BIOMECÂNICA 5.1.1 Articulação do ombro O ombro é o conjunto de articulações responsável por conectar a extremidade superior ao tronco, sendo formado pelas articulações glenoumeral, acromioclavicular, esternoclavicular e escapulotorácica (veja a figura a seguir), além dos músculos que agem sobre ele, garantindo dinamismo e mobilidade. Esternoclavicular Escapulotorácica Acromioclavicular Glenoumeral Figura 16 – Demonstração ilustrativa das articulações que compõem o ombro A articulação esternoclavicular ocorre entre a clavícula proximal e o manúbrio do esterno, sendo uma articulação sinovial deslizante, reforçada por ligamentos e músculos, e que permite movimentos da clavícula, principalmente. Os movimentos da clavícula nessa articulação podem ocorrer em três planos: nos sentidos superior e inferior, em movimentos conhecidos como elevação e depressão, com amplitude de movimento de cerca de 30º a 40º; nos sentidos anterior e posterior, realizando, respectivamente, protração e retração, também com amplitude de movimento de, aproximadamente, 30º; e rotação anterior e posterior ao longo de seu eixo longitudinal, por cerca de 40º a 50º. A ligação entre o processo acromial da escápula e a porção distal da clavícula forma a articulação acromioclavicular. Essa articulação é responsável pela maioria dos movimentos da escápula com relação à clavícula. Por localizar-se acima da cabeça do úmero, funciona como uma das principais restrições aos movimentos realizados acima da cabeça. É também reforçada por uma cápsula densa e por ligamentos importantes, como o coracoclavicular, que funciona como um eixo de rotação, viabilizando movimentos da escápula. A escápula é capaz de realizar movimentos em três direções nessa articulação: no sentido anteroposterior em relação ao eixo vertical, com movimentos conhecidos como protração (ou abdução) e retração (ou adução), com amplitude de movimento variando entre 30º e 50º; no sentido médio-lateral no plano frontal, realizando rotação para cima e para baixo, com amplitude de movimento próxima a 60º; e no sentido para cima/para baixo, com movimentos de elevação e depressão ao longo de uma amplitude de movimento de 30º, conforme a figura a seguir. Cumpre destacar que os movimentos da escápula são dependentes da posição e movimento da clavícula, ocorrendo em direções opostas. Isso 52 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 Unidade II significa, por exemplo, que quando ocorre elevação na articulação acromioclavicular, uma depressão na articulação esternoclavicular é observada, e assim por diante. a b c Elevação Depressão Abdução Rotação para cima Rotação para baixo Adução Figura 17 – Movimentos escapulares em suas três direções possíveis: elevação e depressão (a), adução e abdução (b) e rotação para cima e para baixo (c) Uma terceira articulação que compõe o ombro é a escapulotorácica, formada pela interface entre a escápula anterior e a parede torácica. Devido à sua conformação, a articulação escapulotorácica não é considerada uma articulação comum, que conecta osso com osso, mas sim uma articulação fisiológica, já que, na verdade, a escápula repousa sobre dois músculos (serrátil anterior e subescapular), que, por sua vez, estão situados no tórax. Como o movimento da escápula ao longo do tórax resulta das ações que ocorrem nas articulações acromioclavicular e esternoclavicular, isso lhe permite uma amplitude total de movimento de 60º a 180º, sendo que 65% dessa amplitude é decorrente de movimento na articulação esternoclavicular, enquanto 35% é resultado de ações na articulação acromioclavicular. Para completar a composição do complexo do ombro, temos a articulação glenoumeral. Essa é a principal articulação do complexo do ombro, na medida em que oferece amplitude de movimento e potencial de mobilidade dentre todas as articulações do corpo. Tal capacidade se dá devido à sua conformação: trata-se de uma articulação sinovial em formato de esfera, composta de cavidade glenoidal (local de encaixe da cabeça do úmero), lábio glenoidal (borda de fibrocartilagem), cápsula articular, bolsas (ou “bursas”, que são bolsas repletas de líquido localizadas em pontos estratégicos da articulação a fim de reduzir o atrito existente entre as estruturas) e reforço ligamentar, tendíneo e muscular. É exatamente essa composição de quatro articulações, e seus componentes associados agindo em conjunto, que confere ao ombro mobilidade maior que a permitida por qualquer uma dessas 53 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 BIOMECÂNICA articulações menores individualmente. Além disso, tal composição estrutural permite ao ombro amplitude total de movimento bastante considerável, sendo a articulação com a maior mobilidade dentre todas as articulações do corpo, e uma das poucas articulações do aparelho locomotor capazes de realizar movimento em três planos anatômicos diferentes (ou seja, possui três graus de liberdade de movimento). Veja: Flexão 180º Flexão horizontal 135º Extensão horizontal 45º Rotação externa 90º Rotação interna 90º Hiperextensão 60º Hiperadução 75º Abdução 180º Vistade cima 135º 45º Figura 18 – Movimentos realizados pelo ombro e suas respectivas amplitudes No plano sagital, o ombro é capaz de executar movimento de, aproximadamente, 180º de flexão a 60º de hiperextensão, sendo o movimento nesse plano limitado pela presença de rotação externa. Em caso de rotação externa, a amplitude de movimento do ombro no plano sagital diminui significativamente. A abdução e adução são os movimentos feitos pelo ombro no plano frontal. A amplitude da abdução é também de, aproximadamente, 180º. No entanto, essa ação articular é limitada pela presença de rotação interna, podendo diminuir sua amplitude máxima para 60º. A adução é realizada até a posição neutra (ou anatômica), podendo continuar como hiperadução por cerca de 75º. Conforme já apontado, o ombro é capaz de efetuar rotação interna e externa, com uma amplitude de movimento total de 180º (sendo 90º o limite para cada tipo de rotação) no plano transversal. Ainda nesse plano, o ombro também possui a capacidade de realizar os movimentos de adução (ou flexão) e abdução (ou extensão) horizontal, com amplitude de 135º e 45º, respectivamente. Lembrete Os movimentos de flexão e extensão articular são visualizados no plano sagital do movimento. Os movimentos de adução e abdução das articulações são visualizados no plano frontal do movimento. Os movimentos de rotação das articulações são visualizados no plano transversal do movimento. A ampla mobilidade do ombro é extremamente importante por viabilizar a participação em diversas atividades motoras e modalidades esportivas, como natação, ginástica, esportes envolvendo 54 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 Unidade II arremesso, entre outras. Porém, em algumas situações o praticante é submetido a amplitudes extremas de movimento, o que, em longo prazo, com grande quantidade de carga e repetições, pode levar ao desgaste das estruturas e à frouxidão dos elementos da articulação. Tal condição pode se apresentar como uma adaptação negativa à prática e como risco de lesão ao praticante ou atleta. Para que o potencial de mobilidade do ombro possa ser utilizado, diversos músculos localizam-se e trabalham nessa região, sendo os principais músculos, e suas respectivas ações, apresentados no quadro a seguir. Quadro 6 – Principais músculos do complexo do ombro e suas respectivas ações Músculo Localização Ação Peitoral maior Anterior ao tronco/superficial Flexão, adução e adução horizontal de ombro Latíssimo do dorso Posterior ao tronco/superficial Extensão, adução e rotação medial de ombro Deltoide Lateral à cintura escapular/superficial Flexão, adução horizontal, abdução, abdução horizontal e extensão Co m pl ex o do m an gu ito ro ta do r Subescapular Anteroinferior à cintura escapular/profundo Rotação medial e estabilização anterior e inferior do ombro Supraespinhal Superior à cintura escapular/profundo Abdução e rotação lateral do ombro Infraespinhal Posterossuperior à escápula/profundo Abdução horizontal e rotação lateral do ombro Redondo menor Posterolateral à escápula/profundo Abdução horizontal e rotação lateral do ombro Bíceps braquial Anterior ao braço/superficial Ação no ombro: ajuda na flexão, adução, adução horizontal, rotação medial e abdução do ombro Tríceps braquial Posterior ao braço/superficial Ação no ombro: extensão do ombro Trapézio Posterior ao tronco/superficial Levanta, abaixa e aduz a escápula O deltoide se apresenta como um importante e bastante solicitado músculo da articulação do ombro. Com três porções independentes (anterior, posterior e lateral), o deltoide é um dos músculos mais ativos dessa articulação e participa de quase todos os movimentos realizados pelo complexo do ombro. Por exemplo, cerca de 50% da força muscular para a abdução ou flexão do ombro é gerada por esse músculo, com sua contribuição aumentando ainda mais à medida que a abdução aumenta. Embora o deltoide seja mais ativo numa amplitude de movimento de 90º a 180º, esse músculo apresenta maior resistência à fadiga em movimentos entre 45º e 90º de abdução. Durante os movimentos de adução ou extensão dos ombros, os principais responsáveis por essas ações são os músculos latíssimo do dorso, redondo maior e peitoral maior. Um complexo composto de quatro músculos merece destaque: é o manguito rotador. Formado pelos músculos subescapular, supraespinhal, infraespinhal e redondo menor, o manguito rotador contribui de forma importante para a rotação do úmero e, ao mesmo tempo, forma uma cobertura colagenosa ao redor da articulação glenoumeral, circundando o ombro por quase todos os lados. Contudo, sua principal contribuição se dá através da tração exercida pelos seus músculos sobre a cabeça 55 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 BIOMECÂNICA do úmero na direção da cavidade glenoide, contribuindo de maneira fundamental para a estabilidade dessa articulação. Embora seja um elemento protetor de relevante importância, o manguito rotador tem sua capacidade de produzir força reduzida em angulações acima de 90º de flexão ou abdução, situação que pode ainda ser piorada com a realização simultânea de rotação externa. Nessas condições, o manguito não é capaz de cumprir adequadamente sua função de promover a estabilidade articular e proteger o ombro, tornando a articulação mais vulnerável e suscetível a lesões. Os movimentos de rotação de ombro são de suma importância, já que muitos esportes se utilizam dessas ações, como o beisebol e o handebol. A rotação externa, especialmente com o braço acima de 90º, é executada pelos músculos infraespinhal e redondo menor, com a atividade desses músculos aumentando à medida que a amplitude da rotação externa aumenta. A rotação interna é gerada pelos músculos subescapular, latíssimo do dorso e redondo maior e por porções do peitoral maior. O peitoral maior e a porção anterior do deltoide são as musculaturas que mais contribuem para a realização da adução horizontal. Já a abdução horizontal é gerada principalmente pelos músculos infraespinhal e redondo menor e por porção posterior do deltoide. Cada ação articular efetuada pelo complexo do ombro é caracterizada por determinada capacidade de produzir força. A maior capacidade de produzir força pelo ombro se dá em adução devido à quantidade e às características dos músculos envolvidos nessa ação. Em caráter de exemplo, a força de adução dos músculos do ombro é equivalente ao dobro da força gerada pela abdução. A segunda ação articular capaz de produzir maior força pelo ombro é a extensão, possivelmente por utilizar grupamentos musculares semelhantes ao da adução. Em seguida, temos a flexão e a abdução como ações do ombro capazes de produzir grande força. Se observarmos atentamente essas características de força dessa articulação, podemos perceber que o ombro tem maior capacidade de produzir força em movimentos ou fase de movimentos que envolvam abaixar o braço (adução e extensão) que na elevação do braço (abdução e flexão). Cabe ainda ressaltar que as rotações são as ações nas quais o ombro tem menor capacidade de produzir força, especialmente rotação externa. As articulações que compõem o complexo do ombro, como já apontado anteriormente, estão interligadas e atuam de maneira conjunta, funcionando como uma unidade única de sustentação das cargas e de absorção de choque mecânico no ombro. Contudo, a articulação glenoumeral é a principal desse complexo articular por fornecer apoio mecânico direto ao braço. Logo, ela é responsável por sustentar cargas muito maiores do que as outras articulações que compõem o ombro. As características anatômicas, funcionais e biomecânicasdo complexo do ombro acabam por gerar forças elevadas na própria articulação. Para se ter dimensão da capacidade dessa articulação, o manguito rotador, composto apenas de pequena parte dos músculos do ombro, é capaz de gerar uma força de 9,6 vezes o peso do próprio membro, produzindo forças máximas à 60º de abdução e gerando carga sobre a articulação de, aproximadamente, 70% do peso corporal. O deltoide produz força de cerca de 8 a 9 vezes o peso do membro em abdução de 90º, o que resulta, em média, em uma sobrecarga na articulação do ombro equivalente a 40 ou 50%, podendo atingir o valor de 90%, do peso corporal. Tal variação se dá devido ao fato de que o torque gerado no ombro será sempre o produto do peso do segmento pelo braço de alavanca (ou braço de momento) do membro na posição articular adotada. 56 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 Unidade II Figura 19 – Torque gerado no ombro em diferentes posições do membro superior O conhecimento acerca da anatomia, funcionalidade e características biomecânicas do ombro é de suma importância porque nos permite analisar e entender o movimento ou atividade de interesse; compreender os aspectos funcionais do movimento; identificar aspectos relevantes para o treinamento e fortalecimento da articulação, como os músculos mais solicitados em diferentes movimentos e a forma como trabalham; e, consequentemente, entender os riscos e mecanismos de lesão dessa articulação. Como exemplo para aplicação desse conhecimento, trouxemos duas situações esportivas bastante conhecidas e nas quais o ombro apresenta grande participação e relevância: o nado crawl e o arremesso por cima da cabeça. A natação é um dos esportes com maior solicitação da articulação do ombro, já que a propulsão do corpo no meio líquido é bastante dependente da torção gerada por essa articulação. Focando-se mais especificamente no nado crawl, podemos dividir esse estilo de nado em duas fases básicas: propulsão e recuperação. É observável que na primeira fase forças propulsivas são geradas pelo ombro a partir do movimento do braço na água a partir de movimentos de rotação interna e adução. Estudos mostram que tais movimentos e, consequentemente, a geração de força para a propulsão são resultados do esforço dos músculos latíssimo do dorso, redondo maior e peitoral maior, predominantemente. Por outro lado, a fase de recuperação é caracterizada pela saída do braço para fora da água por intermédio de rotação externa e abdução. Para essa fase do movimento, supraespinhal, infraespinhal, deltoide médio e serrátil anterior são os músculos solicitados e que permitem as ações articulares necessárias. O arremesso realizado acima da cabeça é outro movimento com grande envolvimento do ombro. Ele implica grande tensão nessa articulação e é característico de muitas modalidades esportivas, como beisebol, atletismo, futebol americano e handebol. Esse tipo de arremesso 57 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 BIOMECÂNICA geralmente pode ser dividido em três fases: preparação, aceleração e desaceleração. Analisando- se biomecanicamente o movimento, é possível observar que a fase de preparação é mediada por uma abdução do braço em 90º, rotação externa e adução da escápula, o que exige a solicitação de grande parte dos músculos do ombro, como deltoide, supraespinhal, infraespinhal, redondo menor, subescapular, trapézio e romboide. O fim da fase de preparação é acentuado pela rotação externa máxima do ombro e aumento da contribuição dos músculos latíssimo do dorso e peitoral maior. Essa contribuição ocorre inicialmente de forma excêntrica, a fim de limitar a rotação externa, e posteriormente ocorre de forma concêntrica para iniciar a segunda etapa do movimento, a fase de aceleração. Com exceção do deltoide, o restante dos músculos aumenta sua intensidade de ativação nesse momento, o que se reflete também em um aumento do trabalho dos ligamentos e cápsula articular. A fase de aceleração destaca-se pela realização combinada de rotação interna com manutenção da abdução a 90º, abdução da escápula e flexão horizontal, sendo realizados usualmente de forma explosiva. Os músculos mais ativos nesta fase do movimento são o latíssimo do dorso, subescapular, redondo maior e peitoral maior. Não é por coincidência que esses mesmos músculos iniciam sua ativação, ainda que de forma excêntrica, já na fase final da preparação. A desaceleração, última fase do movimento do arremesso, é marcada por solicitação muscular semelhante à fase de preparação, porém viabilizada por ações excêntricas, a fim de reduzir e controlar a velocidade do segmento no fim do movimento. Dadas as características anatômicas, biomecânicas e funcionais da articulação do ombro já discutidas previamente, é possível perceber que determinadas situações e ações podem aumentar a vulnerabilidade da articulação durante a execução do movimento, aumentando também o risco de lesões. O ombro é suscetível a grande variedade de lesões, cuja natureza pode ser traumática ou por excesso de uso (overuse), sendo responsável por cerca de 8-13% das lesões relacionadas ao esporte. As lesões traumáticas ocorrem por meio de contato com o ambiente externo, geralmente com algum objeto ou outro indivíduo. Já as lesões por overuse estão relacionadas ao excesso de carga ou, principalmente, ao excesso de ações articulares repetidas pelo ombro, gerando inflamações em estruturas biológicas que a compõem, como ligamentos, tendões e músculos. Dentre as lesões mais comuns no ombro, destacamos as luxações (ou subluxações), as lesões no manguito rotador e rotacionais, a bursite e a tendinite. As luxações ou subluxações são deslocamentos de dois ou mais ossos que compõem a articulação em relação às suas respectivas posições originais. A articulação glenoumeral do ombro é a região com maior incidência de luxações. Isso porque, além de apresentar características anatômicas e biomecânicas que predispõem essa articulação a luxações, a articulação glenoumeral apresenta frouxidão natural de suas estruturas para garantir grande mobilidade e amplitude de movimento, e embora existam diversos ligamentos com esse fim, a estabilidade nessa articulação é reduzida em comparação às outras articulações. As luxações ocorrem comumente quando há abdução somada à rotação externa do úmero, sendo as luxações anteroinferiores e oriundas de traumas as mais comuns (95% dos casos). O manguito rotador é outra região do ombro comumente acometida por lesões. A principal delas é a síndrome de impacto do manguito rotador (ou síndrome de impacto do ombro), que tem origem 58 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 Unidade II em movimentos vigorosos realizados acima da cabeça envolvendo, geralmente, abdução ou flexão de ombro em conjunto com rotação interna. Dentre as atividades que apresentam essa característica e podem tornar o ombro suscetível a essa lesão, podemos destacar os arremessos, especialmente aqueles que envolvem implementos com carga, como o atletismo, o saque no tênis, o saque e o ataque no voleibol e a natação. A síndrome de impacto do manguito rotador é causada pela compressão progressiva exercida sobre os tendões dos músculos que compõem o manguito rotador por estruturas ósseas e outras estruturas biológicas moles que compõem o complexo do ombro, resultando em inflamação dos tendões (tendinites) do manguito e das bursas (bursites) ou, até mesmo, no rompimento desses tendões. Além da dor, os principais sintomas atribuídos a essa síndrome são hipermobilidade da cápsula anterior, hipomobilidade da cápsula posterior, rotação externaexcessiva associada à rotação interna limitada e frouxidão ligamentar generalizada. Possivelmente por apresentar aporte sanguíneo mais predisposto à compressão, o músculo supraespinhal é geralmente o mais afetado. Sendo assim, apesar de apresentar a maior mobilidade do aparelho locomotor, essa característica causa ao ombro considerável instabilidade e suscetibilidade a lesões. Logo, o fortalecimento dos músculos, ligamentos e estruturas que formam o complexo do ombro é de suma importância para a sustentação, estabilização e proteção dessa articulação. 5.1.2 Articulação do cotovelo O complexo do cotovelo é uma articulação consideravelmente estável, bem estruturada e com boa sustentação ligamentar e muscular. Tem como principal função viabilizar o movimento do antebraço, por intermédio de sua ligação ao braço, e é vital para auxiliar o ombro na aplicação de força e no controle do posicionamento da mão no espaço. Para cumprir seu papel, o cotovelo é formado por três articulações: a umeroulnar, a umerorradial e a radioulnar (veja a figura a seguir). As duas primeiras são responsáveis pelo movimento entre o antebraço e braço, enquanto a última tem como função os movimentos entre o rádio e a ulna. Articulação umerorradial Articulação umeroulnar Articulação radiulnar superior Figura 20 – Demonstração ilustrativa das articulações que compõem o complexo do cotovelo Em formato de dobradiça, a articulação umeroulnar situa-se entre o úmero e a ulna, sendo a principal deste complexo, na medida em que é responsável pela flexão e extensão do antebraço (principais movimentos da articulação). Forma-se a partir do encaixe recíproco da tróclea umeral na fossa troclear da ulna. O contato entre o processo coronoide da ulna com a fossa coronoidea do úmero, 59 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 BIOMECÂNICA na região anterior da articulação, impõe limite à amplitude de movimento de flexão. Por outro lado, na face posterior, o contato do olécrano da ulna com a fossa do olécrano do úmero dita os limites de extensão dessa articulação. A articulação umerorradial trata-se de uma articulação deslizante formada a partir do contato do capítulo (epicôndilo umeral) com a extremidade superior proximal do rádio, contribuindo também para a flexão e extensão do antebraço. A terceira articulação deste complexo articular é a articulação radioulnar, formada entre a ulna e o rádio por intermédio de sindesmoses, e que permite o movimento do rádio ao redor da ulna, ocorrendo pronação ou supinação. Diferentemente do ombro, o complexo do cotovelo possui mobilidade e amplitude de movimento mais limitada. Com apenas dois graus de liberdade, os movimentos do cotovelo restringem-se à flexão e extensão, no plano sagital, e pronação e supinação, no plano transversal. A amplitude de movimento para flexão e extensão do cotovelo é de cerca de 170º. O ângulo de máximo de flexão ativa é de 145º, ao passo que para a flexão passiva esse valor chega a 160º. Diversos fatores anatômicos determinam os limites da flexão, como a cápsula articular, os músculos extensores e o contato osso a osso na região do processo e fossa coronoide. Fatores relacionados à composição corporal, como hipertrofia muscular e concentração de tecido adiposo na região também podem contribuir para limitar a amplitude de movimento de flexão de cotovelo. Devido às suas características anatômicas, o ângulo máximo de hiperextensão fica restrito a 5-10º, sendo limitado pela cápsula articular, pelos músculos flexores e pelo contato dos ossos na região do olécreano. A maioria dos movimentos cotidianos e esportivos exige amplitude de movimento de flexão e extensão que varia entre 100º e 140º. Os movimentos de pronação e supinação apresentam amplitude de movimento de, aproximadamente, 70º e 85º, respectivamente. Ambos os movimentos são limitados pela cápsula articular, pelos ligamentos localizados nessa região e pela musculatura antagonista de cada movimento. Apesar dessa limitação, a tal amplitude atende adequadamente às exigências da maioria das atividades cotidianas e esportivas, que está em cerca de 50º de pronação e supinação. Para que os movimentos realizados na articulação do cotovelo sejam possíveis, diversos músculos cruzam essa articulação. Os músculos principais e de maior contribuição para as ações no cotovelo são apresentados no quadro a seguir. Quadro 7 – Principais músculos do complexo do cotovelo e suas respectivas ações Músculo Localização Ação Bíceps braquial Anterior ao braço/superficial Ação no cotovelo: flexão e supinação de cotovelo Braquial Anterior ao braço/profundo Flexão do cotovelo Braquiorradial Lateral ao braço/superficial Flexão do cotovelo Tríceps braquial Posterior ao braço/superficial Ação no cotovelo: extensão do cotovelo 60 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 Unidade II Os músculos bíceps braquial, braquial e braquioradial, flexores do cotovelo, tornam-se mais efetivos no movimento à medida que a flexão do cotovelo aumenta. A razão desse comportamento é a alteração braço de alavanca ao longo da realização da flexão, aumentando a vantagem mecânica e facilitando o movimento. Por ser único músculo uniarticular e puramente flexor de cotovelo, o músculo braquial é o músculo mais forte dessa articulação, realizando sempre mais esforço que os demais músculos e sem ter seu desempenho influenciado pela pronação e supinação do antebraço. O músculo braquial revela-se ativo em todas as posições e velocidades de flexão do cotovelo, independentemente da presença de carga, atingindo sua máxima capacidade de produção de força a 120º de flexão. A contribuição do músculo bíceps braquial à flexão de cotovelo sofre influência da posição do antebraço em relação à pronação e supinação, já que este músculo é biarticular. A posição de supinação do antebraço é a que mais favorece a ação do bíceps braquial como flexor do cotovelo. Isso porque, em posição pronada, o tendão desse músculo sofre uma torção, prejudicando a capacidade de produzir força, conforme visto na figura a seguir. O bíceps braquial apresenta-se mais efetivo e com maior contribuição na flexão de cotovelo na amplitude de movimento entre 30º e 120º. Figura 21 – Efeito da posição supinada e pronada do antebraço sobre o músculo bíceps braquial na flexão do cotovelo, favorecendo ou dificultando sua ação, respectivamente Um terceiro flexor importante de cotovelos é o músculo braquiorradial. Apesar de exibir um pequeno volume muscular, o braquiorradial é um músculo bastante eficiente, especialmente para movimentos rápidos de flexão de cotovelo. Assim como o bíceps braquial, o músculo braquiorradial tem seu trabalho favorecido pela posição supinada do antebraço, apresentando maior atividade a 120º de flexão. 