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Capítulo - Desinstitucionalização nos manicômios judiciários

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356
CAPÍTULO 14
Desinstitucionalização nos manicômios judiciários:
quem se assegura com a medida de segurança?
SIMONE MAINIERI PAULON
MOYSÉS PINTO NETO
MIRIAM THAIS GUTERRES DIAS
WILLIAM GUIMARÃES
o0o
 
Introdução
OORDENAMENTO JURÍDICO que dispõe sobre a medidade segurança carrega na letra da lei a marca da históriada loucura, ressaltando, com isso, sua relação com a
instituição do louco perigoso. A periculosidade é o constructo
social que justifica o claustro como dispositivo de (pretenso)
controle do perigo. Conforme Carrara (1998), a medida de se-
gurança foi um instituto inicialmente aplicado aos loucos infra-
tores que visava nova abordagem de contenção. Assim, ela foi
incorporada à maioria dos códigos penais do Ocidente ao longo
do século XX, formando a base legal que sustenta os regimes
políticos autoritários.
O texto que passamos a apresentar acompanha tais movi-
mentos reformistas da saúde pública brasileira. Para tanto, traz
inicialmente os fundamentos essencias à compreensão da especi-
ficidade do problema jurídico que se coloca quando o crime se
357
encontra com a loucura, se desdobra em uma segunda parte com
um breve panorama de como as pessoas com transtornos men-
tais e em conflito com lei se situam em relação à política de
saúde mental vigente em nosso país e um terceiro ponto que
apresenta as diretrizes e alguns impasses de um Programa de
desinstitucionalização voltado para este segmento de usuários,
construído a partir de um acordo de cooperação estabelecido
entre universidade — UFRGS — e poder judiciário — TJ-RS. 
Medida de Segurança
sob o prisma jurídico e criminológico
OCÓDIGO PENAL BRASILEIRO de 1890 ainda não incor-porava tantas inovações e a inimputabilidade surge relacio-
nada aos casos de “imbecilidade nativa ou enfraquecimento se-
nil” ou à “completa privação de sentidos e de inteligência” no
momento do crime. Após longo período de revisão desse Códi-
go, chega-se ao Código Penal Brasileiro de 1940 (Brasil, 2010),
que está em vigor até os dias de hoje e implanta, de forma gene-
ralizada, a medida de segurança no país, como possibilidade para
os inimputáveis. Com efeito, como é amplamente relatado na
investigação criminológica e jurídico-penal, a organização da Parte
Geral do Código Penal, ao dividir as respostas estatais à violação
da lei em penas e medidas de segurança, dependendo da imputa-
bilidade do autor, estava, desde 1940, buscando uma solução
“conciliatória” no grande debate epistemológico que permeou
todo século XIX entre a chamada “Escola Clássica” (na realida-
de, os filósofos e juristas inspirados nas ideias iluministas) e a
“Escola Positiva”.
Como se observa, por exemplo, nos comentários ao Códi-
go Penal de Nélson Hungria, o principal dos autores da lei, a
solução dual era já defensiva, na medida em que a época era de
forte hegemonia teórica positivista, com a ampla repercussão da
358
tese da substituição do direito penal clássico por um direito de
medidas pautado na “ciência” e administrado por técnicos habi-
litados para “curar” o criminoso, naquele momento associado a
indivíduo “atávico”, nos termos definidos por Cesare Lombroso.
A resposta de Hungria e outros teóricos foi na direção mista ou
eclética, inspirada pelo Código Penal fascista chamado “Projeto
Rocco”, reconhecida como modelo para o Código Penal Brasi-
leiro (Hungria, 1959, pp. 10-26; Bruno, 1967, pp. 197-204).
Segundo as palavras do autor, “a pena conserva sua função ético-
-jurídica, aquela condicionada à culpa moral ”, enquanto a me-
dida de segurança voltar-se-ia à “periculosidade”, sem “caráter
expiatório” e buscando ser “um meio profilático do crime, um
expediente de cura, de assistência, de tutela, de reeducação ou
readaptação social do autor do crime” (Hungria, 1959, p. 26).
Naquele momento, opta-se pelo sistema chamado “duplo biná-
rio”, que, além de prever medidas de segurança para o inimputável,
admitia sua aplicação também aos imputáveis após a pena (Bru-
no, 1967, p. 200).
Mais tarde, com a reforma da Parte Geral de 1984, o siste-
ma monista viria a ser adotado, intitulado “vicariante”, a partir
do qual as medidas de segurança passam a ser exclusivamente
para inimputáveis, corrigindo-se o duplo binário. A nova Parte
Geral vincula o louco infrator ao conceito jurídico de inimputa-
bilidade, expresso no seu artigo 26: “é isento de pena o agente
que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto
ou retardado, era ao tempo da ação ou da omissão inteiramente
incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se
de acordo com esse entendimento”. Assim, não sendo o sujeito
considerado responsável, ou seja, ao considerá-lo inimputável
ou semi-imputável, não lhe será atribuída uma pena, mas uma
medida de segurança. Juridicamente, ele é “absolvido” e deverá
receber um “tratamento”. O tratamento poderá ser de internação
ou ambulatorial, regulado pelo artigo 97, que diz: “Se o agente
for inimputável, o juiz determinará sua internação. Se, todavia,
359
o fato previsto como crime for punível com detenção, poderá o
juiz submetê-lo a tratamento ambulatorial”. Quando o trata-
mento for de internação, a regulação ocorre pelos artigos 96,
inciso I e artigo 99. O primeiro desses artigos determina que “a
internação deverá ser realizada em hospital de custódia e trata-
mento psiquiátrico ou, à falta, em outro estabelecimento ade-
quado” e o artigo 99 regula as características necessárias à
internação: “O internado será recolhido a estabelecimento dota-
do de características hospitalares e será submetido a tratamen-
to”. Quando a medida de segurança for ambulatorial esta deverá
ser cumprida como tratamento obrigatório, de acordo com pro-
jeto terapêutico definido pela equipe de atenção psicossocial. 
