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Entre os séculos XV e XVIII vivemos um dos momentos mais significativos da História ocidental. Esse período marcou a transição da Era Medieval para a Idade Moderna, com expressivas mudanças nas esferas econômica, política e social. Ao longo desse período, o mundo tornou-se cada vez mais laico, desligando-se do sagrado e das questões transcendentais. Com o advento do Renascimento e do Humanismo, o homem passou ao centro das preocupações (antropocentrismo), sendo levado a pensar e analisar com objetividade a realidade ao seu entorno (racionalismo), abrindo novas possibilidades para o desenvolvimento das ciências e das artes. Assistimos ao fortalecimento da burguesia e do modo de produção capitalista, marcado pela expansão do comércio, da manufatura e por um novo ordenamento territorial da produção e da vida social, refletidos na expansão das cidades, na ascensão dos Estados Nacionais e no efetivo conhecimento do planeta, com as Grandes Navegações e Descobertas. Nesta aula, listaremos as principais mudanças ocorridas com o advento da modernidade e como estas influenciaram o processo de sistematização da Geografia a partir do século XIX. Analisaremos, ainda, como esta sistematização se consolidou, com as contribuições de Humboldt e Ritter, considerados os “pais” da Geografia Moderna. • Identificar os pressupostos da sistematização da Geografia como ciência, consolidados entre os séculos XV e XVIII; • Descrever o processo de sistematização da Geografia a partir das contribuições de Humboldt e Ritter. De acordo com MORAES (1983), até o final do século XVIII não era possível falar de conhecimento geográfico como algo padronizado, com um mínimo de unidade temática e continuidade nas formulações. Eram designados como Geografia os relatos de viagem, os compêndios de curiosidades sobre os lugares exóticos, os relatórios estatísticos produzidos pelos órgãos de administração, e algumas obras que agrupavam os conhecimentos sobre os fenômenos naturais, os continentes e o globo. Para compreender a Geografia como um conhecimento autônomo foram necessários alguns pressupostos cruciais, consolidados no processo de avanço e domínio das relações capitalistas de produção e das condições históricas, técnicas, científicas e filosóficas da sociedade. São apontados quatro pressupostos fundamentais para a sistematização da Geografia como ciência: • O conhecimento efetivo da extensão real do planeta; • O acúmulo de informações sobre os diferentes lugares; • O aperfeiçoamento das técnicas cartográficas; • As mudanças filosóficas e científicas; – Era necessário que a Terra toda fosse conhecida para que seu estudo fosse pensado de forma unitária. As condições materiais para a realização desse conhecimento se concretizaram com as grandes navegações e descobertas efetuadas pelos europeus a partir do século XV, com pleno cumprimento no século XIX. De acordo com MORAES (1983), a formação do modo de produção capitalista exige a articulação de suas relações a uma escala planetária, o que fez com que as sociedades europeias expandissem sua área de ação pelas diversas áreas do globo. A consciência da magnitude real da superfície terrestre - sua forma, dimensão, subdivisão e limites -, representava o patamar mínimo para a reflexão sistematizada sobre esse espaço concreto. RODRIGUES (2008) afirma que, para a consolidação desse conhecimento foram importantes as viagens realizadas por Pedro Álvares Cabral, que descobriu o Brasil, em 1500; Cristóvão Colombo, que descobriu a América, em 1492; Vasco da Gama, que descobriu um novo caminho para o Oriente contornando a África, chegando a Calicute, na Índia, em 1498; Fernão de Magalhães, que iniciou a primeira viagem de circum-navegação da Terra, em 1519; e James Cook, que descobriu a Austrália, em 1770. As grandes navegações e descobertas contribuíram para o processo de sistematização da Geografia, por meio da produção de informações mais apuradas sobre a realidade dos diferentes pontos da Terra, construindo uma base empírica de dados que possibilitaram o conhecimento e a comparação entre as diversas áreas do planeta. Segundo MORAES (1983), o estabelecimento de atividades econômicas nas colônias aprofundava ainda mais o conhecimento de suas características. A fim de ampliar seu domínio sobre os territórios conquistados, os Estados europeus