61 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 BIOMECÂNICA Considerando agora o movimento de extensão de cotovelo, o principal músculo envolvido nessa ação é o tríceps braquial. É um músculo bastante volumoso, o que lhe garante grande potência, e também biarticular, o que faz com que sua contribuição ao movimento de extensão sofra influência do posicionamento do ombro. Das três cabeças expostas pelo tríceps braquial, a principal é a cabeça medial, pois está ativa em todos os momentos do movimento de extensão, independentemente da posição, velocidade e resistência imposta. A musculatura flexora do cotovelo possui grande capacidade de produzir força. Em comparação aos extensores, os músculos flexores exibem força igual ao dobro da força apresentada pelos seus antagonistas, o que os torna vocacionadosà tração ao invés de impulsão. A caráter de exemplo, as forças compressivas geradas sobre a articulação do cotovelo em flexão isométrica máxima na posição estendida equivalem a, aproximadamente, duas vezes o peso corporal. Em uma hierarquia de cargas, a posição semipronada é aquela que permite a máxima produção de força em flexão pela musculatura do cotovelo, seguida pela posição supinada e, por fim, pela posição pronada. Os extensores de cotovelo demonstram maior capacidade de produzir força a partir de uma posição de 90º de flexão, o que é importante, pois coincide com a posição mais comum observada em movimentos esportivos e do cotidiano que exigem esse esforço. Por destacar-se como uma posição neutra, a posição semipronada é a de maior produção de força em pronação e supinação, com o torque diminuindo consideravelmente na amplitude máxima desses movimentos. Ainda que não seja uma das principais articulações voltadas para a sustentação do peso corporal, o cotovelo é frequentemente exigido para sustentar grandes e diferentes demandas de carga durante movimentos do cotidiano e esportivos. Em exercícios de flexão e extensão de cotovelos, o torque gerado nessa articulação pode atingir valores equivalentes a 45% do peso corporal. O cotovelo é uma articulação envolvida em diversas tarefas motoras, desde movimentos do cotidiano, como apoiar-se para levantar de uma cadeira ou carregar uma sacola de compras, a gestos esportivos, como o arremesso, a rebatida no tênis ou o levantamento de peso olímpico. Para facilitar a compreensão, ilustraremos a contribuição da Biomecânica na análise do movimento tratando de uma tarefa já abordada previamente, que é o arremesso. Embora o ombro seja uma articulação muito solicitada nesse gesto, como vimos anteriormente, o movimento do arremesso também é determinado pela ação do complexo do cotovelo. Nesse movimento, a musculatura flexora e extensora do antebraço apresenta-se ativa ao longo de todo o movimento. Na fase de preparação, enquanto o ombro realiza rotação externa e abdução, há flexão do cotovelo por intermédio da ativação dos músculos braquial e bíceps braquial. Quando o antebraço se encontra em sua máxima flexão, no fim da fase de preparação, há o início da ativação do tríceps braquial em um momento de co-contração dos flexores e extensores do cotovelo. Em seguida, na fase de aceleração do movimento, a ativação do tríceps braquial aumenta consideravelmente à medida que ocorre a rápida extensão do antebraço, enquanto a ativação dos músculos flexores do antebraço vai diminuindo em velocidade equivalente. A finalização do movimento com a fase de desaceleração é caracterizada por um rápido aumento dos músculos antagonistas (ou seja, dos flexores do antebraço), ao passo que a ativação do tríceps braquial 62 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 Unidade II diminui também rapidamente. Essas últimas ações ocorrem na tentativa de reduzir a velocidade dos segmentos e, consequentemente, as cargas tensivas na extensão do antebraço. Sendo assim, a ativação dos músculos bíceps braquial e braquial ocorrem de forma excêntrica nesta fase e são tão intensas quanto a velocidade do arremesso. Embora seja uma articulação bastante estável e bem estruturada, o complexo do cotovelo apresenta situações de vulnerabilidade e é submetido a grandes cargas durante a realização das atividades físicas e esportivas, o que o predispõe a certos tipos de lesões. De mesma forma que o ombro, as lesões no cotovelo podem ser traumáticas, originadas pela absorção de cargas muito intensas, ou de overuse, obtidas por esforço repetitivo e/ou excesso de uso. As entorses e luxações são as principais lesões traumáticas que acometem a articulação do cotovelo. Essas lesões ocorrem por causa de altas cargas impostas ao cotovelo por meio de quedas ou outros traumas de contato. Em geral, ocorrem em praticantes de esportes como ginástica, futebol americano e lutas. Dependendo da intensidade e gravidade do trauma, outros tipos de lesões traumáticas, como fraturas ósseas, ruptura de tendões e ligamentos e bursite do olécrano, também podem ser observadas. Contudo, o principal mecanismo de lesão do cotovelo parece ser o excesso de uso. As lesões por overuse geralmente estão associadas a movimentos velozes, executados acima da cabeça e com alta frequência de execução. As tarefas com essas características impõem altas cargas tensivas, compressivas e de cisalhamento nas estruturas que compõem o complexo do cotovelo, gerando situações de inflamação em diferentes estruturas e regiões da articulação, como a epicondilite (inflamação das fibras de colágeno e do local no qual músculos do cotovelo se inserem no epicôndilo) ou a tendinite (inflamação de tendões e músculos do complexo do cotovelo). Essas lesões são tão comuns a determinados esportes e gestos esportivos, que, muitas vezes, elas passam a fazer parte da nomenclatura da lesão, como “cotovelo de arremessador” ou “cotovelo de tenista”, geralmente atribuídas à epicondilite medial e lateral, respectivamente, muito comuns em esportes envolvendo arremesso e nos praticantes de tênis. 5.1.3 Articulação do punho e segmento mão A última região que compõe a extremidade superior é formada pela articulação do punho e dedos da mão. O uso das mãos está relacionado a tarefas finas e que dependem da ampla variedade das posturas dos dedos. Por sua vez, as posições adotadas pelas outras articulações que compõem o membro superior interferem nas atividades manuais. O punho é exatamente a articulação responsável por conectar a mão com o restante da extremidade superior. O punho e a mão são formados pelas seguintes articulações: radiocarpal, mediocarpal, intercarpal, carpometacarpal, metacarpofalângica e interfalângica (veja a figura a seguir). 63 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 BIOMECÂNICA Distaias Médias Fa la ng es Proximais Hamato Piramidal Pisiforme Capitato Escatoide Trapézio Trapezoide Articulação carpometacarpal Articulação metacarpofalângica Articulação interfalângica proximal Articulação interfalângica distal Semilunar Ulna Rádio INTERCARPAIS RADIOCARPAIS MEDIOCARPAIS Figura 22 – Demonstração ilustrativa das articulações que compõem o complexo do punho e dedos da mão A articulação radiocarpal é formada a partir da ligação entre o rádio e três ossos do carpo (o escafoide, o semilunar e o piramidal) e corresponde à principal articulação do punho. É responsável pelo movimento da mão como um todo e permite mobilidade em dois planos: sagital (flexão e extensão do punho) e frontal (flexão radioulnar). As articulações mediocarpais e intercarpais atuam de maneira conjunta e complementar ao complexo articular do punho. A articulação mediocarpal é responsável por conectar as duas fileiras de ossos do carpo, ao passo que a articulação intercarpal realiza a conexão entre pares de ossos do carpo. Ambas as articulações são deslizantes e viabilizam movimentos de translação no punho, sendo a fileira proximal a região de maior mobilidade. A exceção é o osso escafoide, que, apesar de localizar-se na fileira distal, apresenta grande mobilidade, participa de maneira fundamental em todas as ações do punho, auxilia na sustentação do peso do braço e transmite ao antebraço as forças recebidas pela mão. A articulação mediocarpal é responsável por 60% da amplitude total de flexão de punho, sendo 40% atribuída aos ossos do carpo, especialmente o escafoide. A maioria dos movimentos esportivos e do cotidiano exige amplitude de movimento de punho, que varia entre 10º e 15º; contudo, a amplitude máxima que o punho é capaz de realizar para essemovimento é de 70º a 90º. O principal fator que interfere na amplitude de movimento é a ação dos músculos antagonistas: a amplitude da flexão de punho é reduzida quando realizada com os dedos da mão flexionados. Para a extensão de punho, é possível observar um comportamento inverso: embora também iniciado por intermédio da articulação 64 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 Unidade II mediocarpal, essa articulação é responsável por apenas 30% da capacidade de extensão do punho, sendo mais de 60% do movimento de extensão responsabilidade da articulação radiocarpal. A amplitude de movimento para a extensão de punho é semelhante à flexão, variando entre 70º e 80º. Tal amplitude de movimento é mais do que suficiente para o aparelho locomotor, já que os movimentos esportivos e do cotidiano ocorrem em cerca de 35º de extensão do punho. O deslizamento da fileira proximal dos carpos sobre a fileira distal permite os movimentos de flexão ulnar e radial, conforme a figura a seguir. A flexão ulnar ocorre quando a fileira proximal dos carpos se move em direção ao rádio, enquanto a fileira distal se move em direção à ulna. A amplitude de movimento para essa ação articular é de cerca de 30º a 40º. O movimento de flexão radial é caracterizado exatamente pela situação oposta: movimento da fileira proximal dos carpos em direção à ulna e da fileira distal em direção ao rádio, apresentando amplitude de movimento de 15º a 20º. Hiperestensão Desvio radial Desvio ulnar Flexão Figura 23 – Movimentos articulares realizados pelo punho As posições articulares que oferecem máxima sustentação ao punho e, consequentemente, maior estabilidade a essa articulação são a hiperextensão e a flexão radial. Isso porque nessas situações há o máximo contato entre os elementos que formam as articulações do punho. Logo, a adoção dessas posições é extremamente importante em movimentos nos quais a estabilidade de punho é fundamental, como em esportes com raquete, por exemplo. Outra articulação que compõe o complexo do punho e dedos da mão é a articulação carpometacarpal, cuja finalidade é ligar os ossos do carpo com cada um dos dedos, o que é feito por intermédio dos ossos metacarpos. A articulação carpometacarpal viabiliza principalmente a movimentação do polegar, com mínima movimentação dos dedos restantes (cerca de 10 a 30º para flexão e extensão dos dedos anelar e mínimo). Para o polegar, essa articulação permite amplitudes de movimento de 50º a 80º de flexão e extensão, 40º a 80º de adução e abdução e 10º a 15º de rotação. O polegar é capaz de realizar movimento de oposição com todos os demais dedos. Devido à sua grande amplitude de movimento e a tais características, o polegar possui suma relevância funcional, especialmente em tarefas que envolvam aperto e preensão. 65 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 BIOMECÂNICA As articulações matacarpofalângicas conectam os ossos metacarpos às falanges. Assim como na articulação anterior, a articulação metacarpofalângica difere entre o polegar e o restante dos quatro dedos: essa articulação permite amplitude de movimento maior para os quatro dedos que para o polegar. Os dedos indicador, médio, anelar e mínimo são capazes de realizar movimento em dois planos: sagital (flexão e extensão) e frontal (adução e abdução). A amplitude de flexão dos dedos varia entre 70º e 90º, sendo observada a maior amplitude no dedo mínimo e a menor no dedo indicador. A capacidade dos dedos em produzir força de flexão, o que está diretamente relacionado à capacidade de preensão, aumenta quando o punho é mantido em posição de 20º a 30º de hiperextensão, devido ao aumento do comprimento dos flexores dos dedos, favorecendo a produção de força. A amplitude de movimento para a extensão dos dedos é de, aproximadamente, 25º. Novamente, a posição do punho é um fator limitante da amplitude de movimento, sendo que a hiperextensão do punho restringe a extensão dos dedos, ao passo que a flexão dessa articulação favorece a extensão dos dedos. A adução e abdução apresentam amplitude de movimento restrita a 20º e são limitadas pela flexão dos dedos. Já o polegar tem apenas um grau de liberdade para essa articulação, executando movimento em um único plano. O polegar movimenta-se no plano sagital, sendo capaz de realizar 30º a 90º de flexão e cerca de 15º de extensão. Completando esse complexo articular, as articulações interfalângicas conectam as falanges de cada um dos dedos. Sendo articulações em gínglimo, permitem apenas movimentos no plano sagital, de flexão e extensão. Com amplitude de movimento variando entre 90º e 110º, a flexão é extremamente importante para a produção de força de preensão. Assim como na articulação anterior, a produção de força de flexão a partir da articulação interfalângica é favorecida pela posição de 20º de hiperextensão de punho. Diversos músculos são responsáveis pelos movimentos efetuados nas articulações do punho e dedos, podendo ser classificados em dois tipos: os extrínsecos (cujas inserções proximais são localizadas acima e as distais abaixo do punho) e os intrínsecos (ambas as inserções são abaixo do punho). Em geral, os músculos extrínsecos são os mais atuantes nas articulações do punho e dedos. Por outro lado, os músculos intrínsecos são intimamente ligados aos movimentos realizados nas articulações metacarpofalângicas e interfalângicas. Os músculos flexores do punho são o flexor ulnar do carpo, o flexor radial do carpo e o palmar longo. Desses, os dois primeiros são os que mais contribuem para a flexão do punho, dado que o músculo palmar longo pode ser muito pequeno ou, até mesmo, inexistente em algumas pessoas. Os músculos extensores do punho são constituídos pelo extensor ulnar do carpo, extensor radial longo do carpo e extensor radial curto do carpo. Tanto os músculos flexores como extensores do punho são biarticulares. Logo, a posição da articulação do cotovelo interfere na amplitude de movimento da articulação e na capacidade de produzir força por esses músculos. No entanto, para a flexão ulnar e radial do punho, a musculatura flexora e extensora dessa articulação trabalha em conjunto, sendo a flexão ulnar gerada pelos flexores e extensores ulnares, enquanto a flexão radial é gerada pela musculatura flexora e extensora radial. Na região dos dedos, o movimento de flexão é realizado principalmente por dois músculos extrínsecos: o flexor profundo dos dedos e o flexor superficial dos dedos. Devido a suas 66 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 Unidade II características anatômicas de inserção, o músculo flexor profundo dos dedos não é capaz de flexionar cada um dos dedos de forma independente, com exceção do dedo indicador, que possui um tendão separado. Já o músculo flexor superficial dos dedos possui a capacidade de flexionar cada um dos dedos independentemente, porém apenas nas articulações interfalângicas proximais. Contudo, a flexão dos dedos é potencializada por músculos intrínsecos que atuam em cada dedo, como os músculos lumbricais e interósseos. O músculo extensor dos dedos, como o próprio nome já prevê, é o principal responsável pelo movimento de extensão dos dedos. No entanto, este músculo extrínseco pode também ser ajudado pelos lumbricais e interósseos a realizar sua função. Adicionalmente os dedos são capazes de realizar adução e abdução por intermédio da ativação dos músculos interósseos palmeres e interósseos dorsais, respectivamente. A flexão dos dedos limita severamente o movimento dos dedos no plano sagital, especialmente a abdução, dado que os músculos interósseos tambémsão flexores desta região e, neste caso, já se apresentariam tensionados. Apesar de termos falado dos dedos em geral, todo esse comportamento abordado anteriormente só é relativo aos dedos indicador, médio, anelar e mínimo. O polegar apresenta estrutura e funcionalidade um pouco diferente, já que possui oito músculos responsáveis por seus movimentos, o que lhe garante ampla mobilidade. O movimento mais importante realizado pelo polegar é a oposição, pois viabiliza a capacidade de preensão de qualquer coisa, sendo o músculo oponente do polegar o principal responsável por esta tarefa. O complexo articular do punho e mão é responsável pela geração de uma força essencial para diferentes tipos de tarefas motoras do cotidiano e esportivas: a força de preensão. Cabe destacar que a estratégia de preensão, a solicitação muscular e a consequente produção desse tipo de força serão reguladas pelas características da tarefa. Em caráter de exemplo, um indivíduo ao segurar uma barra com carga em determinado exercício de musculação exigirá maior produção de força nesse complexo articular, solicitando muito da musculatura extrínseca. Por outro lado, uma tarefa motora mais fina, como segurar um dardo para lançá-lo a um alvo, requer um movimento mais delicado de pinça e menor força muscular, havendo solicitação da musculatura intrínseca para melhor regulação desse movimento. A capacidade de produzir força de preensão pelo punho e mão é influenciada pela posição articular das estruturas envolvidas. Quando o punho é posicionado em leve flexão ulnar e hiperextensão, a geração de força de preensão é potencializada. Em contrapartida, a capacidade de produzir força de preensão é reduzida quando o punho é posicionado em flexão. Para ter-se dimensão dessa diferença, a força de preensão gerada pelo punho posicionado em 40º de hiperextensão é mais de três vezes maior que a força de preensão produzida com o punho posicionado no mesmo grau de flexão (40º). É importante lembrar que a sobrecarga imposta à articulação aumenta proporcionalmente em vista ao seu trabalho. Sendo assim, a potencialização da produção de força de preensão acaba por acarretar maior sobrecarga sobre a articulação do punho e dedos da mão. Nesse sentido, a posição neutra do punho tem sido sugerida como a mais segura para muitas das tarefas motoras realizadas. Numa hierarquia de capacidade de produção de força na mão, temos como músculo mais forte o flexor profundo dos dedos, sendo seguido em ordem decrescente pelos músculos flexor ulnar do carpo, 67 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 BIOMECÂNICA extensor dos dedos, flexor longo do polegar, extensor ulnar do carpo e extensor radial longo do carpo. Os dois músculos mais fracos e com menor capacidade de trabalho envolvidos nessas articulações são o palmar longo e o extensão longo do polegar. A partir desses dados, é possível ter excelentes parâmetros para o treinamento e fortalecimento dos principais e mais importantes músculos da articulação do punho e dedos da mão, podendo influenciar positivamente o desempenho dos indivíduos em suas atividades cotidianas, bem como a performance de atletas em esportes dependentes dessas articulações. A articulação do punho e dedos pode ser determinante para diferentes tarefas. No dia a dia, o desempenho dessas articulações pode ser diferencial na atuação de pessoas que lidam com ferramentas e equipamentos em sua ocupação profissional, ou para idosos que necessitam de autonomia para realizar tarefas simples como lavar louças. Nos esportes, a articulação do punho e dedos da mão é de incontestável relevância em modalidades que envolvem a manipulação de objetos, como o tênis, o tênis de mesa e o golfe, ou em modalidades que envolvem arremessos ou golpes, como o handebol, o beisebol e o vôlei. Em algumas situações, as ações do punho são de cunho estático com a finalidade de estabilizar a articulação numa determinada posição de forma a viabilizar algum movimento. É o caso da habilidade de tocar piano e da rebatida no golfe ou no tênis. Em outros contextos, ações de flexão e extensão de punho têm característica dinâmica e são geralmente realizadas com velocidade, a fim de imprimir mais velocidade ou efeito a algum objeto, ou ainda aplicar força de forma mais eficiente. Bons exemplos são o quicar bola e o drible no basquete, a cortada no voleibol e o arremesso no beisebol. Em relação à mão, a contribuição das articulações dos dedos relaciona-se a posições estáticas que podem viabilizar dois tipos de preensão para tarefas esportivas e do cotidiano: a preensão de força e a preensão de precisão. A preensão de força é marcada pelo punho cerrado e por intensa flexão dos dedos a fim de envolver um objeto, solicitando geração de força de todas as articulações dos dedos. A preensão para o arremesso do dardo do atletismo e a tacada de golfe são bons exemplos dessa estratégia. Em contrapartida, a preensão de precisão caracteriza-se por limitada flexão apenas das articulações interfalângicas, por menor geração de força e pelo envolvimento de poucos dedos. Ações como escrever ou arremessar um objeto a um alvo dependem dessa última estratégia. O polegar é o principal determinante, e consequentemente o principal indicador, da estratégia de preensão utilizada (veja a figura a seguir). Quando os dedos se flexionarem de forma a envolver determinado objeto e o polegar permanecer no plano da mão em posição de adução, destaca-se uma preensão de força. Cabe ressaltar que a maioria das posições de preensão de força nos dedos é acompanhada por flexão ulnar e extensão do punho. Por outro lado, em tarefas que exigem preensão de precisão, a posição adotada pelo polegar é de oposição e de ligeira flexão pelos demais dedos envolvidos na tarefa. 68 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 Unidade II Precisão Força Adução Adução Adução Figura 24 – Exemplos de tarefas de preensão de força e de preensão de precisão É importante lembrar a capacidade e a importância dos dedos em atividades dinâmicas coordenadas, como tocar instrumentos musicais ou escrever, nas quais é exigido o uso coordenado dos movimentos de flexão, extensão, adução e abdução dos dedos. O punho e as mãos estão envolvidos em ampla variedade de tarefas e movimentos, tanto da vida diária como de modalidades esportivas. Em todas essas tarefas, a capacidade de produzir força e o resultante potencial lesivo disso é bastante considerável. As lesões podem ocorrem de forma traumática, pelo contato ou absorção de força brusca, como em uma queda ou impacto com algum indivíduo ou implemento, e que leva à flexão ou extensão máxima da articulação. Os esforços repetitivos apresentam-se como outro mecanismo comum de lesão do punho e mão. Dentre as principais e mais comuns lesões, destacamos aquelas relacionadas à hiperextensão extrema, como entorse do punho, distensão dos músculos, fratura do escafoide ou dos carpos, fratura da região distal do rádio e luxação. Fraturas na região distal do rádio são bastante comuns. Isso porque é um osso pequeno e pouco volumoso, porém frequentemente utilizado como anteparo em quedas. Sendo assim, esportes de contato e de aventura geralmente apresentam alta incidência de lesões e fraturas nessa região. A mão também pode sofrer lesões a partir de impactos intensos e bruscos. Contudo, estas lesões estão geralmente relacionadas a esportes específicos, como boxe, judô e beisebol. As lesões de maior incidência no punho e mão, e atribuídas ao esforço repetitivo, são a tenossinovite e a síndrome do túnel do carpo. Tenossinovite é a inflamação da bainha dos tendões e da membrana sinovial que envolve a articulação do punho e dedos,ocorrendo em praticantes de modalidades com característica de movimentos repetitivos, como remo, canoagem, tênis, esgrima, golfe, entre outros. A síndrome do túnel do carpo é decorrente da inflamação 69 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 BIOMECÂNICA de tendões que passam pelo túnel do carpo, também por excesso de movimento repetitivo no punho, e acabam por comprimir nervos que passam pela mesma região, gerando desconforto, formigamento, atrofia de músculos e dor. 5.2 Extremidade inferior Veremos que a extremidade inferior guarda algumas semelhanças em relação à extremidade superior. Contudo, a extremidade inferior apresenta muitas peculiaridades e funções que a tornam bastante especial, como a sustentação do corpo e a locomoção. Além disso, é capaz de realizar movimentos complexos e usufruir de capacidades que a extremidade superior não é capaz. Como exemplo, temos o equilíbrio na ponta dos pés típico de bailarinas ou a habilidade de colocar o corpo no espaço aéreo através dos saltos. Para compreender os movimentos executados pela extremidade inferior, é necessário conhecer suas características anatômicas e biomecânicas. Para iniciar nosso estudo, recordamos que a extremidade inferior é composta de algumas articulações/estruturas importantes, como quadril, joelho, tornozelo e pé. Embora a extremidade inferior funcione como uma cadeia, na qual uma parte influencia a outra, e que o movimento da extremidade inferior seja resultado da atuação dessas estruturas em conjunto, cada articulação será analisada separadamente. 