Mesmo os trabalhos de juristas encarregados da mencio-
nada reforma, do como Gérson Pereira dos Santos e Francisco
de Assis Toledo, entretanto, continuam referindo a periculosidade
como uma questão importante. No artigo 59 ela aparece como
moduladora da culpabilidade, a partir das cláusulas abertas da
“personalidade” e da “conduta social”, buscando, com isso, con-
ter uma visão exclusivamente retributiva da pena (Santos, 1985,
pp. 94-6; Toledo, 1987, pp. 234-8). O Código Penal Brasileiro
de 1940 é justamente o “Novo Código”, ao qual será incorpora-
da a noção de periculosidade, como resultado de longos anos de
discussões nos meios jurídicos brasileiros em torno dos modos
de julgar e punir (Rauter, 2003). Segundo Delgado (1992, p.
89), a medida de segurança teria dupla finalidade: “proteger a
sociedade dos inimputáveis perigosos, e tratá-los até que cesse
sua periculosidade”. Dessa forma, o tempo de cumprimento da
medida de segurança é pautado pela periculosidade, como se
fosse possível estabelecer-se alguma medida de valor, calculada
em tempo de reclusão, para o grau de perigo que o sujeito impõe
à sociedade. O prazo para o tratamento é regulado pelo artigo
97, parágrafo 1.o, que determina: “A internação, ou tratamento
ambulatorial, será por tempo indeterminado, perdurando en-
quanto não for averiguada, mediante perícia médica, a cessação
Carmensita
Nota
Excluir "do".
360
de periculosidade. O prazo mínimo deverá ser de 1 (um) a 3
(três) anos”. O que vemos na prática, e também é referido por
diversos autores, é o prolongamento demasiado da internação,
muitas vezes ad eternum, gerando consequências que se colocam
indeléveis para o paciente. Segundo Barros-Brisset (2010), o
Ministério Público Federal (MPF) e a Procuradoria Federal dos
Direitos do Cidadão destacam que manter a pessoa internada
ou mesmo em tratamento ambulatorial, ainda que por tempo
determinado por lei até que “cesse sua doença/periculosidade”,
significa negar o princípio da proporcionalidade, que diz res-
peito à equivalência da pena com relação à gravidade da infração
penal, bem como à dignidade humana. 
Os mecanismos presentes na legislação penal, que reme-
tem ao Positivismo Criminológico hoje, são amplamente criti-
cados por diversos campos, inclusive a própria Criminologia e
DireitoPenal. Eugenio Raúl Zaffaroni e outros, por exemplo,
consideram que Lombroso teria criado apenas uma “estética do
mal” geradora de um autoritário direito penal do autor, no qual
há “um jogo de parasitas e leucócitos do imenso organismo social,
que, no entanto, não interessam em sua individualidade, mas
apenas em razão da saúde social”, costumando “revestir de ciên-
cia mecanicista valorações meramente moralizantes” (Zaffaroni et
al., 2003, p. 132). Também a chamada “virada criminológica”
— comandada por Becker e Goffman — teria demonstrado que
os indivíduos que correspondem ao ideal de criminoso nos ter-
mos lombrosianos não são os criminosos por excelência, mas sim
aqueles segmentos sociais mais vulneráveis à intervenção seletiva
do controle penal (Zaffaroni et al., 2003, p. 46). Além disso, e
ainda na Criminologia, estudos como os de Rosa de Del Olmo,
Salo de Carvalho, Eugenio Zaffaroni e Francisco Muñoz Conde
exploraram amplamente as afinidades entre o conceito de pericu-
losidade e todo arsenal teórico-conceitual positivista com formas
autoritárias e totalitárias de Estado, investigando como a atua-
ção concreta desses conceitos serviu de pretexto para massacres e
Carmensita
Nota
Dúbia interpretação:
Os mecanismos presentes na legislação, que hoje remetem ao Positivismo Criminológico, são amplamente criticados por diversos campos...?

Ou os mecanismos presentes na legislação, que remetem ao Positivismo Criminológico, são hoje amplamente criticados?

 
361
genocídios no século XX na América Latina e na Europa
(Zaffaroni, 2007; Olmo, 2004; Muñoz Conde, 2005; Carva-
lho, 2003). 
Finalmente, trabalhos inspirados no conceito de “garantis-
mo penal” de Luigi Ferrajoli, fazendo uma leitura constitucio-
nal do sistema penal, têm criticado amplamente a presença de
mecanismos arbitrários que mutilam as garantias e os direitos
fundamentais dos indivíduos em conflito com a lei penal. As-
sim, por mais falível que possa ser o controle jurídico, ainda
parece ser o mecanismo mais eficiente para — a partir de uma
visão “pessimista” sobre o exercício do poder estatal — controlar
abusos e excessos de práticas de poder entre desiguais. Dentro
dessa visão, todo mecanismo que remete ao direito penal do au-
tor, como por exemplo o conceito de periculosidade e a pena
como mecanismo de tratamento, constituem elementos autori-
tários incompatíveis com o Estado de Direito e a dignidade hu-
mana entendida no sentido de autonomia moral do indivíduo.
As medidas de segurança violam, segundo Ferrajoli, os princí-
pios de retributividade, da jurisdição e da estrita legalidade
(Ferrajoli, 2002, pp. 626-9). No limite, Ferrajoli defende in-
clusive o “direito à perversidade” (Carvalho, 2003, p. 33), na
medida em que o Estado de Direito não pode interferir na esfe-
ra interna dos indivíduos, podendo apenas punir segundo os pa-
râmetros do “princípio da materialidade” (nullum crime sine
actione), complementado com a ideia de “ofensividade” ou “lesi-
vidade” (nullum crime sine injuria), isto é, por atos que se tenham
exteriorizado e causado danos a terceiros pelo agente (Ferrajoli,
2002, p. 629).
