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SUMÁRIO INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 3 1 CONCEITOS....................................................................................................... 4 1.1 Saúde Pública ................................................................................................... 4 1.2 Saúde coletiva .................................................................................................. 6 1.3 Meio ambiente e saúde coletiva ....................................................................... 8 1.4 Atuação da saúde coletiva .............................................................................. 10 2 POLÍTICAS DE SAÚDE NO BRASIL ............................................................... 13 2.1 Modelo político atual ....................................................................................... 16 3 HUMANIZAÇÃO DA ASSISTÊNCIA EM SAÚDE ............................................ 19 3.1 Política nacional de humanização (PNH) ........................................................ 19 3.2 Princípios e diretrizes da humanização .......................................................... 22 3.3 Humanização em gestão e serviços de saúde ............................................... 23 4 POLÍTICAS PÚBLICAS PARA SAÚDE DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE 26 4.1 Atendimento público voltado à criança e ao adolescente. .............................. 26 4.2 Tipos de ações no atendimento às crianças e aos adolescentes ................... 28 4.3 Proteção à saúde da criança e do adolescente .............................................. 31 5 ÓRGÃOS REGULADORES DA SAÚDE PÚBLICA NO BRASIL .................... 33 5.1 Conceito de órgão regulador .......................................................................... 34 5.2 Objetivo dos órgãos reguladores .................................................................... 38 6 REFRÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................... 41 INTRODUÇÃO Prezado aluno, O Grupo Educacional FAVENI, esclarece que o material virtual é semelhante ao da sala de aula presencial. Em uma sala de aula, é raro – quase improvável - um aluno se levantar, interromper a exposição, dirigir-se ao professor e fazer uma pergunta, para que seja esclarecida uma dúvida sobre o tema tratado. O comum é que esse aluno faça a pergunta em voz alta para todos ouvirem e todos ouvirão a resposta. No espaço virtual, é a mesma coisa. Não hesite em perguntar, as perguntas poderão ser direcionadas ao protocolo de atendimento que serão respondidas em tempo hábil. Os cursos à distância exigem do aluno tempo e organização. No caso da nossa disciplina é preciso ter um horário destinado à leitura do texto base e à execução das avaliações propostas. A vantagem é que poderá reservar o dia da semana e a hora que lhe convier para isso. A organização é o quesito indispensável, porque há uma sequência a ser seguida e prazos definidos para as atividades. Bons estudos! 4 1 CONCEITOS A saúde sempre foi um tema muito debatido na sociedade, pois ele faz parte de nossas vidas. Se trata de um tema fundamental para a preservação da vida humana, e sua promoção vai muito além de descobrir curas para determinadas doenças, pois incluí também a prevenção delas. A prevenção envolve tanto aspectos relacionados à saúde, como também aspectos sociais. Essa visão mais ampla de saúde é a base para a formação de uma saúde coletiva. 1.1 Saúde Pública Embora muito próximas e muitas vezes confusas, saúde pública e saúde coletiva não são a mesma coisa: têm origens, projetos e compromissos diferentes. A saúde pública refere-se às intervenções e serviços voltados ao combate de doenças ou outras situações que ameacem a saúde da população, sendo o Estado o principal responsável pela realização da saúde pública, ou seja, promover ações voltadas ao desenvolvimento do bem-estar e da saúde da população. No entanto, a promoção da saúde pública vai além do que o Estado pode fazer: a sociedade civil também contribui para a construção da saúde pública por meio de ações de desenvolvimento da cidadania, e importantes elementos do capital social contribuem para a construção de uma cultura em uma sociedade que entende a saúde como um valor social. Winslow (apud SOUZA, 2014, p. 15) define saúde pública como: [...] a ciência e a arte de prevenir a doença, prolongar a vida, promover a saúde física e a eficiência através dos esforços da comunidade organizada para o saneamento do meio ambiente, o controle das infecções comunitárias, a educação dos indivíduos nos princípios de higiene pessoal, a organização dos serviços médicos e de enfermagem para o diagnóstico precoce e o tratamento preventivo da doença e o desenvolvimento da máquina social que assegurará a cada indivíduo na comunidade um padrão de vida adequado para a manutenção da saúde. 5 Seguindo este entendimento, Wislow (apud LECHOPIER, 2015, p. 209) apresenta os meios para alcançar os objetivos da saúde pública. São eles: sanitarização do ambiente; controle das infecções transmissíveis; educação individual da higiene pessoal; organização de serviços médicos e de enfermagem para o diagnóstico precoce e o tratamento preventivo de doenças; construção da maquinaria social para assegurar a todos um padrão de vida adequado para a manutenção da saúde. Portanto, a saúde pública é uma atividade coletiva entre o Estado e a sociedade com o objetivo de preservar e melhorar a saúde de cada indivíduo. A saúde pública é muitas vezes considerada sinônimo de ações de saúde promovidas pelo Estado, mas também inclui ações não estatais, e nem todas as ações de saúde promovidas pelo Estado são iguais à saúde pública. Dessa forma, a Organização Pan-americana de Saúde (OPAS) define 11 funções atuais essenciais da saúde pública na América: 1. monitoramento, avaliação e análise da situação de saúde; 2. vigilância da saúde pública, pesquisa e controle de riscos e danos à saúde pública; 3. promoção da saúde; 4. participação dos cidadãos na saúde; 5. desenvolvimento de políticas e capacidade de planejamento e gestão institucional da saúde pública; 6. fortalecimento da capacidade institucional de regulação e fiscalização em questões de saúde pública; 7. avaliação e promoção do acesso equitativo aos serviços de saúde essenciais; 8. desenvolvimento e treinamento de recursos humanos para a saúde pública; 6 9. garantia da melhoria da qualidade dos serviços de saúde individuais e coletivos; 10. pesquisa em saúde pública; 11. redução do impacto de emergências e desastres na saúde. 1.2 Saúde coletiva A saúde coletiva no Brasil foi construída a partir do movimento sanitarista latino- americano e da corrente da reforma sanitária no país, que aconteceu entre 1960 e 1970. Nesse mesmo período foram instituídos programas para expandir o atendimento médico às zonas rurais e periféricas urbanas; também foram elaborados, nos cursos de medicina, departamentos de medicina preventiva. Elementos como por exemplo as políticas de saúde pública e de ciências sociais fazem parte da formação da saúde coletiva. Ela tem uma visão econômica, social e ambiental sobre as possíveis propagação de doenças nas regiões, lidando de forma preventiva para combatê-las. A prevenção se torna possível por meio de dados sociais, econômicos e informações sobre a propagação de doenças. As formas de prevenção adotadas devem levar em consideração específicas de cada região. Souza (2014, p. 11) define saúde coletiva como: [...] uma área do saber que toma como objeto as necessidades sociais de saúde (e não apenas as doenças, os agravos ou os riscos), entendendo a situação de saúde como um processo social (o processo saúde-doença) relacionado à estrutura da sociedade e concebendo as ações de atenção à saúde como práticas simultaneamente técnicas e sociais. Em relação ao campo de conhecimento, Paim e Almeida (1998, p. 309) expressam a seguinte visão sobre saúde coletiva: [...] a saúde coletiva contribui com o estudo do fenômeno saúde/doença em populações enquanto processo social; investiga a produção e distribuição das doenças na sociedade como processos de produção e reprodução social; analisa as práticas de saúde (processo de trabalho) na sua articulação com as demais práticas sociais; procura compreender, enfim, as formas com que a sociedade identifica suas 7 necessidades e problemas de saúde, busca sua explicação e se organiza para enfrentá-los. Por vezes, pode parecer que não existe diferença entre a saúde coletiva e a saúde pública, todavia, é importante lembrar que a saúde coletiva tem como objeto de estudo as necessidades da saúde, enquanto que a saúde pública tem como objeto de estudo os problemas de saúde. A diferença entre esses dois objetos de estudo, dizem respeito aos aspectos de combate à doença e longevidade; já as necessidades da saúde, além disso, também engloba os aspectos de melhoria na qualidade de vida, liberdade humana e busca pela felicidade (SOUZA, 2014, p. 17 e 18). A saúde coletiva é um elemento social fundamental e a sua promoção está diretamente vinculada ao conceito de políticas públicas e popularização da vida social. Outra maneira de verificar a diferença entre saúde pública e coletiva é analisar os meios de trabalhos utilizados por ambas. No entendimento de Souza, (2014, p. 18), o instrumento de trabalho da saúde pública é a epidemiologia tradicional, ou seja, a concepção biologista da saúde, e o instrumento da saúde coletiva é: [...] a epidemiologia social ou crítica que, aliada às ciências sociais, prioriza o estudo da determinação social e das desigualdades em saúde, o planejamento estratégico e comunicativo e a gestão democrática. Além disso, abre-se às contribuições de todos os saberes - científicos e populares - que podem orientar a elevação da consciência sanitária e a realização de intervenções intersetoriais sobre os determinantes estruturais da saúde. Assim, os movimentos como promoção da saúde, cidades saudáveis, políticas públicas saudáveis, saúde em todas as políticas compõem as estratégias da Saúde Coletiva. De certa forma, pode-se afirmar que a saúde pública é uma forma de saúde coletiva, ou seja, a saúde coletiva é um aspecto mais amplo da saúde. Atualmente, a saúde pública engloba um planejamento nacional e mais recursos do Estado. Já a saúde coletiva deve ser elaborada de forma regional, em consonância com a realidade local, e atuar estrategicamente na prevenção. 