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TEXTO DE APOIO DA DISCIPLINA DE HISTÓRIA DE MOÇAMBIQUE SÉC XVI-XIX

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TEXTO DE APOIO DA DISCIPLINA DE HISTÓRIA DE MOÇAMBIQUE SÉC. XVI-XIX 
 
CRONOLOGIA SOBRE A HISTÓRIA DE MOÇAMBIQUE 
▪ 1505: Portugueses fundam feitoria e Fortaleza de Sofala; 
▪ 1507: Portugueses fundam feitoria Fortaleza na Ilha de Moçambique; 
▪ 1511:Portugueses atacam Angoxe, onde os Árabes-Swahili tinham formado um núcleo 
de resistência e usavam o Zambeze como via de penetração no interior; 
▪ 1522: Portugueses conquistam ilha de Cabo Delgado ou Quirimbas; 
▪ 1530: Portugueses penetram no Cuamba (nome primitivo de Zambeze). Fundação da 
Feitoria de Sena e Tete; 
▪ 1544:Fundação da Feitoria ou Fortaleza de Quelimane. Os portugueses chegam a 
Loureço Marques. 
▪ 1561: Padre Gonçalo da Silveira ao Zimbabwe do Mwenemutapa. O Mwenemutapa 
reinante é baptizado com o nome de Sebastião; 
▪ 1571: Expedição militar de Francisco Barreto no Zambeze e chega no Sena; 
▪ 1572: Expedição militar de Fernando Homem. Invasão de Quiteve e de Manica. 
▪ 1607: Gatsi Lucere, Mwenemutapa reinante, cede as minas do seu Estado aos 
Portugueses; 
▪ 1629: Mavura é baptizado e cognominado D. Filipe II, faz amplas concessões militares, 
políticas e comerciais aos Portugueses; 
▪ 1686: Chegam os primeiros sete mercadores indianos à Ilha de Moçambique; 
▪ 1693: O primeiro levante armado sistemático contra a penetração portuguesa, 
encabeçado pelos Changamiras do Estado Butua; 
▪ 1720: Portugueses fundam a Feitoria de Zumbo; 
▪ 1721-30: Feitoria Holandesa da Baía de Maputo; 
▪ 1752: As feitorias e entrepostos comerciais portugueses em Moçambique passam 
para a dependência administrativa directa de Portugal, separando-se assim das 
possessões coloniais portuguesas na Índia e do seu Vice-Rei. 
▪ 1762: Um documento escrito refere à saída neste ano de 1100 escravos de 
Moçambique. 
▪ 1765: Um documento refere a existência de Prazos em Moçambique. 
▪ 1799: Documento refere a saída anual de quatro a cinco mil escravos do nosso país. 
▪ 1815/1820: Saem de Moçambique, anualmente, 15 a 20 mil escravos. 
▪ 1821: Shochangana é o primeiro rei do Estado de Gaza. 
▪ 1836: Primeira abolição do tráfico 
▪ 1884 / 85: Conferência de Berlim, também conhecida como conferência da África 
Ocidental. 
 
