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Resenha Os estabelecidos e outsiders

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ELIAS, Norbert; SCOTSON, John L. Os estabelecidos e outsiders: sociologia das 
relações de poder a partir de uma pequena comunidade. Trad. Vera Ribeiro. Rio de 
Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2000. Pp. 19-69.1 
 
Danielle Balieiro dos Santos2 
 
 
A obra “Os Estabelecidos e Outsiders” (2000), de caráter sociológico de 
Norbert Elias, foi resultado de uma pesquisa de campo consistente realizada no final 
dos anos 50 em uma pequena comunidade suburbana inglesa denominada de 
maneira fictícia de Winston Parva, inicialmente realizada pelo sociólogo John L. 
Scotson, motivada primeiramente, em investigar os casos de delinquência que 
chamavam a atenção para essa comunidade, mas, que posteriormente, no decorrer 
das revelações e imbricações metodológicas sob o olhar de Norbert Elias, foram se 
aprofundando e ampliando-se para as investigações sociológicas estruturais que 
dimensionam as relações de poder, bem como suas configurações no espaço em 
que se resultam os sistemas complexos a que tangenciam os aspectos subjetivos, o 
que permitiu assim, articulações com as diversas interpretações estruturais similares 
que as teorias sociológicas ou históricas se habituam a generalizar. 
A iniciativa de estudar uma especificidade dessas relações, na forma de um 
recorte do todo social, permitiu uma releitura condensada, porém detalhada dos 
episódios em que algumas particularidades sociais, políticas e culturais se 
sustentam e se flexionam, o que serviu assim, parar o avistar de uma teoria crítica 
que consequentemente, poderia fragilizar ou pelo menos, agitar a postura dos 
investigadores ao considerar diferentes e criativos meios de conjecturar suas 
reflexões, assim como o percurso que a leitura da obra traz ao elencar em 
contribuições interdisciplinares, despretenciosa e consciente para se definir em 
interpretações que se infira conclusiva. 
As observações sociológicas apoiadas na “estrutura mais ou menos fixa” de 
uma sociedade, combinam-se ao exercício do novo estudo proposto a partir da 
metodologia de Norbert Elias, uma vez que podem ser manipuladas, testadas, 
 
1
 Resenha apresentada como método avaliativo à Disciplina Cultura, Política e Identidade, sob a 
orientação da professora Dra. Gláucia Maria Tinoco Barbosa. 
 
2
 Acadêmica do curso de Especialização em Estudos Culturais e Políticas Públicas da Universidade 
Federal do Amapá – UNIFAP. 
2 
 
aperfeiçoadas ou refutadas diante da experimentação real empírica, na qual a 
pesquisa participante adotada ao caso particular de Winston Parva tendeu a se 
ampliar e possibilitou preencher as lacunas investigativas, muitas vezes 
imprevisíveis, iluminando os casos mais gerais relativos ao panorama da 
configuração de elementos constantes que se enxergam nas estruturas das 
sociedades, como aquelas a que endossaram as conceituações de classe, gênero e 
raça, por exemplo, que na contemporaneidade se perduram. 
Diante disso, a relação entre os estabelecidos e outsiders se justifica como 
releitura das relações de poder ou posições de grupo em que uma organização se 
estabelece a partir de elementos concentrados nas ideologias individuais ao grupal 
em que a auto representatividade se transparece para uma organização externa, 
espacial, geográfica e mesmo, para algum aspecto físico que justifique algum 
diferencial consciente a fim de ser materializado. Isso passa a ser compreendido, 
pelas interpretações de Elias, como criação de “adjetivos de evitação” que são 
impostos pelos reconhecidos superiores àqueles percebidos inferiores (outsiders) 
que condensam assim, todo um processo de desigualdade em que são 
reconhecidas as formas de exclusão e ‘anomias’3 presentes nos relacionamentos 
estratificados do cotidiano. 
Ao estudar as diferenças estruturais em que se organizava a dinâmica da 
comunidade de Winston Parva, cujo levantamento se deslocava entre as zonas 
significadas pelos próprios moradores, verificou-se um modelo de ordenamento 
espacial distribuído a partir de posições geográficas ao contorno das fábricas que 
neste local vinham se desenvolvendo e se tornando atrativo para os processos de 
imigração. Assim, as zonas 1 e 2 eram habitadas pelos estabelecidos, por um grupo 
de indivíduos temporalmente fixados, os mais “antigos” na localidade e por isso, 
mais coesos em seus modos de organizar, visto que a zona 3, representava o 
loteamento daqueles considerados “recém chegados” de outras localidades, os 
estranhos a ordem tradicional e compondo a massa de operários. 
Essas disparidades organizacionais, ao servirem de apoio para as 
investigações panorâmicas, se ampliaram para uma óptica sistemática a partir de 
 