8 1.3 Meio ambiente e saúde coletiva Antes de compreender a relação da saúde coletiva com o meio ambiente, se faz necessário definir o que é meio ambiente, porque muitas vezes vinculamos essa palavra apenas às florestas e aos rios afastados da urbanização. Todavia, o meio ambiente é tudo aquilo que está à nossa volta, é o local do qual fazemos parte. Portanto, sendo o ambiente rural ou urbano, das duas formas é meio ambiente. A Lei da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981) no artigo 3, nos diz que o meio ambiente pode ser compreendido como “o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas”. (BRASIL, 1981) As dimensões do meio ambiente seriam tanto os patrimônios naturais (fauna, flora, recursos minerais, recursos hídricos) e sua relação direta e indireta com os seres vivos e humanos quanto os patrimônios artificiais construídos pelos seres humanos e toda a sua infraestrutura relacionada, como a construção de uma cidade e seu devido saneamento básico, rodovias, serviços médico-hospitalares, sem esquecer a cultura humana que perpassa por esses ambientes diferentes (OLIVEIRA; CASTRO, 2013, p. 6). A partir dessa compreensão sobre o meio ambiente, é possível entender a sua relação com a saúde coletiva. Os indivíduos fazem parte do meio ambiente e as alterações no meio ambiente afetam o bem-estar e a saúde dos seres humanos, assim como as modificações humanas alteram o meio ambiente. Sendo assim, as condições sanitárias, como parte do ambiente em que o homem vive, atingem a saúde humana. Como dito anteriormente, a saúde coletiva atua diretamente na prevenção das epidemias, e, para isso, é necessário também que ela atue sobre a área sanitária, ou seja, na higiene. Por isso, por volta de 1980, no Brasil, a luta pela saúde coletiva ficou vinculada com a busca pela Reforma Sanitária. Durante alguns anos, esses dois assuntos foram pensados de maneira separada, mas ainda estão estreitamente ligados. 9 Um importante fator para a prevenção de doenças, é a higiene em volta do ambiente onde as pessoas moram. Muitas vezes a saúde é prejudicada por conta da poluição e pela destruição da água, do ar e do solo, bem como também pelas condições ruins de moradia, e ausência de saneamento básico. Essas condições são muito comuns nas grandes regiões urbanas, principalmente nas favelas e nos cortiços. Para assegurar a saúde, a habitação das pessoas necessita ser saudável. [...] a habitação é considerada como um agente da saúde de seus moradores e relaciona-se com o território geográfico e social onde se assenta, os materiais usados para sua construção, a segurança e qualidade dos elementos combinados, o processo construtivo, a composição espacial, a qualidade dos acabamentos, o contexto global do entorno (comunicações, energia, vizinhança) e a educação em saúde e ambiente de seus moradores sobre estilos e condições de vida saudável. Do ponto de vista do ambiente como determinante da saúde, a habitação se constitui em um espaço de construção e desenvolvimento da saúde da família. (AZEREDO et al., 2007, p. 744). De acordo com a empresa Terra Ambiental, o não tratamento do esgoto pode acarretar doenças como febre tifoide, cólera, hepatite A e leptospirose. No Brasil, segundo o IBGE, uma pesquisa feita em 2017 mostrou que 60,9% das residências tinham banheiro e esgoto sanitário por rede geral de esgoto, ou seja, 39,1% dos domicílios brasileiros ainda não têm saneamento básico (IBGE, 2020). A poluição e a degradação da água e do solo têm origem por diversos fatores, e o principal deles é o despejo de resíduos químicos, como mercúrio e enxofre, pelas indústrias de mineração, que podem produzir graves danos à saúde da população que se encontra no meio ambiente afetado. Os alimentos transgênicos e o uso em excesso de agrotóxicos são também fatores que afetam de forma considerável a saúde da população. Há sérias evidências de que os alimentos transgênicos afetam a saúde do consumidor, reduzindo a expectativa de vida e aumentando as possibilidades de desenvolver câncer. O lixo sólido despejado nas ruas e avenidas das áreas urbanas também é causa de problemas de saúde pública, esse lixo acumulado prejudica a rede de 10 drenagem das ruas, levando a alagamentos e aumentando o risco de epidemias como a leptospirose. Em 2011, houve um caso de intensos deslizamentos de terras nos municípios de Nova Friburgo, Petrópolis, São José do Vale do Rio Preto e Teresópolis; nesse mesmo período, ocorreu um aumento no número de internações causadas pela leptospirose, chegando a quase 20 internações em fevereiro de 2011 – sendo que a média registrada para esse mês era menor que cinco internações. Quando esses resíduos estão acumulados em terrenos abandonados, tornam- -se redutos de larvas do mosquito aedes egpypti, que transmite dengue, zika, febre chikungunya e febre amarela. Através das informações citadas, é possível perceber que a maioria das causas ambientais mencionadas até agora que afetam a saúde das pessoas atingem diretamente a população mais pobre. Por isso, podemos considerar que a desigualdade, a exclusão social e a marginalização de indivíduos estão entre as condições que mais acarretam impactos na saúde humana. As condições básicas de vida a que todos os seres humanos têm direito (saúde, segurança, trabalho, educação, moradia etc.), dependem diretamente de um meio ambiente saudável (Johnston, 1995). Os elevados índices de morbidade e mortalidade nos países em desenvolvimento, com os conhecimentos de prevenção que se têm, poderiam ser reduzidos quase aos níveis dos países desenvolvidos. As causas dos atuais excessos de doenças nos países em desenvolvimento são, na sua maioria, originárias do meio ambiente e poderiam essencialmente ser evitadas (DOLL, 1992; MENDES, 1988 apud FERREIRA; ANJOS, 2001, p. 695) A melhoria na distribuição de renda, que envolve fatores políticos, econômicos e sociais, proporcionaria uma melhoria na saúde da população. 1.4 Atuação da saúde coletiva A saúde coletiva, representar um conceito mais amplo de saúde, atuando em vários focos. De modo geral, ela atua na promoção, proteção e recuperação da saúde. A promoção da saúde atua no diagnóstico, reconhecimento e tratamento das doenças e de aspectos que interfiram na qualidade de vida da população, bem como 11 no desenvolvimento e elaboração de tecnologias voltadas para os variados aspectos da saúde, como cultura, educação e cuidado. Já a proteção da saúde, age no diagnóstico, reconhecimento e tratamento dos fatores que geram a desigualdade e a vulnerabilidade social, no controle de doenças, na vigilância epidemiológica, sanitária e ambiental e na redução de riscos. Combater a desigualdade e a vulnerabilidade social é uma tarefa que deve incluir todas os suportes sociais e estatais, bem como a participação de toda a população. A recuperação da saúde atua no âmbito institucional, na gestão e no planejamento das clínicas, hospitais, nos processos de acolhimento, nos programas e sistemas assistenciais e de apoio psicológico e de toda a rede de saúde. A saúde coletiva atua em inúmeras áreas para garantir a promoção da saúde em todos seus aspectos. Por meio dos estudos e pesquisas acadêmicas desenvolvidas para tentar compreender as dimensões em que a saúde coletiva deve atuar, também se tem compreendido que a saúde coletiva exige uma transdisciplinaridade, ou seja, a junção de várias disciplinas para se chegar ao conhecimento. Acerca desse assunto, observe o que escrevem Sánchez e Bertolozzi (2007, p. 322): A abordagem na perspectiva da determinação social da saúde-doença e que o modelo de vulnerabilidade apresentado incorpora aponta para a necessidade da transdisciplinaridade, o que é fundamental quando se trata de problemas ou de necessidades de saúde, na medida em que a complexidade do objeto da saúde requer diferentes aportes teórico-metodológicos, sob pena de reduzir as ações a “tarefas” pontuais, de caráter emergencial, que não modificam a estrutura da teia de causalidade. Uma outra maneira de ver os focos de atuação da saúde coletiva é através de uma análise da forma como os profissionais que nela atuam podem exercer suas atividades. Regis e