Por tudo isso, há um indicativo claro no campo da crimi-
nologia crítica, que hoje já encontra aliados em vários outros cam-
pos de saber afetos aos direitos humanos, de que todos os dispo-
sitivos que remetem a essas noções fortemente comprometidas
com ideias autoritárias e fora do eixo do Estado de Direito devem
ser simplesmente extirpadas da legislação, sendo substituídas por
362
noções que permitam o controle jurídico e definam com clareza
os limites da sua aplicação. É o caso justamente das medidas de
segurança, hoje ainda legalmente sujeitas à indeterminação ab-
soluta e dependentes do conceito pseudocientífico de “cessação
da periculosidade”, a exigir da perícia técnica um tipo de garan-
tia impossível e com isso desencorajar — em total confronto
com os princípios legais da reforma psiquiátrica — a convivên-
cia com a diferença do sujeito sob medida, mantendo-o segrega-
do em uma instituição total cujos efeitos tendem a ser o agrava-
mento do quadro ou, no mínimo, um tratamento não afinado
com os direitos fundamentais.
Do ponto de vista das consequências subjetivas que a apli-
cação da Medida de Segurança tem oferecido ao louco infrator,
os efeitos não são menos danosos do que os observados no plano
dos direitos civis. Se a reclusão às instituições totais com conse-
quente submetimento do paciente judiciário a um modelo tu-
telar de atenção, quando não de maus-tratos e abandono, já con-
figura uma prática de violência do Estado contra estes sujeitos;
o impedimento de que ele responda pelo seu crime, uma vez
configurada a inimputabilidade, é uma agressão psicológica ain-
da maior. Mesmo estabelecido o nexo causal entre o ato crime e
o transtorno psíquico, considerar o sujeito incapaz de compre-
ender esta relação e por ela responder é, de alguma forma, sen-
tenciá-lo à própria doença e a permanecer preso a este crime
pelo qual não pode pagar. Nessa medida, o dispositivo jurídico
da inimputabilidade associado ao laudo de cessação de periculo-
sidade, delegado a um perito, como única forma de revisão da
medida, significa de fato a perpetuação da pena que a medida
de segurança “velou” sob o artifício de uma proteção, retirando o
elementar direito à defesa e o humano direito à resposta social
proporcional e adequada ao ato de fato praticado.
363
Reforma psiquiátrica
e o mito da periculosidade
Um trabalho que favoreça o esvaziamento do imaginário
social ligado à periculosidade parece ser essencial, por ali-
mentar o medo, a insegurança e a crença de que é possível
construir uma sociedade onde não existam riscos. A partir
do esvaziamento do imaginário social, talvez o campo da
justiça possa se alinhar de modo mais amplo a essa concep-
ção e apoiar mudanças na atual lei penal, que ainda con-
sidera o louco infrator como presumidamente perigoso (Go-
mes, 2017, p. 9)
O movimento da Reforma Psiquiátrica tem apontado a
inconstitucionalidade da medida de segurança, pois sua aplica-
ção fere os princípios constitucionais da reserva legal e da
proporcionalidade da pena. Com isso, ressaltam a necessidade
de formulação de novos paradigmas jurídicos e assistenciais para
enfrentar a injunção crime-loucura, que superem o conceito de
imputabilidade e excluam o conceito de “presunção de pericu-
losidade” do nosso Código Penal. Tais movimentos reformistas,
aos quais os autores deste texto se alinham, reivindicam que os
pacientes judiciários, em cumprimento de medida de segurança,
sejam incluídos na rede de atenção psicossocial e que seus trata-
mentos estejam de acordo com as diretrizes do SUS e respeitem
a Lei n.o 10.216/2001, a Lei da Reforma Psiquiátrica, doravante
Lei da RP, visando a extinção de qualquer manicômio incluin-
do, por óbvio, o Judiciário. Além disso, as diretrizes da Política
Nacional de Saúde Mental brasileira vigente a partir da aprovação
da referida Lei da RP, indicam a necessidade de que os pacientes
judiciários sejam incluídos entre os grupos prioritários nos progra-
mas e políticas públicas como Habitação, Cultura, Esporte e
Lazer, Assistência Social, Educação, Transporte, Trabalho e
364
Renda,Segurança Alimentar, Segurança Pública, Previdência
Social e Justiça.
O movimento da Psiquiatria Democrática italiano desde
1978 com a aprovação da Lei 180 — conhecida como Lei Basa-
glia, em reconhecimento ao médico que ajudou a criá-la — re-
sultou no fechamento dos manicômios em toda a Itália. Fonte
inspiradora do movimento e mais tarde da legislação brasileira
para a reformulação do modelo assistencial em saúde mental, a
reforma italiana sustenta-se na crítica ao reducionismo tecnicista
operado por uma lógica médica e hospitalocêntrica que resume
a complexidade da experiência da loucura ao conceito teórico
científico de doença mental. Ao fazê-lo, como bem denunciou
Foucault (1961/2000, 1975/2001) põe-se de lado a existência
real de um corpo em sofrimento, de um existente que está em
condição de sofrimento em relaçãoao corpo social. A institucio-
nalização da loucura daí decorrente, que tem como recurso a
hospitalização ainda que não se limite a ela, teve, e ainda tem,
efeitos danosos e mortificantes por selar destinos, decidir cami-
nho e limitar as possibilidades de vida de um conjunto signifi-
cativo de pessoas. Ao longo do tempo, foram os imperativos téc-
nicos, a soberania de um tipo de conhecimento, que justificaram
a realização dos mais distintos tipos de atrocidades realizadas
para com os sujeitos considerados alvo das práticas psiquiátricas
(Basaglia, 2005). 