5.2.1 Articulação do quadril O complexo do quadril é um dos principais e maiores complexos articulares do nosso corpo, responsável por conectar as extremidades inferiores ao tronco. É formado pelo cíngulo do membro inferior (veja a figura a seguir), conhecido também como citura pélvica, que consiste na união fibrosa de três ossos: o ílio (parte superior), o ísquio (parte posteroinferior) e o púbis (parte anteroinferior). A conexão entre os lados direito e esquerdo da pelve é feita por intermédio da sínfise púbica. Ligamento iliolombar Ligamento sacroilíaco ant. Ílio Púbis Fibrocartilagem interpúbica Articulação sacroilíaca Sínfise púbica Ligamento púbico Ísquio Sacro Figura 25 – Ilustração da cintura pélvica 70 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 Unidade II A conexão da pelve ao tronco é feita através da articulação sacroilíaca. Essa articulação é de extrema importância, na medida em que transmite o peso corporal ao quadril, sendo submetida a cargas consideráveis vindas do tronco ou provenientes do solo. É uma região bastante reforçada por fortes ligamentos e estável, mas que, ainda assim, é capaz de realizar movimento. Os movimentos executados nessa articulação referem-se à mobilidade do sacro, cujo comportamento é dependente das ações articulares do tronco. A flexão sacral ocorre simultaneamente à extensão de tronco ou flexão de coxa e a extensão sacral é realizada quando ocorre a flexão do tronco ou extensão da coxa. Adicionalmente ao movimento entre sacro e ílio, a pelve é capaz de se movimentar como um todo através das ações de inclinação anterior e posterior, rotações e inclinações laterais. Como o cíngulo pélvico não possui musculaturas próprias que permitam seu trabalho isolado, os movimentos pélvicos sempre ocorrem em função dos movimentos de coxa e vértebras lombares, sendo descritos a partir do monitoramento do ílio. Veja a figura: 70 - 75º 50 - 55º a) Inclinação anterior c) Inclinação lateral para a esquerda e) Rotação para a esquerda d) Inclinação lateral para a direita f) Rotação para a direita b) Inclinação posterior Figura 26 – Movimentos da pelve 71 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 BIOMECÂNICA A articulação que completa o cíngulo do membro inferior e é a mais importante desse complexo articular é a articulação do quadril (veja a figura a seguir). O quadril caracteriza-se como uma articulação esferoidal, formada a partir do encaixe da cabeça do fêmur no acetábulo, e que apresenta considerável mobilidade, exibindo três graus de liberdade para realização de movimentos. Uma característica importante dessa articulação é sua estabilidade. Diversos aspectos anatômicos, como encaixe mais justo e profundo entre as peças ósseas, estrutura óssea mais resistente, maior número e força muscular e ligamentar atravessando a articulação, entre outras, fazem com que a articulação do quadril seja inerentemente mais estável que o ombro. Em caráter de curiosidade, a cabeça do fêmur articula-se com aproximadamente 70% do acetábulo, enquanto a cabeça do úmero articula-se com apenas 20% a 25% da cavidade glenoidea. Porém, em outros aspectos, apresenta semelhanças ao ombro, destacando- se o mesmo tipo de articulação, a presença de borda fibrocartilaginosa (aqui chamada de lábio do acetábulo), de bursas e de cápsula articular compondo e protegendo essa estrutura. Lábio do acetábulo Cápsula articularTrocanter maior Cabeça do fêmur Acetábulo Fêmur Colo Ligamento redondo Figura 27 – Figura ilustrativa da articulação do quadril A articulação do quadril possui três vitais ligamentos fundidos à cápsula articular e nutridos por ela: o iliofemoral, o pubofemoral e o isquiofemoral. O ligamento iliofemoral localiza-se na parte anterior do quadril e tem como principais funções a sustentação da articulação do quadril na postura em pé e a geração de resistência à extensão, rotação interna e rotação externa, controlando esses movimentos. O ligamento pubofemoral, também localizado na região anterior, é responsável por oferecer resistência aos movimentos de abdução e rotação externa, enquanto o ligamento isquiofemoral (localizado na região posterior do quadril) tem a função de oferecer resistência à adução e rotação interna. A flexão do quadril é a única ação articular que não apresenta nenhum ligamento realizando resistência a ela, o que lhe garante a maior amplitude de movimento dentre todas as ações realizadas pelo quadril. O fêmur, osso que se articula com a pelve para formar o quadril, é um dos principais ossos responsáveis pela sustentação do peso corporal, sendo o mais longo, espesso e resistente osso do corpo. Sua região medial, especialmente do colo, tem a função de resistir às forças de reação do solo, ao passo que a região lateral do colo do fêmur tem a responsabilidade de resistir às forças de compressão e tensão geradas pelos músculos. 72 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 Unidade II O colo do fêmur encaixa-se no acetábulo em determinado ângulo de inclinação no plano frontal, que é de cerca de 125º na idade adulta, conforme a figura a seguir. Esse ângulo é 20-25% maior no nascimento e início da vida, e vai diminuindo com o desenvolvimento do indivíduo. A relevância do ângulo de inclinação decorre do fato deste determinar a eficácia dos abdutores do quadril, o comprimento do membro e as forças impostas à articulação. Ângulos de inclinação maiores que 125º caracterizam coxa valga e resultam em maiores comprimentos do membro, menor eficácia dos abdutores de quadril, maior carga sobre a cabeça do fêmur e menor sobrecarga sobre o colo desse osso. Ângulos de inclinação inferiores a 125º caracterizam coxa vara, resultando em membros menores, maior eficiência de abdutores de quadril, menor carga na cabeça do fêmur e maior sobrecarga sobre o colo. 125º 105º 140º Figura 28 – Ângulo de inclinação do encaixedo fêmur no acetábulo, no plano frontal No plano transverso, o ângulo de encaixe do colo do fêmur na pelve pode assumir um ângulo de anteversão ou ângulo de retoversão. A anteversão do quadril é caracterizada pela rotação anterior de 12-14º do colo do fêmur em relação ao fêmur, aumentando a vantagem mecânica do músculo glúteo máximo e tornando-o, consequentemente, mais eficiente no seu papel de rotador externo. No entanto, se ocorrer de forma excessiva, a anteversão acaba por gerar na marcha, por exemplo, aumento do ângulo Q (ângulo formado entre as retas que passam pelo centro patelar e tuberosidade tibial e pelo centro patelar e crista ilíaca anterossuperior, e que se relaciona a diversas lesões nos membros inferiores, especialmente no joelho), sobrecarga patelar, maiores comprimentos de membro, maior pronação do tornozelo e aumento da curvatura lombar. A rotação posterior do quadril é chamada de retroversão e na marcha ocasiona rotação externa, supinação do tornozelo e diminuição do ângulo Q. Como já dito anteriormente, o quadril é uma articulação naturalmente estável. Um dos motivos é a presença de ligamentos e músculos fortes em todas as direções, garantindo apoio, sustentação e estabilidade a essa articulação. A máxima estabilidade do quadril ocorre quando a máxima congruência entre a cabeça do fêmur e sua cavidade é alcançada. Essa situação é atingida com o quadril em 90º de flexão somada a ligeira rotação e abdução. Em contrapartida, uma situação de grande instabilidade para o quadril é a posição cujas ações de flexão e adução são realizadas conjuntamente. O complexo do quadril é uma articulação capaz de realizar movimento em três direções, apresentando, assim, grande mobilidade e amplitude de movimento (veja a figura a seguir). No plano sagital, o quadril apresenta amplitude de movimento de 70º a 140º para a flexão e de 4 a 15º de hiperextensão. 73 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 BIOMECÂNICA Tal característica é importante, pois a demanda e exigência de amplitude de movimento de flexão e extensão nas tarefas motoras realizadas no cotidiano e em modalidade esportivas são bastante grandes, variando de 20º a mais de 100º. Por exemplo, subir e descer uma escada requer amplitude de cerca de 65º de flexão para a subida e 25 a 30º de flexão para a descida; para sentar-se em e levantar-se de uma cadeira, a amplitude de flexão e extensão necessária é de 80º a 100º. O principal fato limitante da flexão de quadril é a extensão de joelhos devido à resistência imposta pelos músculos isquiotibiais. Já a extensão e hiperextensão de quadril têm como fatores limitantes de movimento a cápsula articular anterior, os músculos flexores do quadril e o ligamento iliofemoral. A articulação do quadril permite também que a coxa realize movimentos de adução e abdução no plano frontal. A amplitude de abdução do quadril é de aproximadamente 30º, enquanto a abdução pode ser feita em até 25º além da posição anatômica. A maioria das atividades motoras e exercícios requer amplitude de cerca de 20º de adução e abdução. A realização da marcha, por exemplo, exige aproximadamente 12º de adução e abdução. Com amplitude semelhante, a tarefa de agachar-se requer 18º a 20º de abdução e adução. Os movimentos de adução e abdução são basicamente controlados e limitados por seus músculos antagonistas. Sendo assim, a adução é limitada principalmente pelo músculo tensor da fáscia lata, ao passo que a abdução é limitada pelos músculos adutores. O terceiro tipo de movimento realizado pela articulação do quadril ocorre no plano transversal e é composto da rotação interna, com amplitude de 70º, e a rotação externa, com amplitude de 90º, ambos a partir da posição anatômica. Embora algumas tarefas motoras exijam grande mobilidade e amplitude, a amplitude de rotação apresentada pelo quadril vai muito além daquela necessária para a maioria dos movimentos esportivos e do cotidiano. Tomando novamente a marcha como exemplo, a coxa realiza de 8º a 10º de rotação externa e de 4º a 6º de rotação interna. Contudo, é importante observar que a amplitude de movimento das rotações pode ser aumentada caso a coxa esteja em flexão. Assim como os movimentos do plano frontal, as rotações são basicamente limitadas pela musculatura antagonista ao movimento, com controle adicional dos ligamentos da articulação do quadril. Abdução de 30º Adução de 20º Hiperextensão de 4-15º Flexão de 70-140º Rotação externa de 90º Rotação interna de 70º Figura 29 – Movimentos articulares realizados pelo quadril e suas respectivas amplitudes 74 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 Unidade II O movimento da pelve é geralmente realizado concomitantemente com o das vértebras lombares e coxa. E a coordenação dessas estruturas, bem como a influência mútua, dependerá de diversos fatores, como: se a tarefa realizada ocorrerá de forma bilateral ou unilateral e se o exercício é realizado com ou sem o apoio dos pés ou, ainda, de forma suspensa. Desse modo, a análise dos movimentos do quadril utilizados na realização de qualquer tarefa motora e gesto esportivo deve considerar esses fatores. A mobilidade do complexo articular do quadril depende do esforço de ampla gama de músculos que trabalham nessa articulação. Quadro 8 – Principais músculos do complexo do quadril e suas respectivas ações Músculo Localização Ação Reto femoral Anterior à coxa/superficial Flexão do quadril Co m pl ex o is qu io tib ia is Bíceps femoral Posterior à coxa/superficial Extensão do quadril Semitendíneo Posterior à coxa/superficial Extensão do quadril Semimembranáceo Posterior à coxa/superficial Extensão do quadril Co m pl ex o ili op so as Ilíaco Anterior ao quadril/superficial Flexão e rotação lateral do quadril Psoas maior Anterior ao quadril/superficial Flexão do quadril e da coluna lombar e rotação lateral do quadril Glúteo máximo Posterior ao quadril/superficial Extensão e rotação lateral do quadril Piriforme Posterior ao quadril/profundo Rotação lateral e pouca extensão de quadril Glúteo médio Posterior ao quadril/profundo Abdução e rotação lateral do quadril Glúteo mínimo Posterior ao quadril/profundo Abdução e rotação lateral do quadril Tensor da fáscia lata Lateral ao quadril/superficial Abdução do quadril Grácil Medial à coxa/superficial Adução do quadril Adutor longo Medial à coxa/superficial Adução, rotação lateral e flexão de quadril Adutor curto Medial à coxa/profundo Adução, rotação lateral e flexão de quadril Adutor magno Medial à coxa/profundo Adução, rotação lateral e flexão de quadril Pectíneo Medial à coxa/superficial Adução e flexão de quadril A flexão de quadril é um movimento de grande relevância para muitas tarefas, especialmente para a locomoção. Embora poucos treinadores deem atenção ao fortalecimento da musculatura envolvida na realização desse movimento, corredores em geral, velocistas e atletas de provas com barreiras e saltos têm a flexão de quadril como um dos principais determinantes de suas performances, apresentando alta exigência e esforço dos músculos flexores de quadril. O mais forte e importante dos músculos flexores é o complexo muscular iliopsoas, formado pelos músculos psoas maior e ilíaco. Por ser um músculo biarticular (atua no tronco e quadril), quando o tronco estiver estabilizado, a ação do iliopsoas será a flexão do quadril, que pode ser ainda facilitada caso haja leve rotação externa e abdução; caso a coxa esteja fixa, a ação do iliopsosas gerará a hiperextensão das vértebras lombares 75 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io -1 3/ 01 /2 01 7 BIOMECÂNICA e a flexão de tronco. A maior ativação desse músculo ocorre na fase intermediária (amplitude média) do movimento de flexão. Um segundo flexor importante do quadril é o músculo reto femoral. Assim como o iliopsosas, o músculo reto femoral também é biarticular, contudo, atua nas articulações do quadril e joelho. Logo, sua contribuição para a flexão de quadril dependerá sempre do posicionamento do joelho na tarefa. Ainda assim, a contribuição desse músculo para a flexão de quadril é bastante significativa: estima-se que a perda de função do músculo reto femoral acarrete uma redução na força flexora do quadril da ordem de 17%. O quadril possui ainda mais três músculos flexores, porém com papel secundário no movimento devido aos seus respectivos volumes e capacidades de produção de força: o satório, o pectíneo e o tensor da fáscia lata. O sartório é mais um músculo biarticular a atuar no quadril e no joelho. Por suas inserções, tem capacidade de realizar abdução e rotação externa de quadril, além da flexão. O pectíneo localiza-se na região da virilha e trabalha em conjunto com o tensor da fáscia lata. O músculo pectíneo tem como ação básica a adução do quadril; entretanto, quando o movimento é de locomoção (especialmente marcha e corrida), esse músculo auxilia na realização da flexão de quadril. Da mesma forma, o tensor da fáscia lata é um rotador interno por natureza, porém, durante a locomoção, também auxilia na flexão de quadril. Devido à sua característica biarticular (também atravessa a articulação do joelho), o tensor da fáscia lata depende da posição do joelho para atuar como flexor de quadril, tendo essa sua capacidade limitada ao permanecer alongado quando o joelho está estendido. A extensão de quadril apresenta-se como uma importante ação articular para a sustentação do peso corporal, para controle das respostas do quadril à ação da gravidade, para estabilização da pelve e para a impulsão e propulsão do corpo nas diversas tarefas de locomoção. Os músculos isquiotibiais possuem contribuição bastante relevante na extensão do quadril, já que participam em todas as condições de extensão dessa articulação. Três músculos formam o complexo isquiotibial: o semimembranoso, o semitendíneo e o bíceps femoral. Os dois primeiros músculos apresentam contribuição secundária, ao passo que o bíceps femoral é considerado o músculo mais efetivo destes na realização da extensão de quadril. A ação dos isquiotibiais é novamente determinada pela posição do joelho, pois são músculos biarticulares. Com o joelho em extensão, a ação dos isquiotibais na extensão de quadril é facilitada na medida em que ficam alongados e em posição ideal para produzir força nesse sentido. A eficiência dos músculos isquiotibiais é também facilitada na presença de graus maiores de flexão da coxa. Em atividades de baixa intensidade e baixo nível de esforço, são os músculos isquiotibiais que mais contribuem para a execução da extensão de quadril. Entretanto, em caso de aumento da intensidade da tarefa ou realização de exercícios mais pesados, torna-se necessária uma extensão mais vigorosa. Nesse caso, o músculo glúteo máximo surge como um importantíssimo extensor de quadril. Em atividades menos intensas, o esforço do glúteo máximo é direcionado a apenas controlar a movimentação da pelve. A posição ideal para recrutamento desse músculo é a hiperextensão com rotação externa do quadril. 76 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 Unidade II Dada a ação conjunta dos flexores e extensores de quadril, e a relevância desses movimentos para o controle anteroposterior da pelve, é de suma importância que a musculatura flexora e a extensora de quadril estejam equilibradas em suas capacidades, especialmente em força e flexibilidade, de forma a evitar movimentos indesejados, sobrecarga de estruturas na própria articulação e ao longo do membro inferior e surgimento de lesões. Os movimentos de abdução e adução de quadril também são essenciais em muitos exercícios físicos, tarefas motoras e modalidades esportivas. A abdução, por exemplo, apresenta grande relevância em tarefas relacionadas à dança e à ginástica. Contudo, os abdutores de quadril podem desempenhar papel de estabilizadores da articulação, conforme ocorre durante a locomoção. O músculo glúteo médio é o principal abdutor do quadril e sua efetividade varia de acordo com o ângulo de inclinação do colo do fêmur e a vantagem mecânica que ela proporciona. A atuação do glúteo médio será mais efetiva na articulação do quadril e pelve em ângulos de inclinação inferiores a 125º, aumentando a vantagem mecânica do músculo e tornando a pelve mais ampla. Como resultado, a capacidade de gerar força e promover estabilidade na articulação aumentará. Com menores contribuições, os músculos glúteo mínimo, tensor da fáscia lata e piriforme também realizam abdução de quadril, sendo o glúteo mínimo o mais forte e efetivo deles. A adução de quadril é uma ação articular presente em diversos esportes, como natação (nado peito), ginástica e futebol, além de funcionar como estratégia de estabilização da pelve a partir de torque abdutor. Como músculos responsáveis pela adução, temos o grácil, o adutor longo, o adutor curto, o adutor magno e o pectíneo. Considerando que trabalham em conjunto a fim prevenir inclinações da pelve e manter a articulação estável, é de singular importância que a musculatura adutora e abdutora também apresente equilíbrio de força e flexibilidade para realizar adequadamente e com segurança suas funções. E, por fim, a articulação possui músculos responsáveis pela rotação externa e interna do quadril. A rotação externa está relacionada a movimentos de potência e propulsão pelos membros inferiores e tem como principais responsáveis dessa ação os músculos glúteo máximo, obturador externo e quadríceps femoral. Embora apresentem contribuição limitada (ativos nessa função apenas quando o quadril está em extensão), os músculos obturador interno, gêmeos inferior e piriforme também atuam na realização da rotação externa. Por outro lado, a rotação interna é um movimento pouco utilizado dentro do repertório motor humano, sendo uma ação secundária para todos os músculos envolvidos nessa ação. Os principais rotadores internos são os músculos glúteo médio e glúteo mínimo; porém, eles recebem auxílio dos músculos grácil, adutor longo, adutor magno, tensor da fáscia lata, semimenbranáceo e semitendíneo. A maior capacidade de produção de força na articulação do quadril ocorre na ação de extensão, com a somatória do esforço de duas musculaturas poderosas, o glúteo máximo e os isquiotibiais. A força máxima de extensão é gerada com o quadril posicionado em 90º de flexão, sendo essa força reduzida em 50% à medida que o ângulo de flexão se aproxima da posição neutra (ou de 0º). Além disso, a força de extensão é limitada pelo posicionamento do joelho, de forma que a capacidade de produzir força pelos isquiotibiais apresenta-se aumentada quando o joelho está estendido. 77 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 BIOMECÂNICA De todos os diversos músculos capazes de realizar flexão de quadril, o iliopsoas é o mais potente e o único a realizar essa ação articular como tarefa primária. Contudo, cabe ressaltar que sua capacidade de gerar força flexora diminui com a flexão do tronco. A produção de força flexora no quadril pode ser potencializada pelo aumento da contribuição do reto femoral quando o joelho se apresenta fletido. Quanto à abdução, sua máxima produção de força ocorre a partir da posição neutra e diminui com o aumento da amplitude, exibindo capacidade de abdução 50% menor quando o quadrilestá posicionado a 25º de abdução. A realização da abdução com o quadril em flexão é uma estratégia que aumenta a capacidade de se gerar força abdutora. O grande número de músculos atuando em conjunto para realizar a abdução torna o potencial de produção de força adutora bastante considerável. A maior capacidade de geração de força adutora é observada quando a tarefa parte de uma posição de leve abdução, situação na qual o grupamento muscular apresenta-se alongado. Na rotação, a força produzida pelos rotadores externos é cerca de 60% maior que dos rotadores internos, exceto em flexão de quadril, situação na qual os rotadores internos são levemente mais fortes. A produção de forças de rotação pelo quadril é favorecida pela posição sentada. O quadril é a principal articulação responsável pela sustentação do peso corporal. Logo, a força muscular gerada nessa articulação somada às forças geradas pela interação com o ambiente, especialmente o peso corporal e impacto, acabam por aumentar a compressão na articulação, submetendo o quadril a sobrecargas significativas. A posição estática em pé, com apoio bipodal, é suficiente para gerar uma carga equivalente a 30% do peso corporal sobre o quadril, o que é aumentado para até três vezes o peso corporal no caso do apoio unipodal. Carregar uma mala de viagem, com peso equivalente a 25% do peso corporal, de modo unilateral pode aumentar a sobrecarga sobre o quadril contralateral em 167%. A sobrecarga sobre o quadril durante diferentes estratégias de locomoção varia de três a dez vezes o peso corporal. Embora tais valores possam parecer exacerbados e perigosos, é importante destacar que estão dentro dos limites do tecido biológico da articulação, capaz de suportar cargas de, aproximadamente, 15 vezes o peso corporal sem que ocorram lesões ou fraturas. A articulação do quadril possui fundamental importância em diversos exercícios, tarefas motoras e gestos esportivos. Contudo, sua relevância e contribuição para os movimentos de locomoção merece ser destacada. Durante a marcha, a ativação dos músculos do quadril contribui mais para a estabilização e controle da pelve que para a propulsão. No início do apoio do pé no solo, glúteo médio e musculatura abdutora trabalham para sustentação do peso e manutenção da pelve equilibrada, atividade que vai até a metade da fase de apoio. Nesse instante do movimento, o músculo glúteo mínimo e os adutores se ativam concomitantemente aos músculos anteriores, de forma a ajudar no cumprimento da tarefa de estabilização do quadril e pelve. Na fase de contato, há também a ativação dos músculos isquiotibiais e glúteo máximo, que, de forma excêntrica, controlam a 78 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 Unidade II flexão de quadril, de tronco e a movimentação do segmento inferior durante o apoio do pé e aceitação da carga, diminuindo sua ativação logo em seguida. Nessa fase há também o auxílio do tensor da fáscia lata para controlar o movimento da pelve no plano frontal. Na fase propulsiva há predominância do esforço de extensão do quadril por parte dos músculos isquiotibiais e glúteo máximo, somada à ligeira abdução da articulação. Com a perda do contato do pé com solo, inicia-se a fase de balanço da marcha, caracterizada por flexão, ligeira adução e rotação interna do quadril, mediadas pelos músculos iliopsosas, reto femoral, tensor da fáscia lata e adutores do quadril. No fim da fase de balanço, há novo esforço da musculatura isquiotibial e glúteo máximo para desacelerar o segmento, atuando de forma excêntrica nesta fase do movimento. Variações da marcha, como a marcha atlética e a corrida, seguem técnica e comportamento bastante semelhantes entre si, embora cada uma possua suas peculiaridades. Na marcha atlética, devido às características inerentes ao esporte, há um aumento da amplitude de movimento no plano frontal, exigindo maior trabalho dos abdutores de quadril, maior atividade flexora na fase de balanço e realização mais rápida de extensão de quadril na fase propulsiva. Já na corrida, o comportamento é basicamente o mesmo, porém, com maior amplitude de movimento e maior ativação dos músculos envolvidos. Possivelmente devido às suas características estruturais e anatômicas, a articulação do quadril apresenta a menor incidência de lesões no membro inferior. A lesão traumática é principalmente oriunda de quedas, sendo o principal mecanismo de fraturas na articulação. A região mais afetada nesses casos é o colo do fêmur, e acometendo em grande parte os idosos devido à alta incidência de osteoporose. Embora seja um dos mecanismos possíveis de lesão, as lesões por estresse repetitivo nessa região representam apenas 5% do total de lesões dessa natureza em todo o corpo. Dessa forma, o principal mecanismo de lesões na região do quadril e pelve parece ser funcionalidade anormal dessa articulação, e a consequente sobrecarga imposta em algumas estruturas. Como resultado, há o surgimento de lesões, como: distensões musculares, relacionadas geralmente à fraqueza ou desequilíbrio muscular de músculo com grande solicitação no movimento; inflamações ósseas geradas, por exemplo, por amplitudes excessivas de movimento e maior sobrecarga nas estruturas de controle, e que podem, inclusive, evoluir para uma fratura por estresse; luxações, tendinites e bursites, geralmente oriundas de amplitudes excessivas de movimento e/ou mal alinhamento das estruturas do quadril. Das lesões de tecidos moles, as mais comuns na articulação do quadril são as tendinites, especialmente de glúteo médio, a bursite e a distensão dos músculos isquiotibiais. 