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0 1 SUMÁRIO 1 Política de segurança pública e o seu papel na sociedade ........................ 2 2 A SEGURANÇA PÚBLICA NO BRASIL...................................................... 5 3 Segurança pública e entes federados ......................................................... 8 4 INOVAÇÃO NA GESTÃO DA SEGURANÇA PÚBLICA ........................... 11 5 SISTEMA ÚNICO DE SEGURANÇA PÚBLICA (SUSP) ........................... 15 6 CIENCIAS AUXILIARES ........................................................................... 17 7 EFICÁCIA DA LEI PROCESSUAL PENAL NO ESPAÇO ......................... 19 8 EFICÁCIA DA LEI PROCESSUAL PENAL NO TEMPO ........................... 21 9 AÇÃO PENAL ........................................................................................... 27 10 REFERENCIAS BIBLIOGRAFIA .............................................................. 45 2 1 POLÍTICA DE SEGURANÇA PÚBLICA E O SEU PAPEL NA SOCIEDADE Fonte: segurança.publica.com O direito penal e o direito processual penal e o sistema de justiça penal constituem normas e mecanismos institucionais no âmbito do Estado de Direito para minimizar e controlar o poder punitivo do país, de modo que se possa considerar o objetivo de proteger os cidadãos dos crimes. Portanto, a tarefa do direito penal e do direito processual penal é estabelecer fiscalizações que possam mitigar os riscos inerentes ao desequilíbrio de poder entre o Estado e os cidadãos. (AZEVEDO, 2018). Na sociedade a ordem pública pode ser compreendida como uma situação pacífica que possibilita uma ampla convivência social distante de ameaças de violências ou sublevação capazes de ocasionar, ainda a curto prazo, a prática de delitos de quaisquer espécies, ou seja, o contraponto do estado de segurança social é aquele em que se dá a prática de crimes (SILVA, 2020). Nesse sentido, para uma conivência harmônica, é fundamental que se preservem os direitos e garantias fundamentais. Logo, o Estado precisa desenvolver uma atividade constante de vigilância, prevenção e repressão de condutas que estejam em desconformidade com o estabelecido pelas normas jurídicas de determinado ordenamento (SILVA, 2020). No Brasil, a segurança pública levanta inúmeros questionamentos em relação à sua eficácia, já que compreende uma garantia que não pode ser entendida apenas como a disposição de policiamento nas ruas: as políticas públicas de segurança 3 envolvem um conjunto de outras garantias, como o acesso à educação, à saúde, à moradia e ao lazer (SILVA, 2020). De acordo com Silva (2020), o dever do Estado de garantir a segurança pública se estabelece no fato de a missão dessa entidade ser a consecução do bem-estar coletivo, buscando mecanismos que visem à manutenção da pacificação social dentro de situações de adversidades, nas quais se evidencia o papel fundamental do poder estatal. Essa finalidade pode ser compreendida como as ações que levem ao (re)equilíbrio das relações sociais. Já o direito à segurança pública está atrelado à implementação de políticas públicas. Conforme Bulos (2017), o direito à segurança é uma prerrogativa constitucional indisponível, garantida mediante a implementação de políticas públicas, ou seja, há uma imposição ao Estado de criar condições objetivas que concretizem o efetivo acesso a tal direito. Assim, pode ser considerado um direito fundamental de segunda dimensão, visto que exige ações positivas por parte do Estado (Apud SILVA, 2020). Tais condições devem ser verificadas por todos os poderes estatais. Especificamente, o Judiciário poderá determinar a implementação de ações que garantam esse direito quando do inadimplemento estatal de suas obrigações, ou seja, quando do enfretamento de matérias que careçam de ações estatais para assegurar o direito à segurança pública, o Poder Judiciário poderá determinar que os entes estatais desenvolvam ações que visem à garantia prática desse direito (SILVA, 2020). Para Silva (2020) tal prerrogativa do Judiciário é frequentemente criticada, visto que a judicialização das demandas com o objetivo de concretizar direitos e garantias fundamentais podem levar ao chamado ativismo judicial, ou seja, condições que extrapolem sua função precípua e passem a adentrar outros poderes. Outra crítica posta diz respeito ao fato de esse poder não ter uma compreensão ampla sobre as reais condições dos demais entes para efetivar as políticas públicas. Assim, a segurança pública, como dito, não se resume à questão de oferta de policiamento à determinada localidade. A amplitude dessa garantia pode ser verificada quando a Constituição de 1988, em seu art. 144, eleva ao Estado, na figura de todos os entes, o direito e a responsabilidade da concretização desse valor (BRASIL, 1988). Ainda assim, Silva (2020), acredita que a polícia cumpre um papel fundamental para a consecução dessa garantia. O já mencionado art. 144 estabelece que são 4 órgãos que cumprem essa finalidade de forma direta: a polícia federal, a polícia rodoviária federal, a polícia ferroviária federal, a polícia civil, a polícia militar e os corpos de bombeiros militares. Ao estabelecer essa última entidade como um guarda e executor das ações de segurança pública, o Poder Constituinte (responsável por construir as normas constitucionais originárias) reconhece que ações como desastres naturais comprometem diretamente a manutenção da incolumidade física e psíquica dos indivíduos. A função básica dos órgãos de segurança pública consiste em proteger todos os elementos da sociedade, incluindo os cidadãos, a economia e a infraestrutura crítica. Logo, existem vários agentes, como a polícia e os serviços de emergência, os departamentos municipais ou governamentais, os operadores de transporte e os grupos de segurança da comunidade, todos com um papel importante a desempenhar (SILVA, 2020). O Sistema Único de Segurança Pública (SUSP), criado pela Lei nº 13.675, de 11 de junho de 2018, substituiu o Conselho Nacional de Segurança Pública (CONASP), tendo por finalidade a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, por meio da atuação conjunta, coordenada, sistêmica e integrada dos órgãos de segurança pública e defesa social (BRASIL, 2018). Para além das suas funções sociais, a segurança pública pode ser vista como um direito fundamental, ou seja, todo indivíduo tem direito à incolumidade físico- psíquica e à locomoção. Aliás, essas garantias fazem parte da essência da dignidade da pessoa humana. Para ressaltar, a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 (DUDH/1948), em seu art. 23, estabelece que os indivíduos têm direitos à segurança pessoal. Vale destacar que não adianta a Carta Magna assegurar um conjunto de direitos caso não concretize, ao mesmo tempo, às pessoas (incluindo as jurídicas e similares) condições reais e efetivas de seu exercício regular. Assim, o Texto Maior garantiu que seja assegurado o direito à segurança como critério básico do Estado Democrático de Direito, o qual deve proteger a pessoa humana e seu patrimônio (SILVA, 2020). Embora o direito à proteção contra o crime ou a violência interpessoal ou social não esteja expressamente protegido pelo sistema internacional de direitos humanos, o Estado não pode se eximir de garantir aos seus cidadãos um ambiente seguro para 5 o desenvolvimento das relações, cabe a ele buscar mecanismos que garantam o bem- estar social (SILVA, 2020). Todavia, o conceito de segurança pode tomar conotações distintas quanto ao modelo estatal autoritário e democrático, bem como em relação à categoria tempo. Logo, esse conceito evoluiu ao longo da história e, dentro da perspectiva de uma democracia, significa a manutenção da ordem do poder e da supremacia estatal (SILVA, 2020). Para concretizar o modelo democrático,os Estados têm adotado cada vez mais instrumentos que viabilizam a participação cidadã. A aplicação das leis que compõem um ordenamento jurídico deve ter, entre outras coisas, a premissa de concretização do princípio da proteção cidadã com base nos direitos humanos, que, para além do crime, auxilie no processo de pacificação social (SILVA, 2020). 