O fato de o foco não estar no sofrimento do indivíduo,
mas sim no conceito abstrato da doença mental, é algo que se
manifesta bem concretamente na vida diária de muitos sujeitos
com transtorno psíquico, na medida em que impede seus aces-
sos ao mercado de trabalho, diminui sua circulação pelas cidades
e os impede de administrar seus próprios bens (Severo & Di-
menstein, 2009). A criação, consolidação e difusão da institui-
ção psiquiátrica é aqui identificada como uma responsável pela
naturalização da exclusão sistemática de uma parcela considerá-
vel de indivíduos do corpo social. Como, da mesma forma, não
365
há nenhum processo penal que não seja passível de submissão à
avaliação de incidente de insanidade mental. Ibrahim afirma que
esses aparatos institucionais surgem não com o propósito de aco-
lher o suposto sujeito anormal, mas de funcionar como instrumen-
to de defesa da sociedade. Uma “caça aos degenerados”, o portador
do perigo, o inacessível à pena, o incurável (Ibrahim, 2014, p. 31).
É justamente esta vertente institucional, este mandato so-
cial delegado a um conjunto de técnicos, que o movimento da
psiquiatra democrática italiano toma como alvo de crítica e
reformulação. Neste ponto, é imprescindível ressaltar, como fa-
zem os autores, que
[. . .] a negação da instituição não é negação da doença
mental, nem a negação da psiquiatria, tampouco o simples
fechamento do hospital psiquiátrico, mas uma coisa muito
mais complexa, que diz respeito fundamentalmente à ne-
gação do mandato que as instituições da sociedade delegam
à psiquiatria para isolar, exorcizar, negar e anular os sujei-
tos à margem da normalidade social (Rotelli & Amarante,
1992, p. 44).
Desinstitucionalizar implica, pois, um movimento para
tentar desmontar a estrutura institucional de saberes e práticas
que sustentam a identificação da loucura como doença mental.
É uma tentativa de minimizar os efeitos mortificantes na vida
dos sujeitos acometidos por algum sofrimento psíquico, decor-
rentes da apropriação da experiência de des-Razão pelo saber
médico psiquiátrico (Alvarenga & Dimenstein, 2005). Diz-se
isso, pois, desde que a experiência da loucura foi tomada como
objeto específico da Psiquiatria, o foco passou a ser sempre este
objeto forjado — a doença mental — e não o indivíduo em
sofrimento (Foucault, 1961/2000). A desinstitucionalização visa
recolocar a “existência-sofrimento” e a produção de vida como
focos de qualquer intervenção no campo da saúde mental.
366
A luta a ser travada, portanto, encontra-se muito mais em
um plano micropolítico, implica processos subjetivos complexos
e evoca, por isso mesmo, uma intervenção junto àqueles segmentos
alijados de seus direitos mais elementares que extrapola, em
muito, as medidas jurídicas e estruturais que também se incluem,
mas não esgotam a tarefa de desinstitucionalizar. Assim,
Podemos definir a tarefa da desinstitucionalização como
incessante questionamento dos valores que atribuímos a
nossas formações culturais, constante potencialização dos
movimentos críticos às formas dadas que aparecem como
naturais e incansável disposição a produzir o novo, resgatan-
do o devir criador de cada um de nós (Paulon, 2006, p. 14).
Este corpo teórico ganha ainda mais expressão quando à
estigmatização da loucura soma-se a repulsa, nunca livre de al-
guma forma de tentação, do crime. Para lidar com esta ainda
mais complexa formação humana que são as pessoas com trans-
tornos psíquicos e em conflito com a Lei, nossa moderna socie-
dade inventou o aparato jurídico-sanitário do manicômio judi-
ciário. Nascido do encontro das duas clássicas instituições totais
(Goffman, 1992), prisão e manicômio, estas casas de reclusão
para os mais desajustados às regras sociais constituem-se, assim,
“o lugar de realização do consórcio Psiquiatria-Direito Penal e o
espaço social em que a lei designa ao louco infrator” (Delgado,
1992, p. 58). 
Os manicômios judiciários surgem na Europa, na segunda
metade do século XIX, tendo sido a Inglaterra, em 1870, o pri-
meiro país a construir um estabelecimento especial para delin-
quentes criminosos. Antes já havia surgido na França e nos Es-
tados Unidos anexos especiais junto aos presídios para atender
essa população, além dos delinquentes que enlouqueciam du-
rante o período de cumprimento de pena, mas ainda como espa-
ços subordinados a prisões (Carrara, 1998). No Brasil, em 1903
367
foi criada uma lei especial para a organização da assistência mé-
dico-legal dos loucos criminosos, sendo, portanto, neste ano que
a construção dos manicômios judiciários se torna proposta oficial.
Essa legislação previa que os estados reunissem recursos para a
construção dos manicômios judiciários e que, enquanto não fos-
se possível serem erigidos, os asilos públicos deveriam criar ane-
xos especiais para atender os loucos criminosos. Foi assim que,
no mesmo ano de 1903, foi criada a seção Lombroso no Hospí-
cio Nacional de Alienados para atender essa população. Dezessete
anos mais tarde, em 21 de abril de 1920, no Rio de Janeiro, era
lançada a pedra fundamental do primeiro manicômio judiciário
do Brasil e da América Latina e inaugurado em 30 de maio do
ano seguinte. Em 1925, é criado o segundo manicômio judiciá-
rio no estado do Rio Grande do Sul.