Batista (2015, p. 835) explicam como deve ser a atuação do enfermeiro na saúde coletiva: [...] desenvolver atividades gerenciais e contribuir com a consolidação da estratégia da saúde da família. É competência do enfermeiro, ainda, promover atividades educativas e ações que garantam a integralidade 12 do ser humano na atenção à saúde. Evidencia-se a importante contribuição da saúde coletiva para o empoderamento de enfermeiros dentro do atual contexto brasileiro e mundial. A saúde coletiva configura-se como uma nova perspectiva de saberes e práticas: as possibilidades teóricas são ampliadas para além da enfermagem centrada em procedimentos e no corpo biológico; a autonomia e o trabalho em equipe ressignificam a prática dos enfermeiros e atributos como comprometimento social e visão crítica e reflexiva são identificados não só como características do ser humano-cidadão, mas também do ser humano-profissional enfermeiro. O nutricionista pode ser compreendido como um profissional que atua na saúde coletiva, e promove a segurança alimentar como uma maneira de prevenir doenças de uma pessoa ou de um determinado grupo da população; por exemplo, ele pode trabalhar no combate à obesidade em um caso específico ou com campanhas educativas junto a grupos de crianças em escolas. O fisioterapeuta também pode exercer suas atividades na saúde coletiva, tanto desenvolvendo seu trabalho no atendimento de reabilitação, como também na orientação postural, que é um importante aliado na prevenção de inúmeras doenças. Bispo Júnior (2010, p. 1633) relata a importância da orientação postural e diz como deve ser construída essa orientação nas comunidades: A questão da postura deve ser difundida em âmbito coletivo não apenas como questão estética, mas como atitude corporal inerente a uma vida saudável e fator preventivo para diversas doenças. No âmbito da atenção básica, o fisioterapeuta deve atuar preferencialmente com grupos populacionais, orientando sobre as posturas mais adequadas para cada grupo ou para cada situação. A prática da educação em saúde não deve e não pode ser entendida como ação vertical e unidirecional, do profissional que sabe para a população que não sabe. O processo de educação e orientação postural deve ser construído coletivamente, levando-se em consideração quais os hábitos, costumes e crenças com poder de influência na postura daquela comunidade. O psicólogo saindo das práticas individuais de consultórios pode abranger sua contribuição para o campo coletivo. Sua principal atuação é exercer acolhimento e cuidado com os usuários das redes de saúde pública, suas famílias e os profissionais que atuam nela. Esses profissionais, são apenas exemplos para que se possa compreender melhor como acontece o trabalho na saúde coletiva. Todavia, existem 13 outros profissionais que também podem colaborar com as áreas da saúde coletiva, uma vez que ela integra diversos focos de atuação dentro da saúde, economia e sociedade. 2 POLÍTICAS DE SAÚDE NO BRASIL Durante muitos anos, as políticas públicas de saúde no Brasil sofreram modificações e adequaram-se aos momentos políticos, econômicos e sociais do país. Apenas em 1808, com a chegada da família real portuguesa ao Brasil, certas normas sanitárias foram colocadas em prática, mesmo que apenas nos portos, para evitar a entrada de doenças contagiosas que pudessem alcançar a nobreza. Por volta de 1822, novas políticas públicas frágeis foram aplicadas no controle dos portos, mas, sem muito sucesso. Somente após a Proclamação da República é que foram implementadas práticas de saúde em nível nacional. Após um longo período, a saúde ganhou força no Brasil a partir da Constituição de 1988, que criou o Sistema Único de Saúde (SUS). O SUS surgiu para proporcionar aos excluídos a assistência à saúde (BRASIL, 1988). 14 Fonte: Palm et al. (2011) No ano de 1904, ocorreu a chamada Revolta da Vacina, em decorrência de um modelo de intervenção chamado Campanhista, que, apesar de alguns abusos nas práticas de saúde, obteve também algumas vitórias contra as epidemias. Um dos 15 médicos desse período foi Oswaldo Cruz, que elaborou uma reforma, incorporando ações de Saúde, inserindo novos elementos, como: a) o registro demográfico, proporcionando o conhecimento da composição e os fatos vitais de importância da população; b) a inserção do laboratório como auxiliar do diagnóstico etiológico; c) a produção organizada de produtos profiláticos para uso em massa (PAIM, 2009). Em 1920 Carlos Chagas surgiu como sucessor de Oswaldo Cruz, e conseguiu inserir a propaganda e a educação sanitária na rotina de ação, reinventando o modelo Campanhista de Oswaldo, que era apenas fiscalizador. Foram instituídos, nesse período, órgãos especializados contra a tuberculose, a lepra e as doenças venéreas. Como foi uma luta marcada por muitos professores, pesquisadores e médicos, esse movimento conquistou bases e sindicatos. Através desses primeiros esforços, o Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (CEBES) foi criado em 1976, organizando o movimento da reforma sanitária e, em 1979, formou-se a Associação Brasileira de Pós-Graduação em Saúde Coletiva (ABRASCO) ambas ajudaram nas reformas da saúde. No decorrer da ditadura militar, pouco foi feito pela saúde dos brasileiros. No período, foram desenvolvidos os Institutos de Aposentadoria e Pensões (IAP), unificados no Instituto Nacional de Previdência Social (INPS). Foi um período em que houve também um aproveitamento da medicina pela previdência social. Foi uma época em que a população brasileira enfrentava a ditadura e denunciava o autoritarismo nas práticas de saúde (PAIM, 2009). Em 1970, foi criado o Movimento da Reforma Sanitária, “que tinha como finalidade conquistar a democracia para mudar o sistema de saúde” (PAIM, 2009). O movimento da reforma sanitária no Brasil acabou se desenvolvendo, e a partir de 1979, acorreram inúmeras reuniões de pesquisadores, gestores de Saúde e outros movimentos sociais e, em 1980, foi instituído o Conselho Nacional de Secretários de Saúde (CONASS). Na 8ª Conferência Nacional de Saúde, em 1986, 16 foi feita a elaboração do SUS, com base em estratégias de saúde que foram realizadas no Brasil (PAIM et al., 2011). Dessa forma, é possível fazer uma ligação de que o SUS é uma decorrência direta da Reforma Sanitária, mas não é filho único. O SUS foi regulamentado na Constituição de 1988, onde ficou garantido o direito à saúde como sendo um direito fundamental e social do ser humano. (BRASIL, 1988) O SUS foi elaborado com princípios doutrinários, que são a base de tudo que é praticado para a população. Sendo eles: Universalidade: o acesso às ações deve ser garantido a todas as pessoas. Equidade: garante a igualdade da assistência à saúde sem preconceitos ou privilégios. Integralidade: considera o indivíduo como um todo, e as ações de saúde devem atender a todas as necessidades. Hierarquização: é um conjunto de ações e serviços preventivos e curativos, individuais e coletivos, para todos os níveis de complexidade. Participação popular: democratização dos processos decisórios dos serviços de saúde. Descentralização: consolidada com a municipalização, torna o município gestor do SUS. 2.1 Modelo político atual O sistema de saúde vigente atual é descentralizado, ou seja, o poder e a responsabilidade sobre o setor são distribuídos entre as três competências do governo, buscando uma prestação de serviços mais eficiente, e com maior fiscalização. Podemos dizer ainda, que o modelo de saúde vigente no Brasil é composto por uma rede complexa que gera uma combinação público-privada, financiada por recursos privados. Nesse atual Sistema de Saúde existem subsetores, sendo eles: 17 subsetor público, no qual os serviços são financiados e providos pelo Estado nos níveis federal, estadual e municipal, incluindo os serviços de saúde militares; subsetor privado (com fins lucrativos ou não), no qual os serviços são financiados de diversas maneiras com recursos públicos ou privados; subsetor de saúde suplementar, com diferentes tipos de planos privados de saúde e de apólices de seguro, além de subsídios fiscais. A política de saúde vigente incentiva o setor privado e possibilita a privatização da saúde através de credenciamentos de médicos, remuneração e criação de clínicas diagnósticas ou terapêuticas e hospitais e ainda estimula empresas de planos de saúde. Grande parte dos planos de saúde no Brasil são de empresas comerciais e oferecem planos com diferentes níveis. Para regulamentar esses planos, no ano de 2000 foi elaborada a Agência Nacional de Saúde Suplementar. O modelo é hierarquizado, separado em níveis de complexidade os serviços, formados pela atenção básica, que é a principal porta de entrada no sistema, a qual deve ser a sua ordenadora. Dessa forma, temos: atenção primária ou básica; atenção secundária; e atenção terciária ou de média e alta complexidade (PAIM et al., 2011) Atenção básica: por conta do processo de descentralização, tem melhorado muito. Por meio dela são realizadas diversas estratégias, como, por exemplo, o Programa de Agentes Comunitários de Saúde e o Programa de Saúde da Família (PSF), também conhecido como Estratégia de Saúde da Família (ESF). A ESF funciona por meio de equipes de saúde, que atuam em áreas geográficas e populações bem definidas. As