2 A SEGURANÇA PÚBLICA NO BRASIL Fonte:gov.br/sudene/pt-br No Brasil, a primeira instituição policial surge com a transferência da família real portuguesa, em 1808. Apesar de ter moldes muito diferentes dos que você conhece hoje, a Intendência Geral da Polícia da Corte e do Estado do Brasil, sediada no Rio 6 de Janeiro, era responsável pelo policiamento judiciário e pela fiscalização; além disso, atendia às necessidades relativas a serviços urbanos (MARCINEIRO; PACHECO, 2005). Menos generalista, a Divisão Militar da Guarda Real de Polícia tinha cunho mais coercitivo. Criada em 1809, detinha competências militares e estava subordinada ao Ministério da Guerra. Além de reprimir atos criminosos, atuava na captura de escravos fugitivos e na patrulha (MENDONÇA, 2020). Segundo Mendonça (2020), com a independência e a convulsão social que ela provocou, uma Guarda Real foi estabelecida, visando à proteção do País e de seus cidadãos. Essa força policial agia em conjunto com o Exército, criado em 1648, mas com limitações de atuação em virtude da dependência brasileira de Portugal. Posteriormente, a Regência pôs fim à Guarda Real, substituindo-a pelo Corpo de Guardas Municipais Voluntários Permanentes. Tais instituições eram regionalizadas, o que mais tarde possibilitou a alteração de cada uma de acordo com a unidade federativa. Note que há uma relação entre o policiamento brasileiro e as forças militares. A estrutura social vigente em todo o período anterior à proclamação da República colocava a manutenção da ordem sob os cuidados da nobreza e de grandes proprietários de terra. Além disso, a polícia exercia um controle que visava a coibir insubordinações, fossem às leis ou aos costumes. Nesse período, as forças policiais tratavam de garantir a presença do poder estatal em todos os territórios, em uma tentativa de se aproximar da população, de modo a solucionar os conflitos cotidianos. Aos poucos, a instituição policial tomou forma e adquiriu força para manter a ordem social. Como seu poder ainda era submisso à coroa portuguesa, a instituição policial exigiu esforços da nobreza e dos magistrados brasileiros para se tornar submissa ao Poder Judiciário (MENDONÇA, 2020). O período imperial trouxe inovações importantes para a descentralização do poder policial. Com a promulgação do Código Processual Penal, em 1832, foram criadas duas autoridades provinciais, que eram indicadas pelo governador e coordenavam a polícia regionalmente: os chefes de polícia e os juízes de paz. Mas esse modelo não foi bem-sucedido; afinal, ao regionalizar o controle, o Estado perdia poder de decisão. Assim, o cargo de juiz de paz perde sua autonomia frente às forças policiais em 1841, ficando tal autonomia concentrada nos chefes de polícia, agora indicados diretamente pelo governo central (MENDONÇA, 2020). 7 Com a proclamação da República, em 1889, somada aos resultados da abolição da escravidão, as relações sociais sofreram um impacto significativo. Os escravos fugitivos, antes alvo da polícia, transformaram-se em uma classe subalterna livre, e a classe dominante perdeu parte de seu poder. Além disso, a rápida urbanização das cidades e o adensamento demográfico exigiram das instituições policiais algumas adequações. Configurava-se a passagem do espaço rural para o urbano, agora com diferentes demandas de vigilância e repressão (MENDONÇA, 2020). O federalismo trouxe a descentralização de poderes, exigindo uma nova dinâmica para exercer o controle social. Apenas a vigilância e a repressão já não eram suficientes, e novos instrumentos precisavam ser pensados e implementados. O Código Penal de 1890 foi um desses instrumentos. Segundo Holloway (1997), o novo código voltou os olhos para as chamadas “classes perigosas”, tipificando como crimes a vadiagem, a prostituição, a embriaguez e a capoeira (MENDONÇA, 2020). É com o golpe de 1930 que a polícia começa a desempenhar um papel de destaque na manutenção do regime autoritário. Getúlio Vargas amplia as tarefas policiais para controlar as dissidências políticas e promove uma reforma no alto escalão das polícias civis em todo o País. Desse modo, somente pessoas de sua estrita confiança podiam ocupar cargos de comando (MENDONÇA, 2020). Para Faoro (1997), Vargas fazia repressão política e colocava todo o aparato policial sob suas ordens. Considere o seguinte: A Constituição Federal de 1934 outorga o controle direto das forças públicas estaduais ao governo federal. É nesse texto constitucional que pela primeira vez na história há a imposição formal de um caráter eminentemente militarizado ao campo da segurança, tornando as forças estaduais, auxiliares do exército. Com isso a segurança pública brasileira segue na tênue e complexa dinâmica política e social que envolve o poder e a violência. Esse princípio metamórfico atinge especialmente as polícias que passam a receber uma espécie de upgrade em suas prerrogativas quanto ao uso do poder e do exercício da prática violenta (BONAMIGO; CHAVES, 2014, p. 461 Apud MENDONÇA, 2020). A militarização das polícias toma corpo no regime militar. Assim como na Era Vargas, a polícia tinha como missão principal conter a oposição política, daí o histórico de abuso de autoridade, repressão violenta e tortura que marca esse período. Ainda que, pela perspectiva do governo, as polícias estivessem garantindo a ordem pública, 8 os excessos cometidos no período da ditadura militar deixaram marcas profundas na história da instituição policial (MENDONÇA, 2020). No período seguinte, a centralização do comando começa a ser questionada, bem como o papel da instituição policial como um órgão de prestação de serviços para a sociedade. A Constituição Federal de 1988 reorganiza a estrutura das polícias, atribuindo a cada uma competências capazes de atender às necessidades sociais (MENDONÇA, 2020). 3 SEGURANÇA PÚBLICA E ENTES FEDERADOS Fonte: pt.dreamstime.com Conforme explica Mendonça (2020), em um país como o Brasil, de dimensões continentais e com tanta diversidade cultural, o controle da criminalidade e a manutenção da ordem são desafios para os governos. Ainda que o planejamento e a implementação das políticas públicas de segurança atendam a critérios regionais, o monitoramento, o controle e a avaliação precisam estar dispostos de forma a permitir a rápida tomada de decisão e o reencaminhamento de ações. Com o fim da ditadura e o começo da abertura democrática, torna-se possível pensar em alternativas para alterar a realidade da ação policial. A Assembleia 9 Nacional Constituinte se preocupa em dedicar um espaço na Constituição para inovar na segurança pública (MENDONÇA, 2020). O modelo policial reativo praticado até então (era necessário que o delito se efetivasse para que a polícia agisse) estava muito longe do que a sociedade precisava. Assim, a Constituição Federal de 1988 propõe e legitima uma ação policial proativa, com políticas de prevenção. Além disso, ainda inova ao determinar a gestão participativa como elo fundamental para a resolução dos crescentes violência e criminalidade (MENDONÇA, 2020). No seu art. 144, a Constituição estabelece os órgãos policiais e suas competências. Veja (BRASIL, 1988): Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos: I — polícia federal; II — polícia rodoviária federal; III — polícia ferroviáriafederal; IV — polícias civis; V— polícias militares e corpos de bombeiros militares. Ao estabelecer cinco âmbitos de atuação das polícias, o legislador pretendia obter uma organização por competências, antes de uma organização hierárquica. Isto é, ele não desejava estabelecer uma concorrência na ação das instituições, que passam a atuar de acordo com as demandas dos entes federativos. O art. 144 ainda determina o seguinte (BRASIL, 1988): § 1º A polícia federal, instituída por lei como órgão permanente, organizado e mantido pela União e estruturado em carreira, destina-se a: I — apurar infrações penais contra a ordem política e social ou em detrimento de bens, serviços e interesses da União ou de suas entidades autárquicas e empresas públicas, assim como outras infrações cuja prática tenha repercussão interestadual ou internacional e exija repressão uniforme, segundo se dispuser em lei; II — prevenir e reprimir o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o contrabando e o descaminho, sem prejuízo da ação fazendária e de outros órgãos públicos nas respectivas áreas de competência; III — exercer as funções de polícia marítima, aeroportuária e de fronteiras; IV — exercer, com exclusividade, as funções de polícia judiciária da União. § 2º A polícia rodoviária federal, órgão permanente, organizado e mantido pela União e estruturado em carreira, destina-se, na forma da lei, ao patrulhamento ostensivo das rodovias federais. § 3º A polícia ferroviária federal, órgão permanente, organizado e mantido pela União e estruturado em carreira, destina-se, na forma da lei, ao patrulhamento ostensivo das ferrovias federais. § 4º Às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares. 10 § 5º Às polícias militares cabem a polícia ostensiva e a preservação da ordem pública; aos corpos de bombeiros militares, além das atribuições definidas em lei, incumbe a execução de atividades de defesa civil. § 6º As polícias militares e corpos de bombeiros militares, forças auxiliares e reserva do Exército, subordinam-se, juntamente com as polícias civis, aos Governadores dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios. § 7º A lei disciplinará a organização e o funcionamento dos órgãos responsáveis pela segurança pública, de maneira a garantir a eficiência de suas atividades. Veja que, com exceção da Polícia Rodoviária Federal e da Polícia Ferroviária Federal, a Polícia Federal e as polícias civis e militares apresentam competências muito semelhantes, o que pode significar uma dificuldade na definição e no cumprimento de suas competências. O legislador procurou determinar uma separação regional e ainda de subordinação. Ao atribuir a uma lei futura a organização e o funcionamento dos órgãos de segurança pública, buscou descentralizar a organização de acordo com a realidade de cada ente federado. Veja a seguir uma síntese das competências de cada uma das polícias (MENDONÇA, 2020). Polícias militares: são as forças estaduais de segurança pública. Sua função principal é a preservação da ordem pública. O policiamento é ostensivo e reativo. As polícias militares são subordinadas aos governadores. Polícias civis: também são forças estaduais de segurança pública, no entanto atuam como polícia judiciária, como auxiliares na aplicação da lei pela Justiça Estadual. São consideradas forças de inteligência, pois, cabe a elas a investigação policial. Polícia Federal: trata-se de instituição subordinada diretamente ao Ministério da Justiça, portanto investiga os crimes julgados pela Justiça Federal. Policiamento marítimo e aeroportuário, fiscalização de fronteiras e alfândegas, além de emissão de passaportes, são de competência da Polícia Federal. Polícia Rodoviária Federal: a atuação da Polícia Rodoviária Federal está circunscrita às rodovias federais. Ela é responsável pela fiscalização de trânsito e pelo combate ao crime. Polícia Ferroviária Federal: é subordinada diretamente à União, como as outras polícias federais. É responsável pelo patrulhamento ostensivo nas ferrovias federais. 