“Lugar especial que se constituiria, no Brasil, como insti-
tuição concreta médico-penal entre os anos 20 e 30, mas que
veio se construindo, como intersecção ativa dos discursos psi-
quiátrico e judiciário, ao longo das três primeiras décadas deste
século” (Delgado, 1992, p. 61). O manicômio judiciário é o des-
tino jurídico dos que receberam medida de segurança: comete-
ram crimes e foram considerados inimputáveis ou semi-impu-
táveis na forma da lei, isto é, foram considerados como incapazes
de entender ou de se determinar ante o ato crime. Assim, em
troca da culpa jurídica recebem absolvição, em troca da pena
recebem tratamento. Mas um tratamento que implica muito
mais um “deixar morrer”, já que se trata de uma internação que
tem seu fim na “cessação da periculosidade”, nome dado à avalia-
ção que é a porta de saída médico-jurídica desse tipo de estabe-
lecimento, como vimos acima. Mantendo-se, entretanto, a avalia-
ção da periculosidade nas mãos dos psiquiatras e sob a mesma
lógica dos que definem a pena, sem uma data estabelecida, a
prorrogação da internação pode dar-se indefinidamente. Em
outras palavras, a dita “absolvição” convertida em suposto “trata-
mento” reverte-se, de fato em um tempo pago com a vida. Como
368
é denunciado por muitos criminólogo críticos e foi numerica-
mente demonstrado no Censo da população que habitava os, à
época, vinte e seis estabelecimentos de custódia e tratamento do
Brasil (Diniz, 2013) não raro muitos desses sujeitos nunca en-
contram saída da clausura, seja porque a relação com a vida se
perdeu lá dentro do manicômio, seja porque a morte real encur-
tou o inevitável caminho. É necessário entender que essa escolha
por colocar o louco infrator no manicômio judiciário não vem
despregada de um contexto histórico. É uma escolha que fala da
invenção moderna dos dispositivos no trato da loucura e do cri-
me e “traz na sua montagem [. . .] uma concepção de sujeito e
de sociedade correlata a uma concepção de poder e dominação a
partir de estratégias de segregação” (Barros, 2010), “que já dura
bem dois séculos” (Carrara, 1988, p. 28).
Dessa maneira, vemos que a defesa social e a periculosidade
parecem ser os principais conceitosdiscursivos que fundamen-
tam a escolha legal pela internação neste “novo” dispositivo de
disciplinarizaçao dos corpos e desejos que é o manicômio judi-
ciário. Ou seja, esse dispositivo manicomial encontra na periculo-
sidade o instrumento essencial que faz girar e lubrificar suas
engrenagens, um aparelho discursivo que é disparado pela cons-
trução social do louco perigoso, dando consistência a um saber
que se articula no encontro da loucura e do crime, para produ-
zir, como efeito, o objeto da defesa social, que se faz ao custo de
um sujeito que é lançado para fora do mundo: um não mundo
para um não sujeito. Esse ser-objeto da defesa social, então, que
se produz como efeito discursivo da trama ficcional que envolve
os saberes-poderes do direito e da psiquiatria juntos e que fez
do conceito de periculosidade o sustentáculo da invenção do
monstro perigoso, mito fundador do perigo que habita toda a
loucura, acaba por justificar e naturalizar o destino dos loucos
no dispositivo de segregação desses sujeitos da convivência social.
Expressão contundente dessa trama encontra-se, por exem-
plo, na maneira como as sentenças judiciais são instituídas quando
Carmensita
Nota
Realocar "os" para depois de "à época" (entre vírgulas).

(...) Censo da população que habitava, à época, os vinte e seis estabelecimento (...)
Carmensita
Nota
Incluir vírgula após parênteses.
369
o processo penal associa o delito à figura de um doente mental.
Tais sentenças “não remetem a um código de leis e de penas
diferenciadas, mas a algumas poucas sentenças escritas ou dese-
nhadas à mão [. . .], pelo antigo comandante morto” [. . .], como
bem nos lembra Gagnebin (2006, p. 121). O que faz do antigo
comandante, segundo a interpretação irônica do explorador, um
“soldado, juiz, construtor, químico, desenhista”, lembrando o
poder-saber que os psiquiatras possuem dentro do manicômio
judiciário. Depois que o paciente se torna “judiciário”, sua saída
está condicionada a um parecer médico, conforme define a Lei
n.o 7.210 de 11 de julho de 1984 (Santos, 1985). Mesmo na
melhor das hipóteses, quando este parecer é elaborado por uma
equipe interdisciplinar, o que está em jogo é o poder de uns
decidirem sobre a vida de outros. Na medida, portanto, em que
sua “periculosidade precisa cessar” para que ele saia do manicô-
mio judiciário, e não sua pena precisa ser paga com base no cri-
me que ele cometeu, pode-se afirmar que a medida de seguran-
ça está baseada não no ato criminoso, mas na personalidade do
diagnosticado como delinquente. O procedimento jurídico aqui
corresponde a uma ação sobre uma personalidade considerada
anormal através da imposição de um tratamento calculada em
um suposto perigo representado por esse sujeito (Rauter, 2003).