atividades de promoção de saúde funcionam nas unidades, nas casas dos pacientes e na comunidade. Atenção secundária: é pouco regulamentada, e os procedimentos de média complexidade normalmente são deixados de lado em prol dos procedimentos de alto custo. Nessa atenção secundária, o SUS é totalmente dependente de contratos com o setor privado, sobretudo no caso de serviços de apoio diagnóstico e terapêutico. Na atenção secundária, encontramos especialidades odontológicas, serviços de 18 aconselhamento para HIV, centros de referência de Saúde do trabalhador, além da criação das unidades de pronto atendimento (UPAs), que são articuladas com o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU). Atenção terciária ou hospitalar: incluem-se aqui procedimentos de alto custo, que muitas vezes são realizados por prestadores privados ou hospitais públicos de Ensino. Nesse nível de atenção à saúde está incluído o sistema de gerenciamento de listas de espera para transplantes de órgãos. As políticas públicas de saúde desenvolvidas no Brasil são pautadas por diretrizes e medidas que expressem o posicionamento do Estado diante de situações consideradas de interesse público, visando à recuperação em nível individual ou coletivo. Essas são políticas que devem sempre reconhecer as desigualdades e buscar uma redução das diferenças existentes entre os cidadãos. Uma das políticas implementadas é a questão da disparidade de gênero. As políticas públicas devem levar em consideração não somente as diferenças biológicas nas condições de saúde entre homens e mulheres, mas, também, a dimensão social e os meios de adoecimento, que são diferentes entre homens e mulheres. A naturalização da agressividade como um atributo masculino e da fragilidade e submissão como características femininas impactam negativamente nas condições de saúde (LIMA, 2015). Entre as reformulações nos processos de saúde vigentes, uma das mais novas foi a de Contratualização. A Contratualização acontece nos cuidados primários de saúde e é uma tendência internacional das reformas dos sistemas de saúde, adotada entre as décadas de 1990 e 2000, nos países da Europa. No Brasil, a Contratualização foi recepcionada na atenção básica das três esferas governamentais, através do Programa de Melhoria de Acesso e Qualidade, com base em parcerias estabelecidas entre a administração direta e instituições do terceiro setor. A Contratualização pode ser compreendida como um processo no qual o gestor do SUS e o representante legal do hospital público ou privado elaboram metas quantitativas e qualitativas de atenção à saúde e de gestão hospitalar. Se trata de um 19 modelo novo, fundamentado no repasse de incentivos financeiros calculados a partir da série histórica da produção hospitalar, possibilitando um incentivo de Adesão à Contratualização (IAC) (PACHECO, 2006). A seguir temos algumas vantagens da Contratualização: Programação Orçamentária e Financeira; Facilitação dos Processos de Avaliação, Controle e Regulação dos Serviços Ofertados; Possibilidade de Investimento na Gestão Hospitalar; Adequação dos Serviços conforme a demanda e as necessidades do gestor local de saúde; Maior transparência na relação com o gestor local do SUS; Melhor inserção institucional na rede de serviços de Saúde. 3 HUMANIZAÇÃO DA ASSISTÊNCIA EM SAÚDE 3.1 Política nacional de humanização (PNH) A humanização é hoje um tema bastante comum nos serviços públicos de saúde, nos textos oficiais e também nas publicações da área da saúde coletiva. O termo “humanização” lembra os movimentos de recuperação de valores humanos esquecidos nos tempos de relaxamento da ética. Em todo o decorrer da história, a humanização surge no momento em que a sociedade pós-moderna passa por uma revisão de valores e atitudes. O princípio da PNH tem origem vinculada a uma inspiração humanista: universalidade, integralidade, equidade e participação social. Levados às últimas consequências, conceituam a humanização em qualquer concepção, em qualquer instância de atenção ou gestão. Esse caráter faz do SUS, hoje, o principal sistema de inclusão social deste país. A humanização da atenção no SUS envolve a compreensão de que o trabalho em saúde precisa transformar as necessidades humanas e fortalecer a vida. Acolher 20 e garantir o acesso, determinar atenção e cuidado integral, sempre com equidade. Humanizar significa compreender a necessidade dos conflitos existentes para que a produção do mundo e dos seus valores seja coletiva e pública. Os procedimentos das ações propostas pela Política de Humanização da Assistência à Saúde (PHAS) tem como princípios fundamentais o respeito às especificidades de cada instituição, incentivando assim a cooperação entre as mesmas pela troca de experiências elaboradas, visando a qualificação do serviço público de saúde. Anos após o seu surgimento, o SUS é um sistema idealizado para satisfazer os anseios do povo brasileiro, todavia, é também um sistema de saúde público que apresenta diversas contradições e heterogeneidades, pois é caracterizado por serviços modernos, e também de serviços sucateados nos quais estão presentes a permanência de um modo obsoleto de executar o serviço público, a burocratização e os fenômenos que representam situações de violência institucional. No ano 2000, o Ministério da Saúde, sensível às manifestações setoriais e às diversas iniciativas locais de humanização das práticas de saúde, criou o Programa Nacional de Humanização da Assistência Hospitalar (PNHAH). Esse programa incentivava a disseminação das ideias da humanização, bem como os diagnósticos que surgiam, e a promoção de ações humanizadoras de acordo com a realidade de cada local. Sendo um programa inovador e bem construído por um grupo de psicanalistas, tinha ainda forte ênfase na transformação das relações interpessoais devido ao aprofundamento da compreensão dos fenômenos no campo das subjetividades. No ano de 2003, o Ministério da Saúde analisou o PNHAH e iniciou a política nacional de humanização (PNH) que alterou o patamar de alcance da humanização dos hospitais para toda a rede SUS e determinou uma política cujo foco passou a ser principalmente os processos de gestão e de trabalho. Dessa forma, a PNH passou a ser um conjunto de diretrizes transversais que são a base para toda atividade institucional que engloba usuários ou profissionais da saúde, em qualquer instância de efetuação. 21 Nessa vertente, a humanização enfatiza os processos de trabalho e os modelos de gestão e planejamento, se envolvendo na vida institucional. O resultado que se espera com a humanização, é a valorização das pessoas em todas as práticas de atenção e gestão, a integração, o compromisso e a responsabilidade de todos com o bem comum. Diversas ações e indicadores de validação e monitoramento foram elaborados pelo Ministério da Saúde para incentivar e acompanhar os processos de humanização não só nos hospitais, mas também nos três níveis de atenção à saúde no SUS. A estratégia de formação e fortalecimento dos Grupos de Trabalho de Humanização nas instituições (grupos compostos por pessoas ligadas ao tema e aos gestores dos serviços de saúde, com o papel de implementar a PNH em sua unidade) mostrou êxito em vários locais, acumulando muitos bons exemplos de trabalho na área. Entretanto, a humanização só se torna real em uma instituição, quando seus administradores fazem dela mais que retórica, um modelo de fazer gestão. Somente as boas intenções e programas vinculados a ações circunstanciais não são suficientes para a a realização da humanização como processo transformador. Os meios que de fato asseguram esse processo são a informação, a educação contínua e a gestão participativa. Focar na humanização significa menos o que fazer e mais como fazer. Mesmo sendo importantes, as ações ditas humanizadoras não necessariamente especificam um caráter humanizado ao serviço como um todo. Na verdade, são os princípios conceituais que definem a humanização como uma base para toda e qualquer atividade. Dessa forma, existe um desafio que é criar uma nova cultura institucional que seja cercada pelos valores da humanização. Tornar a assistência à saúde humanizada, é dar voz não somente ao usuário, mas também ao profissional de saúde, para que ambos participem de uma rede de diálogo. Essa rede deve promover ações, campanhas, e políticas assistenciais, tendo como fundamento a ética, o respeito, o reconhecimento mútuo, a solidariedade e responsabilidade. Seguindo neste entendimento, a Política de Humanização da assistência à Saúde mostra diferentes parâmetros para a humanização da assistência hospitalar em três áreas: acolhimento e atendimento dos usuários; trabalho dos 22 profissionais; e lógicas de gestão e gerência. Esses padrões podem servir para o trabalho de análise, reflexão e elaboração de ações, campanhas, programas e políticas assistenciais que orientem um plano de humanização. O objetivo da PHAS é elaborar uma nova cultura de humanização, que valoriza as ações humanizadas já em andamento, criando uma filosofia organizacional que incentive a conjugação cotidiana do verbo humanizar. Uma cultura de humanização precisa de tempo para ser construída, e requer a participação de todos os atores do sistema, determina a ruptura de paradigmas. O verbo humanizar é pessoal e intransferível, uma vez que ninguém pode ser humano em nosso lugar. 