11 As polícias legislativa e do Exército são instituídas em regulamento próprio, por serem internas aos seus órgãos. Assim, não cabe a elas funções que extrapolem o âmbito da instituição em que atuam. Por isso, essas polícias não constam do art. 144 da Constituição Federal. Há ainda a Força Nacional de Segurança Pública, que atua em situações localizadas e que, por seu caráter não permanente, não pode ser considerada uma força policial. As guardas municipais, apesar da previsão constitucional, possuem especificidades locais e não compõem a força policial, dado o seu caráter preventivo e de vigilância (MENDONÇA, 2020). Por fim, os corpos de bombeiros militares são instituições de defesa civil, mas também atuam como forças auxiliares do Exército quando necessário, assim como as polícias militares. Seu caráter é mais protetivo, estando a serviço da população no combate a situações de calamidade pública (MENDONÇA, 2020). Os estados federados desempenham dois papéis fundamentais: a preservação da ordem e a investigação em seus territórios. Isso ocorre tanto no policiamento ostensivo das polícias militares quanto nas forças de inteligência representadas pelas polícias civis (MENDONÇA, 2020). 4 INOVAÇÃO NA GESTÃO DA SEGURANÇA PÚBLICA Fonte:saibadascoisas.blogspot.com 12 Quando se fala em inovação de serviços públicos, surge uma série de entraves burocráticos a serem transpostos. Com a segurança pública, não é diferente. Como ela é uma questão de extrema importância para a sociedade e envolve tantos fatores, qualquer mudança deve ser discutida e refletida com vistas a oferecer à sociedade condições de segurança suficientes para o exercício pleno da cidadania (MENDONÇA,2020). Na inovação do setor público, destaca-se a exigência de novos arranjos políticos, o que exige investimento em recursos humanos, capacitação profissional e gestão eficiente de recursos econômicos. Face a tantas condicionalidades, cada mudança proposta, apesar de necessária, enfrenta resistências e causa desconforto. Na segurança pública, com a gestão participativa, novos atores são convidados a opinar e debater as demandas, sempre com suas especificidades (MENDONÇA, 2020). Segundo Rolim (2007), as instituições possuem uma cultura própria, resistente a modificações. As instituições policiais são marcadas pelo conservadorismo e atuam como se não tivessem de prestar contas de seus atos, como se fossem a autoridade máxima do Estado. Assim, boa parte das distorções do trabalho policial, como violência desmedida, atos de corrupção e mandonismo, estão presentes na atuação cotidiana dos policiais, manchando a imagem da corporação e gerando mal-estar social. Veja: A cultura policial se marca, finalmente, por um conservadorismo intelectual que, sob a capa do pragmatismo, privilegia o olhar rasteiro, a tomada em consideração apenas dos elementos concretos e o anti-intelectualismo. Tudo o que se apresenta sob a forma de inovação, de experimentação ou de pesquisa suscita reações de rejeição imediata. Pelo fato de ser redutora de incerteza, a reprodução do “eterno passado” congela o universo policial em práticas rotineiras e bloqueia sua capacidade de se adaptar à mudança social (MONET, 2001, p. 155 Apud MENDONÇA, 2020). É histórica a atuação violenta das polícias militares, pois o caráter de órgão ostensivo privilegia uma postura rígida frente à sociedade. Mas há um conflito subjetivo que permeia a relação entre polícia e sociedade: de um lado, a rigidez necessária para coibir a ação criminosa; de outro, o diálogo equilibrado com a sociedade. Assim, para todos aqueles que estão acostumados a um tipo de abordagemrepressiva e que imaginam que a atividade policial seja exclusivamente isso, será, por certo, bastante difícil operar uma transição para um modelo fundado 13 em outras premissas; um modelo em que, por exemplo, a repressão esteja subordinada a uma racionalidade preventiva. Por óbvio, a resistência à inovação oferecida pelas instituições policiais não é apenas motivada por diferenças culturais ou ideológicas. Ocorre que o atual modelo de polícia tem permitido também que determinados interesses particulares, articulados ilegalmente e mesmo em estreita colaboração com grupos criminais, tenham fincado raízes nas instituições policiais. Reformas, então, também ameaçam práticas altamente lucrativas já acomodadas na instituição, e que beneficiam parte das elites policiais (ROLIM, 2007, p. 36 Apud MENDONÇA, 2020). Mas a Constituição Federal e as legislações posteriores se propuseram a trazer novas ferramentas e instrumentos para se pensar a segurança pública, de maneira a romper com o paradigma de uma polícia truculenta. A Política Nacional de Segurança Pública, juntamente ao Sistema Único de Segurança Pública, visa a uniformizar e multiplicar as boas práticas nas diferentes polícias, bem como a atender o anseio da sociedade por segurança e bem-estar (MENDONÇA, 2020). A prevenção ainda é reconhecida como uma das melhores estratégias para a redução dos índices de criminalidade. Mas trabalhar a prevenção exige uma interação cooperativa com a sociedade e com outras organizações públicas, além de incentivos dos entes federativos. A repressão continua sendo importante, no entanto pode ser minimizada por ações preventivas e educativas. Veja o que afirma Oliveira Junior (2016, p. 14): Parte-se do pressuposto de que a atuação de instituições participativas, tais como os conselhos comunitários de segurança pública (ou instituições congêneres) e os programas criados principalmente por iniciativa das polícias estaduais, como o Rede de Vizinhos Protegidos, consiste em uma forma relativamente nova de participação da sociedade civil na segurança pública no Brasil. Trata-se de programas, ações ou projetos costumeiramente classificados sob a rubrica do policiamento comunitário, ou modelos afins, como polícia de proximidade e outros (Apud Mendonça, 2020). Políticas e programas têm trazido bons resultados, embora ainda tímidos, nas inovações em segurança pública no Brasil. Base comunitária, Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs), programas de prevenção ao uso de drogas, conselhos de segurança, territórios de paz, entre tantas outras ações, destacam- -se como iniciativas importantes para modificar a realidade dos índices de violência e criminalidade do País (MENDONÇA, 2020). Como exemplo, você pode considerar a Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo, que criou em 2008 a Diretoria de Polícia Comunitária e de Direitos Humanos (DPCDH). Com a DPCDH, a instituição constrói um rol de valores para a aproximação com a comunidade. Isso passa pela capacitação profissional dos 14 agentes policiais e por ações e programas de estreitamento do vínculo com a comunidade. Os valores da DPCDH são representado: pelos pilares da hierarquia e da disciplina; pela filosofia de polícia comunitária; pelo mais absoluto respeito aos direitos humanos; pela ação em defesa da vida, da integridade física e da dignidade das pessoas; pela ação com honestidade de propósitos, probidade, patriotismo, civismo e coragem. As relações humanas no ambiente de trabalho devem ser pautadas pela fraternidade, pela justiça, pela lealdade, pela constância de propósitos e pelo profissionalismo. Além disso, os policiais devem servir à população da mesma forma como gostariam de ser servidos (MENDONÇA, 2020). As UPPs do Rio de Janeiro não foram bem-sucedidas como política permanente; várias unidades já foram desativadas. Para saber mais sobre essa iniciativa no contexto fluminense, leia a dissertação de mestrado de Marielle Franco, intitulada “UPP – A redução da favela a três letras: uma análise da política de segurança pública do Estado do Rio de Janeiro” e o artigo “UPPs, mais uma história de esperança e fracasso na segurança pública do Rio”, de Felipe Betim, na seção brasileira do site do jornal espanhol El Pais (MENDONÇA, 2020). Todos os programas têm como base a polícia comunitária, filosofia organizacional compartilhada por todos os órgãos de polícia: É uma filosofia e estratégia organizacional que proporciona uma nova parceria entre a população e a polícia. Baseia-se na premissa de que tanto a polícia quanto a comunidade devem trabalhar juntas para identificar, priorizar e resolver problemas contemporâneos tais como crime, drogas, medo do crime, desordens físicas e morais, e em geral a decadência do bairro, com o objetivo de melhorar a qualidade geral da vida na área (TROJANOWICZ; BUCQUEROUX, 1994, p. 4 Apud MENDONÇA, 2020). A polícia comunitária atua a partir dos seguintes requisitos: 15 imagem da polícia protetora e amiga; aproximação entre a comunidade e a organização policial; noção de que o agente policial tem função didático-pedagógica, orientando e educando o cidadão; respeito aos direitos humanos e direitos fundamentais garantidos pela Constituição; noção de que o policial é um cidadão íntegro, um representante do Estado que atende às demandas sociais. Todas essas inovações no comportamento e nas competências das polícias requerem também uma modificação da participação da sociedade e, principalmente, dos órgãos públicos na promoção de uma cultura de justiça social. São necessárias políticas públicas transversais e integradas com vistas ao exercício pleno da cidadania. 