 
UNIDADE TEMÁTICA I: MOÇAMBIQUE E O COMÉRCIO DESIGUAL SÉC. XV – XVIII 
 
1. Introdução 
No final do séc. XV há uma penetração mercantil portuguesa, principalmente pela demanda 
de ouro destinado à aquisição das especiarias asiáticas. Inicialmente, os Portugueses fixaram-
se no litoral onde construíram as fortalezas de Sofala (1505), Ilha de Moçambique(1507). Só 
mais tarde através de processos de conquistas militares apoiadas pelas actividades 
missionárias e de comerciantes, penetraram para o interior onde estabelecerem algumas 
feitorias como a de Sena (1530), Quelimane (1544). O propósito, já não era o simples controlo 
do escoamento do ouro, mas sim de dominar o acesso às zonas produtoras do ouro. Esta fase 
da penetração mercantil é designada de fase de ouro. As outras duas últimas por fase de 
marfim e de escravos na medida em que os produtos mais procurados pelo mercantilismo 
eram exactamente o marfim e os escravos respectivamente. O escoamento destes produtos 
acabou sendo efectivado através do sistema de Prazos do vale do Zambeze que teriam 
constituído a primeira forma de colonização portuguesa em Moçambique. Os prazos eram 
uma espécie de feudos de mercadores portugueses que tinham ocupado uma porção de terra 
doada, comprada ou conquistada. A abolição do sistema prazeiro pelos decretos régios de 
1832 e 1854 criou condições para a emergência dos Estados militares do vale do Zambeze 
que se dedicaram fundamental ao tráfego de escravos, mesmo após a abolição oficial da 
escravatura em 1836 e mais tarde em 1842. 
 
 
1.1. Objectivos 
▪ Prover informações necessárias para a realização do exercício prático para esta 
unidade, 
▪ Resumir a segunda ronda de relações comerciais de Moçambique com o mundo, 
▪ Explicar o progresso de relações comerciais entre Moçambique e Portugal e os estados 
asiáticos na costa 
 
1.2. Desenvolvimento 
Entre os séculos IX e XIII encontramos evidências de uma progressiva e lenta fixação de 
populações provenientes principalmente do Golfo Pérsico, a qual era um dos principais 
centros de comércio no Índico no século X. Essas populações estabeleceram-se em toda a 
costa oriental e, particularmente, nas Ilhas de Zanzibar e de Pemba. Aparentemente foi no 
século XIII que o maior número de emigrantes se fixou em entrepostos comerciais ao longo 
da costa oriental africana. Muitos geógrafos daquele tempo referem a existência de um activo 
comércio com as terras de Sofala. Foi talvez durante o século XII que Mogadixo surgiu como 
centro de absorção do comércio de ouro feito por Sofala, tendo, porém, sido rapidamente 
substituído pela mais proeminente das cidades do Índico: Quíloa, a sul da costa tanzaniana. 
Antes do século XVI, o comércio no Oceano Índico era controlado pelos muçulmanos, os 
Árabes Swahili. No subcontinente asiático as suas actividades eram dominantes ao longo da 
costa de Malabar até baixo Calcut. A indicação mais antiga a cerca de Sofala encontra-se em 
Al-Masud, viajante árabe do século X que refere, que os marinheiros de Oman, da tribo de 
Alazd, viajavam nos mares de Zanga até Kambala e Sufalh. A principal mercadoria era o ouro 
e o marfim. No século X (ano de 930), instalaram-se na costa africana, refugiados árabes 
criando as cidades mercantis de Bravo e Mogadixo. 
Em meados do século XII, comerciantes da indonésia juntara-se aos árabes comerciando com 
os povos do litoral trocando seus produtos orientais por ouro, marfim, pele do leopardo, 
carapaça de tartaruga, âmbar cinzento, chifres de rinoceronte e mais tarde por escravos. 
Segundo Al-Idris (viajante árabe), indianos e chineses também frequentaram a costa oriental 
africana comerciando com as Ilhas Comores. Não era, contudo, o domínio territorial que 
pretendiam, mas o desenvolvimento do comércio. Tornou-se, por isso, importante para eles, 
o controlo dos pontos das costas mais ricos ou que seriam para o escoamento dos produtos 
do interior. O tráfico intensifica-se no século XIII, altura em que comerciantes de Guzurate, 
Coromondel, Malabar e Bengala, passaram a dominar grande parte das rotas comerciais do 
Oceano Indico que atingiu o seu apogeu no século XV, nas vésperas da chegada dos 
Portugueses. Pode-se pois dizer-se que, a costa oriental de África, era visitada (pelo menos 
desde os primeiros séculos da nossa era) por navegadores indonésios, que mantinham já no 
primeiro milénio relações regulares com a Arábia do Sul, Pérsia, Índia e Malaca, contactos 
estes favorecidos pelo regime das monções do Oceano Indico. Portanto, a actividade 
mercantil asiática na costa norte de Moçambique teve início por volta do século IX. Relatos 
de viajantes e comerciantes árabes apontam Sofala como tendo sido o limite extremo ao sul, 
visitado por mercadores proveniente do Golfo Pérsico e da Península Arábica, muito antes da 
chegada dos portugueses nos finais do século XV. Na opinião de Al-Masudi, Sofala não definia 
qualquer estabelecimento particular, mas significava baixo ou terras baixas. 
O ouro produzido no interior e o marfim, inicialmente fornecido pelos caçadores macuas da 
costa de Nampula, foram os primeiros produtos asiáticos em Moçambique. Tecidos de seda, 
louça de vidro e de porcelana, artigos que as populações africanas ainda não produziam 
apareceram nas formações sociais moçambicanas como resultado directos dos contactos 
comerciais com os mercadores asiáticos. 
 