3.2 Princípios e diretrizes da humanização Atualmente, diversas sondagens conceituais, protestos ideológicos, elaborações teóricas e técnicas e programas temáticos fazem com que a humanização seja um incentivo para as inovações da produção teórica e prática no âmbito da saúde. Sob diversos olhares, a humanização pode ser entendida como: um princípio de conduta de base humanista e ética; um movimento contra a violência institucional na área da saúde; uma política pública voltada para a atenção e gestão no SUS; uma metodologia que contribui para a gestão participativa; uma tecnologia de cuidado em relação a assistência à saúde. A humanização, baseada no respeito e valorização da pessoa humana, forma um processo que visa à transformação da cultura institucional através da construção em conjunto de compromissos éticos e de métodos para as ações de atenção à saúde e de gestão dos serviços. Esse conceito genérico, abriga as diferentes visões da humanização já comentadas, na forma de abordagens complementares que possibilitam a realização dos propósitos para os quais aponta seu conceito. De modo geral, a humanização tem como finalidade a compreensão dos problemas e o alcance de soluções compartilhadas. Participação, autonomia, 23 responsabilidade e atos solidários caracterizam essa forma de fazer saúde, no qual a essência é a aliança da competência técnica e tecnológica com a competência ética e relacional. Dessa forma, destacamos a seguir mais alguns princípios que complementam a base da política de humanização: Valorização da dimensão subjetiva e social em todas as práticas de atenção e gestão no SUS, aumentando o compromisso com os direitos de todos os cidadãos, independentemente de gênero, etnia, raça e orientação sexual; fortalecimento de trabalho em equipe multiprofissional, incentivando a transversalidade e a grupalidade; auxílio à construção de redes cooperativas, solidárias e comprometidas com a produção de saúde e com a produção de sujeitos; elaboração de autonomia e protagonismo dos sujeitos e coletivos implicados na rede do SUS; corresponsabilidade desses sujeitos nos processos de gestão e atenção; fortalecimento do controle social com caráter participativo em todas as instâncias gestoras do SUS; comprometimento com a democratização das relações de trabalho e valorização dos profissionais de saúde, estimulando processos de educação permanente. 3.3 Humanização em gestão e serviços de saúde Através da PNH, a humanização se aproxima dos processos de gestão e organização do trabalho nos serviços de saúde, e a gestão participativa surge como modelo eleito para a execução dessa política. Quando se fala em gestão participativa ou cogestão, está se discorrendo sobre um modo de administrar que não se limita à linha superior de comando e insere o pensar e o fazer de modo coletivo. Os planejamentos para a gestão participativa nos serviços de saúde devem ser estudados de acordo com cada caso, a partir do conhecimento das realidades 24 institucionais individualizadas, contudo, abaixo seguem algumas ações que a propiciam em qualquer contexto: a elaboração de espaços de discussão para a contextualização de impasses, sofrimentos, angústias e desgastes no qual os profissionais de saúde venham a passar no dia a dia em virtude da natureza de seu trabalho; pensar e decidir de forma coletiva acerca da organização do trabalho, inserindo gestores, usuários e trabalhadores em grupos com diversas formações; formar equipes transdisciplinares efetivas garantam a diversidade dos vários discursos presentes na instituição, propiciando o aproveitamento da inteligência coletiva. De certa forma, as estratégias, metodologias e ferramentas usadas para desenvolver o profissional da área da saúde são de extrema importância. O resultado desses meios é capaz de promover atendimentos que sejam de fato humanizados. Nesse sentido, a Educação contínua é uma estratégia para o exercício da gestão participativa, visando à transformação das práticas de formação, de atenção e de gestão na área da saúde. Através da aprendizagem significativa, a educação permanente elabora os saberes a partir das experiências das pessoas. Através dos encontros, é possível discutir os problemas, sugerir soluções gerenciais, modificação na organização do trabalho e estabelecer ações educativas de acordo com as necessidades detectadas. Dessa forma, é possível transformar a gestão participativa no caminho para a humanização dos serviços. Todavia, como existem poucos gestores com formação técnica para exercer essa prática, ainda não é comum as experiências dessa forma inovadora de fazer gestão de pessoas. O tecnicismo da prática atual desconsiderou os aspectos humanísticos em relação ao cuidado com a saúde. Algumas pesquisas mostram que os recursos tecnológicos, a visão centrada nos aspectos biológicos da doença e a organização do trabalho médico para o atendimento de massa ampliaram o acesso da população aos bens e serviços de saúde, mas, em compensação, criaram um abismo entre o médico e o paciente. 25 A tecnologia, que é um fator essencial para aumentar a sobrevida humana e reduzir os sofrimentos que acometem a saúde, tornou-se um intermediário que distancia os profissionais do contato mais próximo e mais longo com o paciente. A tecnologia acelera o atendimento e aumenta a produtividade contada em números, mas também fascina e captura o interesse dos profissionais da saúde, particularmente dos médicos. Dessa forma, os pacientes passam à condição de objetos de estudo e manipulação na elaboração do saber e da prática “científica”. Por outro lado, os profissionais passam a condição de peças que irão colocar em execução a máquina institucional. O tecnicismo deixa de lado vivências importantes para a realização do cuidado à saúde. Já no modelo psicossocial você agrega saberes de teorias compreensivas sobre o vínculo capazes de desvendar atitudes e emoções que facilitam ou impedem o bom diagnóstico e a aliança terapêutica. Por exemplo, a psicanálise ensina que, ao adoecer, a pessoa vive um processo que chamamos de regressão narcísica, que, em graus variáveis de acordo com a história pessoal, a personalidade e a gravidade de sua doença, a torna mais frágil, mais sensível e mais dependente daquele que lhe presta cuidados. É como se o paciente, inconscientemente, voltasse aos tempos em que era cuidado pela mãe e dela dependia para sobreviver. As mudanças sociais e culturais que atravessaram os tempos transformaram a face da medicina e das práticas de saúde, chegando ao contexto aqui discutido e às implicações para o surgimento da humanização na saúde. Começando por ações isoladas, pontuais, amadoras, a humanização foi desenvolvendo conceitos e tecnologias para sua aplicação tanto no campo das relações profissionais-pacientes, quanto no campo da gestão, chegando à forma de política pública na saúde. Todavia, a falta de entendimento mais profunda da dimensão psicossocial que engloba os processos saúde-doença, a falta de compromisso com o resultado do trabalho, a falta de decisões compartilhadas com pacientes, de projetos assistenciais discutidos em equipe multidisciplinar, e mesmo de gestão participativa nos serviços de saúde, tornam a humanização do cuidado um projeto que ainda se encontra distante da realidade dos serviços de saúde. 26 4 POLÍTICAS PÚBLICAS PARA SAÚDE DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE A saúde das crianças se trata de um tema que merece grande destaque. Inicialmente, o foco eram a mortalidade infantil e a prevenção com as doenças que poderiam levar as crianças a óbito ou possivelmente deixar alguma sequela. Hoje, é possível notar toda a inclusão de ações voltadas aos cuidados dos adolescentes e à promoção da saúde, desde a gestação, englobando ações de melhoria da qualidade do pré-natal, fomento ao aleitamento materno, desenvolvimento infantil da primeira infância, imunização, nutrição e até mesmo sexualidade. Algumas ações mais amplas, ainda incluem o tratamento de reabilitação, o progresso da saúde e a prevenção de doenças. A equipe de saúde pode ainda prevenir e combater eventuais violências contra crianças e adolescentes. 