Esse cálculo, como já vimos em Foucault, é realizado pelos
exames psiquiátricos que têm por função identificar o autor do
crime, responsável ou não, com um sujeito delinquente que será
objeto de uma tecnologia específica. Em um primeiro momen-
to, essas avaliações fizeram coincidir o delito com uma série de
comportamentos e maneiras de ser que, no discurso do perito
psiquiatra, são apresentadas como a causa, a origem e a motiva-
ção do próprio delito. Num segundo movimento, o exame psi-
quiátrico dobra o autor do crime com esse personagem que é o
delinquente. Assim, antes de qualquer coisa, o exame demons-
tra como o sujeito já se parecia com seu crime antes mesmo de
tê-lo cometido (Foucault, 1975/2001). É nesse sentido que, para
370
a medida de segurança, o crime é apenas um eventual sintoma
indicativo de estados perigosos de determinados desviantes. Su-
jeito e ato são postos aqui como indissociáveis. A periculosidade
criminal está, nesses termos, relacionada à ideia da probabili-
dade de o sujeito vir novamente a cometer delitos, o que, no caso
do inimputável, seria necessariamente presumida porque se con-
funde com a sua personalidade considerada anormal que é
indissociável ao seu “estado perigoso” individual. Ou seja, para
os considerados inimputáveis, a periculosidade “é o simples pe-
rigo para os outros ou para a própria pessoa, e não o conceito de
periculosidade penal, limitado à probabilidade da prática de
novos crimes” (Cataldo Neto et al., 2006, p. 170). Por isso, Peres
& Nery Filho (2002) afirmam que a medida de segurança olha
somente para o futuro, gerando consequências para os inimpu-
táveis, pois é essa periculosidade inerente a sua personalidade
que fundamenta o cálculo da pena-tratamento. 
Mesmo havendo avanços nas legislações que dizem respeito
ao tratamento das pessoas com sofrimento mental, como mencio-
nado acima, o código que orienta o tratamento, quando crime e
loucura se encontram, ainda reflete o lugar social destinado à
loucura na sua forma mais primitiva, ou seja, no encarceramento.
Distante disso, entretanto, quando se trata do louco infrator, o
que comumente temos assistido são direitos elementares feridos
em sua essência. Por exemplo, o artigo 5.o, inciso LIV, da nossa
Constituição Federal de 1988, atesta para o princípio de que
“ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devi-
do processo legal”. O atual Código Penal de 1940, ao possibili-
tar que o louco infrator seja encaminhado para o manicômio ju-
diciário tão logo seja instaurada a dúvida sobre sua sanidade
mental, ou seja, antes mesmo da conclusão do seu processo, faz
deste princípio constitucional letra morta. 
371
Algumas saídas possíveis:
por um acompanhar na rede
OMOVIMENTO DA REFORMA PSIQUIÁTRICA tem aponta-do que, entre as necessárias desconstruções de valores e
alterações nos modos de cuidado requeridas para a continui-
dade do processo de desinstitucionalização da loucura em nossa
sociedade, o enfrentamento das violações de direitos, assim como
criação de ferramentas teórico-metodológicas e equipamentos
técnico-assistenciais que permitam lidar com as pessoas com
adoecimento mental em conflito com a lei faz-se urgente.
Nesta perspectiva, alguns avanços significativos no campo
jurídico feitos nos últimos anos merecem destaque. Em 30 de
julho de 2010, o Conselho Nacional de Política Criminal e Pe-
nitenciária (CNPCP) estabelece “As Diretrizes Nacionais de
Atenção aos Pacientes Judiciários e Execução da Medida de
Segurança”, mediante a Resolução n.o 4, e recomenda a adoção
da política antimanicomial no que tange à atenção aos pacientes
judiciários e à execução da medida de segurança (Brasil, 2010).
Essa resolução orienta que o tratamento seja redirecionado aos
serviços substitutivos em meio aberto e que a intersetorialidade
seja a forma de abordagem, articulando o diálogo e a parceria
entre as diversas políticas públicas e a sociedade civil. Indica,
ainda, que a medida judicial seja realizada pore programa espe-
cífico de atenção ao paciente judiciário que atenda às condições
singulares de tratamento, levando em consideração as singularida-
des psíquicas, sociais e biológicas do sujeito, bem como as circuns-
tâncias do delito. A intenção é de que essa medida judicial via-
bilize a inserção social, a promoção da saúde e a invenção do laço
social possível ao sujeito específico em sua condição de sofrimento.
A resolução estabelece ainda que, em caso de necessidade de
internação, ela ocorra na rede de saúde municipal com acompa-
nhamento do programa especializado de atenção ao paciente
Carmensita
Nota
Corrigir "por"
372
judiciário. É recomendando às autoridades responsáveis que evi-
tem, tanto quanto possível, a internação em manicômio judiciário.
Por fim, no artigo 6.o, indica que Poder Executivo e Poder Judiciá-
rio, em parceria, irão implantar e concluir, no prazo de dez anos,
a substituição do modelo manicomial de cumprimento de medida
de segurança para o modelo antimanicomial, valendo-se do pro-
grama específico de atenção ao paciente judiciário (Brasil, 2010).
Entretanto, à luz do que acontece com tantas outras ga-
rantias legais em nosso país, agravado, possivelmente, com o peso
do estigma da loucura e, neste caso ainda, piorado com o medo
associado à figura de louco infrator,muitas são as pessoas que
vivem em privação de liberdade, alienadas de suas histórias de
vida e alijadas de seus direitos à saúde por terem recebido não
uma pena por um delito, mas uma sentença judicial de medida
se segurança.
Para enfrentamento desta complexa circunstância em que
se encontram os pacientes judiciários em nosso país, algumas
iniciativas dignas de nota podem ser mencionadas.
Em Goiás, o Programa de atenção Integral ao Louco In-
frator (PAI-LI) atua desde 2006 como responsável pela execu-
ção das medidas de segurança no estado, na perspectiva de evitar
internações manicomiais e integrar os pacientes judiciários à rede
de atenção psicossocial da região.
Compreendido como um projeto de êxito e consistência
ética e política, o Programa de Atenção Integral ao Paciente
Judiciário (PAI-PJ) é um programa do Tribunal de Justiça de
MG, que desde 1999 vem subvertendo a lógica de exclusão e
segregação que envolvia réus com transtorno psíquico. Pensado
a partir do conceito de inserção social e cuidado em rede, atua
em qualquer processo criminal em que uma pessoa com sofri-
mento mental esteja respondendo por algum delito. Articula-se
em parceria com diversos atores, como a rede pública de saúde
de Minas Gerais, com os movimentos sociais de defesa dos di-
reitos humanos em todo o estado.