5 SISTEMA ÚNICO DE SEGURANÇA PÚBLICA (SUSP) Fonte: justiça.gov.br 16 A criação do Sistema Único de Segurança Pública (Susp) é um marco divisório na história do país. Implantado pela Lei nº 13.675/2018, sancionada em 11 de junho, o Susp dá arquitetura uniforme ao setor em âmbito nacional e prevê, além do compartilhamento de dados, operações e colaborações nas estruturas federal, estadual e municipal (JSP, 2020). Com as novas regras, os órgãos de segurança pública, como as polícias civis, militares e Federal, as secretarias de Segurança e as guardas municipais serão integrados para atuar de forma cooperativa, sistêmica e harmônica (JSP,2020). Como já acontece na área de saúde, os órgãos de segurança do Susp já realizam operações combinadas. Elas podem ser ostensivas, investigativas, de inteligência ou mistas e contar com a participação de outros órgãos, não necessariamente vinculados diretamente aos órgãos de segurança pública e defesa social – especialmente quando se tratar de enfrentamento a organizações criminosas. O Sistema Único de Segurança Pública (Susp) tem como órgão central o Ministério da Segurança Pública e é integrado pelas polícias Federal, Rodoviária Federal; civis, militares, Força Nacional de Segurança Pública e corpos de bombeiros militares. Além desses, também farão parte do Susp: agentes penitenciários, guardas municipais e demais integrantes estratégicos e operacionais do segmento da Segurança Pública (JSP,2020). A lei do Susp cria também a Política Nacional de Segurança Pública e Defesa Social (PNSPDS) para fortalecer "as ações de prevenção e resolução pacífica de conflitos, priorizando políticas de redução da letalidade violenta, com ênfase para os grupos vulneráveis". A Política será estabelecida pela União e está prevista para valer por dez anos. Caberá aos estados, ao Distrito Federal e aos municípios estabelecerem suas respectivas políticas a partir das diretrizes do Plano Nacional (JSP,2020). 17 6 CIENCIAS AUXILIARES Fonte: empenhoconsultoria.com.br Dentre as ciências auxiliares de maior conexão com o direito processualpenal, podem ser mencionadas a política criminal, a criminologia, a medicina legal, a psiquiatria forense e a polícia científica. Política Criminal É a política criminal que fornece o critério para apreciação do valor da norma vigente e propõe o modelo de norma a vigorar. O processo criminal não pode se afastar do modelo de política criminal adotado. Este se reflete no processo e é inegável a relação existente entre ambos, pois não basta apenas impor as sanções, mas saber como aplicar a pena eficazmente, a fim de se obter os seus efeitos preventivos e repressivos. Criminologia Criminologia é a ciência que se ocupa do estudo do crime, da pessoa do infrator, da vítima e do controle social do comportamento delitivo, procura fornecer uma informação válida, contrastada, sobre a gênese, dinâmica e variáveis principais do crime - contemplado este como problema individual e como problema social - 18 fornecendo programas de prevenção eficaz do mesmo e técnicas de intervenção positiva no homem delinquente. Medicina legal Há uma ligação muito próxima entre o direito processual e a medicina legal. Esta fornecerá parâmetros para se aferir a imputabilidade do réu sobre o qual pairar dúvidas quanto à sanidade mental. Apurará os vestígios dos delitos e suas sequelas nas vítimas. É importante ressaltar que o resultado final do processo está vinculado à qualidade de determinada perícia, daí sua inequívoca relevância para o processo. Psiquiatria forense A intervenção da psiquiatria na criminologia forense deriva de norma expressa do Código Penal, o art. 26 e seu parágrafo único. Art. 26. É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. Parágrafo único. A pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, em virtude de perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. Na verdade, observamos que a sociedade separou a criminalidade da loucura, depois de tê-las confundido por um longo período. Dessa diferenciação nasceu a perícia psiquiátrica. O perito psiquiatra desempenha papel de extremo significado na aplicação da justiça criminal. 19 7 EFICÁCIA DA LEI PROCESSUAL PENAL NO ESPAÇO Fonte:gov.com.br A lei processual penal aplica-se a todas as infrações penais cometidas em território brasileiro, sem prejuízo de convenções, tratados e regras de direito internacional. Vigora o princípio da absoluta territorialidade, ou seja, aos processos e julgamentos realizados no território brasileiro, aplica-se à lei processual penal nacional. Justifica-se por ser a função jurisdicional a manifestação de uma parcela da soberania nacional, podendo ser exercida apenas nos limites do respectivo território (AZEVEDO, 2019). A territorialidade vem consagrada no art. 1º do Código de Processo Penal: Art. 1º. O processo penal reger-se-á, em todo território brasileiro, por este Código, ressalvados: I - os tratados, as convenções e regras de direito internacional; II - as prerrogativas constitucionais do Presidente da República, dos ministros de Estado, nos crimes conexos com os do Presidente da República, e dos ministros do Supremo Tribunal Federal, nos crimes de responsabilidade (Constituição, arts. 86, 89, parágrafo 2º, e 100); III - os processos da competência da Justiça Militar; 20 IV - os processos da competência do tribunal especial (Constituição, art. 122, nº 17); V - os processos por crimes de imprensa; Parágrafo único. Aplicar-se-á, entretanto, este Código aos processos referidos nos ns. IV e V, quando as leis especiais que os regulam não dispuserem de modo diverso. As ressalvas mencionadas neste artigo não são, como podem parecer, exceções à territorialidade da lei processual penal brasileira, mas apenas à territorialidade do Código de Processo Penal. Impõem, tendo em vista as peculiaridades do direito, a aplicação de outras normas processuais positivas na Constituição Federal e em leis extravagantes, v.g., nos casos de crimes de militares, eleitorais, falimentares, de entorpecentes, nas contravenções do jogo do bicho, nas infrações de menor potencial ofensivo etc. O inciso I contempla verdadeiras hipóteses excludentes da jurisdição criminal brasileira, isto é, os crimes serão apreciados por tribunais estrangeiros segundo suas próprias regras processuais, v.g., casos de imunidade diplomáticas, de crimes cometidos por estrangeiros a bordo de embarcações públicas estrangeiras em águas territoriais e espaço aéreas brasileiro etc (AZEVEDO, 2019). Considera-se praticado em território brasileiro o crime cuja ação ou omissão, ou cujo resultado, no todo ou em parte, ocorreu em território nacional. Considera-se como extensão do território nacional, para efeitos penais, as embarcações e aeronaves públicas ou a serviço do governo brasileiro, onde quer que se encontrem, e as embarcações e aeronaves particulares que se acharem em espaço aéreo ou marítimo brasileiro, ou em alto-mar ou espaço aéreo correspondente (AZEVEDO, 2019). A lei penal aplica-se aos crimes cometidos fora do território nacional que estejam sujeitos à lei penal nacional. É a chamada extraterritorialidade da Lei penal. Contudo, é preciso que se frise: a lei processual brasileira só vale dentro dos limites territoriais nacionais. Se o processo tiver tramitação no estrangeiro, aplicar-se-á a lei do país em que os atos processuais forem praticados (AZEVEDO, 2019). 