4.1 Atendimento público voltado à criança e ao adolescente. Nas últimas décadas do século XX, os processos de modernização e democratização experimentados no Brasil permitiram reordenar a política de assistência social para o conjunto da população, estabelecendo novos parâmetros para a intervenção pública. No âmbito da assistência pública, a infância e a adolescência foram reconduzidas como processos sociais de desenvolvimento humano. A proteção social direcionada aos jovens, pessoas em formação que exigem atenção específica, acabou se tornando uma prioridade. A visão sobre a criança e ao adolescente como seres em desenvolvimento no mundo moderno foi ampliada ao longo de um processo social que envolveu modificações na organização social, tanto no âmbito privado das famílias, e também na esfera pública do convívio social. Em 2002, a geração de adolescentes e jovens de 10 a 24 anos de idade já era a mais numerosa em toda a história do Brasil, representando um total de 51.429.397 pessoas – 30,3% da população brasileira –, sendo 35.287.882 adolescentes de 10 a 19 anos e 16.141.515 jovens com idades entre 15 e 24 anos (IBGE, 2002 apud 27 BRASIL, 2010). A grande maioria (84%) dos adolescentes e jovens brasileiros (10 a 24) vivia em áreas urbanas, enquanto 16% viviam em áreas rurais (IBGE, 2002 apud BRASIL, 2010). Existia uma prevalência de homens jovens nas áreas rurais (15-17 anos: 52,90% e de 18-24 anos: 53,16%) e, na zona urbana, de mulheres jovens (15- 17: 50,47% e de 18-24: 50,99%). Os jovens supracitados, são exatamente os que estão expostos às mais altas taxas de mortalidade por causas externas. É fundamental a existência de serviços de saúde que ampare suas necessidades específicas e que elas sejam eficazes na integralidade da atenção à saúde. O Ministério da Saúde adota a convenção elaborada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) que marca o período entre 10 e 19 anos, 11 meses e 29 dias de idade como adolescência, e, aqueles com idade entre 15 e 24 anos como juventude. Dessa forma, existe uma interseção entre a segunda metade da adolescência e os primeiros anos da juventude. O termo “pessoas jovens”, é comumente citado para se referir ao conjunto de adolescentes e jovens, abrangendo assim faixa compreendida entre 10 e 24 anos. Esses limites relacionados a faixa etária, são um marco útil para a elaboração de políticas e de estratégias, contudo, é importante lembrar que na vida concreta e na experiência individual de cada um, não existem fronteiras fixas e homogêneas para a adolescência e a juventude (BRASIL, 2009). Sendo assim, talvez seja mais adequado falar em adolescências e juventudes, dando importância aos diversos grupos populacionais, uma vez que essa etapa da vida decorrerá em experiências diferenciadas e em significados peculiares. É importante pensar na adolescência e na juventude como procedimentos complexos de emancipação, que não se limitam à passagem da escola para o trabalho. Esses procedimentos envolvem três dimensões interdependentes: a macrossocial, referente as desigualdades sociais (classe, gênero e etnia); a dimensão dos dispositivos institucionais, no qual se encontram os sistemas de ensino, as relações produtivas e o mercado de trabalho; e, por fim, a dimensão biográfica, ou seja, as particularidades da trajetória pessoal de cada indivíduo. 28 Existem duas vertentes das políticas do governo federal voltadas à juventude que procuram modificar o quadro retratado. Uma delas é a Política de Promoção e Proteção Integral da Infância e da Adolescência, desenvolvida desde 1995, pelo Ministério da Justiça, e a outra vertente é o Programa Comunidade Solidária, que se direcionou preferencialmente ao jovem vulnerável em a situação de risco social, através de uma série de programas setoriais voltados para a saúde, educação, geração de renda e trabalho. Essas duas vertentes dão preferência a uma intervenção específica e a reversão de situações especiais ou de risco social, que atinge a população-alvo. Essas ações homogêneas não ponderam diferenças entre os diversos grupos ou reações em face das intervenções. O que as diferenciava era o local onde elas ocorriam e os agentes que as executavam (VOLPI, 1999). Para a saúde da criança e do adolescente, um conjunto de ações essenciais de saúde é priorizado segundo os princípios da integralidade e universalidade que vêm sendo definidos na saúde pública desde a década de 1980. No novo contexto, esse foco se concentra no risco de grupo, em sua intercessão com os critérios seletivos que definem pobreza e indigência. No entanto, mantém seu objetivo principal de garantir a manutenção e reprodução das condições necessárias para uma vida humana saudável. 4.2 Tipos de ações no atendimento às crianças e aos adolescentes A saúde infantil é uma área prioritária na saúde da população. Para desenvolver efetivamente esse campo, além de compreender características associadas à morbimortalidade, como aspectos biológicos, demográficos e socioeconômicos, é importante ressaltar o papel dos serviços e sistemas de saúde, inclusive em setores complementares. É possível notar, que ainda hoje há a necessidade de desenvolver um conjunto de ações de promoção, prevenção e proteção infantil, considerando aspectos 29 epidemiológicos, sociais, culturais, ecológicos e psicológicos, visando desenvolver e construir políticas de saúde para essa população. Os programas de promoção e prevenção voltados para a saúde da criança devem deslocar o foco do cuidado baseado na patologia para uma abordagem assistencial que inclua a criança em seu processo de crescimento e desenvolvimento e cidadania. Alguns dos principais eixos estratégicos são: redução da mortalidade infantil, humanização e melhoria da qualidade da assistência prestada, mobilização social e política, construção de parcerias e promoção da vida saudável. A redução da mortalidade infantil continua sendo um grande desafio para o país. Apesar dos declínios substanciais nas últimas décadas, a mortalidade continua alta devido à redução da mortalidade infantil pós-neonatal (28 dias a 1 ano). A mortalidade neonatal (0 a 27 dias após o nascimento) no país é um dos principais componentes da mortalidade infantil desde a década de 1990 e concentra-se nas regiões e populações mais pobres, refletindo as desigualdades sociais. Você nota a gravidade da situação ao reconhecer que, em sua maioria, essas mortes precoces podem ser consideradas evitáveis. As causas perinatais, a pneumonia e a diarreia associadas à desnutrição são as principais causas de morte no primeiro ano de vida (BRASIL, 2004). Sendo assim, o nascimento saudável, a promoção do crescimento, o desenvolvimento e a alimentação saudáveis, bem como a prevenção de doenças respiratórias não podem ser incompletas e nem deixar de abranger todos os níveis de atenção. Promover a saúde geral das crianças, realizar operações de prevenção e assistência e reduzir a mortalidade infantil demonstram nosso compromisso em proporcionar às crianças uma vida de qualidade para que possam crescer e atingir seu potencial. As principais ações gerais são: Proporcionar o nascimento saudável. Auxiliar no crescimento, desenvolvimento e a imunização. Proporcionar o aleitamento materno e alimentação saudável: atenção aos distúrbios nutricionais e anemias. Abordar as doenças respiratórias e infecciosas. 30 Realizar visita domiciliar de enfermagem ao recém-nascido na primeira semana. Realizar consulta médica. Realizar consulta de nutrição. Realizar atividades educativas coletivas para as mães/pais/responsáveis com equipe multiprofissional, com abordagem sobre os fatores de risco e ênfase no desenvolvimento de um estilo de vida saudável. Orientar a execução de atividades de vida diária e prevenção de acidentes. Orientar a execução de atividades de desenvolvimento psicomotor. Sensibilizar sobre o tema do desenvolvimento saudável por meio de palestras ou outras atividades organizadas/patrocinadas pela operadora. Realizar atividades físicas coletivas orientadas. Criar rotina e calendário vacinal. Realizar integração com os programas voltados para a prevenção de doenças comuns da infância. Realizar exames periódicos. Inserir no site da operadora informações sobre fatores de risco e doenças, bem como sobre o Programa de Promoção da Saúde. Inserir informações sobre fatores de risco e doenças no serviço de atendimento ao cliente via telefone. Criar e distribuir material educativo sobre fatores de risco, doenças e o Programa de Promoção da Saúde. A adolescência é o período de transição entre a infância e a fase adulta (entre 10 e 19 anos) com intensas transformações biopsicossociais (BRASIL, 2006). A Saúde do Adolescente tem como características as ações e o enfoque preventivo e educativo. Conhecer os conteúdos da Atenção Integral à Saúde dos Adolescentes é importante para as equipes de saúde. Para ser bem- -sucedido, o programa deve interagir com o público-alvo, respeitar sua cultura e conhecimentos adquiridos, criando condições para o crescimento adequado. 31 A abordagem desses conteúdos aumenta a possibilidade de absorção dos conhecimentos pelos participantes do programa, o que favorece o aperfeiçoamento da sociedade (BRASIL, 2002). No caso do Brasil, país com história e formação social continental e multicultural, levar em conta a diversidade dos ambientes de vida dos adolescentes e jovens, não é apenas uma ferramenta analítica, mas uma compreensão das condições dos adolescentes e jovens brasileiros. Os principais temas a serem abordados em programas de promoção e prevenção voltados à área de atenção à saúde do adolescente são: Desenvolvimento de ações de promoção da saúde, prevenção, tratamento e reabilitação dos agravos; Crescimento e desenvolvimento; Alimentação saudável e atividade física; e Saúde reprodutiva e sexualidade. 