373
Tem por finalidade “oferecer à autoridade judicial subsí-
dios para decisão nos incidentes de insanidade mental e promo-
ver o tratamento em saúde mental na rede pública de saúde, por
meio do acompanhamento da aplicação das medidas de segurança
ao agente infrator. De forma multidisciplinar, sugere a aplicação
a cada caso de uma medida singular, tensionada pelos princípios
normativos universais” (Barros-Brisset, 2012, não paginado).
Inicialmente, o paciente judiciário é avaliado pela equipe interdis-
ciplinar do PAI-PJ, que, imediatamente, o acompanha até a rede
pública de saúde, visando a construção de um projeto clínico
singular. Dessa forma vemos que o PAI-PJ faz resistência a um
modelo de exclusão e segregação do louco infrator, criando no-
vas maneiras de tratamento a partir de novos conceitos. 
Pautado por essas mesmas diretrizes, em 2012 uma equi-
pe de professores da UFRGS, pesquisadores e militantes dos
direitos humanos propôs ao judiciário gaúcho uma parceria e
criou o Programa de Extensão: “DES’MEDIDA — Saúde Men-
tal e Direitos Humanos: por um acompanhar na rede”. A
Vara de Execução e Penas alternativas do TJ-RS acolheu a pro-
posta e juntou-se à equipe acadêmica na construção de um Pro-
grama com o objetivo prestar assessoria interdisciplinar ao Judi-
ciário e ao paciente judiciário, com vistas à progressiva extinção
do Manicômio Judiciário (de acordo com a Lei 10.216/2001).
Trata-se de um Programa de atenção intersetorial e interinsti-
tucional que envolve a Psicologia, Serviço Social e Direito da
UFRGS com o Tribunal de Justiça do RS, voltado a assessorar
juízes de primeira instância na aplicação e execução da sentença
dos processos judiciais com indicativo de incidente de insanidade
mental ou já sentenciados com medida de segurança, na perspec-
tiva de oferecer condições singulares de atendimento ao pacien-
te judiciário com vistas a sua inserção junto ao território social.
Com foco no estrangulamento da porta de entrada do
manicômio judiciário do RGS, e em associação ao trabalho de
desinstitucionalização que veio sendo elaborado nos últimos anos
Carmensita
Nota
Incluir vírgula após " direitos humanos"
374
para abertura da porta de saída deste estabelecimento, o que o
DES’MEDIDA propõe, de fato é um processo de Desinstitu-
cionalização da Medida de Segurança — já que não se trata de
mero processo de desospitalização, mas de desconstrução cultu-
ral, invisível e em boa parte inconsciente de valores e tradições
arraigados socialmente — a esta DESmesura com que vimos
serem tratados os crimes sentenciados com Medida de Seguran-
ça. Contra a violação aos direitos do cidadão quando considera-
do inimputável ofereçamos “Um acompanhar na Rede”, uma
aposta nos sujeitos, na reconstrução de vínculos mesmo ali onde
eles parecem tão improváveis, como na saída possível.
Em seus quatro anos de estruturação, o Programa DES’-
MEDIDA tem enfrentado muitos impasses para sua execução
que incluem desde emperramentos burocráticos dos mais prosai-
cos, como a dificuldade de espaço físico para realizar suas ativida-
des e situar a equipe entre duas instituições públicas imensas e
com espaços de poder muito demarcados; até as dificuldades
mais sutis e não menos significativas, como a resistência encontra-
da entre profissionais de serviços substitutivos aos manicômios
que diante do egresso do manicômio judiciário evidenciam todos
os seus preconceitos e limites técnicos para o trabalho que deve-
riam saber fazer. Mas nem só de limites o DES”MEDIDA sobre-
viveu neste primeiro período de sua construção. O envolvimento
das equipes de bolsistas das três áreas de formação envolvidas no
Programa, as pequenas vitórias alcançadas com pacientes ganhan-
do as ruas, se experimentando para além dos muros manicomiais
pelas primeiras vezes em até uma década, a produção de redes afe-
tivas viabilizando novas formas de existência, a abertura de peque-
nas brechas nos territórios amedrontados pelo estigma da loucura,
algumas portas se abrindo, novos movimentos em corpos antes
enrijecidos pela máquina dessingularizante da Casa dos Mortos1
1 Alusão à expressão utilizada por Antonin Artaud para se referir aos hospícios
a que foi submetido inúmeras vezes e que a antropóloga brasileira Débora Diniz to-
maria como emblema dos modos de existência encontrados nos manicômios judiciários
fazendo da expressão o título de seu documentário sobre o tema.
Carmensita
Nota
Incluir vírgula após "execução"
375
. . . também foram experimentações que os primeiros pacientes
judiciários acompanhados em seus processos de desinstitucio-
nalização no Rio Grande do Sul nos permitiram.
A rede de saúde e especialmente da de atenção psicossocial
do Rio Grande do Sul teve avanços nos últimos anos, porém está
longe de alcançar os horizontes almejados pelo movimento re-
formista e mais próximo às demandas concretas da população.
O que conseguimos até aqui constituir foram apostas ainda tí-
midas, reduzidas a um mínimo de risco com poucos espaços
para produzir autonomia na construção de um processo efetiva-
mente terapêutico aos sujeitos que, adoecidos, cometeram um
crime. As saídas ainda precisam da garantia da tutela. A família
ou outra pessoa próxima, as vezes dos serviços, devem assistir o
uso da medicação, os passeios devem ser cuidados e o trabalho
quase sempre é estimulado para “passar o tempo”. O medo que o
“monstro perigoso” retorne está sempre ali, fazendo sombra na
condução do tratamento. Mesmo que o paciente saia esporadi-
camente ou em temporadas maiores, ele continua circunscrito
num espaço e tempo determinados. Os muros não precisam mais
necessariamente fazer esse contorno. O espaço de fora também é
vigiado, como bem demonstrou Foucault (1975/1999) ao evi-
denciar a estratégia de controle dos corpos na gestão biopolítica
da sociedade. 