21 A legislação processual brasileira também se aplica aos atos referentes às relações jurisdicionais com autoridades estrangeiras que devem ser praticados em nosso país, tais como o cumprimento de rogatória etc. 8 EFICÁCIA DA LEI PROCESSUAL PENAL NO TEMPO Fonte: veja.abril.com.br “A lei processual penal aplicar-se-á desde logo, sem prejuízo da validade dos atos realizados sob a vigência da lei anterior” (BRASIL,1941). Percebe-se, desde logo, que o legislador pátrio adotou o princípio da aplicação imediata das normas processuais, sem efeito retroativo, uma vez que, se tivesse, a retroatividade anularia os atos anteriores, o que não ocorre (AZEVEDO, 2019). Dessa forma, sem a sua retroatividade, os atos processuais realizados sob a égide da lei anterior são considerados válidos e as normas processuais têm aplicação imediata, regulando o desenrolar do processo. Todavia, embora a lei processual não seja retroativa, há que se atentar quanto às normas jurídicas que possuem natureza mista, ou seja, serem dotadas de natureza processual e material, concomitantemente, atribuindo-lhe, assim, efeito retroativo ao dispositivo que for mais favorável ao réu (AZEVEDO, 2019). Princípios do Direito Processual Penal 22 Verdade real No processo penal, o juiz tem o dever de investigar como os fatos se passaram na realidade, não se conformando com a verdade formal constante dos autos, como acontece no processo civil. Desse modo, se o juiz não estiver ainda convencido da autoria, ou necessitar de outras provas, poderá requisitá-las para esclarecer eventuais dúvidas sobre pontos relevantes. No processo penal, o juiz não representa mero espectador, mas deverá esgotar todos os meios para satisfazer o princípio maior do processo penal que é à busca da verdade real. Legalidade (art. 28, do CPP) Os órgãos incumbidos da persecução penal não podem possuir poderes discricionários para apreciar a conveniência ou oportunidade da instauração do processo ou do inquérito. Assim, a autoridade policial, nos crimes de ação pública, tem o dever dedeterminar a instauração do inquérito policial, e o órgão do Ministério Público é obrigado a apresentar a respectiva denúncia, desde que o fato seja delituoso. Oficiosidade Os órgãos incumbidos da persecução penal devem proceder ex officio, não devendo aguardar provocação, ressalvados os casos de ação penal privada e ação penal pública condicionada à representação do ofendido. (CPP, artigo 5º §§ 4º e 5º, e artigo 24). Autoritariedade Os órgãos investigantes e processantes devem ser autoridades públicas (delegado de polícia e promotor ou procurador de justiça). Exceção a esta regra é a ação penal privada. Indisponibilidade (CPP, art. 17, 42 e 576) - A autoridade policial não pode determinar o arquivamento do inquérito policial (CPP, art. 17). - O Ministério Público não pode desistir da ação penal pública, nem do recurso interposto (CPP, arts. 42 e 576). Princípio do juiz natural (CF, art. 5º, incisos XXXVII e LIII). 23 A Constituição Federal proíbe a criação de tribunais de exceção, e, ligado à proibição dos tribunais de exceção está o princípio do juiz natural ao expressar “Ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente”. Não se devem confundir as justiças especiais com os chamados tribunais de exceção. As justiças especiais são as previstas na própria Constituição para o julgamento de determinadas causas, como a Justiça Eleitoral, a Justiça do Trabalho e a Justiça Militar. A proibição dos juízes de exceção refere-se à eventual criação de órgão específico para a decisão civil ou penal de determinados casos, fora da estrutura do Poder Judiciário. Os tribunais de exceção normalmente são instituídos em período revolucionário, para o julgamento de fatos políticos, e estão afastados pelo texto constitucional. Publicidade (CPP, art. 792 e CF, art. 5º, LX, e 93, IX, parte final). Em regra, os atos processuais são públicos e as audiências são franqueadas ao público em geral (CPP, art. 792). Contudo, segundo o parágrafo 1º do art. supra, “se da publicidade da audiência, da sessão ou do ato processual, puder resultar escândalo, inconveniente grave ou perigo de perturbação da ordem, o juiz, ou tribunal, câmara ou turma, poderá, de ofício ou a requerimento da parte ou do Ministério Público, determinar que o ato seja realizado a portas fechadas, limitando o número de pessoas que possam estar presentes”. Contraditório e ampla defesa (CF, art. 5º, LV). O réu deve conhecer a acusação que se lhe imputa para poder contrariá-la, ou, ainda, dela se defender, posto que nenhum acusado será processado ou julgado sem defensor constituído ou nomeado, evitando possa ser condenado sem ser ouvido. Por isso, é essencial que o acusador, ao formular a denúncia ou queixa-crime, narre claramente os fatos que está a imputar ao futuro réu, a fim de que este tenha pleno conhecimento da acusação, podendo elaborar sua defesa e produzir provas, sob pena de inépcia da inicial. Iniciativa das partes (“ne procedat judex ex officio”) - (CF, art. 5º, LIX e art. 129, I, e CPP, arts. 29 e 30). 24 O juiz depende da provocação da parte. Cabe ao Ministério Público promover privativamente a ação penal pública e ao ofendido, a ação penal privada. Se o juiz der início a uma ação penal ele perderá sua imparcialidade. 10. Ne eat judex ultra petita partium (arts. 383 e 384 do CPP). O juiz deve pronunciar-se sobre aquilo que lhe foi pedido. O que efetivamente vincula o juiz criminal, definindo a extensão do provimento jurisdicional, são os fatos submetidos à sua apreciação. Se o promotor, na denúncia, imputa ao réu um crime de furto, e, ao final, apura-se que o crime cometido foi o de estupro, não pode o juiz proferir condenação, ainda que o outro crime esteja caracterizado. 11. Devido processo legal (CF, art. 5º, LIV). Consiste em assegurar à pessoa o direito de não ser privada de sua liberdade e de seus bens, sem a garantia de um processo desenvolvido na forma que estabelece a lei. (CF, art. 5º, LIV). 12. Presunção de inocência (CF, art. 5º, LVII). Nossa Constituição Federal consagra o princípio de que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória. Porém, convém lembrar a Súmula 9 do Superior Tribunal de Justiça, segundo a qual a prisão processual não viola o princípio do estado de inocência. Entretanto, o art. 594 do nosso diploma processual impõe que o réu não poderá apelar sem recolher-se à prisão, ou prestar fiança, salvo se for primário e de bons antecedentes, assim reconhecido na sentença penal condenatória, ou condenado por crime que se livre solto. Nesse sentido, há muita discussão doutrinária a respeito de flagrante inconstitucionalidade. 13. Favor rei (CF, art. 5º, XL e CPP, art. 617). 25 A dúvida sempre beneficia o acusado. Se houver duas interpretações, deve- se optar pela mais benéfica; na dúvida, absolve-se o réu, por insuficiência de provas; só a defesa possui certos recursos, como o protesto por novo júri e os embargos infringentes; só cabe ação rescisória penal em favor do réu (revisão criminal). 14. Inadmissibilidade das provas obtidas por meios ilícitos (CF, art. 5º, LVI). Todas as provas obtidas por meios ilícitos são inadmissíveis no processo, visto constituírem espécie de provas chamadas vedadas (CF, art.5º, LVI). São consideradas provas vedadas àquelas produzidas em contrariedade a uma norma legal específica, podendo ser imposta por norma de direito processual ou material. Conforme a natureza, pode a prova vedada ser descrita como ilícita ou ilegítima, sendo, em qualquer hipótese, proibidas pela Constituição. São consideradas provas ilícitas, aquelas produzidas com violação às regras de direito material, onde são praticados ilícitos de ordem penal, civil ou administrativa. Exemplos: Diligência de busca e apreensão sem prévia autorização judicial ou durante o período noturno; Confissão obtida mediante prática de tortura; Interceptação telefônica sem autorização judicial (violação de sigilo telefônico); Interceptação de cartas particulares (violação de correspondência). Já as provas ilegítimas são aquelas produzidas com violação às regras de natureza meramente processual. Exemplos: 26 Exibição de documento em plenário do Júri com desobediência ao disposto no artigo 475 do CPP; Juntada de documentos na fase de alegações finais (art.406 do CPP); Depoimento prestado com violação à regra proibitiva do art.207 CPP. Entretanto, alguns autores como Fernando Capez e Vicente Greco, entendem que desprezar, sempre, toda e qualquer prova ilícita não é conduta juridicamente correta, tendo em vista que, em determinadas situações, a importância do bem jurídico envolvido no processo e a ser alcançado com a obtenção irregular da prova levará os tribunais a aceitá-las. Leve-se em consideração uma prova obtida por meio ilícito que, entretanto, levará à absolvição de um inocente. Entendem estes autores que o interesse que se quer defender é muito mais relevante do que a intimidade que se deseja preservar. Acreditam que o juiz poderá admitir uma prova ilícita ou sua derivação a fim de evitar um mal maior. Podemos resumir que o direito à liberdade e à segurança, à proteção da vida, do patrimônio, consequentemente, não podem ser levados como regra e ser restringidos pela prevalência do direito à intimidade e pelo princípio da proibição das demais provas ilícitas. Outros autores como Grinover, Scarance e Magalhães esclarecem ser praticamente unânime o entendimento que admite possa ser utilizado, no processo penal, a prova favorável ao acusado, ainda que colhida com infringência aos direitos fundamentais seus ou de terceiros. Embora pacífica a aplicação do princípio da proporcionalidade somentepro reo, o STJ, em julgado recente, admitiu a incidência pro societate, aceitando que, dentro de princípios lógicos, é perfeitamente viável a aceitação da prova obtida mediante interceptação telefônica. No entanto, oportuno ressaltar que, legalmente, em consonância com o que dispõe a Lei n. 9.296, de 24 de julho de 1996, a interceptação de comunicações telefônicas de qualquer natureza não será admitida, salvo por ordem judicial e sob segredo de Justiça, sob pena de constituir-se em crime capitulado no artigo 10 da referida Lei. 27 9 AÇÃO PENAL 1. Conceito O direito de ação é o direito subjetivo público de pleitear ao Poder Judiciário uma decisão sobre uma pretensão. Desde o momento em que o Estado instituiu a proibição da justiça privada, foi outorgado aos cidadãos o direito de recorrer a órgão estatais para a solução de seus conflitos de interesses. 