4.3 Proteção à saúde da criança e do adolescente A legislação vigente no Brasil reconhece a família como estrutura importante para a humanização e socialização de crianças e adolescentes, espaço ideal para o desenvolvimento integral do indivíduo. As crianças e adolescentes têm o direito de constituir família, e seus vínculos devem ser protegidos pela sociedade e pelo Estado. Em situações de risco e fragilização familiar, as estratégias de cuidado devem fazer todo o possível para preservar esses vínculos, combinando o suporte socioeconômico com o desenvolvimento de novas formas de interação e referenciamento emocional dentro dos grupos familiares. O Estatuto da Criança e do Adolescente, que é a Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, determina que medidas de proteção à criança e ao adolescente são aplicáveis sempre que os direitos reconhecidos nesta Lei forem ameaçados ou violados: 32 I - por ação ou omissão da sociedade ou do Estado; II - por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsável; III - em razão de sua conduta. (BRASIL, 1990) A disposição descrita nos artigos 101 e 129 da mesma Lei, reserva a aplicação das medidas mais sérias, que se referem a separação da criança e do adolescente de sua família, por autoridade judicial. Ainda assim, se trata de uma lei que busca preservar os vínculos familiares originais e evitar rupturas que possam interferir o seu desenvolvimento. De fato, o ECA tem a relevante função de regulamentar e impedir que o texto constitucional “não se constitua em letra morta”. Mas, para isso, é preciso “[...] uma política social eficaz, que de fato assegure materialmente os direitos já positivados” (HOPPE apud VERONESE; COSTA, 2006, p. 132). Sendo assim, nota-se a importância das medidas expressas no ECA visando à inclusão das famílias nos programas de assistência e proteção. Com esses programas disponíveis e bem estruturados, é possível superar as dificuldades que determinadas famílias passam, e restaurar direitos ameaçados ou violados sem retirar a criança ou adolescente de seu núcleo familiar. No âmbito das medidas protetivas, os programas sociais de apoio à família devem fortalecer as famílias e desenvolver programas de trabalho ou programas de promoção familiar de forma participativa, valorizando sua capacidade de encontrar soluções para os problemas que enfrentam com apoio técnico e institucional. Os programas buscam basicamente: superação de vulnerabilidades sociais consequente da pobreza e privação –incluidive as condições de habitabilidade, segurança alimentar, trabalho e geração de renda; consolidação de vínculos familiares e de pertencimento social fragilizados. acesso à informação sobre as demandas individuais e coletivas. orientação da família e, especialmente, dos pais, quanto ao adequado 33 exercício das funções parentais, em termos de proteção e cuidados a serem dispensados às crianças e adolescentes em cada etapa do desenvolvimento, mantendo uma abordagem dialógica e reflexiva. superação de conflitos relacionais e/ou transgeracionais, rompendo o ciclo de violência nas relações intrafamiliares. Orientação jurídica, quando necessário. As estruturas destes programas requerem técnicos teóricos e qualificados e são dimensionadas para se adequarem às necessidades existentes de cada região. Existem duas características importantes nesse aspecto, que são a interdisciplinaridade e interdepartamentalidade. Os programas de apoio social à família devem articular as diferentes políticas sociais básicas (saúde, assistência social e educação) e trabalhar em estreita colaboração com o governo e as políticas de habitação, trabalho, esportes, lazer e cultura. A efetividade do programa de apoio social à família é essencial para promover o direito de convivência das famílias e comunidades e é um dos pilares desse programa nacional para ampliar sua cobertura e melhorar sua qualidade. Isso deve acontecer com a integração de políticas públicas universais e de qualidade e a integração entre o Sistema Único de Assistência Social (SUAS), o Sistema Único de Saúde (SUS), o Sistema de Garantia de Direitos (SGD) e o sistema educacional. 5 ÓRGÃOS REGULADORES DA SAÚDE PÚBLICA NO BRASIL Os órgãos reguladores são criados por leis específicas e integram as administrações públicas para determinar como as atividades devem ser conduzidas e fiscalizar os serviços públicos ou empresas privadas que realizam essas atividades. A saúde pública brasileira é gerida por órgãos como a Anvisa e a Agência Nacional de Saúde Suplementar. 34 5.1 Conceito de órgão regulador O processo de descentralização do setor saúde, ainda que recente, demonstra o fortalecimento da capacidade administrativa nos níveis estadual e municipal, bem como a ampliação da rede de atendimento do Sistema Único de Saúde (SUS). No entanto, a realidade mostra vários modelos de atenção à saúde isolados que muitas vezes concorrem com a compra de parcela significativa de serviços privados para atender às necessidades da gestão local. Também se observam desigualdades na capacidade de gestão estadual e municipal, que levam a diferentes capacidades de atendimento dos sistemas de saúde, inclusive no atendimento a populações fora de sua abrangência territorial. A organização das redes de serviços de saúde e o planejamento das ações são feitos de forma fragmentada ou parcial, dificultando o estabelecimento de referências pactuadas, refletindo as significativas barreiras físicas e burocráticas ao acesso das pessoas às ações e serviços apesar da expansão da rede nos últimos anos. A política regulatória da atenção à saúde deve ter como objetivo implementar um conjunto de ações que afetem os prestadores públicos e privados para orientar ações de saúde eficientes, buscando promover melhorias no acesso, integridade, qualidade, resolutividade e humanização dessas ações. Deve articular e integrar mecanismos que permitam aos gestores regular as ações e serviços de saúde, como fazer dos contratos pactos entre gestores e prestadores; reformular as atividades de controle assistencial e da avaliação da atenção à saúde; desenvolver os protocolos assistenciais e implementar a regulação do acesso por meio dos complexos reguladores. Essa política é um dos elementos do Pacto pela Saúde na sua diretriz Pacto de Gestão e está focada em três eixos estruturantes: 1. Recursos financeiros para implantar e custear os Complexos Reguladores 2. Instrumentos para operacionalizar os Complexos Reguladores 3. Programa permanente para capacitar os recursos humanos 35 Nos anos 90, o Brasil, após um grave processo inflacionário, logrou a estabilidade monetária com o Plano Real de 1994, e avançou na reforma do Estado, entendida como um requisito da retomada do crescimento. É nesse contexto que ocorreu, na década de 90, a criação das agências reguladoras como um novo modelo institucional de intervenção no mercado e na sociedade. Isso foi uma mudança importante, pois a regulação baseia-se “[...] na intervenção do Estado no mercado e na sociedade, em substituição à intervenção direta que caracterizou o desenvolvimento do Estado de Bem-Estar...” (MENICUCCI, 2007, p. 234). Nessa perspectiva, algumas agências de regulação foram criadas em substituição a algumas atividades retiradas da gestão do Estado. Na gestão do presidente Fernando Henrique Cardoso, foram criadas oito agências reguladoras e uma no governo de Luiz Inácio Lula da Silva. Nesse governo, a tentativa de criação da Agência Nacional do Cinema e do Audiovisual (ANCINAV) não teve êxito. Analisando as principais agências reguladoras no Brasil, é possível notar, segundo afirmação de Menicucci (2007, p. 271), que “[...] as agências reguladoras expressam, ao mesmo tempo, a expansão da atividade privada para novas áreas e a reconfiguração das funções do Estado [...]”. As agências reguladoras foram criadas para fiscalizar os serviços públicos prestados pelo setor privado. Além de controlar a qualidade da prestação do serviço, eles também definem as regras para o setor. Hoje, são dez reguladores. A regulação envolve medidas e ações governamentais, inclusive normatizando, controlando e examinando segmentos de mercado explorados pelas empresas para garantir o interesse público. Mas as principais são: Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS): Criada em 2000, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) é vinculada ao Ministério da Saúde. A ANS promove a defesa do interesse público na assistência suplementar à saúde, regula as operadoras setoriais, inclusive quanto às suas relações com prestadores e consumidores, e contribui para o desenvolvimento das ações de saúde no país. 36 Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa): A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) foi criada em 1999, tem independência administrativa e autonomia financeira e é vinculada ao Ministério da Saúde. Protege a saúde da população ao realizar o controle sanitário da produção e da comercialização de produtos e serviços que devem passar por vigilância sanitária, fiscalizando, inclusive, os ambientes, os processos, os insumos e as tecnologias relacionados a esses produtos e serviços. A Anvisa também controla portos, aeroportos e fronteiras e trata de assuntos internacionais a respeito da vigilância sanitária. Por outro lado, é possível notar a inexistência de mecanismos regulatórios para o setor de saúde suplementar até a década de 90. Esse setor já existia antes desse período, com a presença do setor privado e regulação tênue. Com a criação do SUS, ele passa a integrar o Sistema Nacional de Saúde (SNS), mas ainda permanece praticamente sem regulação durante uma década. A Anvisa foi a primeira agência que não foi criada para regular setores privatizados. Portanto, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária, por meio da Lei 9.782/99, ao criar o Sistema Nacional de Vigilância Sanitária (SNVS) e substituir a Secretaria Nacional de Vigilância Sanitária, que era subordinada ao Ministério da Saúde, superou o quadro anterior de fragmentação institucional. Antes da criação da Anvisa, as ações de vigilância sanitária eram fragmentadas e subordinavam-se à Secretaria Nacional de Vigilância Sanitária. Mas as práticas clientelistas e a baixa capacidade técnica começaram a incomodar as partes envolvidas. Assim, a Anvisa incorporou as funções dessa secretaria e passou também a coordenar o SNVS, executar o programa nacional de sangue e hemoderivados, o programa nacional de prevenção e controle da infecção hospitalar, bem como a: monitorar os preços dos medicamentos e dos produtos para a saúde; aplicar penalidades; fazer a regulamentação sanitária de derivados do tabaco; assessorar o Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (INPI); fiscalizar as propagandas e a publicidade de produtos sob o regime da vigilância sanitária; e conceder o certificado de cumprimento de boas práticas de fabricação. 