5.2.2 Articulação do joelho A articulação do joelho é uma das mais importantes do aparelho locomotor. Ao cumprir a função de conectar a coxa à perna, a articulação do joelho cumpre também a grande responsabilidade de ser a principal articulação envolvida na sustentação do corpo e na absorção de choque mecânico, 79 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 BIOMECÂNICA com capacidade para suportar enormes cargas. O complexo do joelho é uma articulação sinovial, com dois graus de liberdade de movimento (realiza flexão e extensão e também rotação), e que é composta de três articulações dentro de sua cápsula articular: a tibiofemoral, a patelofemoral e a tibiofibular superior. A articulação tibiofemoral, também conhecida como articulação do joelho propriamente dita, articula os dois mais longos e fortes ossos do corpo humano: o fêmur e a tíbia. É formada por duas articulações condiloides duplas, entre os côndilos medial e lateral da tíbia e do fêmur, compondo uma articulação em dobradiça (veja a figura a seguir). Fêmur Patela Epicôndilo Fíbula Articulação patelofemoral Côndilo lateral do fêmur Côndilo lateral do fêmurCôndilo medial do fêmur Côndilo medial do fêmur Articulação tibiofemural Tuberosidade da tíbia Tuberosidade da tíbia Fossa intercodilar Insisura troclear Eminência intercodilar Fêmur Tíbia Platô tibial lateral Platô tibial lateral Platô tibial medial Platô tibial medial Figura 30 – Figura ilustrativa da articulação tibiofemoral Diferenças estruturais e anatômicas entre os côndilos lateral e medial podem explicar a articulação no joelho, conforme a figura a seguir. O côndilo lateral do fêmur localiza-se basicamente alinhado com o fêmur, é mais achatado, porém, mais saliente anteriormente, a fim de manter a patela em seu devido lugar, e possui maior área de superfície. Em contrapartida, o côndilo medial é mais longo na direção anteroposterior, projeta-se num sentido longitudinal-medial, ao passo que faz angulação em afastamentodo fêmur na parte posterior, e está alinhado com a tíbia. O encaixe entre fêmur e tíbia na região medial ocorre de maneira razoavelmente justa e satisfatória, ao passo que a região lateral não se encaixa de maneira satisfatória devido à convexidade das duas superfícies. Dessa forma, diferenças em formato, tamanho e orientação dos côndilos são determinantes para a existência de movimento de rotação no joelho, criando-se condições para que a tíbia gire lateralmente sobre o fêmur em determinadas situações. 80 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 Unidade II Fêmur Fêmur Fêmur Fêmur Patela Fíbula Fíbula Côndilo medial Côndilo medial Côndilo medial Côndilo lateral Côndilo lateral Menisco lateral Ligamento cruzado posterior Ligamento cruzado anterior Ligamento transversoMenisco lateral Menisco medial Menisco medial Côndilo lateral Epicôndilo lateralSuperfície patelar Superfície articular Epicôndilo medial Côndilo medial TuberosidadeEminência intercodiloide Eminência intercodiloide Tíbia Tíbia Tíbia Tíbia Vista anterior Vista posterior Vista posterior Vista superior Figura 31 – Estrutura anatômica da articulação tibiofemoral Outra importante estrutura que compõe a articulação tibiofemoral é o menisco. Os meniscos (veja a figura a seguir) são discos fibrocartilaginosos em formato de meia-lua que se localizam entre a tíbia e o fêmur. Mais especificamente, os meniscos situam-se aderidos firmemente à superfície dos côndilos da tíbia por intermédio dos ligamentos coronários e da cápsula articular. Entre si, os meniscos são conectados por intermédio do ligamento transverso. O aporte sanguíneo e de nervo alcança apenas a parte externa dos meniscos, sendo a parte interna avascularizada. Assim, diante de algum trauma ou ruptura, apenas a parte externa dos meniscos apresenta possibilidade de reparação e cicatrização. 81 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 BIOMECÂNICA Fêmur Fíbula Menisco lateral Menisco lateral Ligamento cruzado posterior Ligamento meniscofemoral Ligamento cruzado anterior Ligamento transverso Menisco medial Menisco medial Tíbia Figura 32 – Figura ilustrativa dos meniscos do joelho Os meniscos têm o fundamental papel de distribuir melhor as cargas incidentes no joelho, ampliando a superfície de recebimento da carga, aumentar a estabilidade da articulação e auxiliar na absorção de choques mecânicos. Em extensão completa, os meniscos são responsáveis pela distribuição de 50% da carga, atuando também de forma significativa na transmissão da carga em flexão pela superfície articular. O menisco lateral transfere percentual de carga significativamente maior que o medial, sendo o mais solicitado pelo aparelho locomotor na realização de tarefas motoras. Os meniscos apresentam também papel relevante na lubrificação e diminuição do atrito entre as superfícies da tíbia e do fêmur e funcionam com fator limitante do movimento entre tíbia e fêmur. Muitos ligamentos cruzam a articulação do joelho de forma a garantir estabilidade à articulação. No caso da articulação tibiofemoral, são quatro os ligamentos a lhe conferirem estabilidade, controle e posicionamento adequado das estruturas: os ligamentos colaterais (medial e lateral) e os ligamentos cruzados (anterior e posterior). Esses ligamentos são de importância singular, pois atuam como transportadores passivos de carga e como uma forma de reserva para os músculos. Os ligamentos colaterais situam-se nas bordas da articulação. A posição de joelho estendido é a mais estável para ambos. O ligamento colateral medial (LCM) tem como função oferecer resistência às forças em valgo e às rotações (tanto interna como externa). Apresenta tensão em extensão e, com a flexão completa, reduz seu comprimento em até 17%. A 25º de flexão, o LCM é capaz de oferecer 78% 82 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 Unidade II da resistência total em valgo. Com ação oposta, o ligamento colateral lateral (LCL) é responsável pela resistência às forças em varo, não sendo influenciado pelas forças de rotação. Também apresenta tensão em posição de extensão e reduz em 25% seu comprimento na flexão completa. Com o joelho a 25º de flexão, oferece 69% da limitação às forças em varo. Os ligamentos cruzados localizam-se no interior da articulação e executam o controle dos movimentos anteroposteriores e rotacionais da articulação. O ligamento cruzado anterior (LCA) é o principal elemento de resistência e controle ao movimento de anteriorização da tíbia em relação ao fêmur, sendo responsável por cerca de 85% da limitação total nessa direção. Quando o joelho se movimenta da extensão para a posição de flexão a 90º, aumenta seu comprimento em 7%, mantendo esse mesmo comprimento até a flexão máxima. Em caso de rotação interna, o LCA movimenta-se anteriormente, aumentando ainda mais seu comprimento. No entanto, em rotação externa, o LCA não altera seu comprimento até 90º de flexão de joelho, momento a partir do qual pode alongar-se em 10% caso o movimento continue até a flexão completa. O ligamento cruzado posterior (LCP) tem como função limitar e controlar o movimento de posteriorização da tíbia em relação ao fêmur, respondendo por 95% da resistência exercida a esse movimento. Apresenta diminuição de seu comprimento e, consequentemente, afrouxamento de aproximadamente 10% a 30º de flexão, mantendo esse comprimento no restante da flexão de joelho. Com rotação interna da articulação em até 60º de flexão, o LCP apresenta comprimento aumentado em 5%, porém, caso a flexão continue, há uma redução de 5% a 10% em seu comprimento. Entretanto, não é afetado pela rotação externa da articulação. Apresenta máxima tensão no intervalo de 45º a 60º de flexão. Os ligamentos cruzados são envoltos por outra estrutura que desempenha importante papel na articulação: é a própria cápsula articular, que envolve, protege e oferece considerável área patelar. Assim como em outras articulações, inúmeras bursas estão presentes dentro e ao redor da cápsula a fim de auxiliar na redução do atrito entre as estruturas da articulação. A segunda articulação a compor o complexo do joelho é a articulação patelofemoral. Essa articulação ocorre entre a patela e o fêmur e é formada pela ligação da patela (osso sesamoide em formato de triângulo), embutida no tendão patelar (do músculo quadríceps femoral), com o sulcro troclear localizado entre os côndilos femorais. A superfície posterior da patela é coberta por cartilagem articular, o que garante redução do atrito entre a patela e o fêmur. A patela desempenha diversas funções biomecânicas, no entanto, a principal delas é aumentar a vantagem mecânica dos músculos extensores do joelho: a patela permite aumentar o ângulo de tração do tendão do músculo quadríceps femoral, alterando o braço de momento da articulação e elevando em cerca de 50% a vantagem mecânica desse músculo para a extensão de joelho. Além disso, a patela centraliza a tensão divergente exercida pelo quadríceps, sendo transmitida ao tendão patelar; amplia a área de contato entre o tendão patelar e o fêmur, reduzindo o estresse de contato nessa articulação; e ajuda a proteger a região anterior do joelho e outros tendões incidentes no local. A principal conexão entre a patela e a tuberosidade da tíbia é mediada pelo ligamento patelar. O ângulo Q (discutido de maneira bastante breve na abordagem da articulação do quadril) é o fator determinante do posicionamento dapatela e alinhamento do membro inferior no plano frontal. Reforçando a definição já apresentada previamente, o ângulo Q é o ângulo formado entre o traçado de uma linha imaginária desde a espinha ilíaca anterossuperior até o centro da patela e o traçado de uma segunda linha imaginária que vai do centro da patela à tuberosidade da tíbia. O valor de ângulo Q ideal, 83 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 BIOMECÂNICA de maneira a tornar a ação do músculo quadríceps femoral mais eficiente, seria por volta de 10º. Por representar as forças em valgo atuantes sobre o joelho, um ângulo Q excessivo pode acarretar severos problemas patelofemorais. Dessa forma, o ângulo Q é um importante indicador de risco de lesões no joelho. Valores muito pequenos de ângulo Q indicam o arqueamento do joelho, configurando-o em joelho varo. Já valores de ângulo Q acima de 17º são considerados excessivos e configuram o joelho valgo, conforme a figura a seguir: Joelho Varo Espinha ilíaca anterossuperior Ponto médio da patela Tuverosidade da tíbia Ângulo Q pequeno ou negativo Ângulo Q > 17º 8º Joelho Valgo Figura 33 – Ilustração do ângulo Q e de sua influência sobre a articulação do joelho Encerrando a formação do complexo do joelho, a última articulação a ser apresentada é a tibiofibular. Trata-se de uma articulação pequena, mas que permite articular a cabeça da fíbula com o côndilo tibial. Embora sua mobilidade no complexo do joelho seja limitada (está mais relacionada ao tornozelo e pé), a articulação tibiofibular exibe conexões com estruturas e tecidos moles que cruzam o joelho. Sendo assim, acaba por influenciar, ainda que de forma ligeira e sutil, a movimentação do joelho. Apresenta mobilidade articular anteroposterior, superior e inferior e rotacional. Dentre suas funções, destacamos a dissipação das forças de torção incidentes no joelho e aplicadas pelo movimento do pé, e controle das cargas tensivas aplicadas ao membro inferior. Devido à relação comprimento-tensão nos músculos isquiotibiais, a amplitude de flexão de joelho é influenciada pelo posicionamento da coxa. Dessa forma, o joelho é capaz de flexionar-se por, aproximadamente, 145º com o quadril em flexão e 120º com o quadril hiperestendido. A flexão de joelho é acompanhada de rotação interna da tíbia com relação ao fêmur. A rotação interna é oriunda de diferenças anatômicas entre os côndilos e só pode ocorrer com algum grau de flexão. Ou seja, não há rotação em posição de joelho estendido. Cerca de 6º a 30º de rotação interna são observados ao longo de 90º de flexão de joelho. A rotação tibial interna pode ocorrer também por causa dos movimentos de dorsiflexão e pronação do pé. 84 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 Unidade II Com a flexão do joelho há a movimentação da patela pela articulação. A patela chega a deslocar-se por uma distância superior ao dobro de seu comprimento quando o joelho é flexionado. O movimento da patela é influenciado principalmente por dois fatores: pela superfície articular e pelo comprimento do tendão patelar, havendo mínima influência do músculo quadríceps femoral. Em flexão, os movimentos lineares e translacionais da patela são, predominantemente, posteriores e inferiores; contudo, a patela também é capaz de realizar alguns poucos movimentos angulares. A patela ainda pode realizar flexão, abdução e rotação externa durante a flexão de joelho. A extensão de joelho apresenta comportamento oposto ao observado na flexão. A amplitude máxima de extensão de joelho é cerca de 10º de hiperextensão. Concomitantemente à extensão, há a realização de rotação externa pela articulação. Essa rotação externa culmina na ação de travamento no fim da extensão, denominada mecanismo de aparafusamento. Esse mecanismo representa o ponto no qual côndilos medial e lateral são travados, gerando a posição de máximo contato para a articulação do joelho. Tal fenômeno ocorre durante os últimos 20º de extensão, movimentando lateralmente a tuberosidade da tíbia e promovendo um desvio medial no joelho. O LCA parece ser o principal controlador desse mecanismo, já que lesões nesse ligamento comprometem o mecanismo de aparafusamento ao permitirem a anteriorização da tíbia, ao passo que lesões e perda de LCP parecem não afetar o mecanismo. A tíbia é capaz de realizar rotação externa com amplitude de 45º. Esse movimento geralmente acompanha as ações de flexão plantar e supinação do pé. O retorno da patela à sua posição inicial de repouso ocorre por intermédio da extensão de joelho. Com isso, o movimento linear é invertido com relação à flexão, com a patela se movimento agora anteriormente e superiormente. Neste caso, os movimentos angulares da patela são a extensão, a adução e a rotação interna. Como apontado, diversos músculos cruzam a articulação do joelho, conferindo-lhe mobilidade e capacidade de absorver carga. Os principais músculos atuantes na articulação do joelho e envolvidos nos movimentos realizados por ele são apresentados no quadro a seguir: Quadro 9 – Principais músculos do complexo do joelho e suas respectivas ações Músculo Localização Ação Gastrocnêmio lateral Posterior à perna/superficial Flexão do joelho Gastrocnêmico medial Posterior à perna/superficial Flexão do joelho Co m pl ex o do qu ad ríc ep s Vasto lateral Anterior à coxa/superficial Extensão do joelho Vasto medial Anterior à coxa/superficial Extensão do joelho Vasto intermédio Anterior à coxa/profundo Extensão do joelho Reto femoral Anterior à coxa/superficial Extensão do joelho Co m pl ex o is qu io tib ia is Bíceps femoral Posterior à coxa/superficial Flexão do joelho Semitendíneo Posterior à coxa/superficial Flexão do joelho Semimembranáceo Posterior à coxa/superficial Flexão do joelho 85 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 BIOMECÂNICA A extensão de joelho é uma ação articular com grande contribuição para a geração de força e potência pelos membros inferiores, o que acarreta grande exigência dos músculos extensores. Adicionalmente, o esforço da musculatura extensora é fundamentalmente utilizado para a realização de ações excêntricas que visam à desaceleração dos segmentos inferiores e à absorção de choque. Não à toa, o principal extensor de joelho, o músculo quadríceps femoral, é uma das musculaturas mais fortes do corpo, chegando a ser até três vezes mais forte que seu antagonista, o músculo isquiotibiais. O quadríceps femoral é um complexo muscular formado por quatro músculos: reto femoral, vasto lateral, vasto intermédio e vasto medial. Além de ser um potente extensor de joelho, o quadríceps femoral contribui para a estabilidade da patela por intermédio de seu tendão patelar. Por outro lado, é o antagonista do LCA. Dos quatro músculos formadores do quadríceps femoral, o maior e mais forte é o vasto lateral, cuja característica é a aplicação de força lateral à patela. O único músculo biarticular desse complexo é o reto femoral, o que o leva a ser significante para a extensão de joelho apenas se estiver em posição favorável, o que será determinado pela posição do quadril. Sua ação como extensor de joelho é facilitada quando o quadril está estendido. A ativação dos flexores do joelho está relacionada à realização da flexão em tarefas motoras realizadas em cadeia cinética aberta, ou seja, sem o apoio dos pés no solo, ou ao controle da extensão de joelho em movimentos rápidos, atuando de forma excêntrica. O principal flexor de joelho é o músculo isquiotibiais, formado pelos músculos semimembranáceo, semitendíneoe bíceps femoral. Por possuir músculos biarticulares, a eficiência e amplitude da ação do músculo isquitiobiais também é dependente do posicionamento do quadril. Como flexores, os músculos isquiotibiais geram a maior força a partir de uma posição de 90º de flexão. A capacidade de produzir força flexora diminui quanto maior for a extensão. Em caráter de exemplo, a força de flexão apresenta-se reduzida em 50% na posição de completa extensão em comparação à posição de 90º de flexão. O bíceps femoral atua ainda na geração de rotação externa da perna, no fornecimento de apoio lateral à articulação e auxilia o LCA na estabilização do joelho. O músculo semimembranáceo reforça a cápsula posterior e medial, trabalhando em conjunto com o LCA para impedir o avanço anterior da tíbia; adicionalmente, é responsável por tracionar posteriormente o menisco e produzir rotação interna na articulação. O músculo semitendíneo, além de ser um importante flexor (contribui com 47% da força flexora), contribui para a realização de rotação interna e atua tanto com o LCA como com o LCM a fim de garantir estabilidade à articulação do joelho. A eficiência dos músculos isquiotibiais como flexores de joelho é aumentada à medida que uma posição de flexão de quadril é adotada. Isso porque deixa esse grupamento muscular numa situação favorável na relação comprimento-tensão do músculo. De maneira secundária, o músculo gastrocnêmio contribui também com a flexão do joelho, já que é biarticular. Sua contribuição é potencializada quando o pé se apresenta em posição neutra ou em dorsiflexão. O fato de a articulação do joelho localizar-se entre as duas alavancas mais longas do corpo (o fêmur e a tíbia) lhe garante grande potencial para desenvolvimento de torque, bem como vocação para sustentação do peso corporal e suporte de carga. Em geral, os músculos extensores do joelho possuem maior capacidade de produzir força que os flexores durante toda a amplitude de movimento, atingindo seu pico a 50-70º de flexão de joelho. A posição em que se atinge a força extensora máxima varia com a velocidade do movimento. Em 86 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 Unidade II contrapartida, as maiores forças de flexão de joelho são atingidas nos primeiros 20º a 30º de flexão, a partir da posição de extensão, sendo também influenciadas pela velocidade de movimento. A realização da flexão de joelho com o quadril flexionado coloca o músculo isquiotibiail em boa situação na relação comprimento-tensão, permitindo aumentar a capacidade de produzir torque flexor. A relação quadríceps femoral/isquiotibiais apresenta valores médios pouco abaixo de 1 (aproximadamente 0,7). Valores muito menores que esse apontam para o desequilíbrio muscular e de forças entre a musculatura extensora e flexora de joelho, indicando alto risco de lesões. Os torques rotacionais (interno e externo) são maiores com o joelho a 90º de flexão, já que nessa posição uma maior amplitude de rotação pode ser alcançada. A capacidade de gerar torque de rotação interna é maior que de rotação externa. A maior capacidade de produzir força de rotação interna ocorre entre 45º e 90º de flexão de joelhos. Tal capacidade ainda é influenciada pela posição do quadril, com a força máxima de rotação interna de joelho sendo atingida com o quadril a 120º de flexão. Como já apontado previamente, o joelho é a estrutura do membro inferior mais vocacionada à sustentação do peso corporal e à absorção de cargas mecânicas. Ela é responsável por sustentar tanto as cargas de compressão geradas pela gravidade como as forças de cisalhamento criadas em diferentes tarefas e as forças de tensão produzidas pelos músculos em suas ações. Para ter-se uma dimensão das cargas incidentes sobre o joelho, essa articulação chega a suportar cargas tensivas e compressivas durante a marcha equivalentes a três vezes o peso corporal. Ao subir uma escada ou realizar um agachamento, o valor dessa carga pode subir para quatro a cinco vezes o peso corporal. A força compressiva sobre o joelho é que predomina quando essa articulação está totalmente estendida. Já a força de cisalhamento é máxima nos últimos graus de extensão de joelho, tendo sua direção alterada de acordo com a quantidade de flexão na articulação. Essa alteração da direção da força de cisalhamento ocorre entre cerca de 50º e 90º de flexão. A maior sobrecarga sobre o LCA ocorre nos últimos 30º de extensão de joelho. Nesse momento, o LCA é responsável por controlar e absorver 86% da força de cisalhamento anterior. Os meniscos também contribuem para a absorção das cargas incidentes no joelho, suportando cerca de 45% da carga total. Apesar da considerável sobrecarga compressiva quando o joelho está em posição estendida, a área de contato entre as estruturas que compõem a articulação é maior, o que reduz a pressão. Com os joelhos estendidos há um aumento de 50% na área de contato em comparação à posição de 90º de flexão de joelho, o que se traduz em cargas de pressão 25% menores. Mais especificamente com relação à articulação patelofemoral, sabe-se que as forças compressivas sobre essa estrutura durante a marcha variam entre 0,5 e 1,5 vezes o peso corporal, aumentando para mais de três vezes, ou até para oito vezes ao subir uma escada. A articulação patelofemoral tem relevante participação na absorção de forças compressivas do fêmur, transformando-as em forças tensivas no tendão do quadríceps femoral e no ligamento patelar. A força compressiva patelofemoral aumenta à medida que a velocidade de execução da tarefa e/ou a flexão de joelho aumenta. Aos 50º de flexão de joelho é atingida a máxima força de compressão patelofemoral. Contudo, entre 60º e 90º de flexão de joelho se dá a maior área de contato com a patela. Dessa forma, embora haja a incidência de altas cargas compressivas, a maior área de contato com a patela permite manter reduzidos valores de pressão 87 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 BIOMECÂNICA na articulação. Tais valores apresentam-se como importantes valores de referência para manipulação da sobrecarga imposta aos alunos e atletas, permitindo controlar a amplitude de tarefas motoras (por exemplo, o agachamento) de acordo com a carga e estresse que se quer proporcionar. Altas forças de compressão patelofemoral estão geralmente relacionadas a maiores ângulos de flexão de joelho, como as observadas ao descer escadas (4.000 N), ao chutar uma bola (6.800 N), ao realizar uma corrida leve (5.000 N) ou ao realizar um agachamento paralelo (14.900 N). O joelho é uma articulação ativa e essencial na grande maioria dos movimentos e gestos esportivos realizados pelos membros inferiores. Para ilustrar sua contribuição na realização de movimentos e habilidades motoras, traremos a análise biomecânica de sua atuação durante a locomoção e na ação de levantar um peso do solo. Durante movimentos de locomoção, como marcha, corrida e saltos, o joelho e a musculatura ligada a ele serão de extrema importância para a absorção de choques mecânicos, estabilização do corpo e membros inferiores, e para a realização da fase propulsiva desses movimentos. Analisando-se o mais simples dos movimentos de locomoção, a marcha, é possível observar grande esforço excêntrico do músculo quadríceps femoral e da articulação do joelho no contato do pé com o solo e na parte inicial da fase de apoio a fim de desacelerar e controlar a flexão de joelho que ocorre nessa fase do movimento, assim como absorver e controlar a carga imposta ao joelho pelo peso corporal e força de reação do solo. Esse início de movimento da marcha é caracterizado por uma situação de co-contração dos músculos quadríceps femoral e isquiotibiais: enquantoo primeiro está atuando no joelho, o segundo atua na articulação do quadril. A atividade dos isquiotibiais reduz somente a partir do momento em que o pé está totalmente apoiado no chão, ao passo que o esforço do quadríceps femoral sofre redução quando 30% da fase de apoio é atingida. Na fase propulsiva da marcha, o músculo quadríceps femoral volta a trabalhar realizando a extensão de joelho, que viabiliza a propulsão. Isso ocorre em torno de 85% da fase de apoio, já em seu trecho final. Nesse momento, os isquiotibiais apresentam comportamento semelhante, porém atuando novamente no quadril. Na fase de balanço, o quadríceps femoral atua auxiliando na extensão de joelho a fim de trazer a perna a frente a posicioná-la para o próximo apoio. Os isquiotibiais são ativos no joelho no trecho final dessa fase, atuando de forma excêntrica exatamente para o controle da extensão de joelho e desacelerar a perna de forma que ela fique adequadamente posicionada para o apoio seguinte. Já em uma tarefa com posicionamento estático do corpo, como o levantamento de peso do chão, o joelho apresenta comportamento de trabalho um pouco diferente, com a contribuição dos músculos envolvidos nessa articulação se alterando de acordo com as alterações da postura do corpo para realização da tarefa. Se o levantamento de um peso que está no chão for executado a partir da flexão e extensão do tronco mantendo-se joelhos estendidos (como ocorre no exercício stiff, por exemplo), a sobrecarga sobre os joelhos e os músculos que o envolvem é bastante reduzida. O esforço para a realização da