2. Espécies de ação penal no direito brasileiro No processo penal é corrente a divisão subjetiva das ações, isto é, em função da qualidade do sujeito que detém a sua titularidade. Diante disto, levando-se em conta o sujeito que a promove, a ação penal pode ser pública ou privada. Ação penal pública: quando promovida pelo Ministério Público, e constitui regra do nosso Direito. Ação penal privada: quando promovida pelo particular. É privada, porque entendeu o Estado que certas infrações penais afetam muito mais o interesse particular que o social e, sem abrir mão do direito de punir, que irrefragavelmente lhe pertence como uma das expressões mais características da sua soberania, transferiu ao particular o direito de ação penal. Por outro lado, a ação penal pública pode ser condicionada ou incondicionada. Ação penal pública incondicionada: quando o seu exercício não depende de manifestação da vontade de quem quer que seja. Exemplo: homicídio. Ação penal pública condicionada: quando a propositura da ação penal depende de uma manifestação de vontade. Essa manifestação de vontade se cristaliza num ato que se chama representação ou requisição. 28 Seja condicionada, seja incondicionada, a ação penal inicia-se por um ato processual - a denúncia, que é apresentada pelo representante do Ministério Público. Tratando-se de ação penal privada, a sua peça inicial é denominada queixa-crime. A ação penal privada apresenta-se sob três modalidades: a) ação penal privada, ou propriamente dita: que somente pode ser exercida pela vítima ou por quem legalmente a represente e, no caso de morte, por qualquer uma das pessoas citadas no art. 31; b) ação penal privada subsidiária da pública: que é aquela iniciada por meio de queixa, quando embora se trate de crime de ação pública, o Promotor não haja oferecido denúncia no prazo legal (art. 29 do CPP); c) ação privada personalíssima: aquela cujo exercício cabe apenas ao ofendido. As condições da ação São requisitos que subordinam o exercício do direito de ação. Para se poder exigir, no caso concreto, a prestação jurisdicional, faz-se necessário, antes de tudo, o preenchimento de certas condições, que se denominam condições de procedibilidade. São de duas ordens: Condições genéricas: exigidas sempre, pouco importando o tipo de ação penal (se pública ou privada). 3.2. Condições específicas: exigidas num ou noutro caso, e, quando necessário, a lei penal ou processual consigna a exigência. As genéricas são três: a) possibilidade jurídica do pedido: Significa que o Estado tem possibilidade, em tese, de obter a condenação do réu, motivo pelo qual é indispensável que a imputação diga 29 respeito a um fato considerado criminoso. Demanda-se, assim, que a imputação diga respeito a um fato típico, antijurídico e culpável. Em sendo o fato praticado atípico, não há infração; não havendo infração, não pode haver pretensão punitiva e, não havendo pretensão punitiva, não pode ser exercida a ação penal, devendo ser rejeitada a peça acusatória. b) legitimidade de parte: Somente a parte legítima é que pode promover a ação penal. Assim, apenas o titular do bem ou interesse lesionado é que pode exercer a ação penal. O Estado é que detém o direito de punir, sendo, portanto, o titular desse direito, apenas ele é que poderá exercer a ação penal. Todavia, em determinados casos, poucos, aliás, sem abrir mão do seu direito de punir, o Estado transfere ao particular o jus persequendi in judicio, isto é, o direito de agir e de acusar - são os casos de ação penal privada. Nestes casos, o particular é parte legítima para requerer que se instaure o processo. Assim, se por acaso, num crime de ação privada, o Promotor oferece a denúncia, deve o juiz rejeitá-la, sob o fundamento de que quem a promoveu não era parte legítima. c) interesse de agir: representa o interesse de obter do Estado-Juiz a tutela jurisdicional, desde que presente o trinômio: necessidade, utilidade e adequação. Na falta de um destes elementos, é inútil a provocação da tutela jurisdicional, porque se apresenta não apta a produzir a correção da violação do direito arguido na inicial. Exemplo: quando já estiver extinta a punibilidade do acusado. As específicas são: a) representação do ofendido e requisição do Ministro da Justiça; b) entrada do agente no território nacional; 30 c) autorização do legislativo para instauração de processo contra Presidente e Governadores, por crimes comuns; d) trânsito em julgada da sentença que, por motivo de erro ou impedimento, anule o casamento, no crime de induzimento a erro essencial ou ocultamento do impedimento. Obs: A partir da Lei 11.719/2008 revogou-se o art. 43 e o seu conteúdo foi transferido, com alterações, para o art. 395 do CPP, todavia, quanto às condições genéricas da ação, vários doutrinadores continuam a sustentar serem as três já indicadas, ou seja, possibilidade jurídica do pedido, interesse de agir e legitimidade de parte. 4. Ação penal pública incondicionada: Titularidade e Princípios Titularidade Exclusiva do Ministério Público, com uma única exceção: no caso de inércia demonstrada pelo órgão público, é admitida ação penal privada subsidiária, proposta pelo ofendido ou seu representante legal. Princípio da obrigatoriedade Identificada à hipótese de atuação, não pode o Ministério Público recusar-se a dar início à ação penal. Devendo denunciar e deixando de fazê-lo, o promotor poderá estar cometendo crime de prevaricação. Atualmente, o princípio sofre inegável mitigação com a regra do art. 98, I, da Constituição Federal, que possibilita a transação penal entre Ministério Público e o autor do fato, nas infrações penais de menor potencial ofensivo. A possibilidade de transação está regulamentada pelo art. 76 da Lei 9.099/95, substituindo nestas infrações penais, o princípio da obrigatoriedade pelo da discricionariedade regrada. 31 Princípio da indisponibilidade Oferecida à ação penal, o Ministério Público dela não pode desistir (CP, art. 42). Tal princípio não vigora no caso das infrações regidas pela Lei n. 9.099/95, cujo art. 89, concede ao Ministério Público a possibilidade de preenchidos os requisitos legais, propor ao acusado, após o oferecimento da denúncia, a suspensão condicional do processo, por prazo de dois a quatro anos, cuja fluência acarretará a extinção da punibilidade do agente (art. 89). É, sem dúvida, um ato de disposição da ação penal. Princípio da oficialidade Os órgãos encarregados da persecução penal são oficiais, isto é, públicos. Princípio da autoritariedade Corolário do princípio da oficialidade. São autoridades públicas os encarregados da persecução penal extra e in judicio (respectivamente, autoridade policial e membro do Ministério Público). Princípioda oficiosidade Os encarregados da persecução penal devem agir de ofício, independentemente de provocação, salvo nas hipóteses em que a ação pública for condicionada à representação ou à requisição do ministro da justiça. Princípio da indivisibilidade Também aplicável à ação penal privada (CPP, art. 48). A ação penal pública deve abranger todos aqueles que cometeram a infração, não podendo o Ministério Público escolher, dentre os indiciados, quais serão processados. Princípio da intranscendência A ação penal só pode ser proposta contra a pessoa a quem se imputa a prática do delito, é personalíssima. 32 Ação penal pública condicionada É aquela cujo exercício se subordina a uma condição. Essa condição tanto pode ser a manifestação de vontade do ofendido ou de seu representante legal (representação), como também a requisição do Ministro da Justiça. Entretanto, a ação continua sendo pública, exclusiva do Ministério Público, que só pode dar início se a vítima ou seu representante legal o autorizarem, por meio de uma manifestação de vontade. Todavia, uma vez iniciada a ação penal, o Ministério Público a assume incondicionalmente, a qual passa a ser informada pelo princípio da indisponibilidade, sendo irrelevante qualquer tentativa de retratação. Crimes cuja ação depende de representação da vítima ou de seu representante legal. 