37 A missão institucional da Anvisa se relaciona à proteção da saúde da população brasileira através do controle sanitário exercido sobre os produtos e sobre a comercialização de medicamentos. Esse controle também abrange os serviços subordinados à Anvisa, incluindo os locais, os processos, os insumos e as tecnologias. Ainda compete à Anvisa o controle sanitário dos aeroportos, dos portos, das fronteiras e as relações exteriores com outras instituições estrangeiras responsáveis pela regulação do setor de saúde, bem como a interlocução com o Ministério das Relações Exteriores. Logo, a Anvisa fica sujeita, em muitos casos, às pressões exercidas pelos vetores econômicos. Cabe destacar algumas ações desenvolvidas pela Anvisa no Brasil contemporâneo: o Programa Nacional de Verificação da Qualidade de Medicamentos, criado em 2004, que visava ao monitoramento da qualidade dos medicamentos consumidos pela população; o Projeto Farmácias Notificadoras, criado em 2005, que objetivava ampliar as fontes de notificação de casos suspeitos de efeitos adversos a medicamentos e de queixas técnicas de medicamentos; o projeto EducAnvisa, criado em 2005, que buscava desenvolver ações e estratégias de educação e comunicação em saúde para atingir os mais diversos segmentos da sociedade. Também merece ser citado o Sistema de Notificações em Vigilância Sanitária (Notivisa), definido em 2006, utilizado para captar e gerenciar as notificações de eventos adversos e queixas técnicas de todas as áreas do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária (SNVS), bem como o Sistema Nacional de Gerenciamento de Produtos Controlados (SNGPC), criado em 2007, que visava ao aprimoramento das ações de vigilância sanitária no controle e na fiscalização das substâncias e dos medicamentos sujeitos ao controle especial (ANVISA, 2009). Segundo Lucchesi (2008, p. 102-103): “[...] a criação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, então ANVISA, no final dos anos 90, teve seus objetivos comprometidos com o aumento da eficiência econômica estatal – via administração gerencial – na área de avaliação e gerenciamento do risco sanitário, com a transparência de seus processos e a clara responsabilização política pelos gastos públicos, tanto quanto com a maior participação da sociedade no controle de suas ações”. 38 O aumento de eficiência na área da vigilância sanitária significa especialmente, mas não somente, o fortalecimento da capacidade fiscalizatória do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária. Entretanto, o próprio processo de criação da ANVISA e do SNVS parece não ter sido realizado conforme os pressupostos da transparência, da participação e da responsabilização de cada agente que atua no sistema. 5.2 Objetivo dos órgãos reguladores A garantia do acesso da população aos serviços públicos de saúde a uma assistência qualificada, por meio de uma rede organizada de serviços, requer a atuação direta do Estado na busca do estabelecimento de regras definidas para atuação dos mercados, o que configura a passagem de um Estado prestador a um Estado regulador. No Brasil, o debate mais aprofundado com relação ao conceito, às práticas e às finalidades da regulação, do controle, da avaliação e da auditoria em saúde iniciou- se em 2001, com as Normas Operacionais de Assistência à Saúde (NOAS). As NOAS SUS 01/2001 ampliam a responsabilidade dos municípios sobre a atenção básica e reservam à União e aos Estados a gestão da média e da alta complexidade dos serviços públicos de saúde. A regulação no SUS ganha força após o Pacto de Gestão (2006), que tem como principal finalidade a busca de maior autonomia para os estados e municípios no que tange aos processos normativos do SUS, definindo a responsabilidade sanitária de cada esfera de governo e tornando mais claras as atribuições de cada uma, contribuindo, assim, para o fortalecimento da gestão compartilhada. No final dos anos 1990, por meio da Lei nº 9.782/99, como você já aprendeu na seção anterior, criou-se a primeira agência reguladora social no Brasil: a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), para atuar não em um setor específico da economia, mas em todos os setores relacionados a produtos e serviços que podem afetar a saúde da população brasileira. Uma das singularidades dessa agência é a sua competência tanto na regulação econômica do mercado (definição de preços e 39 monitoramento do mercado) quanto na regulação sanitária (registros de medicamentos, por exemplo). Você também recorda da seção anterior que a outra agência reguladora criada foi a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), por meio da Lei nº 9.961/00, com a finalidade de regulamentar os planos privados de saúde. Ela tem desenvolvido mecanismos tanto para as formulações de políticas públicas de saúde quanto para a busca de melhor atendimento do beneficiário, no intuito de procurar um equilíbrio entre os procedimentos de mercado das operadoras e os direitos da sociedade de receber melhor qualidade na assistência à saúde (DIAS, 2004). Com o entendimento do Ministério da Saúde (BRASIL, 2005, p. 318) e a anuência do Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde (CONASEMS), a regulação é definida, então, como um conjunto de relações, saberes, tecnologias e ações que intermedeiam a demanda dos usuários por serviços de saúde e o acesso a estes. Criada em 2008, a Política Nacional de Regulação do Ministério da Saúde (BRASIL, 2008) objetiva, principalmente, promover o acesso equânime, universal e integral dos usuários ao SUS. Sem uma lógica meramente financeira, a regulação em saúde contribui para otimizar a utilização dos serviços, em busca da qualidade da ação, da resposta adequada aos problemas clínicos e da satisfação do usuário, sem que haja, para tanto, a fragmentação do cuidado. Em Minas Gerais, a regulação é vista como um conjunto de regras impositivas de proteção com vistas ao monitoramento e ao controle dos serviços prestados. Nesse plano, o objetivo pode ter caráter social ou econômico, e, em geral, visa a encorajar atividades consideradas úteis (MENICUCCI, 2005, p. 152). Já na região metropolitana de São Paulo, a regulação da saúde pública tem um caráter de racionalizar os serviços complementares e suplementares (FIANI, 2004). Como forma de operacionalizar o processo de regulação do acesso aos serviços de saúde, você observa a criação de várias centrais em todo o país nas seguintes áreas: urgência e emergência, consultas e exames de média e alta 40 complexidade, internações clínicas ou cirúrgicas e em terapia intensiva, transplantes, obstetrícia e neonatal. Um exemplo é o Complexo Regulador do Distrito Federal, institucionalizado em 2009. Esse serviço é responsável por um conjunto de estratégias e ações definidas em um plano de regulação assistencial, para todos os níveis de complexidade, visando à organização efetiva de uma rede pública articulada hierarquicamente, a partir do planejamento estruturado em bases regionais. Tem a missão de fornecer o acesso devido aos usuários, por meio de centrais de regulação na área ambulatorial, nas especialidades de dermatologia, oftalmologia, radiologia e cardiologia, e na área de internação, com ênfase no acesso aos leitos de terapia intensiva. Outro modelo é a central de regulação no estado do Ceará, sediada em Fortaleza, voltada para a regulação do acesso à terapia intensiva, com a disponibilização de leitos públicos e privados. Um estudo desenvolvido nesse cenário discute a relação entre o público e o privado na prestação dos serviços, além de abordar o papel do Estado e da sociedade civil na exigência de um controle efetivo sobre a utilização dos serviços oferecidos. 41 6 REFRÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALMEIDA, N. D. A saúde no Brasil, impasses e desafios enfrentados pelo Sistema Único de Saúde: SUS. Revista Psicologia e Saúde. Campo Grande, 2013. AZEREDO, C. M. et al. Avaliação das condições de habitação e saneamento: a importância da visita domiciliar no contexto do Programa de Saúde da Família. Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, 2007. BISPO JÚNIOR, J. P. Fisioterapia e saúde coletiva: desafios e novas responsabilidades profissionais. Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, 2010. BRASIL. 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