impulsionaram a produção de inventários dos recursos naturais presentes em suas possessões. Os Estados europeus incentivaram o levantamento de informações e a criação de instituições que passaram a agrupar o material recolhido. De acordo com RODRIGUES (2008), podemos destacar a criação das escolas de navegação, como a Escola de Sagres, em 1415 (Portugal) e a Escola de Sevilha, em (Espanha); e a fundação das Sociedades de Geografia, como as de Paris (1821), Berlim (1828) e Londres (1830). O aperfeiçoamento das técnicas cartográficas possibilitou a representação dos fenômenos observados, a localização e a delimitação dos territórios. Conforme DANTAS; MEDEIROS (2011), o avanço da linguagem cartográfica foi uma exigência prática para o pleno desenvolvimento das relações comerciais do período, uma vez que permitiram o estabelecimento preciso de rotas de navegação, bem como a localização exata dos lugares e portos. O barateamento das técnicas de impressão garantiu a popularização de cartas e mapas geográficos, ancorando a demanda de instrumentos mais confiáveis para a navegação, uma vez que a economia global nascente articulava áreas cada vez mais longínquas do planeta. As correntes filosóficas apresentaram explicações abrangentes do mundo, formulando sistemas que buscavam explicar a realidade e compreender os fenômenos por meio do entendimento e do conhecimento humano. A explicação racional do mundo rompeu com a visão religiosa predominante durante a Idade Média. Entre os séculos XV e XVII destacamos o advento do Renascimento e do Humanismo. Nesse período, os pensadores começaram a estudar o próprio homem, que passou a ser tratado como um ser racional e superior às demais criaturas. Conforme DANTAS; MEDEIROS (2011), a razão colocou o homem no centro do universo (antropocentrismo), ao passo que, a Terra e a natureza passaram a ser consideradas como submissas e passíveis de serem apropriadas e terem seus fenômenos explicados racionalmente, com uma investigação planejada, rigorosa e objetiva. Por meio do método experimental os fenômenos se tornaram objeto do conhecimento humano e puderam ser explicados pelas incontestáveis leis naturais, em um processo de dessacralização da natureza. Segundo RODRIGUES (2008), a moderna ciência da natureza, fundamentada na experiência, promoveu uma verdadeira revolução no conhecimento científico. Exemplos: • Nicolau Copérnico (1473 – 1543), formulou a teoria sobre a esfericidade da Terra e várias leis sobre o sistema solar; • Galileu Galilei (1542 – 1727), desenvolveu a teoria da rotatividade da Terra e de sua órbita em volta do Sol; • Isaac Newton (1642 – 1727). Pautado nos conhecimentos da física e da matemática, formulou a lei da gravidade terrestre. Durante o século XVIII, o Iluminismo 1 - conhecido também como Esclarecimento, Ilustração, ou Século das Luzes (razão) - foi importante fonte de sistematização da Geografia. Movimento intelectual que surgiu durante o século XVIII na Europa, defendia o uso da razão (luz) contra o antigo regime (trevas) e pregava maior liberdade social, econômica e política, baseadas nos ideais de liberdade, igualdade e fraternidade. O Iluminismo tinha o apoio da burguesia. O Iluminismo foi um movimento intelectual abrangente que teve expressão em diversas áreas do conhecimento, como as artes, as ciências políticas e a doutrinajurídica. Os pensadores iluministas eram defensores das liberdades sociais, econômicas e políticas. De acordo com MORAES (1983), em suas argumentações, os autores iluministas passaram a discutir temas próprios da Geografia, como as formas de poder e a organização do Estado. – – Discutiu a relação entre as formas de gestão do Estado, as formas de representação e a extensão do território de uma sociedade. – Na obra O espírito das leis, dedica um capítulo ao estudo sobre a influência do meio no caráter dos povos. – Nasceu na Prússia e, por cerca de quarenta anos, de 1756 a 1796, lecionou o que hoje chamamos de geografia física na Universidade de Königsberg. Conforme RODRIGUES (2008), a importante contribuição de Kant foi separar a Geografia da História, afirmando em seus estudos que a Geografia descreve a natureza no espaço, enquanto a História descreve a evolução do homem ao longo do tempo. A Geografia tem dimensão espacial, enquanto a História tem dimensão temporal. https://estacio.webaula.com.br/cursos/gon950/aula3.html – Formulador do Positivismo 2, que defende a ideia de que o conhecimento científico é a única forma de conhecimento verdadeiro. De acordo com os positivistas somente podia-se afirmar que uma teoria era correta se ela tiver sido comprovada por meio de métodos científicos válidos. Eles não aceitavam a separação entre as ciências da natureza e as ciências do homem, afirmando que ambas deviam utilizar os mesmos métodos de investigação, ou seja, o método das ciências naturais. Corrente filosófica que surgiu na França no início do século XIX. Defende a ideia de que o conhecimento científico seria a única forma de conhecimento verdadeiro. O Positivismo é a corrente de pensamento que entende que o conhecimento verdadeiro só é possível por meio da observação e da aferição empírica do mundo. – São frequentemente citados pelos sistematizadores do conhecimento geográfico, por suas teorias na Economia Política. – Finalmente, o temário geográfico obteve o pleno reconhecimento de sua autoridade, com o aparecimento das teorias do Evolucionismo, desenvolvidas por Darwin. No início do século XIX, o conjunto de pressupostos históricos para a sistematização da Geografia e a sua colocação como uma ciência particular e autônoma já estavam consolidados. A Geografia surgiu como ciência na Alemanha, durante o século XIX. Os autores considerados os “pais” da Geografia Moderna são os alemães Alexander von Humboldt e Karl Ritter. Todo o eixo de elaboração do pensamento geográfico, no século XIX, esteve sediado na Alemanha. Neste país, aparecem as primeiras teorias, propostas metodológicas e cátedras dedicadas à Geografia. Mapa da Alemanha. – Geógrafo, filósofo, historiador, explorador e naturalista alemão nascido em Berlim, que deu início, em fins do século, a memoráveis expedições naturalísticas e é considerado o fundador da moderna geografia física. De uma nobre e rica família da Pomerânia, província prussiana, irmão do linguista e político Karl Wilhelm von Humboldt, estudou na Universidade de Göttingen e na Escola de Minas de Friburgo. Herdeiro de grande https://estacio.webaula.com.br/cursos/gon950/aula3.html fortuna e atraído desde jovem pelas expedições científicas. Humboldt pertencia a uma família de aristocratas prussianos e, desde muito cedo, recebeu uma boa formação em Economia Política, Matemática, Ciências Naturais, Botânica, Física e Mineralogia. Conforme DANTAS; MEDEIROS (2011), ele viajou para a Venezuela e subiu o rio Orinoco; atravessou a Colômbia até Equador e Peru. Essa viagem lhe deu a oportunidade de escalar alguns dos maiores picos dos Andes e medir suas altitudes. Com esse procedimento, observou a variação do clima com a altitude, introduzindo a terminologia de quente, temperado e frio, utilizada até hoje. Seguiu para a América Central, México, Estados Unidos e Rússia, observando os grandes fenômenos físicos e biológicos, descrevendo as características naturais de fauna, flora, atmosfera, formações aquáticas e terrestres. Seus trabalhos explicaram os fatores que diferenciam as diversas áreas do globo, buscando encontrar as relações entre os diversos fenômenos e as causas que levaram à formação de espaços com características próprias. Também estudou populações que habitavam os diferentes lugares, procurando encontrar semelhanças entre as culturas. Ele comparava sistematicamente as paisagens das áreas que estudava e acreditava que as cada paisagem era resultante da interação de diversos fenômenos. Seus estudos resultaram em uma sistematização de conhecimentos geográficos. Em sua perspectiva, o mesmo fenômeno pode ser analisado tanto em âmbito regional como mundial. Utilizava o método empírico e indutivo, partindo de casos particulares para os gerais, com o objetivo de obter uma lei geral dos fenômenos, válida também para os casos não observados. De acordo com RODRIGUES (2008), Humboldt procurava estabelecer a relação de causa e efeito entre os fatos, surgindo o Princípio Geográfico da Causalidade. – Ritter nasceu na Saxônia. Possui formação em Filosofia e História e se dedicou ao magistério. Foi professor de uma família de banqueiros e professor de História e Geografia no Ginásio de Frankfurt. Em 1820, tornou-se o primeiro docente da recém-criada cátedra de Geografia da Universidade de Berlim. Ele foi considerado um “geógrafo de gabinete”, pois não foi um grande viajante. Ritter propõe o método descritivo