1) Perigo de contágio venéreo (CP, art. 130, § 2º); 2) crime contra a honra de funcionário público, em razão de suas funções (art. 141, II, c/c o art. 145, parágrafo único); 3) ameaça (art. 147, parágrafo único); 4) violação de correspondência (art. 151, § 4º); 5) correspondência comercial (art. 152, parágrafo único); 6) furto de coisa comum (art. 156, § 1º); 7) tomar refeição em restaurante, alojar-se em hotel ou utilizar-se de transporte, sem ter recursos para o pagamento (art. 176, parágrafo único); Natureza jurídica da representação A representação é a manifestação de vontade do ofendido ou do seu representante legal, no sentido de autorizar o desencadeamento da persecução penal 33 em juízo. Trata-se de condição objetiva de procedibilidade. É condição específica da ação penal pública. Na ausência desta não se pode dar início a persecução penal. Prazo O prazo para exercer o direito de representação é de 06 (seis) meses, a contar do dia em que o ofendido ou seu representante legal vier a saber quem é o autor do crime. Forma A representação não tem forma especial. O Código de Processo Penal, todavia, estabelece alguns preceitos a seu respeito (art. 39, caput e §§ 1º e 2º), mas a falta de um ou de outro não será, em geral, bastante para invalidá-la. Óbvio que a ausência de narração do fato a tornará inócua. A representação pode ser dirigida ao juiz, ao representante do Ministério Público ou à autoridade policial (cf. art. 39, caput, do CPP). Feita a representação contra apenas um suspeito, está se estenderá aos demais, autorizando o Ministério Público a propor a ação em face de todos, em atenção ao princípio da indivisibilidade. Irretratabilidade A representação é irretratável após o oferecimento da denúncia (CPP, art. 25). A retratação só pode ser feita antes de oferecer a denúncia, pela mesma pessoa que representou. Não vinculação A representação não obriga o Ministério Público a oferecer a denúncia, devendo este analisar se é ou não caso de propor ação penal, podendo concluir pela sua instauração, pelo arquivamento do inquérito, ou pelo retorno dos autos à polícia, para novas diligências. Ainda, não está vinculado à definição jurídica do fato estabelecida na representação. 34 Ação penal privada: Conceito, fundamento e princípios. É aquela em que o Estado, titular exclusivo do direito de punir, transfere a legitimidade para a propositura da ação penal à vítima ou a seu representante legal. A distinção básica que se faz entre ação penal privada e ação penal pública reside na legitimidade (CF, art. 129, I). Apenas por razões de política criminal é que ele outorga ao particular o direito de ação. Fundamento Evitar que o streptus judici (escândalo do processo), provoque no ofendido um mal maior do que a impunidade do criminoso, caso não proposta à ação penal. Titular O ofendido ou seu representante legal (CP, art. 100, § 2º; CPP, art. 30). Na técnica do Código, o autor denomina-se querelante e o réu querelado. Se o ofendido for menor de 18 anos, ou mentalmente enfermo, ou retardado mental, e não tiver representante legal, o direito de queixa poderá ser exercido por curador especial, nomeado para o ato (art. 33 do CPP). Princípio da oportunidade ou conveniência O ofendido tem a faculdade de propor ou não a ação de acordo com a sua conveniência, ao contrário da ação penal pública, informada que é pelo princípio da legalidade, sendo o qual não é dado ao seu titular, quando da sua propositura, ponderar qualquer critério de oportunidade e conveniência. Diante disto, se a autoridade se deparar com uma situação de flagrante delito de ação privada, ela só poderá prender o agente se houver expressa autorização do particular (CPP, art. 5º, § 5º). Princípio da disponibilidade 35 Na ação privada, a decisão de prosseguir ou não, até o final, é do ofendido. O particular é o exclusivo titular dessa ação, porque o Estado assim o desejou e, por isso, lhe é dada a prerrogativa de exercê-la ou não, conforme suas conveniências. Ainda, é possível, até o trânsito em julgado da sentença condenatória, dispor por meio do perdão ou da perempção (CPP, art.51 e 60, respectivamente). Princípio da indivisibilidade Segundo o artigo 48 do CPP, o ofendido pode escolher entre propor ou não a ação. Não pode, porém, escolher dentre os ofensores qual irá processar. Ou processa todos, ou não processa nenhum. O Ministério Público não pode aditar a queixa para nela incluir os outros ofensores, porque estaria invadindo a legitimação do ofendido. Princípio da intranscendência Significa que a ação penal só pode ser proposta em face do autor e do partícipe da infração penal, não podendo se estender a quaisquer outras pessoas. Espécies de ação penal privada: Exclusivamente privada ou propriamente dita Pode ser proposta pelo ofendido se maior de dezoito anos e capaz; por seu representante legal, se o ofendido for menor de 16; pelo representante legal ou pelo ofendido, se ele for maior de 16 e menor de 18 anos (CPP, art.34); ou no caso de morte do ofendido, ou declaração de ausência, pelo seu cônjuge, ascendente, descendente ou irmão (CPP, art.31). Ação privada personalíssima 36 Sua titularidade é atribuída única e exclusivamente ao ofendido, sendo o seu exercício vedado até mesmo ao seu representante legal, inexistindo, ainda, sucessão por morte ou ausência. Há entre nós apenas dois casos dessa ação penal: Ex: crime de induzimento a erro essencial ou ocultação de impedimento. (CP, art.236, parágrafo único). Observação: No caso de ofendido incapaz, seja em razão da idade ou de enfermidade mental, a queixa não poderá ser exercida, posto que há incapacidade para estar em juízo e impossibilidade do direito ser manejado por representante legal ou por curador. Subsidiária da pública: Proposta nos crimes de ação pública, condicionada ou incondicionada, quando o Ministério Público deixar de fazê-lo no prazo legal. É a única exceção prevista à regra da titularidade exclusiva do Ministério Público sobre a ação penal pública. 7. Crimes de ação penal privada no Código Penal 7.1. Calúnia, difamação e injúria (arts.138, 139 e 140), salvo as restrições do art.145; 7.2. Alteração de limites, usurpação de águas e esbulho possessório,quando não houver violência e a propriedade for privada (art.161, § 1º, I e II); 7.3. Dano, mesmo quando cometido por motivo egoístico ou com prejuízo considerável para a vítima (art.163, “ caput ”, parágrafo único, IV); 7.4. Introdução ou abandono de animais em propriedade alheia (art.164 c/c art.167) 7.5. Fraude à execução (art.179 e parágrafo único); 37 7.6. Violação de direito autoral, usurpação de nome ou pseudônimo alheio, salvo quando praticado em prejuízo de entidades de direito (arts.184 caput e 186); 7.7. Induzimento a erro essencial e ocultação de impedimento para fins matrimoniais (art.236 e seus parágrafos); 7.8. O exercício arbitrário das próprias razões, desde que praticado sem violência (art.345, parágrafo único). 8. Prazo O prazo para o ofendido ou seu representante legal exercer o direito de queixa é de 06 (seis) meses, contado do dia que vierem, a saber, quem foi o autor do crime (CPP, art.38), com a possibilidade de haver exceções: Lei de Imprensa - o prazo é de 03 meses, contado a partir da data do fato; Induzimento a erro essencial e ocultação de impedimento - 06 meses, contados a partir do trânsito em julgado da sentença que, por motivo de erro ou impedimento, anule o casamento; Crimes de ação privada contra a propriedade material que deixar vestígios, sempre que for requerida a prova pericial – 30 dias, contados da homologação do Laudo Pericial. O prazo para propor a ação penal privada é decadencial, conforme regra do artigo 10 do CP, computando-se o dia do começo e excluindo-se o dia final. No caso de ofendido menor de 18 anos, o prazo da decadência só começa a ser contado do dia em que ele completar essa idade, e não no dia em que ele tomou conhecimento da autoria. Tratando-se de ação penal privada subsidiária, o prazo será de 06 meses a contar do encerramento do prazo para o Ministério Público oferecer denúncia. Observação: Lembre-se de que o pedido de instauração de inquérito não interrompe o prazo decadencial. 38 MODELO Nº 01 (Modelo de Denúncia) EXMO.SR.DR.JUÍZ DE DIREITO DESTA 1ª VARA O Promotor de Justiça que esta subscreve, no uso de suas atribuições, vem, perante V.Exa., oferecer denúncia contra Basílio Carapuça, qualificado as fls.18 dos inclusos autos de inquérito policial, pelo seguinte fato : 1)Consta dos referidos autos que, no dia 27 de fevereiro do ano em curso, por volta das 20:00 horas, nesta cidade, à altura do prédio n.20 da Rua Bento Gonçalves, o denunciado agrediu e lesionou Pedro Bernardino. 2)Na verdade, dias antes dos fatos, o denunciado soubera que a vítima ficara desgostosa com o serviço mecânico prestado ao seu veículo na Oficina " Tudo OK ", de propriedade do denunciado, e, por isto, dissera que não pagaria o pretenso conserto. 3)No dia, local e hora já citados, o denunciado encontrou-se casualmente com a vítima e lhe perguntou se era verdade que não iria pagar os serviços que lhe foram prestados e, ante a resposta afirmativa da vítima, que, inclusive, adiantou que assim procedia porquanto seu veículo saíra da oficina do denunciado com os mesmos defeitos mecânicos, o denunciado irritou-se e, segurando a vítima pelo braço, disse- lhe : " Você já me pagou e tenho até de lhe dar o troco " e, ato contínuo, vibrou-lhe um murro à altura da região orbitária direita, produzindo-lhes lesões graves descritas no laudo de fls.03. Em seguida, deixando a vítima estendida no solo, dalí se retirou. 