3 Norbert Elias empresta o termo “anomia”, uma vez atribuído nos estudos de Émile Durkheim sobre 
aspectos particulares, porém ampliando para a compreensão de ausência de ordem diante da 
concepção moral de organização estrutural. 
 
3 
 
investigações participante que possibilitaram compreender as entrelinhas que se 
estruturavam e legitimavam essa organização social, ao que se transitavam os 
processos de idealização, de status configuracional. Logo, a presença de estigmas 
se mostravam evidentes nessas relações conflitantes, confundidas e racionalizadas 
entre os estabelecidos e outsiders. 
Dessa forma a dimensão histórica - no caso o tempo de moradia, se inter 
relacionava com a dimensão desenvolvimentista da estrutura social, pois os 
fenômenos sociais, segundo as compreensões metodológicas previstas à luz de 
Norbert Elias, podem se mostrar flexíveis em determinados momentos e espaços 
das conjunturas sociais, o que requer dessa forma, a capacidade de formular as 
questões que ofereçam assim, elementos característicos a um tipo particular. 
O sentimento de pertencimento dos habitantes mais antigos observados aos 
da zona 1 da comunidade de Winston Parva, compunha um complexo de valores 
simbólicos autorreconhecidos, que refletiam na maneira de enxergar, de 
preconceituar os moradores novos da zona 3 (os outsiders), observações estas 
que, ofereciam um recorte das compreensões estruturais gerais sob o olhar local 
que revelavam diferentes particularidades interpretativas. Amplificando assim, as 
conceituações focadas nas diferenças econômicas, políticas e culturais, ao se 
articularem dentro das tangentes dos aspectos em que se conjugam as 
desigualdades sociais e as relações de poder. 
Dessa maneira, a tentativa investigativa de determinar algum padrão de 
comportamento que rege os hábitos dessa ou de outra comunidade que se possa 
medir, deve considerar os aspectos comportamentais de forma aprofundada, ainda 
que os riscos dos processos investigativos os leve para os caminhos de volta ao 
qual habituamos a enxergar, pois perante a releitura dos problemas que se situam 
os estabelecidos e outsiders, possibilitou perceber o quão necessário se mostram as 
questões sociais em suas complexidades abrangentes na contemporaneidade, de 
requerer um esforço significativo para começar a se pensar, diferentemente das 
limitadas interpretações de caráter maniqueístas fechadas, reproduzidas como 
leitura universal das estruturas conflituosas da sociedade, de forma a exercitar o 
olhar sempre novo, no sentido presente e indeterminado dos fenômenos em que, 
cujas aproximações de inferências temporárias, assinalem algum indício atributivo 
que possa ao menos guiar outros diferentes olhares epistemológicos. 
 
4 
 
REFERÊNCIA 
ELIAS, Norbert; SCOTSON, John L. Os estabelecidos e outsiders: sociologia das 
relações de poder a partir de uma pequena comunidade. Trad. Vera Ribeiro. Rio de 
Janeiro: Jorge Zahar, 2000.

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