Para que se possa concluir:
pelo fim da Medida de Segurança
A exigência de proteção da coletividade não
poderia jamais justificar medidas suscetíveis a
causarem danos, ao invés de vantagens, ao pa-
ciente.2
— Sentença 253 de 2003 da Corte Consti-
tucional italiana)
2 Tradução livre do italiano pelos autores. Retirado de Giudice & Cecconi,
2016.
376
Um delito cometido que, não raras vezes, resumiu-se a um
único gesto, uma ação descontrolada num momento de loucura,
um gesto desmedido, um ato impulsivo e, sob determinadas con-
dições socioeconômicas e configurações familiares e afetivas a
que qualquer um está sujeito, uma sentença com poder de selar
uma vida. Infelizmente ainda são muitas as pessoas que, a partir
de um indicativo de adoecimento mental associado ao ato julga-
do criminoso perdem o direito a responderem pelo que fizeram.
São os chamados “loucos infratores”, que reúnemsob a consigna
da periculosidade alguns dos elementos para rapidamente os
transformarem em algo próximo a seres abjetos. Entretanto, como
alerta a psicanalista, “É preciso lembrar que, antes do ato cri-
minoso, existe uma longa trajetória de sofrimento mental. O
crime é uma consequência dessa história. No entanto, mesmo
diante de um ato trágico, é possível apostar que essa pessoa é
capaz de outras respostas em sua convivência social” (Barros-
-Brisset, 2010, p. 12). 
A aprovação da Lei da Reforma Psiquiátrica brasileira repre-
senta um marco no reordenamento dos modos de produzir saú-
de no país (Brasil, 2004). Além de uma conquista significativa
para aqueles que compõem o quadro de trabalhadores, usuários,
familiares e militantes no campo da saúde mental, ela também
sintetiza um importante movimento na forma de se produzir
políticas públicas no Brasil, na medida em que é uma legislação
que surge como fruto dos embates, desafios e lutas envolvidos
na construção de um modo de tratamento humanizado àqueles
que se encontram em situação de sofrimento mental.
A constituição brasileira garante o direito à saúde univer-
sal a todo cidadão brasileiro, sem distinção de raça, gênero, cor
ou tipo de funcionamento psíquico. Isso deveria por si ser sufi-
ciente para fundamentar o direito ao tratamento digno de toda
pessoa com ou sem transtorno psíquico, tendo ou não praticado
um crime. Sabemos que não é assim que funciona, mas isso não
deve servir de argumento para que deixemos de denunciar os
377
desmandos, de lutar para que as leis sejam cumpridas e de pro-
por alternativas para os desvios que vemos serem operados. As
violações dos direitos mais elementares das pessoas com trans-
torno psíquico em conflito com a lei é uma dessas realidades
que precisam ser enfrentadas e que exigem a reunião de esforços
e conhecimentos dos mais variados. Entre eles, defendemos aqui
o direito de todo paciente judiciário à responsabilidade pelos
seus atos, a responder por eles perante a sociedade e ser julgado
e avaliado pelo que de fato cometeu, e não pelo que é. Como
reza o que se tornou sentença constitucional em 2003 na legis-
lação italiana, acima enunciado, nenhuma pretensão de proteção
social poderia subsidiar a retirada desse direito de uma pessoa
cujo sofrimento psíquico intenso possa ter levado à prática de
um crime. Isto não é o mesmo que a transformar em alguém
incapaz de compreender o que fez ou o que quer para todo o
sempre.
As argumentações desenvolvidas ao longo deste capítulo
procuraram mostrar quão urgentes são as modificações do velho
e atual Código Penal e na Lei de Execuções Penais para que o
direito à responsabilidade possa ser garantido a todo brasileiro e
brasileira. A imputabilidade precisa ser revista e o conceito de
“presunção de periculosidade” necessita ser excluído do nosso
ordenamento jurídico. Para Scaramella (2013), peças judiciais
compõem o que chama de narrativas biográficas judiciárias. Es-
tas compactam mais do que fatos, sintetizam vidas e tempos.
Operam uma lógica particular de atribuir um sentido único à
história dos sujeitos, dando-lhes uma determinada coerência que
os liga ao crime cometido.
O debate acerca da inconstitucionalidade da medida de
segurança deve extrapolar o pequeno círculo de especialistas a
que, na melhor das hipóteses, fica restrito e ganhar a abrangência
que merece em função da relevância social que de fato tem e da
imensa injustiça social que denuncia. Para tanto há que se pro-
vocar o pensamento com novas ações, pois “quando há coragem
378
de levar as questões até seu extremo, aí o pensamento necessaria-
mente deixa de ser um sonífero da prática para tornar-se ele
mesmo ato político” (Pelbart, 1993, p. 103). O manicômio ju-
diciário, como alternativa para tratar o louco infrator (se é que
um dia ele foi criado para isso) fracassou. Já vimos o quanto ele
é uma máquina de fazer morrer, que desenlaça o sujeito na cena
da vida pelo fato de retirar-lhe a possibilidade de poder falar em
nome próprio. A criação de novas formulações baseadas em novos
paradigmas jurídicos e assistenciais ao louco infrator é uma ur-
gência social, jurídica, política e uma dívida que o Estado brasi-
leiro tem para com sua constituição que garante acesso à justiça
e atendimento digno de saúde a todo cidadão.
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