regional, utilizando a comparação para compreender as especificidades de cada país. De acordo com MOREIRA (1983), Ritter definiu o conceito de “sistema natural”, ou seja, uma área delimitada que apresenta uma individualidade própria. Para ele, a Geografia deveria estudar esses arranjos individuais e compará-los. Considerava que cada arranjo era composto de um conjunto de elementos inter-relacionados, representando uma totalidade onde o homem seria o principal elemento. A geografia de Ritter foi direcionada ao estudo dos lugares. Sua proposta foi antropocêntrica e regional, valorizando a relação homem-natureza. Para ele, a Terra e seus habitantes desenvolvem mútuas e estreitas relações, defendendo que História e a Geografia devem estar sempre juntas. Ele utilizou o método empírico e considerava a Geografia uma ciência de síntese. O homem é o sujeito da natureza Dirigida ao estudo da individualidade dos lugares. As obras desses dois autores constituem a base da Geografia Tradicional. Em síntese, a Geografia de Ritter é regional e antropocêntrica, enquanto a Geografia de Humboldt busca abarcar todo o globo, sem privilegiar o homem. A partir deles, a Geografia se configurou como uma ciência descritiva, empírica, indutiva e de síntese, pautada na observação. Todos os trabalhos posteriores se reportarão às formulações de Humboldt e Ritter, para aceitá-las, ou para refutá-las Questão 01 - Os pressupostos necessários para a sistematização da Geografia como ciência são os seguintes, com exceção: a) As explicações do mundo baseadas no sagrado e nas questões transcendentais. b) O conhecimento efetivo da extensão real do planeta. c) O acúmulo de informações sobre os diferentes lugares. d) O aperfeiçoamento das técnicas cartográficas. e) As mudanças filosóficas cientificas. Questão 02 - Sobre a sistematização da Geografia como ciência, não é correto afirmar: a) No início do século XIX, o conjunto de pressupostos históricos para a sistematização da Geografia e sua colocação como uma ciência particular e autônoma já estavam consolidados. b) A Geografia surgiu como ciência na Alemanha, durante o século XIX. Os autores considerados os “pais” da Geografia Moderna são os alemães Alexander vonHumboldt e Karl Ritter. c) Humboldt comparava sistematicamente as paisagens das áreas que estudava e acreditava que as diferentes paisagens eram resultantes da interação de diversos fenômenos. d) A Geografia de Humboldt é regional e antropocêntrica, e a Geografia de Ritter busca abarcar todo o globo, sem privilegiar o homem. e) Ritter define o conceito de “sistema natural”, ou seja, uma área delimitada que apresenta uma individualidade própria. Para ele, a Geografia deveria estudar esses arranjos individuais e compará-los. Questão 03 – O surgimento de uma ciência depende de fatores históricos e também do desenvolvimento técnico, científico e filosófico de uma sociedade. Considerando esta afirmativa, aponte sinteticamente as principais transformações ocorridas com o advento da modernidade e como influenciaram o pensamento geográfico e a sistematização da Geografia como ciência. ____________________________________ ____________________________________ ____________________________________ ____________________________________ ____________________________________ ____________________________________ ____________________________________ ____________________________________ ____________________________________ ____________________________________ ____________________________________ ____________________________________ ____________________________________ ____________________________________ ____________________________________ ____________________________________ ____________________________________ ____________________________________ ____________________________________ ____________________________________ ____________________________________ ____________________________________ ____________________________________ ____________________________________ ____________________________________ ____________________________________ ____________________________________ ____________________________________ ____________________________________ ____________________________________ ____________________________________ ____________________________________ ____________________________________
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