tarefa fica fundamentalmente concentrado nas articulações do tronco e quadril, agindo com grande amplitude de movimento e exigindo alto trabalho muscular nessa região. A contribuição do músculo quadríceps femoral é bastante pequena. Por outro lado, devido a sua característica biarticular, os isquiotibiais contribuem nesse movimento, porém, na articulação do quadril, auxiliando na produção de torque extensor. No entanto, se o levantamento do peso for viabilizado a partir da flexão e extensão do joelho em grande amplitude com flexão e extensão de quadril e coluna em menor amplitude 88 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 Unidade II (situação semelhante à encontrada em exercícios/esportes como agachamento, levantamento terra e levantamento de peso olímpico), a ativação da musculatura dos membros inferior e que atuam no joelho aumenta consideravelmente. A ativação do quadríceps femoral ocorre de forma excêntrica na descida para pegar o peso, controlando a flexão de joelhos, e de forma concêntrica na subida, realizando a extensão de joelhos. Já a atuação dos isquiotibiais altera-se muito pouco, reduzindo ligeiramente sua intensidade de ativação, mas ainda atuando basicamente no quadril. Seu esforço ocorre de forma excêntrica na descida, controlando a flexão de quadril, e de forma concêntrica na subida, auxiliando o glúteo máximo na extensão do quadril. Por causa de suas características estruturais, anatômicas e funcionais, a articulação do joelho é a que apresenta maior incidência de lesões, sendo responsável por até 70% das lesões registradas. Do total de lesões observadas no joelho, 97% delas estão relacionadas à prática esportiva e/ou de atividades vigorosas, sendo 22% delas resultado de contato. As causas das lesões no joelho podem assumir diversas naturezas além do contato (trauma) e esforços repetitivos, como assimetrias, fraqueza ou desequilíbrio muscular e problemas no alinhamento dos membros inferiores. Desvios em valgo ou varo, diferença no comprimento dos membros e desequilíbrio de forças entre agonistas e antagonistas do movimento são alguns exemplos. As lesões mais frequentes na articulação do joelho são: as distensões musculares; as lesões ligamentares, especialmente no ligamento cruzado anterior; as lesões meniscais; a síndrome de dor patelofemoral e a condromalácia patelar. As lesões oriundas de esforço repetitivo estão relacionadas especialmente à corrida e a esportes envolvendo alta frequência de saltos (como o voleibol). Os traumas são as principais causas de lesões nos ligamentos e geralmente ocorrem devido à aplicação de forças de torção ao membro, oriundas de movimentos de rotação. De forma simples, todo giro realizado sobre um membro que esteja participando da sustentação da carga torna o joelho vulnerável a lesões ligamentares. As lesões de ligamento cruzado anterior são as mais frequentes lesões ligamentares na articulação do joelho. Seu mecanismo de lesão se relaciona à aplicação de uma força de torção enquanto o joelho é flexionado, colocando-o em rotação interna e em posição de valgo durante a sustentação do peso. Outro mecanismo ocorre a partir da rotação do fêmur sobre a perna fixa, com o joelho próximo à extensão máxima. Embora seja bastante comum em atletas e praticantes de esportes, inclusive de contato, 70% das lesões de LCA ocorrem sem qualquer contato ou trauma. A ruptura ou perda do LCA acarreta frouxidão em valgo e instabilidade no joelho. Tal contexto implicará maior sobrecarga sobre as outras estruturas estabilizadoras do joelho, como cápsula articular, ligamentos colaterais e músculos. As lesões no ligamento cruzado posterior são menos comuns e resultam basicamente da hiperflexão de joelho. Forças aplicadas na região anterior da articulação flexionada ou hiperestendida, ou movimento de rotação externa com a articulação flexionada e suportando carga (ou seja, com a perna fixa) também se caracterizam como mecanismos de lesão do LCP. Lesões no LCP são geralmente oriundas de traumas e ainda contribuem para a instabilidade na articulação do joelho. Nos ligamentos colaterais, o principal mecanismo de lesão é o recebimento de golpes laterais ou mediais ao joelho, contribuindo novamente para a instabilidade da articulação. 89 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 BIOMECÂNICA Laceração ou ruptura no menisco é a forma de lesão mais comum no joelho, sendo o dano no menisco medial dez vezes mais frequente que no menisco lateral. Os danos aos meniscos ocorrem de forma semelhante às lesões ligamentares, por intermédio de uma compressão associada a uma força de torção sobre a perna fixa, em posição de sustentação da carga. Outra possibilidade é a ruptura durante ações de extensão de joelho com alta carga/intensidade, como em um chute. A ruptura do menisco por compressão resulta do desgaste entre o fêmur e a tíbia devido ao atrito, e da laceração do menisco; já a ruptura em movimentos rápidos de extensão é oriunda do aprisionamento e laceração do menisco no deslocamento rápido do fêmur sobre a tíbia. Nos joelhos com ruptura de LCA, a distribuição das cargas é afetada de modo que a força atuante sobre o menisco medial seja duplicada, resultando em maior incidência de lacerações. As distensões musculares no quadríceps femoral e isquiotibiais também são comuns. No quadríceps femoral, as distensões ocorrem geralmente devido às demandas e sobrecargas impostas ao reto femoral, já que esse músculo é biarticular. Já as distensões nos isquiotibiais são oriundas de reduzida flexibilidade ou do desequilíbrio muscular entre esse músculo e o quadríceps (sendo esse último muito mais forte). Como principais lesões por uso repetitivo da articulação do joelho surgem a síndrome da dor patelofemoral e a condromalácia patelar. A síndrome da dor patelofemoral é a dor localizada no compartimento anterior do joelho, em torno da patela, geralmente durante e após o exercício físico, e particularmente associada a tarefas que envolvem repetidas flexões de joelho. Por ser mais comum entre mulheres que em homens, inúmeras causas possíveis foram atribuídas a essa síndrome,incluindo alinhamentos anatômicos inadequados (especialmente alinhamento em valgo), desequilíbrios de força e ativação entre os músculos vasto medial e vasto lateral e anterversão femoral no membro. O principal fator anatômico agregado a um alinhamento inadequado é o ângulo Q. Um ângulo Q excessivo origina um alinhamento em valgo que resulta em maior tensão sobre a patela. Além disso, assimetria no comprimento dos membros e tendão patelar excessivamente longo ou excessivamente curto também são desvios anatômicos que podem originar a síndrome da dor patelofemoral. Sobre o aspecto muscular, a fraqueza do vasto medial em relação ao vasto lateral ocasiona um desvio lateral da patela, particularmente no início da amplitude de flexão de joelho, o que também é apontado como um relevante fator no acomentimento dessa síndrome. Contudo, há a possibilidade da síndrome da dor patelofemoral estar relacionada à destruição cartilaginosa, especialmente daquela localizada embaixo da patela. Essa condição é denominada condromalácia patelar. 5.2.3 Articulação do tornozelo e segmento pé A estrutura anatômica formada pelo tornozelo e pé encerra a complexa composição da extremidade inferior do aparelho locomotor humano. São cerca de 26 ossos, 30 articulações, mais de 100 ligamentos e 30 músculos atuando, de forma harmoniosa, nesse conjunto articular para que os movimentos possam ser executados. Embora sejam formados por segmentos e articulações menores, e localizarem-se na extremidade distal, o tornozelo e o pé contribuem significativamente para a funcionalidade de todo o membro inferior. Sua relevância está presente em inúmeras tarefas, com destaque para o 90 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 Unidade II suporte de carga e equilíbrio, tanto em posições estáticas quanto em tarefas dinâmicas, como a locomoção. Os movimentos do tornozelo e pé ocorrem, majoritariamente, em três articulações sinoviais: talocrural, subtalar e mediotarsal. A articulação talocrural, ou articulação do tornozelo propriamente dita, é a articulação proximal do pé, formada em dobradiça (gínglimo) pela união da tíbia e fíbula (articulação tibiofibular distal) e pela conexão da tíbia com o tálus (articulação tibiotalar) (conforme a figura a seguir). A tíbia e fíbula formam uma depressão profunda para a tróclea do tálus, criando um encaixe bastante ajustado entre essas estruturas. A posição de máximo contato para o tornozelo é a dorsiflexão. A articulação talocrural possui grande suporte de ligamentar em ambos os lados (medial e lateral). O papel dessa articulação é fornecer mais estabilidade que mobilidade aos membros inferiores. Lateral Medial Fíbula Fíbula Tíbia Talo Calcâneo Tíbia Membrana interóssea Articulação tibiofibular distal Articulação tibiotalar Ligamento deltoide Tálus Calcâneo Articulação tibiofibular Ligamento talofibular ant. Ligamento calcaneofibular Figura 34 – Figura ilustrativa da articulação talocrural (mais comumente denominada tornozelo) O tornozelo é capaz de manter-se estável quando grandes cargas são recebidas pelo membro, esteja ele parado ou em movimento. Em contrapartida, caso alguma das estruturas que o compõem ou lhe dão apoio vier a se lesionar, há um grande aumento da instabilidade na região. Os ligamentos que formam o tornozelo têm a finalidade de limitar movimentos como a flexão plantar, dorsiflexão, movimento anterior e posterior do pé, a inclinação do tálus, a inversão e a eversão. A estabilidade do tornozelo é determinada pela orientação dos ligamentos, tipo de carga imposta e posição do tornozelo no momento do recebimento da carga. É importante observar que, devido à sua conformação anatômica, a articulação talocrural apresenta maiores chances de lesões em sua porção lateral, com incidência de 85% das entorses de tornozelo ocorrendo nessa região (entorses por inversão). O tornozelo apresenta movimentos em um único plano (sagital) a partir de um eixo de rotação médio-lateral que cruza os dois maléolos. Os movimentos realizados pelo tornozelo são a dorsiflexão (quando o pé se movimenta na direção da perna ou a perna se movimenta em direção ao pé) e flexão plantar (quando o pé se afasta da perna ou a perna se afasta do pé). Veja a figura: 91 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 BIOMECÂNICA FP e DF com o pé fixado FP e DF com a tíbia fixada DF DF EixoFP FP Figura 35 – Movimentos realizados pela articulação do tornozelo. FP = flexão plantar, DF = dorsiflexão A amplitude média do movimento de dorsiflexão é de 20º, sendo limitada pelo contato ósseo entre tálus e tíbia, pela cápsula articular, pelos ligamentos envolvidos na articulação e pelos músculos antagonistas ao movimento (flexores plantares). Para a flexão plantar, a amplitude média de movimento está em torno de 50º, tendo as mesmas razões da dorsiflexão como limitantes do movimento, sendo a musculatura antagonista formada pelos dorsiflexores. Na marcha, por exemplo, os movimentos de flexão plantar e dorsiflexão acontecem em uma amplitude de movimento entre 20º e 40º. A segunda articulação que compõe o complexo articular do tornozelo e pé é a articulação subtalar, também conhecida como talocalcânea (conforme a figura a seguir). Essa denominação ocorre porque a articulação subtalar localiza-se embaixo do tálus, consistindo na conexão dessa estrutura com o calcâneo. O tálus e o calcâneo formam uma dupla de osso de grande importância, pois são os maiores ossos do pé e têm grande contribuição na sustentação do peso corporal e das cargas recebidas. A articulação subtalar recebe o apoio de cinco pequenos, mas fortes, ligamentos que são responsáveis por resistir às intensas cargas e pressões impostas pelos movimentos ao membro inferior. Os movimentos dessa articulação ocorrem através de um eixo oblíquo ao longo dos planos sagital, frontal e transverso, garantindo a capacidade de realização de movimentos em triplanares (combinação de ações executadas em três diferentes planos). Os movimentos triplanares realizados pela articulação subtalar são a pronação e a supinação (veja a figura). A pronação consiste na combinação dos movimentos de eversão, abdução e dorsiflexão do calcâneo (ou flexão plantar do tálus). A eversão é a ação articular que ocorre no plano frontal na qual a borda lateral do pé se move na direção da lateral da perna quando não há sustentação de peso (ou vice-versa, quando há sustentação de peso). A abdução é a movimentação no plano transverso na qual os dedos do pé ficam apontados para fora (lateral) do corpo, e que pode ocorrer por intermédio de duas estratégias: ou a partir de rotação externa do pé em relação à perna e com movimento lateral do calcâneo (em situações sem sustentação de peso), ou através de rotação interna da perna com relação ao calcâneo e movimento medial do tálus (em situações com sustentação de peso). No plano sagital ocorre a dorsiflexão do calcâneo, que representa a movimentação do calcâneo superiormente ao tálus em situação em que não há sustentação do peso, ou na movimentação do tálus por baixo do calcâneo em casos com sustentação do peso. 92 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 Unidade II Em contrapartida, a supinação caracteriza-se exatamente pelo contexto oposto ao da pronação, sendo a combinação dos movimentos de inversão, adução e flexão plantar do calcâneo (ou dorsiflexão do tálus). A inversão ocorre no plano frontal quando o peso do corpo se concentra na porção lateral do pé. A adução ocorre no plano transverso a partir do direcionamento dos dedos do pé paraa parte interna (medial) do corpo pela rotação interna do pé em relação à perna e com movimento medial do calcâneo (em situações sem sustentação de peso) ou através de rotação externa da perna com relação ao calcâneo e movimento lateral do tálus (em situações com sustentação de peso). A flexão plantar do calcâneo, que ocorre no plano sagital, consiste na movimentação do distal do calcâneo (inferiormente ao tálus) em situação em que não há sustentação do peso, ou na movimentação do tálus proximalmente em casos com sustentação do peso. Inversão Adução Adução Inversão Eversão Abdução Abdução Eversão Pronação Posição neutra Supinação Figura 36 – Movimentos realizados pelo pé através da articulação subtalar As principais funções da articulação subtalar, e seus respectivos movimentos, são absorver as forças de rotação impostas ao membro inferior, especialmente em tarefas de locomoção, e absorver choque mecânico. A amplitude de movimento dinâmica da pronação e supinação é, em média, de 20º a 62º com a supinação medindo aproximadamente o dobro da amplitude de pronação. Essa articulação e os movimentos realizados por ela também são muito relevantes devido ao fato de que diversas evidências apontam o excesso nas amplitudes de pronação e supinação como causa de diversas dores e lesões, não somente no tornozelo, como ao longo de todo o membro inferior e coluna. 93 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 BIOMECÂNICA A terceira articulação principal do tornozelo e pé é a mediotarsal. Essa articulação é formada pela combinação de outras duas articulações menores: a articulação calcaneocuboidea (região lateral do pé) e a articulação talonavicular (região medial do pé). Juntas elas formam uma articulação em formato de S e com dois eixos (longitudinal e oblíquo), cujos movimentos serão determinados pela posição da articulação subtalar. Em pronação, os dois eixos da articulação mediotarsal se posicionam em paralelo, destravando a articulação e garantindo hipermobilidade ao pé, capacidade bastante útil na absorção de choque mecânico e na adaptação a diferentes tipos de superfície. Em supinação, os dois eixos entram em convergência, travando a articulação e garantindo-lhe rigidez necessária para aplicação eficiente de força, como ocorre na fase propulsiva da locomoção. Como dito anteriormente, o complexo articular do tornozelo e pé possui outras articulações em sua formação, cuja contribuição para o movimento é secundária. Para conhecimento, são elas: • as articulações intertarsais, presentes no mediopé e que realizam a conexão entre os ossos do tarso, permitindo pequenos graus de deslizamento e rotação no pé, bem como alterações nas formas dos arcos plantares; • as articulações tarsometatársicas e intermetatársicas, localizadas no antepé e que ligam os ossos do tarso aos metatarsos e os metatarsos entre si, assegurando a capacidade de executar pequenos movimentos deslizantes, flexibilidade no pé, manutenção ou alterações na forma dos arcos plantares e mobilidade (capacidade de efetuar movimentos de adução, abdução, flexão e extensão no pé/dedos); • as articulações metatarsofalângicas e interfalângicas, localizadas nos dedos do pé e responsáveis por conectar os metatarsos às falanges e as falanges entre si, garantindo também mobilidade aos pés (capacidade de realizar movimentos de adução, abdução, flexão e extensão dedos). Têm boa relevância funcional, pois facilitam a transferência de peso pelos membros inferiores e ajudam a preservar a estabilidade em situações estáticas e de sustentação de peso. Complementando a estrutura e funcionalidade do pé, os tarsos e metatarsos formam três arcos na planta do pé que possuem grande importância para as características biomecânicas dos membros inferiores (veja a figura a seguir). Dois arcos avançam longitudinalmente ao pé, desde o calcâneo até os ossos do tarso, e, devido às suas respectivas localizações, são denominados arco longitudinal medial e lateral. Além disso, há o arco transverso, que avança transversalmente à planta do pé, formando-se nos tarsos e nas bases dos metatarsos. A relevância desses arcos reside no fato de formarem um importante e eficiente sistema elástico para absorção de choque mecânicos no pé. O arco transverso atua aplainando-se para a sustentação do peso e absorção de choque mecânico, suportando carga equivalente a até quatro vezes o peso do corpo. O arco longitudinal medial é o mais dinâmico dos três; adicionalmente, apresenta maior flexibilidade que o arco lateral e contribui significativamente na absorção de cargas no contato com o solo. O arco longitudinal medial é o parâmetro utilizado como referência para classificar os pés em normal, cavo (ou de arco alto) e plano (ou chato). 94 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 Unidade II Arco transverso Arco longitudinal medial Arco longitudinal lateral Figura 37 – Figura ilustrativa dos arcos plantares Devido a sua complexidade estrutural e anatômica, a funcionalidade do pé pode ser alterada consideravelmente por qualquer variação no alinhamento do membro inferior ou como resultado de movimentos anormais nesse segmento. Alinhamentos em varo são associados a aumentos na pronação subtalar. Valores de ângulo Q maior que 20º, varo tibial acima de 5º, varo do retropé superior a 2º e varo do antepé acima de 3º já são suficientes para aumentar significativamente a amplitude de pronação. São 23 os músculos envolvidos no tornozelo e pé, sendo 12 deles extrínsecos (origem fora do pé) e 11 intrínsecos. Todos os músculos extrínsecos atuam por intermédio das articulações subtalar e médio tarsal, exceto os músculos que compõem o tríceps sural. O quadro a seguir introduz os músculos de maior contribuição para os movimentos do tornozelo e pé. O sistema muscular atuante no tornozelo e pé tem grande importância na estabilização da articulação, na absorção de impactos de alta intensidade e no acúmulo e restituição de energia elástica, este último sendo potencializado pela ajuda dos ligamentos. Quadro 10 – Principais músculos do complexo do tornozelo e pé Músculo Localização Ação Tibial anterior Anterior à perna/superficial Flexão (dorsiflexão) e inversão do tornozelo Fibular longo Lateral à perna/superficial Extensão (flexão plantar) e eversão do tornozelo Fibular curto Lateral à perna/profundo Extensão (flexão plantar) e eversão do tornozelo Co m pl ex o tr íc ep s su ra l Gastrocnêmio lateral Posterior à perna/superficial Extensão (flexão plantar) do tornozelo Gastrocnêmico medial Posterior à perna/superficial Extensão (flexão plantar) do tornozelo Sóleo Posterior à perna/profundo Extensão (flexão plantar) do tornozelo Os músculos que realizam a flexão plantar atuam de forma concêntrica em tarefas que envolvem propulsão dos membros inferiores e de forma excêntrica no controle de movimentos de dorisiflexão realizados com rapidez e para manter o tornozelo estável durante o movimento. A flexão plantar é uma ação poderosa, viabilizada por músculos fortes e pela vantagem mecânica existente nessa articulação. A 95 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 BIOMECÂNICA maior parte da força de flexão plantar é produzida pelo complexo muscular tríceps sural, composto de músculos gastrocnêmio lateral, gastrocnêmio medial e sóleo e localizado na parte posterior da perna. Devido ao fato de o músculo gastrocnêmio ser biarticular (atuando também como flexor de joelho), sua atuação como flexor plantar é mais efetiva com o joelho estendido e quadríceps femoral ativo. Na posição em pé, omúsculo sóleo apresenta-se como o flexor plantar preponderante no movimento. Os outros músculos flexores plantares são responsáveis por, apenas, 7% da força de flexão plantar restante. Desses músculos, o fibular longo e o fibular curto são os que possuem maior contribuição; com mínima contribuição, é possível apontar ainda os músculos plantar, flexor longo do hálux, flexor longo dos dedos e tibial posterior. A dorsiflexão tem como principais funções a desaceleração do segmento, a estabilização do tornozelo e o ajuste postural da articulação a fim de viabilizar a tarefa a ser executada. O principal e mais poderoso músculo dorsiflexor é o tibial anterior. Por localizar-se na região anterior da perna e por exibir tendão afastado da articulação, apresenta braço de alavanca potente bastante significativo, o que significa um ganho mecânico importante na capacidade de produzir força. Com contribuições menores, os músculos extensor longo dos dedos, extensor longo do hálux e fibular terceiro auxiliam na geração de força dorsiflexora. Os músculos fibulares (curto, longo e terceiro) são os responsáveis pela pronação na articulação. São músculos que se situam na porção lateral da perna. O enfraquecimento desses músculos leva à hipermobilidade na articulação. Os músculos cuja função principal é a supinação ficam localizados na porção medial da perna e têm como seus principais representantes o tibial anterior, o tibial posterior, os flexores dos dedos, o flexor longo dos dedos e o flexor longo do hálux. Em conjunto, os músculos intrínsecos do pé funcionam como importantes estabilizadores do pé e têm papel essencial na sustentação do peso corporal e de cargas externas. Embora o complexo articular do tornozelo e pé seja capaz de realizar mais de um movimento, o mais forte e potente deles é a flexão plantar. Os principais fatores que contribuem para isso são a maior massa muscular do tríceps sural em comparação aos outros músculos e a vantagem mecânica que a articulação apresenta para esse movimento, havendo geralmente maior braço de alavanca potente que resistente no tornozelo. O maior torque flexor do tornozelo ocorre a partir de uma posição de leve dorsiflexão. Por exemplo: um ângulo inicial de 105º de dorsiflexão permitirá um aumento de 16% da força de flexão plantar em relação ao movimento iniciado a partir de uma posição neutra (90º). Da mesma forma, quando a flexão plantar tem seu início a 75º e 60º, a força flexora fica reduzida em 27% e 42%, respectivamente, em comparação com a força medida a 90º. Outro fato que pode contribuir para o aumento da capacidade de produzir força na flexão plantar é o posicionamento do joelho, no caso da flexão plantar ser realizada com o joelho estendido (comprimento muscular do gastrocnêmio favorável). A dorsiflexão não é capaz de produzir grande força devido à massa muscular reduzida dos músculos dorsiflexores, sendo capaz de gerar apenas 25% da força gerada pelos flexores plantares. No entanto, exerce forte e importante trabalho excêntrico na desaceleração do pé durante a locomoção. Iniciar a dorsiflexão a partir de uma posição de ligeira flexão plantar favorece a produção de força nesse movimento. 