4)Assim, estando ele incurso nas penas do art.129 § 1º, do CP, combinado com o art.61, II, primeira figura do mesmo estatuto, requer, após o recebimento e autuação desta denúncia, seja o réu citado para o interrogatório e, enfim se ver processado até final julgamento, nos termos do art.593 do CPP, notificando-se a vítima e as 39 testemunhas do rol abaixo para virem depor em juízo, em dia e hora a serem designados, sob as cominações legais. Rio de Janeiro, 14 de julho de 1990 Gilmar Augusto Teixeira Promotor de Justiça Rol : 1º) Pedro Bernardino (Vítima), qualificado as fls.4; 2º) Manoel Ricardo, qualificado as fls.08; 3º) Pedro dos Santos (funcionário municipal), qual.fls.10; 4º) Manoel José (Militar), qualif.a fls.15. modelos extraídos do livro ‘ Prática de Processo Penal ‘ - Fernando da Costa tourinho Fº - 1997. MODELO Nº 02 (Modelo de despacho do Juiz recebendo a denúncia) " Recebo a denúncia. Designo o dia ____, as ____ horas para o interrogatório. Cite-se. Notifique-se o Dr.Promotor de Justiça. Defiro as diligências solicitadas pelo MP (Ministério Público) (arts.394 e 399). (Data e Assinatura)" Modelos extraídos do livro ‘Prática de Processo Penal ‘- Fernando da Costa tourinho Fº - 1997. 40 MODELO Nº 03 (Modelo de devolução dos autos à Polícia para novas diligências) MM.Juiz : A digna autoridade policial instaurou o presente inquérito para apurar um crime de furto. Constatou-se, fartamente, a materialidade do fato. Apurou-se, também, que o seu autor, por sinal foragido, fora um empregado da vítima. Embora o Doutor Delegado de Polícia deixasse de proceder à qualificação direta do indiciado, e isto por razões óbvias, não havia motivos que o impedissem de proceder à sua qualificação indireta. Sabe-se, apenas, que o indiciado se chama Pedro. Evidente que a Promotoria não pode ofertar denúncia contra o indiciado, pois deixaria em sobressalto todos os cidadãos com o prenome Pedro... Ademais, o art.41 do CPP dispõe que a denúncia ou a queixa deve conter a qualificação do réu ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, e isto por razões que dispensam comentários. A denúncia deve ser oferecida contra o genuíno autor da infração, e, assim, tal ato processual não pode ser praticado quando não se conhece a pessoa a quem deva ser atribuído tal qualidade. Certo que ele está foragido. Nada impede que a digna autoridade policial colha, junto à vítima, a sua qualificação. O indiciado já trabalhou para a vítima. É possível que ela ainda possua, nos seus arquivos, os dados qualificativos do indiciado. Se a diligência for infrutífera, poderá o Doutor Delegado, com os meios ao seu alcance, envidar esforços no sentido de trazer para os autos tais elementos. Se de todo for impossível, restará à Promotoria requerer o arquivamento dos referidos autos. Ante o exposto, requer a Promotoria sejam os autos devolvidos à Delegacia de origem para os fins acima expostos. Bauru, 17 de julho de 1990 41 Antônio Munir Rafidi Promotor de Justiça Modelos extraídos do livro ‘Prática de Processo Penal ‘- Fernando da Costa tourinho Fº - 1997. MODELO Nº 04 (Modelo de pedido de arquivamento) MM.Juiz : Instaurou-se o presente inquérito, registrado sob o n.29/88, contra Pedro Pedrão, porquanto este, no dia 2-2-1988, por volta das 14:30 horas, dirigindo o seu automóvel Opala, chapa DV-1114, descendo a Rua 13 de maio, ao atingir a confluência com a Av.Rodrigues Alves, convergiu à direita, com o objetivo de ir à Av.das Nações. Naquele instante, trafegava pela referida avenida Rodrigues Alves o Monza dirigido por José. Houve o choque entre os dois veículos e o motorista do Monza saiu lesionado. Instaurou-se o inquérito, porquanto pareceu à digna Autoridade Policial, pelas primeiras informações colhidas, houvesse sido o motorista do Opala o causador do acidente. Na verdade, após perícia e ouvida de testemunhas que presenciaram o fato, foi o motorista do Monza quem, imprudentemente desrespeitou o semáforo, levando o seu conduzido a colidir contra o para-lama esquerdo do Opala. Na verdade, o causador do acidente foi o motorista do Monza. Por outro lado, somente ele saiu ferido. Como se trata de autolesão,o fato não pode ser erigido à categoria de crime. Contudo, houve a contravenção definida no art.34 da Lei das Contravenções. Ele dirigiu o seu veículo pela Av.Rodrigues Alves, pondo em perigo a segurança alheia. De observar-se, entretanto, que o fato ocorreu no dia 2-2-1988, há mais de um ano. Quando do fato, José tinha apenas 20 anos de idade. Ora, a pena cominada àquela contravenção é de quinze dias a três meses. Sendo a pena máxima inferior a um ano, a prescrição ocorre em dois anos (art.109, VI do 42 CP); como ele, à época do fato, era menor de 21 anos, o prazo prescricional é reduzido de metade (art.115 do CP); assim, está extinta a punibilidade, pelo que, uma vez reconhecida, deve o presente inquérito ser arquivado. Bauru, 28-6-1990 Maria Helena Côrtes Pinheiro Promotora de Justiça Modelos extraídos do livro ‘Prática de Processo Penal ‘- Fernando da Costa tourinho Fº - 1997. MODELO Nº 05 (Modelo de despacho do Juíz recebendo o pedido de arquivamento) " Acolho integralmente o pedido de arquivamento, nos termos formulados pelo Dr.Promotor de Justiça. Arquivem-se estes autos, registrados sob o n.87/88. Deste despacho, recorro " ex ofício " para o Eg.Tribunal de Alçada Criminal. Subam os autos. (data e assinatura)". Modelos extraídos do livro ‘ Prática de Processo Penal ‘ - Fernando da Costa tourinho Fº - 1997. MODELO Nº 06 (Modelo de Queixa) Exmo.Sr.Dr.Juiz de Direito desta Comarca Basílio Costa, brasileiro, casado, lavrador, residente e domiciliado nesta cidade, na rua Tupinambá n.10, por seu procurador infrafirmado, vem, perante V.Exa., oferecer queixa contra Ricardo Pantaleão, brasileiro, solteiro, lavrador, residente e domiciliado nesta cidade, na Rua Andradina n.15, pelo seguinte fato: 43 1º) Consta dos inclusos autos de inquérito policial que, no dia 27 de fevereiro último, por volta das 17:00 horas, o querelado, que possui um sítio contíguo ao do querelante, neste município, sem assentimento do querelante ou de quem de direito, abriu a porteira situada na divisa das duas propriedades e introduziu dois cavalos seus no sítio do querelante. 2º) Apurou-se, no inquérito, que, dias antes, o querelado adquirira aquelas duas alimárias e soltou-as em seu sítio, junto às outras de sua propriedade, em vez de prendê-los no curral ou tomar outra providência, limitou-se a abrir a porteira e introduzi-los no sítio do querelante. 3º) Pelo laudo de fls.10, vê-se que os referidos animais estragaram parte da plantação de milho e feijão do sítio do querelante, estimando os peritos que os prejuízos orçaram em R$ 100.000,00 (Cem mil reais). 4º) Ante o exposto, tendo o querelado infringido o disposto no art.164 do CP, requer a V.Exa. que, recebida e autuada esta, seja o querelado citado para o interrogatório e, enfim, para se ver processar até final julgamento, quando, então, deverá ser condenado, observando-se o disposto no art.539 do CPP, notificando-se as testemunhas do rol abaixo para virem depor em juízo, em dia e hora a serem designados, sob as cominações legais. Nestes termos, P.deferimento. Bauru, 17 de julho de 1990. pp.Miriam Badra Freitas e Silva Advogada - OAB/SP__________ 44 Rol : 1º Pedro Maria, qualif.fls.09; 2º Manoel Faria, qualif.fls.1 vº; 3º Ricardo Calafate, qualif.fls.17; 4º Maria dos Santos, qualif.fls.15. Modelos extraídos do livro ‘Prática de Processo Penal ‘- Fernando da Costa tourinho Fº - 1997 45 10 REFERENCIAS BIBLIOGRAFIA BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Diário Oficial da União, Brasília, 5 out. 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ constituicao.htm. Acesso em: 03 Mai 2021. BRASIL. Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984. Institui a Lei de Execução Penal. Diário Oficial da União, Brasília, 13 jul. 1984. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/ l7210.htm. Acesso em: 04 Mai. 2021. BRASIL. Lei nº 13.675, de 11 de junho de 2018. Disciplina a organização e o funcionamento dos órgãos responsáveis pela segurança pública, nos termos do § 7º do art. 144 da Constituição Federal; cria a Política Nacional de Segurança Pública e Defesa Social (PNSPDS); institui o Sistema Único de Segurança Pública (Susp); altera a Lei Complementar nº 79, de 7 de janeiro de 1994, a Lei nº 10.201, de 14 de fevereiro de 2001, e a Lei nº 11.530, de 24 de outubro de 2007; e revoga dispositivos da Lei nº 12.681, de 4 de julho de 2012. Diário Oficial da União, Brasília, 12 jun. 2018. Disponível: http://www. planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2018/lei/L13675.htm. Acesso em: 04 Mai. 2021. CAPEZ, FERNANDO. Curso de Processo Penal. São Paulo: Saraiva, 1997. CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. Dec.Lei nº 3.689 de 03-10-1941, São Paulo: Saraiva, 1998. DELMANTO, ROBERTO. Código Penal. Rio de Janeiro: Renovar, 1991. FRANCO, ALBERTO SILVA, e outros. Leis Penais Especiais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995. GRECO Fº, VICENTE. Manual de Processo Penal. 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