96 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 Unidade II A articulação do tornozelo e pé está intimamente ligada aos movimentos de locomoção e de sustentação do peso corporal. Sendo assim, é uma articulação constantemente submetida a forças de compressão e cisalhamento, especialmente na locomoção. As forças de impacto impostas ao corpo durante a locomoção variam de 1,5 a 2,5 vezes o peso corporal na fase de apoio, e de 2,5 a 5 vezes o peso corporal na fase propulsiva, o que resulta em grande estresse na articulação do tornozelo e pé. Por sua vez, a força de cisalhamento sobre essa articulação pode variar entre 0,45 e 0,80 vezes o peso corporal. Durante a corrida, os picos de força sobre o tornozelo podem variar de 9 a 13 vezes o peso corporal sobre o tornozelo e de 5 a 10 vezes o peso corporal no tendão do calcâneo. A articulação subtalar suporta forças equivalentes a 2,4 vezes o peso corporal, enquanto a mediotarsal recebe o equivalente a 2,8 vezes o peso corporal. As estruturas do tornozelo e pé estão anatomicamente interligadas, de forma que a carga se distribui uniformemente sobre o pé durante a sustentação do peso corporal e cargas externas. Cerca de 50% do peso corporal se distribuem através da articulação subtalar para o calcâneo, ao passo que os 50% restantes são transmitidos pelas cabeças dos metatarsos. A cabeça do primeiro metatarso é capaz de sustentar o dobro da carga sustentada pela cabeça de cada um dos outros metatarsos. Um fator que exerce influência sobre essa carga é a arquitetura do pé: um pé plano tende a reduzir a carga sobre o antepé, enquanto um pé cavo tende a aumentar significativamente a sobrecarga sobre o antepé. Toda tarefa realizada com os pés no solo solicita considerável esforço da articulação do tornozelo e pé, mesmo que seja apenas para a sustentação do corpo. Contudo, a locomoção é uma das habilidades que mais requerem o trabalho do tornozelo. Durante a locomoção há um trabalho significativo dessa articulação a fim de controlar a descida do pé e estabilizar o tornozelo na fase de apoio, e produção de parte considerável da força propulsiva. O esforço inicial, no contato do calcâneo com o solo, é realizado a partir da máxima atividade dos músculos dorsiflexores (especialmente do tibial anterior), que, atuando excentricamente, desaceleram o pé e controlam o restante de sua descida para continuação do apoio. Devido às características do movimento, pouco ou nenhum trabalho dos flexores plantares é observado. Por outro lado, quando o pé está totalmente apoiado e o impacto foi recebido, inicia-se a fase de propulsão do movimento, momento no qual ocorre o início do esforço dos flexores plantares. Na fase propulsiva da locomoção, os flexores plantares atingem seu pico de produção de força imediatamente antes da retirada do antepé e dedos. Há um grande esforço da musculatura intrínseca do pé nesse momento também, de forma a manter o pé rígido e estável o suficiente para a aplicação de força no solo. Com o início da fase de balanço, a atividade dos flexores plantares e músculos intrínsecos do pé reduz drasticamente, enquanto os músculos dorsiflexores voltam a apresentar atividade significativa, com atividade concêntrica para elevação protetora e posicionamento do tornozelo e pé para o próximo apoio. Esse comportamento é observado na marcha e, com algumas pequenas variações, na corrida. As peculiaridades são decorrentes do aumento da intensidade (velocidade) da locomoção. Outra atividade esportiva em que podemos identificar a contribuição do tornozelo e do pé é o ciclismo. Embora poucas alterações angulares sejam observadas na articulação ao longo do ciclo de 360º de pedalada, a contribuição do tornozelo é bastante relevante para a propulsão no ciclismo. Nesse esporte observa-se uma alternação do trabalho de flexores plantares e dorsiflexores. A fase de maior potência do ciclo é mediada pelo esforço do músculo gastrocnêmio, mantendo-se ativo de 30º a 270º na revolução. Ao fim do trabalho desse flexor plantar, de 280º a até um ponto próximo ao centro morto superior, há a contribuição do tibial anterior para a subida do pedal. Em seguida, recomeça-se o ciclo, com novo trabalho do gastrocnêmio. 97 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 BIOMECÂNICA Devido às características das funções desempenhadas pelo tornozelo e pé no movimento humano, essa é uma região bastante suscetível a lesões, representando grande parte das ocorrências no membro inferior. Pelo mesmo motivo, lesões nessa articulaçãoreduzem consideravelmente a mobilidade do indivíduo. A ocorrência de lesões no tornozelo e pé pode estar relacionada a tarefas e esportes determinados. No basquete, por exemplo, as lesões mais frequentes de membro inferior ocorrem no tornozelo, possivelmente devido à demanda gerada pelos movimentos desse esporte. Outra grande parte das lesões de tornozelo e pé deriva do excesso de carga/treinamento e esforço repetitivo, como observado na corrida, por exemplo. Ainda, as lesões no tornozelo e pé podem ser também associadas a fatores anatômicos, alinhamentos corporais e movimentos articulares excessivos. Diferentes tipos de lesões, tanto de natureza traumática como por estresse repetitivo, podem acometer o tornozelo e pé. Como lesões mais comuns nessa articulação, destacamos as entorses e as lesões por estresse (especialmente a canelite), que geralmente se traduzem nas tendinites e nas bursites. As entorses de tornozelo são as lesões mais comuns dessa região, ocorrendo habitualmente na superfície lateral durante uma inversão, devido a um suporte ligamentar mais fraco que o encontrado na região medial. O mecanismo de lesão é um movimento lateral, posterior, anterior ou de rotação da tíbia com o pé fixo na superfície de contato. No cotidiano, as entorses podem ser causadas pela perda de equilíbrio ao usar salto alto ou ao pisar inesperadamente em um buraco; já nos esportes, essa lesão é comum em modalidades que envolvem mudanças de direção, como é o caso do basquete, ou a possibilidade de aterrissagem sobre algum objeto ou pé de outro atleta, como é o caso do voleibol. O ligamento talofibular é o mais suscetível a entorses laterais quando estas ocorrem por flexão plantar somada à inversão. Quando a mudança de direção é feita apenas em inversão, porém com grande amplitude, o ligamento mais suscetível à lesão é o ligamento calcaneofibular. O forte suporte ligamentar e capsular na região medial do tornozelo, tendo o ligamento deltoide como um dos ligamentos mais fortes, torna as entorses mediais consideravelmente menos frequentes. Das lesões por estresse, a mais comum é a famosa “canelite”. Trata-se de desconforto e dor na parte anterior da perna, especialmente na porção lateral, frequentemente observada em corredores (sobretudo iniciantes), e que geralmente reflete uma tendinite no músculo tibial anterior. A principal causa dessa lesão é o esforço repetitivo do músculo tibial anterior, que possui pouca massa e não é usualmente fortalecido por seus praticantes, porém exerce um trabalho excêntrico considerável durante a locomoção. A repetida tensão proporcionada pelo trabalho vigoroso do tríceps sural acaba por acarretar outra lesão: a tendinite do tendão calcâneo. Essa tendinite é outra lesão bastante frequente no tornozelo e pé, especialmente em corredores. A falta de flexibilidade, o alongamento excessivo durante o movimento, o aumento da carga imposta sobre o tornozelo e maior atividade muscular dos flexores plantares também estão associados ao aumento da tensão no tendão calcâneo e, consequentemente, são apontados como causas adicionais da tendinite. A tendinite do calcâneo e seus causadores estão associados à bursite retrocalcânea, inflamação da bursa localizada superiormente ao tendão calcâneo. A fasciite plantar apresenta-se como a lesão mais comum do pé. Trata-se de uma inflamação da fáscia plantar na região inferior do pé, bastante comum em corredores e usuários de sapato com salto alto, e causada por estresse excessivo geralmente relacionado a ajustes inadequado no volume e intensidade de treinamento ou de tarefas do dia a dia. 98 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 Unidade II É extremamente importante destacar que o desalinhamento da articulação em uma extremidade inferior, bem como lesões em alguma articulação do segmento, resulta em desalinhamentos e movimentos compensatórios em uma ou mais das outras articulações do membro inferior, em virtude de sua relevante função de sustentação do peso corporal e de cargas externas. 5.3 Coluna vertebral O tronco se apresenta como uma importante região do aparelho locomotor composta de inúmeros ossos, articulações e músculos responsáveis por parte considerável da sustentação e estabilização do corpo e pelo elo mecânico entre a extremidade superior, extremidade inferior e cabeça. Sendo o maior segmento do corpo, desempenha papel vital tanto nos membros inferiores como nos superiores, pois sua posição determina e pode alterar significativamente a funcionalidade dos membros. Embora seja formada por diversas estruturas, como mencionado há pouco, o componente principal do tronco, e sobre o qual este tópico versará, é a coluna vertebral, segmento complexo e funcionalmente significativo que torna possível o movimento nos três planos. Além disso, é estrutura essencial na proteção da medula espinhal. A coluna vertebral consiste em 33 vértebras posicionadas umas sobre as outras e divididas estruturalmente em cinco diferentes regiões: cervicais, torácicas, lombares, sacrais e coccígeas. Das 33 vértebras, 24 são móveis (cervicais, torácicas e lombares) e contribuem para o movimento do tronco. O restante das vértebras (sacrais e coccígeas) é fundido entre si. As vértebras apresentam-se empilhadas umas sobre as outras e dispostas em quatro curvaturas. Tal disposição permite que a coluna vertebral funcione como um suporte rígido, mas flexível, que permite sustentação da carga, equilíbrio e mobilidade. No sentido céfalo-caudal, a coluna vertebral é formada por sete vértebras cervicais, 12 vértebras torácicas, cinco vértebras lombares, cinco vértebras sacrais fundidas e quatro pequenas vértebras coccígeas fundidas (veja as figuras a seguir). As vértebras cervicais compõem uma curvatura convexa na direção anterior do corpo, na região posterior do pescoço. As vértebras torácicas formam uma curvatura côncava na direção posterior do corpo, localizando-se na região superior das costas. As vértebras lombares constituem uma nova curvatura convexa na direção anterior do corpo, situada na porção inferior das costas. As vértebras sacrais e coccígeas unidas formam a última curvatura da coluna, côncava na direção posterior do corpo, localizada posteriormente à pelve. As curvaturas da coluna vertebral podem ser classificadas em primárias e secundárias. As curvaturas vertebrais primárias são aquelas que já estão presentes no nascimento, e são representadas no corpo humano pelas curvaturas torácica e sacral. Por outro lado, as curvaturas vertebrais secundárias são curvaturas que se desenvolvem ao longo do tempo em resposta à sustentação do peso corporal. Geralmente, os locais de transição entre uma curva e outra (junções) são locais caracterizados por grande mobilidade, porém, com considerável vulnerabilidade a lesões também. O aumento das curvaturas convexas (curvatura excessiva) em relação à parte anterior do corpo (cervical e lombar) é conhecido como lordose. Já a curvatura excessiva na região torácica (caracterizada pelo aumento da curvatura côncava em relação à porção posterior) é denominada cifose. Outra possibilidade de curvatura, porém anormal, na coluna é a escoliose, um desvio lateral da coluna, deixando-a em formato de S ou C. 99 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 BIOMECÂNICA O tronco possui três junções: a cervicotorácica, a toracolombar e a lombossacral (conforme as figuras a seguir). As regiões cervical e lombar apresentam maior mobilidade, enquanto as regiões torácica e pélvica são mais rígidas. Vista anterior Vista lateral esquerda Vista posterior Vértebras cervicais Vértebras torácicas Vértebras lombares Atlas (C1) Atlas (C1) Áxis (C2) Axis (C2)C7 T1 T12 L1 L5 L5 L1 T1 CT T12 Sacro (SI-5) Sacro (SI-5) Sacro (SI-5) Cóccix Cóccix Cóccix Figura 38 – Figura ilustrativa da coluna vertebral e suas vértebras componentes Cóccix Sacro Junção lombossacral Junção toracolombar Junção cervicotorácica Região Sacrococcígea Região Lombar Região Torácica Região Cervical Figura 39 – Curvaturas da coluna vertebral e suas junções 100 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 Unidade II Cada vértebra consiste, basicamente, em um corpo vertebral, pedículos e pilares, formando um canal que permite a passagem de inervações por intermédio da medula espinhal (veja a figura a seguir). Sendo assim, além de permitir mobilidade, sustentação e flexibilidade ao tronco, a coluna vertebral tem a importante função de proteger a medula espinhal. A unidade funcional da coluna vertebral, composta de duas vértebras adjacentes e um disco flexível entre elas, é conhecida como segmento móvel. É semelhante ao longo de toda a coluna, exceto nas duas primeiras vértebras cervicais. Anterior Corpo vertebral Gânglio da raiz dorsal Nervo espinal Processo transverso Medula espinal Pedículo Processo espinhoso Posterior Figura 40 – Estrutura básica de uma vértebra Por apresentar papéis diferentes na funcionalidade da coluna vertebral, o segmento móvel pode ser subdividido em porção anterior e porção posterior: Corpo vertebral Anterior Posterior Processo transverso Articulação invertebral Disco intervertebral Processos espinhosos Figura 41 – Figura ilustrativa do segmento móvel 101 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 BIOMECÂNICA A porção anterior do segmento móvel é formada pelo corpo das duas vértebras que a compõem, pelo disco entre eles (chamado de disco intervertebral) e pelos ligamentos longitudinais (anterior e posterior). A articulação ordenada entre os corpos e o disco intervertebral é exclusiva da coluna, não sendo observada em nenhuma estrutura do corpo. A superfície do corpo vertebral é revestida de cartilagem hialina, de modo a compor placas articulares terminais responsáveis pelo elo com o disco intervertebral. Simultaneamente, o disco intervertebral mantém as vértebras conectadas e garante mobilidade ao segmento móvel. Corpos e disco intervertebrais criam uma articulação extremamente importante para o suporte de absorção de cargas mecânicas na coluna. A própria formação estrutural e anatômica do corpo vertebral é voltada para a absorção de grandes cargas compressivas. Por sua vez, o disco intervertebral também é capaz de suportar altas cargas, inclusive em diferentes direções, como compressivas torcionais e de curvamento. Portanto, o disco intervertebral tem como principais funções suportar e redistribuir cargas de maneira uniforme na coluna vertebral e controlar movimentos excessivos nessa articulação. O disco intervertebral é composto de duas estruturas funcionais: o ânulo fibroso e o núcleo pulposo. O ânulo fibroso é uma estrutura externa espessa, formada de anéis fibrocartilaginosos, e que cria a circunferência do disco intervertebral. As fibras fibrocartilaginosas que constituem o ânulo fibroso possuem de 50-60% de colágeno, garantindo ao disco a capacidade de resistência à tração. As fibras formam camadas concêntricas, da parte mais externa para o centro, porém orientadas na diagonal com relação aos corpos vertebrais. Por esse motivo, o movimento rotacional e de cisalhamento entre as vértebras que compõem o segmento móvel é limitado. Na parte interna do disco, circundado pelo ânulo fibroso, localiza-se o núcleo pulposo, que é um material gelatinoso (gel coloidal) em formato esférico e com alto conteúdo líquido (80-90% de água e 15-20% colágeno). É exatamente esse alto conteúdo hídrico de sua composição que a torna uma estrutura extremamente preparada para o suporte de forças compressivas aplicadas na coluna vertebral. Ao longo do dia, o disco se desidrata progressivamente à medida que suporta as cargas compressivas decorrentes das atividades do cotidiano, resultando em encurtamento da coluna (15 a 25 mm) e redução de cerca de 20% na altura e volume dos discos intervertebrais. Entretanto, uma vez cessada ou reduzida significativamente a compressão (ao longo da noite de descanso, por exemplo), o disco reabsorve água rapidamente, se reidrata e recupera suas dimensões iniciais (veja figura a seguir). Os discos intervertebrais são estruturas avascularizadas, dependentes de estímulos mecânicos para manter um estado nutricional saudável no disco. Logo, lesões nessas estruturas resultam em muita dor e mínima possibilidade de reparo. 102 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 Unidade II Núcleo pulposo Fibras colágenas Processo espinhoso Núcleo pulposo Ânulo fibroso Ânulo fibroso Posterior Vista superior Vista lateral Figura 42 – Composição estrutural do disco intervertebral De forma geral, o disco intervertebral funciona de três formas: de forma hidrostática quando está saudável; com flexibilidade ao ser submetido a baixas cargas; e com rigidez quando cargas mais intensas são aplicadas. Ao ser submetido a cargas compressivas, o disco intervertebral e suas estruturas se deformam: o núcleo pulposo trabalha como amortecedor, movendo-se dentro do disco de acordo com o movimento realizado e distribuindo de modo uniforme a pressão exercida sobre a estrutura. Quando o tronco se flexiona, faz extensão ou se flexiona lateralmente, ocorre uma força compressiva para o lado da inclinação e força tensiva para o lado oposto, conforme a figura a seguir. Em caráter de exemplo, a força tensiva absorvida pelo ânulo fibroso é de, aproximadamente, quatro a cinco vezes a carga aplicada no eixo corporal. A pressão nos discos e, consequentemente, sobrecarga sobre a coluna, aumentam linearmente com o aumento das cargas compressivas, com a pressão intradiscal podendo atingir valores 30-50% maiores que a carga aplicada. O disco é extremamente resistente às forças compressivas. Por sua vez, é mais vulnerável a movimentos que geram cisalhamento e rotação nas fibras do ânulo fibroso. Completando a porção anterior do segmento, temos os ligamentos longitudinais anterior e posterior. Esses ligamentos cruzam a porção anterior de toda a coluna vertebral, desde a região occipital até o sacro. O ligamento longitudinal anterior é bastante forte e denso, insere-se na parte anterior dos discos e corpos intervertebrais e é responsável por limitar a hiperextensão da coluna e o deslizamento anterior de uma vértebra sobre a outra. O ligamento longitudinal posterior se estende por toda a porção posterior da coluna vertebral, conectando-se aos corpos vertebrais e ao centro do disco, e tendo como função limitar a flexão da coluna vertebral. 103 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 BIOMECÂNICA Compressão Vista superior Vista lateral Tensão Figura 43 – Movimentação do núcleo pulposo e forças geradas sobre o segmento móvel Na porção posterior do segmento móvel há os arcos neurais, articulações intervertebrais, processos transversos, processos espinhosos e ligamentos (veja a figura a seguir). O arco neural constitui-se de dois pedículos e lâminas, que, juntamente com o lado posterior do corpo vertebral, compõem a forame vertebral, local de passagem da medula espinhal. Os processos espinhoso e transverso servem como locais de inserção para a musculatura envolvida na região. As articulações intervertebraispresentes nessa porção são de natureza sinovial, localizando-se 104 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 Unidade II dentro de uma cápsula articular e possuindo todo o restante das características atribuídas a esse tipo de articulação. São formadas pelas facetas superior e inferior de cada lâmina vertebral e recebem o nome de articulações apofisárias. Essas articulações auxiliam no controle e limitação do deslizamento de uma vértebra sobre outra, participam da sustentação de carga e, em situações de hiperextensão, são responsáveis pelo suporte de 30% da carga. Adicionalmente, têm o papel de absorver significativamente a carga incidente sobre a coluna em movimentos de flexão e rotação de coluna, protegendo a estrutura das forças contra cisalhamento e rotações excessivas. Importantes ligamentos sustentam a parte posterior do segmento vertebral (ligamentos longitudinais, ligamento amarelo, ligamentos supraespinais, ligamentos infraespinais e ligamentos intertransversários), cujas funções básicas são resistir às forças de tensão e cisalhamentos impostas à coluna e impedir as curvaturas excessivas na coluna vertebral. Processo transverso Processo transverso Processo espinhoso Lâminas Lâminas Faceta articular interior Faceta articular superior Faceta articular superior Porção posterior Pedículo Pedículo Articulação apofisária Porção posterior Vista lateral Vista lateral Vista de cima Figura 44 – Estrutura da vértebra com ênfase na porção posterior do segmento móvel Embora a amplitude de movimento para cada região que forma a coluna seja diferente e a possibilidade de movimento entre as vértebras seja mínima, a coluna vertebral funcionando como um todo, com suas estruturas e regiões formadoras trabalhando em conjunto, é a principal responsável pelos movimentos do tronco, garantindo-lhe grande mobilidade e três graus de liberdade de 105 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 BIOMECÂNICA movimento. Apesar de todas as vértebras terem o mesmo formato básico, há um aumento progressivo súpero-inferior no tamanho dos corpos vertebrais e uma progressão no tamanho e orientação dos processos articulares. É exatamente o tamanho das vértebras e a orientação dos processos articulares e articulações facetárias que determina a capacidade de suportar cargas e a capacidade do segmento móvel de realizar movimento, respectivamente. O tronco pode executar movimentos de flexão-extensão, flexão lateral e rotação, conforme a figura a seguir: Flexão e extensão Rotação Flexão lateral 90º 75-85º 110-140º Figura 45 – Movimentos articulares realizados pelo tronco No plano sagital, a coluna vertebral é capaz de realizar movimentos de flexão e extensão cuja amplitude varia entre 110º e 140º. Nas regiões cervical e lombar o movimento é livre, mantendo-se essa amplitude, ao passo que a flexão e extensão na região torácica é mais restrita. Grande parte da flexão do tronco é garantida pelas vértebras lombares, especialmente nos primeiros 50-60º de movimento; a partir de então, há considerável contribuição da pelve para a realização desse movimento por intermédio de uma inclinação anterior. O processo de realização da extensão de tronco é exatamente o oposto: é iniciado pela inclinação posterior da pelve e, em seguida, a porção lombar da coluna assume a extensão. A flexão é caracterizada pelo deslizamento anterior da vértebra superior sobre a vértebra inferior do segmento móvel, resultando em inclinação da vértebra e força compressiva sobre a parte anterior do disco. Na região posterior do segmento, as articulações apofisárias também deslizam sobre as facetas inferiores, o que resulta em forças 106 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 Unidade II compressivas entre as facetas e transversalmente à face das facetas. O movimento de flexão é sustentado e todas essas forças geradas sobre o segmento móvel são absorvidas por intermédio do ânulo fibroso do disco intervertebral, dos ligamentos e dos músculos inseridos na coluna. O segundo movimento realizado pelo tronco é a flexão lateral. Esse movimento ocorre no plano frontal e possui, aproximadamente, 75-85º de amplitude de movimento, especialmente nas regiões cervical e lombar da coluna. Esse movimento é caracterizado pelo ligeiro deslizamento lateral das vértebras dos segmentos móveis, culminando na compressão discal para o lado da inclinação, conforme a figura a seguir. Movimentos de rotação geralmente acompanham a flexão lateral: quando esta é realizada de forma relaxada, ocorre uma rotação simultânea para o lado oposto da inclinação lateral; porém, quando ocorre a flexão lateral completa, a rotação simultânea ocorrerá para o mesmo lado da inclinação. Os movimentos de rotação representam a terceira possibilidade de movimento pelo tronco. A rotação se dá no plano transversal ao longo de 90º de amplitude de movimento, sendo livre na região da cervical e ocorrendo de forma combinada à flexão lateral para as regiões torácica e lombar, como visto há pouco. O máximo contato entre as articulações apofisárias advém durante a extensão da coluna (exceto para as duas primeiras vértebras cervicais, nas quais essa situação ocorre durante a flexão). Hiperextensão do tronco Flexão do tronco Flexão lateral do tronco Te ns ão Te ns ãoTensão Co m pr es sã o Co m pr es sã o Compressão Figura 46 – Forças geradas sobre o segmento móvel de acordo com o movimento articular realizado pelo tronco 107 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 BIOMECÂNICA Das sete vértebras cervicais, duas delas apresentam estrutura e características distintas das demais: são as duas primeiras vértebras cervicais, o atlas (C1) e o áxis (C2). O atlas é a vértebra responsável por articular a coluna vertebral com o crânio, através da articulação atlantoccipital. É por intermédio dessa articulação que a cabeça realiza movimentos no plano sagital, com amplitude aproximada de 10º a 15º de flexão e extensão. Essa articulação é também capaz de executar movimento de flexão lateral com amplitude de 8º, porém não faz rotação. O atlas possui formato de anel, com um arco anterior e posterior, não possuindo corpo vertebral. Além disso, tem processos transversos grandes, por onde passa a irrigação sanguínea, porém não possui processo espinhoso. O áxis possui corpo vertebral, porém modificado: não possui processo articular na parte superior, tampouco pedículos. Um pilar que se origina na superfície superior do áxis permite o encaixe no atlas, formando uma articulação pivotante. Esse pilar é denominado dente do áxis ou processo odontoide, e a articulação formada entre o atlas e o áxis é chamada de articulação atlantoaxial. Sendo a articulação mais móvel da região cervical, a articulação atlantoaxial permite movimentos de flexão e extensão com amplitude de 10º e rotação de cerca de 47º, sendo responsável por 50% da rotação realizada pelas vértebras cervicais. Contudo, não é capaz de efetuar flexão lateral. A estrutura do restante das vértebras cervicais é semelhante à das vértebras típicas, exceto pelo tamanho. As vértebras cervicais são menores, podendo atingir até metade do tamanho das vértebras de outras regiões. Além disso, possuem pedículos e processos espinhosos mais curtos e processos articulares mais volumosos. Os processos transversos das vértebras cervicais apresentam um forame para a passagem de artérias de irrigação sanguínea quenão é encontrado nas vértebras das outras regiões da coluna. A figura a seguir ilustra as diferenças entre as vértebras cervicais. As facetas articulares que formam as articulações apofisárias entre as vértebras cervicais apresentam-se orientadas em 45º em relação ao plano transverso, paralelas em relação ao plano frontal, e, diferentemente das outras regiões da coluna, possuem discos intervertebrais menores na lateral e mais espessos na porção ventral em comparação à dorsal, contribuindo para a curvatura cervical. Devido a suas características estruturais, a região cervical é a que possui maior mobilidade em comparação às outras regiões da coluna. A região cervical é capaz de realizar movimentos de rotação com amplitude aproximada de 90º, sendo que a rotação máxima ocorre em C1-C2; flexão lateral com amplitude total de cerca de 94º (47º para cada lado), com flexão lateral máxima das vértebras cervicais ocorrendo em C2-C4; flexão de até 40º, sendo a máxima flexão em C1-C3; e extensão ao longo de 24º, com o máximo desse movimento acontecendo em C7-T1. 108 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 Unidade II Tubérculo anterior Tubérculo posterior Processo articular superior Processo articular superior Processo articular inferior Processo espinhoso Processo espinhoso Ápice Processo transverso Processo transverso Processo transverso Faceta para o dente do áxis Forame vertebral Forame transverso Forame transverso Epífise anular do corpo vertebral Forame vertebral Forame vertebral Corpo vertebral Pedículo do arco vertebral Unco do corpo da vértebra (processo uncinado) Superfície articular posterior Superfície articular inferior Arco vertebral Arco posterior Lâmina do arco vertebral Arco vertebral Arco anterior Forame transverso Forame transverso Massa lateral Figura 47 – Figura ilustrativa da estrutura das diferentes vértebras cervicais (de cima para baixo: atlas, áxis e vértebras cervicais restantes) 109 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 BIOMECÂNICA A região de menor mobilidade da coluna vertebral é a região torácica. É formada por 12 vértebras que vão aumentando de tamanho ao longo da coluna, sendo a primeira vértebra torácica a menor e a 12ª a maior. Da mesma forma, as estruturas que compõem as vértebras vão apresentando dimensões maiores ao longo da coluna: os corpos vertebrais vão ficando mais altos, os pedículos se tornam maiores e os processos transversos e espinhosos ficam mais longos. Na região torácica observamos a articulação entre a coluna e as costelas. As vértebras torácicas se articulam com as costelas através das facetas articulares existentes em cada vértebra. A primeira vértebra (T1) e das vértebras 10-12 (T10-T12) possuem facetas completas, enquanto vértebras torácicas 2-9 (T2-T9) possuem hemifacetas para a conexão com as costelas. Na região torácica, as articulações apofisárias entre as vértebras adjacentes são formadas em ângulos de 60º com o plano transverso e de 20º com o plano frontal. A movimentação da região torácica é restrita pela conexão com as costelas, pela orientação das facetas e pelos processos espinhosos mais longos. Os movimentos de flexão e extensão nessa região apresentam amplitude limitada a 3-12º, sendo mais restritos na porção superior da região torácica (2-4º) e mais amplos na região torácica inferior (20º). Da mesma forma, a flexão lateral é bastante restrita nessa região, com amplitude de movimento variando entre 2-4º (porção superior) e 9º (porção inferior). Em contraste aos movimentos anteriores, a rotação das vértebras torácicas possui maior mobilidade na porção superior em comparação à inferior, com amplitude de movimento variando entre 2º (inferior) e 9º (superior). Os discos intervertebrais torácicos expressam a maior relação entre diâmetro e altura de disco que as outras regiões da coluna, características que permitem reduzir a força tensiva sobre as vértebras em compressão e garantem baixa incidência de lesões discais na região torácica em comparação à região cervical e lombar. De forma a suportar as grandes cargas às quais é submetida, a região lombar exibe as maiores vértebras da coluna. Inclusive, a vértebra lombar é a estrutura do sistema esquelético submetida à maior carga. As vértebras lombares são grandes, possuem corpos vertebrais mais largos, pedículos e processos transversos mais curtos e processos espinhosos mais amplos. Da mesma forma, os discos intervertebrais da região lombar são mais espessos, especialmente os do segmento L4- L5 e L5-S1. As articulações apofisárias têm facetas articulares orientadas em 90º com o plano transverso e 45º com o plano frontal. Além de vértebras mais estruturadas, a região lombar possui, sem contar os ligamentos já mencionados ao longo deste tópico, o ligamento iliolombar e a fáscia toracolombar, que são importantes estruturas de auxílio na sustentação e suporte de carga. A lombar é uma região da coluna de razoável mobilidade. Para os movimentos de flexão e extensão, a amplitude de movimento é de 8º a 20º. Já a flexão lateral nas vértebras lombares apresenta-se mais limitada, variando entre 3º e 6º. A capacidade de rotação é ainda menor, restringindo-se a poucos graus (1-2º). A figura a seguir destaca um resumo acerca das principais diferenças entre as vértebras e segmentos móveis das diferentes regiões da coluna vertebral. 110 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 Unidade II Cervical Torácica Lombar Diferenças de tamanho Diferenças estruturais (vista superior) Orientação da articulação apofisária (vista lateral) (vista lateral) Corpo Corpo Corpo Corpo Corpo Corpo Processo espinhoso Processo espinhoso Processo espinhoso Processo espinhoso Processo transverso Processo transverso Processo articular inf. Processo articular inf. Hemifaceta costal para a cabeça da costela Processo articular superior Processo articular superior Processo articular superior 45º 60º 90º Processo articular inf. Forame transverso Figura 48 – Características estruturais e diferenças entre as vértebras e segmentos móveis dos diferentes níveis da coluna vertebral (cervical, torácica e lombar) Ritmo lombopélvico é a denominação empregada à sincronização dos movimentos entre a pelve e o tronco. Como já mencionado anteriormente, a flexão de tronco apresenta atividade máxima da lombar nos primeiros 50-60º do movimento; após essa amplitude, a rotação pélvica torna-se o principal responsável pelo movimento de flexão. Por sua vez, é a inclinação posterior da pelve que realiza os estágios iniciais da extensão de tronco, enquanto a atividade da região lombar domina os estágios finais do movimento. Contudo, as relações entre pelve e tronco, e suas respectivas contribuições para o movimento, ainda são controversas para os movimentos de flexão lateral e rotação de tronco. A tendência é que, na ausência de resistência pelo membro inferior, a pelve se movimente na mesma direção da rotação ou flexão lateral. Porém, na presença de resistência exercida pelo membro inferior, a movimentação da pelve ocorre na direção oposto à do movimento de flexão lateral e rotação. 111 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 BIOMECÂNICA O movimento de extensão de tronco é realizado por diversos músculos posteriores pequenos que formam a musculatura extensora e que percorremtoda a coluna em pares. Dessa forma, a ativação dos pares de músculos resulta na extensão do tronco; em contrapartida, se os músculos forem ativados de forma unilateral, ocorre rotação ou flexão lateral do tronco. Esses músculos estão divididos em dois grupamentos musculares: os eretores da espinha (músculos iliocostal, longuíssimo e espinal) e os paravertebrais (músculos intratransversários, interespinais, rotadores e multífidos). Enquanto os eretores da espinha são mais superficiais, os músculos paravertebrais são profundos. Os músculos eretores da espinha possuem maior massa e apresentam a maior contribuição para a realização da extensão de tronco. Os músculos paravertebrais auxiliam na extensão, assim como na efetivação de outros movimentos do tronco, e possuem relevante papel na sustentação da coluna vertebral, na manutenção de sua rigidez e na execução de movimentos mais finos nos segmentos móveis. Por receberem maior carga e serem regiões com maior amplitude de extensão, a cervical e a lombar exibem eretores da espinha mais fortes e espessos. O músculo multífido também apresenta maior massa e espessura nas regiões cervical e torácica, sendo importante para a produção de torque extensor pelo tronco. Os músculos eretores da espinha e multífidos têm cerca de 60% da sua constituição de fibras musculares do tipo I e cerca de 40% de fibras do tipo II. Tal constituição garante aos extensores do tronco grande versatilidade funcional, pois permitem a produção de movimentos rápidos e vigorosos simultaneamente à capacidade de resistir à fadiga na manutenção de posturas em movimentos e tarefas prolongadas. Além disso, os extensores de tronco são vitais na estabilização posterior da coluna vertebral, na oposição à gravidade em posturas eretas e no controle da flexão de tronco (mediada por ação excêntrica). A flexão de tronco ocorre de forma diferente dependendo da região da coluna: na cervical e lombar o movimento de flexão é livre, ao passo que na torácica esse movimento é bastante limitado. Além disso, diferentemente da musculatura extensora, os músculos flexores não percorrem a coluna vertebral em todo seu comprimento e estão localizados na parte anterior do corpo. A flexão de tronco ocorre principalmente através da região lombar e é viabilizada pelos músculos abdominais. A musculatura é composta dos seguintes músculos: reto do abdome, oblíquo interno, oblíquo externo e transverso do abdome. Os músculos abdominais também são essenciais para a estabilização do tronco e auxiliam no suporte de cargas. Isso porque, ao se contraírem, aumentam a pressão intra-abdominal, o que diminui a compressão discal e, consequentemente, poupa esforço dos extensores do tronco. Dos quatro músculos que compõem o abdome, o transverso do abdome é aquele que desempenha maior papel no aumento da pressão intra-abdominal. Semelhante aos eretores da espinha e multífidos, os músculos abdominais apresentam em sua composição cerca de 55% de fibras tipo I e de 45% de fibras do tipo II, o que resulta em capacidades e versatilidade similares na produção de movimento. Na região da lombar, podemos observar dois músculos flexores importantes. O primeiro é o músculo iliopsoas, atuante no quadril, mas que também possui inserção nas vértebras lombares. Esse músculo permite a conjunção do movimento de tronco e pelve, realizando a flexão de tronco e tracionando a pelve anteriormente. O segundo músculo é o quadrado lombar, que forma a parede lateral da região do abdome. Embora esteja mais relacionado a movimentos laterais, o músculo quadrado lombar também auxilia na flexão de tronco. 112 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 Unidade II O movimento de flexão completa do tronco a partir da posição ereta em pé inicia-se a partir do trabalho dos músculos abdominais e iliopsoas, porém sua continuidade ocorre pela ação da força gravitacional atuante sobre o tronco. Nesse momento, o controle da flexão passa a ser realizado pela ação excêntrica dos músculos extensores de tronco, havendo um aumento progressivo da ativação desses músculos até cerca de 60º de flexão, quando o tronco se flexiona nas vértebras lombares. Ao fim da contribuição das vértebras lombares, a continuação da flexão do tronco ocorre pela inclinação anterior da pelve, havendo adição de trabalho excêntrico da musculatura do quadril. Caso o movimento de flexão ainda continue, a resistência e o controle da flexão serão feitos pelos músculos extensores (de forma passiva) e pelos ligamentos posteriores. Para retorno à posição ereta, o movimento de extensão inicia-se com o trabalho dos músculos posteriores do quadril. Embora ativos desde o início, os músculos extensores do tronco se tornam mais ativos nos últimos 45-50º do movimento de extensão. O movimento de flexão lateral ocorre por intermédio da ação dos músculos laterais do tronco. O movimento ocorrerá para o lado da musculatura contraída. Os principais músculos envolvidos são os eretores da espinha da região lombar (quando ativados unilateralmente), o quadrado lombar e os oblíquos do abdome. No nível da cervical, a contração unilateral dos músculos do pescoço (esternocleidomastoideo e escalenos) realiza a flexão lateral nessa região. A análise da ativação muscular no movimento de rotação do tronco é mais complexa por envolver ações musculares produzidas por ambos os lados da coluna. Na lombar, a maior parte da rotação é realizada pela contração dos multífidos e oblíquo interno no sentido do movimento, enquanto os músculos longuíssimo, iliocostal e oblíquo externo estão ativos no lado oposto. Os principais músculos envolvidos nos movimentos articulares do tronco são apresentados no quadro a seguir: Quadro 11 – Principais músculos do tronco Músculo Localização Ação Co m pl ex o do ab do m e Oblíquo interno Lateral ao tronco/profundo Flexão lateral e rotação lateral da coluna vertebral Oblíquo externo Lateral ao tronco/superficial Flexão lateral e rotação lateral da coluna vertebral Transverso do abdome Anterior ao tronco/profundo Compressão do abdome Reto do abdome Anterior ao tronco/superficial Flexão da coluna Eretores da espinha Posterior ao tronco/profundo Extensão da coluna vertebral Multífidos Posterior ao tronco/profundo Estabilização da coluna Quadrado do lombo Posterior ao tronco/profundo Extensão e flexão lateral da coluna Co m pl ex o ili op so as Ilíaco Anterior ao quadril/superficial Flexão e rotação lateral do quadril Psoas maior Anterior ao quadril/superficial Flexão do quadril e da coluna lombar e rotação lateral do quadril A maior capacidade de gerar força pelo tronco ocorre no movimento de extensão, atingindo valores da ordem de 210 N.m. A força máxima gerada pelo tronco nos movimentos de flexão e flexão lateral 113 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 BIOMECÂNICA é de, aproximadamente, 70% da força da musculatura extensora. A menor produção de força ocorre na rotação, capaz de gerar força equivalente a 43% da força extensora. Contudo, quando todos os fatores relacionados à geração de forças na coluna são considerados, como pressão intra-abdominal e ligamentos, o torque extensor total é apenas ligeiramente superior ao torque flexor. Os músculos abdominais contribuem com a produção de 33% da força flexora, ao passo que os músculos eretores da espinha são responsáveis pela produção de 50% da força extensora. Na rotação, a produção de força é dominada pelos músculos abdominais, com pequena contribuição da musculatura posterior. A posição do tronco é determinante para o processo de produção de força na realização dos movimentos. Por exemplo, a produção isométrica de força flexoraaumenta em 9% quando avaliada com o tronco em posição de 20º de hiperextensão. A geração de força isométrica extensora a 20º de flexão de tronco é 22% maior que na posição de 20º de extensão de tronco. Na posição sentada, a capacidade de geração de força flexora e extensora pode ser ainda maior. No entanto, a capacidade de produção de força altera-se consideravelmente em situações dinâmicas. Há um aumento de 15% a 70% nos torques produzidos no tronco durante esforços dinâmicos, fator que é acompanhado por aumento de ativação da musculatura agonista e antagonista, incremento na pressão intra-abdominal, incremento na carga incidente sobre a coluna vertebral e diminuição da capacidade de resposta dos músculos envolvidos à carga externa. As forças que incidem sobre o tronco incluem o peso corporal, a tensão exercida nos ligamentos e músculos envolvidos no segmento, a pressão intra-abdominal e quaisquer cargas externas que sejam aplicadas ao aparelho locomotor. As principais forças aplicadas na coluna têm característica compressiva. Os discos intervertebrais, as articulações apofisárias e os ligamentos são as principais estruturas de sustentação de cargas na coluna. Devido ao seu posicionamento, à posição do centro de massa e às curvaturas, as vértebras lombares são aquelas que lidam com a maior sobrecarga. Além disso, as forças musculares produzidas para realizar o movimento e proteger a coluna acabam também por submeter a coluna vertebral a forças compressivas elevadas. E quanto maior a flexão lombar e/ou a velocidade de execução, maiores são as cargas compressivas sobre o tronco. Quando o corpo se encontra em pé na postura ereta, a principal forma de carga que age sobre a coluna é axial, atingindo valores da ordem de 700 N nas vértebras lombares. Em ações de levantamento de uma carga elevada do solo, esse valor pode chegar a, até, 3.000 N, valor que ainda está dentro dos limites de tolerância da coluna vertebral (que é de, aproximadamente, 9.800 N). Um dos principais fatores que afetam a sobrecarga incidente na coluna é o braço de alavanca resistente da carga aplicada: quanto maior a distância entre a carga e a coluna (braço de alavanca resistente), maiores serão a força compressiva e a compressão intradiscal. Durante a marcha, por exemplo, a sobrecarga incidente sobre as vértebras lombares é de 2 a 2,5 vezes o peso corporal, enquanto a força compressiva na realização de um meio agachamento assume valores entre 6 e 10 vezes o peso corporal. As cargas impostas à coluna são absorvidas e transmitidas por diversas estruturas que compõem o segmento. As facetas articulares são responsáveis por absorver grandes cargas nas vértebras lombares em todos os tipos de movimento, exceto flexão, suportando de 30% a 50% da carga total incidente na coluna vertebral em extensão. Os ligamentos transmitem carga apenas de flexão e extensão. Grande 114 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 Unidade II parte da sobrecarga imposta à coluna é absorvida e distribuída pelos discos intervertebrais. A pressão intradiscal corresponde a algo entre 1,3 e 1,5 vezes a carga compressiva aplicada no disco, com a pressão discal aumentando linearmente com o aumento da carga. Na posição em pé e ereta, a sobrecarga em L3 é de, aproximadamente, 60% do peso corporal. Devido à posição das estruturas e à alteração da localização do centro de massa, há um aumento de 40% na compressão discal na região lombar na posição sentada em comparação à posição em pé. As cargas impostas na região cervical são menores que as incidentes nas regiões torácica e lombar, variando de acordo com a posição da cabeça. As pressões intradiscais são maiores nos movimentos de flexão e flexão lateral de tronco e pequenas em situações de extensão e rotação. Conforme discutido até o momento, o tronco tem papel importante em diferentes tarefas motoras, desde aquelas realizadas de forma estática, cuja postura é determinante, como em tarefas dinâmicas cuja ação articular do tronco viabiliza o movimento. Dessa força, seria possível elencar e analisar diversos movimentos esportivos e do cotidiano; no entanto, vamos nos ater a dois movimentos: o sit-up e o levantamento de peso do chão. O sit-up é um dos exercícios mais tradicionais para o fortalecimento da musculatura do abdome e envolve a flexão de tronco partindo da posição supinada, em decúbito dorsal, com as pernas completamente estendidas. Esse exercício é caracterizado por ativação dos músculos reto abdominal e oblíquos do abdome durante os primeiros 40º de flexão de tronco. Em seguida, a ativação da musculatura flexora do quadril é responsável pela continuidade do exercício ao longo do restante do movimento. Entretanto, devido às características de execução do exercício, da inserção dos músculos e do braço de alavanca, esse exercício apresenta grande possibilidade de movimento anterior em L5 e aumento da sobrecarga lombar pelo aumento da lordose lombar. Já em uma tarefa com posicionamento estático do corpo, como o levantamento de peso do chão, o tronco apresenta comportamento de trabalho um pouco diferente, com a contribuição dos músculos envolvidos nessa articulação se alterando de acordo com as mudanças da postura do corpo para realização da tarefa. Se o levantamento de um peso que está no chão for realizado a partir da flexão e extensão do tronco mantendo-se joelhos estendidos (como ocorre no exercício stiff, por exemplo), a sobrecarga incidente na coluna é bastante grande. O esforço para a realização da tarefa fica fundamentalmente concentrado nas articulações do tronco e quadril, agindo com grande amplitude de movimento e exigindo alto trabalho muscular nessa região por conta do braço de alavanca resistente gerado nessa posição. No entanto, se o levantamento do peso for viabilizado a partir da flexão e extensão do joelho em grande amplitude, com flexão e extensão de quadril e coluna em menor amplitude (situação semelhante à encontrada em exercícios/esportes como agachamento, levantamento terra e levantamento de peso olímpico), há grande ativação da musculatura extensora do tronco, porém, em menor magnitude em comparação à estratégia de levantamento de peso mencionada anteriormente, devido a menores braços de alavanca resistentes gerados a partir dessa postura de execução e divisão do trabalho com a articulação do joelho. O tronco é uma das regiões mais suscetíveis a dores e lesões devido ao importante papel que desempenha na postura e na sustentação das cargas impostas ao aparelho locomotor. Tem alta incidência de lesões, acometendo cerca de 60-80% da população. No esporte, a dor lombar está intimamente 115 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 BIOMECÂNICA associada a modalidades que demandam níveis elevados de inclinação e rotação, como ginástica, voleibol e golfe. Dentre as lesões que podem acometer o tronco, destacamos as lombalgias, lesões discais e hérnias de disco, fraturas e lesões relacionadas a desvios posturais. A dor lombar crônica (DLC) é a lombalgia mais prevalente na população, com 75-80% das pessoas sofrendo desse problema em alguma época da vida, e a segunda maior causa de afastamento do trabalho. Embora a etiologia da lesão seja multifatorial, o estresse mecânico é um dos fatores mais significativos na causa da lombalgia. As maiores incidências de lombalgias são observadas em indivíduos cujo trabalho está relacionado a uma alta demanda e sobrecarga sobre a região lombar, como postos de trabalho cuja tarefa envolve levantamento e transportes de altas cargas ou permanecer longos períodos sentado, ou ainda posturas e tarefas dinâmicas mediadas por inclinação e rotação de tronco. Dessa forma, o principal mecanismo delesão é a aplicação de carga muito intensa ou a repetição excessiva de cargas moderadas a intensas sobre a coluna. Adicionalmente, o despreparo da musculatura responsável pela estabilidade da coluna vertebral contribui de forma considerável para o surgimento da lombalgia. Cerca de 60% dos casos de lombalgia apresentam natureza idiopática, o que dificulta a identificação dos fatores biomecânicos associados ao surgimento da dor. As lesões relacionadas aos discos intervertebrais também apresentam grande incidência e prevalência na população. Uma das causas de dores nas costas pode ser a compressão de raízes nervosas ou, até mesmo, da medula espinhal, como resultado da protrusão de disco intervertebral (veja a figura a seguir). O fenômeno da protrusão do disco, ou prolapso discal, é mais conhecida como hérnia de disco. As hérnias discais correspondem a cerca de 5-10% dos casos de dores na coluna e são mais comuns na região cervical (entre as vértebras C5-C6 e C6-C7) e lombar (entre as vértebras L4-L5 e L5- S1). As hérnias de disco podem ter origem traumática ou estarem relacionadas ao estresse, contudo, ocorrem somente em discos com sinais de degeneração prévia. Em geral, as lesões discais ocorrem devido ao rompimento de fibras do ânulo fibroso em decorrência da aplicação de cargas de flexão excessivas (em intensidade e/ou repetição) e/ou de estímulos significativos de torção/rotação de tronco. Anterior Gânglio da raiz dorsal Protrusão de núcleo pulposo Nervo espinal Processo transversoMedula espinal Processo espinhoso Posterior Figura 49 – Ilustração do mecanismo de lesão da hérnia de disco 116 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 Unidade II A degeneração dos discos intervertebrais é outra causa de dores no tronco, ocorrendo de forma gradual em decorrência do processo de envelhecimento. Há a desidratação progressiva dos discos intervertebrais e rupturas de fibras do disco. Com o tempo, as rupturas podem ser preenchidas por tecido conjuntivo e tecido ósseo, podendo evoluir para um quadro de formação de conexão óssea entre duas vértebras, conduzindo à necrose do disco. Dessa forma, as hérnias de disco e a osteoartrite das articulações apofisárias podem ser produtos da degeneração dos discos intervertebrais. O segmento do tronco é também suscetível a fraturas nos seus diversos componentes e estruturas. Em geral, as fraturas se localizam nos processos espinhosos, nos processos transversos ou nas lâminas das vértebras e decorrem de forças compressivas impostas pelo próprio corpo vertebral. O tipo mais comum de fratura vertebral é a espondilólise. Essa fratura ocorre na parte interarticular, na região entre as facetas superior e inferior, por fadiga do arco neural posterior, e é uma lesão bastante característica de esportes com grande demanda repetitiva de movimentos de flexão, extensão e rotação de tronco, como a ginástica, o levantamento de peso, o voleibol, a luta greco-romana, o salto com vara, entre outros. A gravidade da espondilólise pode variar de uma simples fissura até a fratura e separação completa do osso, conforme a figura a seguir. É uma lesão associada a atividades repetitivas, tendo pouca relação com eventos traumáticos isolados. Quando ocorre espondilólise de ambos os lados, temos um quadro de espondilolistese. A espondilolistese é a separação bilateral da parte interarticular (fratura bilateral completa), resultando em deslizamento anterior da vértebra em relação à vértebra imediatamente abaixo. Com o defeito bilateral do arco neural, o segmento móvel fica instável, ocorrendo separação dos elementos anteriores e posteriores. A articulação lombossacra é a região com maior incidência de espondilolistese, com 90% de ocorrência nessa região. O segmento móvel L5-S1 é um dos que mais sofrem devido às frequentes e elevadas forças de cisalhamento nessa região, situação piorada pelas frequentes flexões de coluna. Diferentemente da maioria das fraturas por estresse, a espondilólise e a espondilolistese são fraturas que dificilmente se consolidam com o passar do tempo, tendendo a persistir, especialmente se não houver interrupção da atividade. Fratura incompleta Fratura completa Sacro Processo espinhoso Processo articular superior Processo articular inferior L5 L4 Figura 50 – Figura ilustrativa de uma fratura incompleta e completa na coluna vertebral 117 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 BIOMECÂNICA Saiba mais Para ampliar o conhecimento sobre a fisiologia articular, leia o livro de: SACCO, I. C. N.; TANAKA, C. Cinesiologia e biomecânica dos complexos articulares. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2008. 6 BIOMECÂNICA DO TECIDO MUSCULAR Dos biomateriais mencionados até o momento, o tecido muscular é o de maior importância para proteção dos ossos e articulações por sua capacidade de resistir às forças externas. Além disso, esse é o único tecido do nosso corpo que encurta para produzir o movimento dos segmentos corporais. A capacidade de produzir força muscular ocorre por sua composição e devido à interação entre músculo e sistema nervoso, que aciona a fibra muscular por meio de impulsos elétricos para produzir encurtamento (HALL, 2013). O músculo possui uma porção central e mais externa, onde se localizam as proteínas motoras, denominada ventre muscular. Ao redor dela está o epimísio, uma membrana de proteína de colágeno com a função de fornecer ao músculo resistência às forças de tração. A camada seguinte do músculo é formada por fascículos, conjuntos de fibras musculares. Eles são agrupados pelo perimísio, que é uma membrana de proteína de colágeno que também fornece resistência às forças de tração ao músculo. Cada fibra muscular que compõe o fascículo é uma célula do tecido muscular e é envolvida por outra camada de proteínas de colágeno, resistente à tração, chamada de endomísio. Além de ser envolvida pelo endomísio, cada fibra muscular possui mais inúmeras fibras menores em seu interior: são as miofibrilas ou miofilamentos. Elas são formadas por sarcômeros, partes de miofibrilas, que, ao serem posicionados em série (um ao lado do outro), formam a fibra longa, como se a miofibrila fosse o trem e os sarcômeros fossem cada vagão desse trem. O interior de cada vagão do trem, ou seja, de cada sarcômero, tem as proteínas que produzem o encurtamento das fibras e as que promovem seu relaxamento. As proteínas que produzem o encurtamento das fibras são chamadas de proteínas contráteis; são elas o filamento de actina e a miosina. O filamento de actina é uma proteína motora fina, que possui cavidades (sítios) para conexão das cabeças de miosinas. A miosina é um filamento proteico grosso com ramificações em seu filamento principal e enzimas nomeadas de cabeça de miosina na extremidade dessas ramificações. Elas se conectam aos sítios de ligação da actina na contração muscular. 118 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 Unidade II As proteínas que produzem o relaxamento das fibras são chamadas de proteínas reguladoras, tropomiosina e troponina. A tropomiosina é uma proteína filamentar que fica enrolada na actina; na ausência de cálcio intramuscular, a tropomiosina fica sobre o sítio de ligação da actina, evitando o encurtamento muscular. A troponina é uma proteína globular que possui três moléculas específicas: a troponina T, que se prende à tropomiosina para arrastá-la para fora do sítio de ligação da actina na presença de cálcio intramuscular; a troponina A, que se fixa à actina girando-a em torno de si também na presença de cálcio intramuscular; e atroponina I, que se conecta com as outras duas moléculas e fixa o cálcio disponível no interior do músculo no processo de contração muscular para arrastar a tropomiosina para fora do sítio de ligação da actina e favorecer a conexão entre actina e miosina. A ação de encurtar ou não o músculo é feita pelo sistema nervoso no processo de contração muscular. Após o envio do estímulo elétrico entre neurônios motores, um potencial de ação (PA) alcança um neurônio que tem conexão com várias fibras musculares, formando uma unidade motora, e todas essas fibras serão excitadas e se encurtarão – é a Lei do Tudo ou Nada (HALL, 2013; WILMORE; COSTILL; LARRY, 2013; MCARDLE; KATCH; KATCH, 2002). Observação Quando uma célula muscular (fibra muscular) recebe um estímulo elétrico, os sarcômeros que compõem sua estrutura são contraídos em sua totalidade (estímulo excitatório) ou relaxados em sua totalidade (estímulo inibitório). A esse processo dá-se o nome de Lei do Tudo ou Nada. O encurtamento das fibras musculares se dá pelo processo de sinapse. O neurônio motor transmite o estímulo elétrico para o músculo quando o PA alcança um canal iônico dependente de voltagem de Ca2+ no telondendro. Este canal se abre e haverá o influxo de Ca2+ no neurônio. As vesículas concentradas no telodendro se deslocarão e se fundirão com a membrana neural para liberação das glicoproteínas (neurotransmissores). No caso dos neurônios ligados ao músculo, estes sempre liberam na fenda sináptica um neurotransmissor excitatório conhecido como acetilcolina (WILMORE; COSTILL; LARRY, 2013; MCARDLE; KATCH; KATCH, 2002). Observação Sinapse é processo de transformação de um estímulo elétrico, que sai do neurônio pré-sináptico, em estímulo químico, que migra da fenda sináptica para o neurônio pós-sináptico ou para célula muscular e, novamente, é convertido em estímulo elétrico para percorrer o neurônio pós-sináptico ou a célula muscular. 119 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 BIOMECÂNICA Como é excitatório, a acetilcolina se ligará ao canal iônico dependente de ligante de Na+, fazendo com que esse cátion entre no tecido muscular. A partir dessa diferença de voltagem, cria-se um potencial de membrana no músculo, que é similar ao potencial de ação no axônio do neurônio, com abertura sequencial dos canais de K+ e funcionamento da bomba Na+/K+. Assim, a membrana muscular sofre os eventos de despolarização e repolarização. Esses eventos caminham até uma região da membrana muscular conhecida por túbulos T (invaginações da membrana com o formato de um T). Nessa região, o potencial de membrana excita uma proteína que sinaliza para outra proteína, que se encontra na membrana do retículo sarcoplasmático (no interior do músculo), a presença do estímulo elétrico. O retículo sarcoplasmático é uma organela muscular que armazena cálcio para o processo de contração muscular. Com o sinal da proteína da fibra muscular, as proteínas de membrana do retículo sarcoplasmático se abrem como portas. Como há maior concentração de cálcio no interior do retículo e menos quantidade desse cátion no sarcoplasma (citosol do músculo) muscular, o Ca2+ se dispersa para o sarcoplasma. No sarcoplasma encontramos as proteínas reguladoras e contráteis do músculo. A proteína reguladora troponina I fixa o Ca2+ em sua estrutura e empurra a tropomiosina para fora do sítio de ligação da actina. Com o sítio livre, a cabeça de miosina é atraída para se conectar com a actina, uma molécula de ATP é quebrada na cabeça de miosina e esta se movimenta, permitindo o deslizamento da actina. Após sua movimentação, a cabeça de miosina se desconecta da actina e usa a energia de uma nova molécula de ATP para retornar a sua configuração inicial. A frequência com que o estímulo elétrico chega à unidade motora do músculo determina o grau de tensão muscular. Altas frequências de estímulos elétricos fazem a unidade motora recrutar mais fibras musculares inervadas por ela, o que aumenta o grau de encurtamento do músculo (WILMORE; COSTILL; LARRY, 2013; MCARDLE; KATCH; KATCH, 2002). Além da frequência de disparo dos estímulos elétricos, há fatores que interferem na capacidade de o músculo produzir força no movimento, como o comprimento da fibra muscular, a continuidade do movimento para uso da força elástica, a arquitetura e os tipos de fibras musculares. Para entender como o comprimento da fibra muscular interfere na produção de força, é importante lembrar quais tipos de ação (contração) o músculo executa. São elas: dinâmica excêntrica, dinâmica concêntrica e isométrica (NORDIN; FRANKEL, 2014; HALL, 2013). A ação (contração) dinâmica excêntrica é definida quando o músculo gradativamente aumenta seu comprimento até o limite, sem gerar lesão; portanto, o músculo é alongado. Para o músculo alongar, o corpo cede à ação da força da gravidade e permite que o segmento corporal se desloque em direção ao solo ou a favor da gravidade. Com isso, o torque interno ou potente, produzido pelo músculo, é menor do que o torque externo ou resistente dos pesos sustentados pelo corpo no movimento. 120 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 Unidade II Já a ação (contração) dinâmica concêntrica é definida quando o músculo gradativamente diminui seu comprimento, ou seja, encurta. Para tanto, o corpo supera a ação da força da gravidade e permite que o segmento corporal se desloque para cima ou contra a ação da gravidade. Com isso, o torque interno ou potente, produzido pelo músculo, é maior do que o torque externo ou resistente dos pesos sustentados pelo corpo no movimento. Por sua vez, a ação (contração) isométrica é definida quando o músculo assume seu comprimento intermediário, ou seja, não está tão alongado, nem tão encurtado. Em postura estática, o músculo está em contração isométrica quando não há variação aparente em seu comprimento total. Dessa forma, a produção de força muscular se iguala à força da gravidade que atua no corpo; então, os torques interno ou potente e externo ou resistente são iguais. O corpo está em equilíbrio. Quando determinado músculo usa somente as proteínas contráteis de actina e miosina para produzirem o movimento, o comprimento do sarcômero, seja alongado, encurtado ou na condição intermediária, mudará a capacidade de produção de força do tecido muscular. Na biomecânica, a actina e miosina são nomeadas de componentes contráteis (TRICOLI, 2013; KOMI, 2000). Fo rç a 1.0 0.5 1.27 1.65 2.0 3.6.02.24 Comprimento do sarcômero Z Z M A 2.25 - 3.6 µm 2.0 - 2.25 µm < 1.65 µm Figura 51 – Ilustração da curva de comprimento-tensão. Produção de força do sarcômero (eixo y) em função do seu comprimento (eixo x): de 2,25-3,6 µm alongado (ação excêntrica); de 2,0-2,25 µm comprimento intermediário (ação isométrica); < 1,65 µm encurtado (ação concêntrica) A figura anterior mostra a variação da capacidade de produção de força muscular em razão do comprimento assumido pelo sarcômero. Nas condições de alongamento e encurtamento máximo 121 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 BIOMECÂNICA do sarcômero, o músculo tem a menor capacidade de produção de força, isso porque o número de interações entre a actina e a miosina diminui. No entanto, ao manter o sarcômero em seu comprimento intermediário, verifica-se máxima produção de força. Na prática, essa situação é percebida quando um sujeito tenta erguer uma carga alta pela primeira vez. Imagine o movimento de rosca direta com carga máxima; para erguer a barra pela primeira vez, a articulação do cotovelo sai da extensão máximapara flexão máxima. Quando em extensão máxima, os sarcômeros dos músculos responsáveis pela flexão de cotovelo estão totalmente alongados, sendo difícil iniciar o movimento, porque a quantidade de componentes contráteis conectados é pequena e a carga é alta, então, a capacidade de produção de força muscular nesse instante do movimento é baixa. Quando o cotovelo se aproxima do ângulo de 90 graus, o sarcômero alcança seu comprimento intermediário (ação “isométrica”) e o número de actinas e miosinas conectadas é a maior no movimento, garantindo produção de força muscular máxima para acelerar o peso para cima; assim, o movimento fica mais fácil. No entanto, ao aproximar a articulação do cotovelo da sua flexão máxima, ocorre grande encurtamento do sarcômero (ação concêntrica), e o número de conexões entre os componentes contráteis novamente diminui e compromete a produção de força muscular. Vale destacar que o músculo não tem somente esse formato de produção de força. Felizmente, além do componente contrátil que atua para o encurtamento do músculo em qualquer movimento produzido pelo corpo, ele pode produzir força pelos componentes elásticos presentes em sua estrutura. Os componentes elásticos em paralelo do músculo são o epimísio, perimísio e endomísio, e o componente elástico em série é o tendão. Todos esses componentes são formados por fibras de colágeno e, portanto, têm grande flexibilidade e elasticidade e resistem às forças de tração. A distinção de nomes para os componentes elásticos em paralelo ou em série se deve à sua localização em relação aos componentes contráteis (actina e miosina) no músculo. A importância dos componentes elásticos para o músculo é que eles viabilizam a produção de força potente, eles acumulam e restituem a força elástica em determinado gesto motor e somam essa força à contrátil (TRICOLI, 2013; KOMI, 2000). Lembrete A força potente é uma capacidade física que depende do uso de força submáxima ou máxima em alta velocidade de movimento. Entretanto, a capacidade do músculo para produzir força em alta velocidade diminui com o aumento da intensidade da carga. Assim, considerando o aspecto mecânico, o desenvolvimento da potência muscular é muito desafiador para o aparelho locomotor, mas este se adapta positivamente se o planejamento do treino físico for adequado. 122 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 Unidade II Para entender a produção da força potente na prática, atenta-se para a forma do movimento. Sempre que se almeja um movimento com potência, o músculo principal da ação é inicialmente alongado (fase preparatória) para posteriormente ser encurtado (fase principal). Ao alongar o músculo do movimento, este tracionará e acumulará energia elástica por meio do colágeno em sua estrutura. Logo em seguida, o músculo será encurtado, assim a força acumulada na fase preparatória do gesto motor será restituída na fase principal do movimento (TRICOLI, 2013; KOMI, 2000). Além da restituição da energia elástica acumulada, o músculo produz força pela interação entre actina e miosina, alcançando a força potente. Essa mecânica de movimento é vista em saltos, arremessos e chutes, movimentos que dependem de força potente para serem executados com técnica adequada. Uma informação importante para o uso da força elástica, conseguida com o ciclo alongamento- encurtamento do músculo, é manter a continuidade do gesto motor (TRICOLI, 2013; KOMI, 2000). Se um sujeito executar um salto vertical sem pausa entre a fase preparatória e a fase aérea, seu rendimento será maior do que se flexionar as articulações dos membros inferiores na fase preparatória, pausar o movimento e saltar depois da pausa. Na segunda situação, apesar de ter tracionado os músculos na fase preparatória do salto, a energia acumulada por eles se dissipará em forma de calor. Então, ao saltar após a pausa, a maior parte da força produzida pelo músculo será somente a contrátil, porque a força elástica mesmo depois da preparação foi dissipada em forma de calor devido à pausa entre a ação excêntrica e concêntrica do músculo. Saiba mais Leia o artigo científico disponível a seguir para entender mais sobre as adaptações neurais e morfológicas ao treinamento de força com ações excêntricas. BARROSO, R.; TRICOLI, V.; UGRINOWITSCH, C. Adaptações neurais e morfológicas ao treinamento de força com ações excêntricas. Revista Brasileira de Ciência e Movimento, 2005; n. 13(2), p. 111-122. Disponível em: <http://www.nutricaoemfoco.com.br/NetManager/documentos/ adaptacoes_neurais_e_morfologicas_ao_treinamento_de_forca_com_ acoes_excentricas.pdf>. Acesso em: 16 nov. 2016. Exemplo de aplicação Um atleta de voleibol executa dois saltos. No primeiro ele faz, sem pausa, a fase preparatória do movimento seguida da fase de propulsão do movimento. No segundo ele faz a fase preparatória, para por alguns segundos, e depois realiza a fase de propulsão do movimento. O desempenho do primeiro salto foi melhor do que o do segundo salto. 123 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 BIOMECÂNICA Sabendo que o músculo possui dois componentes em sua estrutura que podem produzir força, o contrátil e o elástico, reflita sobre a diferença de rendimento entre os saltos descritos anteriormente. A arquitetura do músculo também é um fator importante para entender sua vocação quanto à produção de força ou de velocidade em um gesto motor. Os músculos peniformes apresentam as fibras musculares anguladas em relação ao eixo longitudinal do músculo (veja os casos b e c na figura a seguir). Essa característica dá ao músculo maior capacidade de produzir força, porque terá maior quantidade de componentes contráteis por área de secção transversa. Se a maior interação entre os componentes contráteis garante maior produção de força, ter maior quantidade desses componentes por área de secção transversa muscular dá à estrutura a vocação de produzir força. Os músculos fusiformes têm fibras mais compridas, os sarcômeros posicionam-se em paralelo em relação ao eixo longitudinal do músculo (conforme o caso a na figura a seguir). Essa característica dá ao músculo maior capacidade de produzir velocidade no movimento. Com fibras mais longas, o número de sarcômero em série (um ao lado do outro) é maior do que por área de secção transversa. Ao receber o estímulo elétrico, a fibra inteira é encurtada, o que permite acelerar mais a execução do gesto motor através do encurtamento conjunto dos sarcômeros em série (HALL, 2013). a) b) c) Figura 52 – Representação da arquitetura dos músculos fusiforme (a) e peniformes (b) e (c) A composição metabólica das fibras musculares também altera sua capacidade de produção de força. As fibras do tipo 1 produzem menos força do que as fibras do tipo 2b. As fibras de contração lenta ou do tipo 1 são mais resistentes à fadiga muscular; no entanto, demoram para produzir sua força máxima, estando mais adaptadas para garantir força de baixa a moderada intensidade por longo período de tempo. Isso ocorre porque as fibras do tipo 1 têm menor quantidade de componentes contráteis por área de secção transversa e possuem em sua estrutura maior quantidade de mitocôndrias; assim, dependem do metabolismo aeróbio para produção de ATP necessário para conectar os componentes contráteis. 124 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 Unidade II As fibras de contração rápida ou do tipo 2b são menos resistentes à fadiga muscular; no entanto, produzem força máxima de imediato, estando mais adaptadas para garantir força de alta intensidade por curto período de tempo.Isso ocorre porque as fibras do tipo 2b possuem maior quantidade de actina e miosina por área de secção transversa e maior quantidade de enzimas que fazem ressíntese rápida de ATP armazenado e aceleram sua quebra para viabilizar o processo de contração muscular. Como os estoques de ATP no músculo são limitados, a manutenção da força máxima dura pouco tempo, característica de uma célula de metabolismo anaeróbio (WILMORE; COSTILL, 2013; MCARDLE; KATCH; KATCH, 2002). Apesar das particularidades estruturais e funcionais de cada músculo, os movimentos humanos ocorrem sempre devido à ação conjunta deles. Essas ações caracterizam a função do grupamento muscular, que pode ser de agonista, antagonista, estabilizador ou neutralizador (HALL, 2013). Os músculos agem como agonistas no movimento quando são os principais responsáveis por executarem o gesto motor. Eles encurtam para acelerar o segmento do corpo contra a ação da gravidade – é o que ocorre ao flexionar o cotovelo, pois os músculos bíceps braquial, braquial e braquiorradial encurtam para aproximar o braço do antebraço e erguer determinado peso. A ação de antagonista ocorre quando o movimento precisa ser desacelerado. O grupo muscular envolvido na ação faz a ação excêntrica, permite o movimento da articulação principal, mas controla sua aceleração angular. É o caso da finalização do chute no futebol: a articulação do joelho estende para o pé atingir a bola; no entanto, do meio para o fim da extensão, o grupamento muscular dos isquiotibiais são acionados em contração excêntrica para frear gradativamente esse movimento. Isso garante proteção para articulação, que não receberá um “tranco” no fim do movimento, e também assegura o controle do movimento, tornando o chute mais preciso ou certeiro. Assim, o fortalecimento muscular para equiparar as forças entre grupamentos antagônicos é de suma importância para evitar estresse na articulação e garantir precisão técnica no movimento. Os músculos estabilizadores são usados para manter uma articulação secundária ao movimento sem se mexer. Eles garantem a postura do corpo no gesto motor e se contraem em ação isométrica para estabilizar a articulação (HALL, 2013). A coluna vertebral no agachamento livre é um bom exemplo de uma área corporal que precisa ficar imóvel nesse exercício. Enquanto as articulações do tornozelo, joelho e quadril se movimentam, os músculos eretores da espinha agem isometricamente para manter a coluna estática, que é a postura adequada para o movimento. Os músculos neutralizadores atuam para anular a ação do músculo agonista do movimento quando esse músculo trabalha em mais de uma articulação. Isso se faz necessário para o músculo não realizar movimentos em articulações que precisam ficar imóveis (HALL, 2013). Considera-se o movimento do chute no futebol novamente: para estender o joelho, o músculo reto femoral é usado juntamente com os demais músculos do complexo do quadríceps – são agonistas do movimento. No entanto, além de estender o joelho, o músculo reto femoral flexiona o quadril, é um músculo biarticular. Para finalizar o chute, o joelho precisa estender, mas o quadril não pode apresentar um movimento de flexão expressivo; então, para neutralizar o movimento de flexão que o músculo reto femoral pode efetuar no quadril, o músculo glúteo máximo (extensor de quadril) atua na finalização do chute. 125 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 BIOMECÂNICA A análise de músculos que atuam no movimento para definir suas funções sobre as articulações em dado gesto motor é um dos objetivos da biomecânica. O entendimento dos métodos de investigação que permitem analisar os movimentos é de fundamental importância para conhecer a técnica de execução do gesto e adequar o planejamento do treino físico para aperfeiçoamento técnico. Os métodos de investigação da biomecânica serão descritos a seguir, juntamente com a caracterização do movimento da locomoção mais evidente do dia a dia, a marcha (caminhada). Resumo O aparelho locomotor é dotado de diversas articulações que garantem sua mobilidade. Didaticamente, ele pode ser dividido em: extremidade superior, extremidade inferior e tronco (ou coluna vertebral). A extremidade superior é constituída pelas articulações do ombro, cotovelo, punho e mão/dedos. Devido a suas características anatômicas e biomecânicas, esse complexo articular é responsável por fazer o elo entre a porção superior do corpo com o tronco. Dessa forma, garante ao ser humano a capacidade de manipular objetos de diferentes formas, bem como suportar cargas que vão além da sustentação do nosso corpo. A extremidade inferior realiza a conexão dos segmentos inferiores com o tronco, sendo composta de quadril/pelve, joelho, tornozelo e pés/ dedos, que são articulações análogas às da extremidade superior. Contudo, devido a diversas peculiaridades anatômicas e biomecânicas, a extremidade inferior apresenta funções bastante especiais, e ainda mais importantes em comparação à extremidade superior, sendo fundamental para a sustentação do corpo e para a locomoção humana. Completando a composição estrutural, anatômica e biomecânica do aparelho locomotor, temos a região do tronco. O tronco destaca-se como uma importante região do aparelho locomotor, formada por inúmeros ossos, articulações e músculos responsáveis por parte considerável da sustentação e estabilização do corpo, e pelo elo mecânico entre a extremidade superior, extremidade inferior e cabeça. Ademais, apresenta características anatômicas, biomecânicas e funcionais relacionadas a uma das mais relevantes estruturas do aparelho locomotor: a coluna vertebral. Os músculos do aparelho locomotor possuem componentes contráteis e elásticos para produção de força. Quando atuam conjuntamente, produzem força máxima e potência muscular, tornando o movimento mais econômico. Quando somente o componente contrátil é usado, o gasto energético é maior e a produção de força, menor. 126 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 Unidade II A disposição das fibras musculares, considerando o tamanho e tipo de fibra, também alteram a capacidade de produção de força. Músculos de fibras penadas produzem mais força do que os de fibras longas, que produzem movimentos velozes. A composição metabólica das fibras, tipo de fibra muscular, gera força máxima ou força resistente. A força máxima é obtida com as fibras do tipo IIb, e a força resistente, com as do tipo I. Exercícios Questão 1. (FUNRIO/SESDEC-RJ 2008) Destaca-se como principal função biomecânica da patela o(a): A) Bloqueio para as rotações do joelho. B) Aumento do braço de alavanca do quadríceps. C) Bloqueio para os movimentos sobre o plano coronal. D) Aumento do torque mecânico do quadríceps. E) Interface biomecânica entre os músculos vastos lateral e medial. Resposta correta: alternativa D. Análise das alternativas A) Alternativa incorreta. Justificativa: o bloqueio para as rotações do joelho é função dos ligamentos colaterais. B) Alternativa incorreta. Justificativa: a patela é mais um fulcro que um braço de alavanca. C) Alternativa incorreta. Justificativa: a patela não limita movimento algum. D) Alternativa correta. Justificativa: a patela é o maior osso sesamoide do corpo humano. Esses ossos se desenvolvem em alguns tendões e são encontrados nos lugares onde os tendões cruzam as extremidades dos ossos longos nos membros; eles protegem os tendões do desgaste excessivo e frequentemente modificam o 127 EF IS - R ev isã o: L uc as - D ia gr am aç ão : F ab io - 1 3/ 01 /2 01 7 BIOMECÂNICA ângulodos tendões em sua passagem até a inserção. A função principal da patela é atuar como uma roldana, potencializando a força dos músculos da parte anterior da coxa para estender o joelho. E) Alternativa incorreta. Justificativa: localiza-se na extremidade desses músculos, não entre eles. Questão 2. (FGV/ASSEMBLEIA LEGISLATIVA-MT 2013) A estabilidade da articulação do joelho é devida aos músculos e ligamentos que a cercam, além de uma cápsula fibrosa que é revestida por uma membrana sinovial. Sobre a referida estabilidade, analise as afirmativas a seguir. I – O ligamento colateral tibial resiste ao stress em varo e limita a rotação lateral da tíbia. II – O ligamento cruzado anterior tem a função de evitar a translação anterior da tíbia sobre o fêmur. III – A função do ligamento patelar é reforçar a cápsula articular anteriormente. Está(ão) correta(s): A) Apenas a afirmativa I. B) Apenas a afirmativa II. C) Apenas as afirmativas I e II. D) Apenas as afirmativas II e III. E) Todas as afirmativas. 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