1.2.1. Consequências da Presença Árabe-Persa em Moçambique 
a) A Nível Político 
▪ Emergiram e desenvolveram-se unidades políticas nas costas de Cabo Delgado e de 
Nampula com predominância de características marcadamente não africanas; 
▪ Aprofundamento das desigualdades sociais; 
▪ Os Reinos Afro-islâmicos, tais como o Sultanato de Angoche e os Xeicadosde Sangage, 
▪ Quitangonha e Sancul tiveram a sua origem na actividade mercantil e foram 
estruturadosexactamente para dar maior dinâmica a essa actividade 
▪ Introdução de artigos que, pela sua raridade, ascendiam, nas formações africanas, à 
categorias de bens de prestigio contribuiu para a elevação do padrão de consumo das 
camadas privilegiadas e estimulou de certa forma a luta pelo poder. Pode-se sustentar 
que a presença de mercadores asiáticos contribuiu directamente para um factor 
externo que catalisou o processo de formação dos primeiros Estados centralizados em 
Moçambique. 
 
 
 
 
b) A Nível Cultural 
▪ No plano cultural, os casamentos, os contactos comerciais e o surgimento de novos 
hábitos e línguas resultantes da fusão de hábitos e línguas africanas e árabes, por 
exemplo, foram responsáveis pela origem e desenvolvimento da cultura Swahili na 
Tanzânia e no Quénia. Em Moçambique a longa coexistência estimulou o 
aparecimento de novos núcleos linguísticos nas costas de Cabo Delgado e Nampula: 
os Mwani na costa de Cabo Delgado; os Naharra na costa de Nampula e Ilha de 
Moçambique; os Koti em Angoxe, etc. Outras línguas como o Sena e Ndau em Sofala 
e Guitonga de Inhambane preservam empréstimos de Swahili; 
▪ A maneira de vestir, uso de brincos no nariz, nas construções, nos casamentos, no 
enterramento dos mortos, na língua 
▪ As religiões na costa norte da Moçambique converteram-se ao islamismo; 
 
c) A nível económico 
▪ Acumulação por parte dos aristocratas de bens de prestígio. Acumulação primitiva do 
capital por parte dos comerciantes. Introdução de algumas culturas como banana, 
Coco, Laranja, Limão, Cana-de-açúcar e arroz. 
 
1.3. O comércio de ouro e a penetração portuguesa no muenemutapa 
A actividade mercantil swahili e árabe em Moçambique data já de antes do século XI da nossa 
era, a crer nos testemunhos árabes (vide secção 1.2.). No inicio do século XVI existiam 
provavelmente alguns milhares de mouros, o termo com que os portugueses designavam os 
swahili, no império de Muenemutapa. Não comerciavam apenas: passaram também a 
trabalhar cobre e ferro. No mesmo período, cerca de 400 mouros estavam estabelecidos em 
Sofala. O ouro constituía o principal artigo de comércio: com efeito, já muito antes da chegada 
dos mercadores portuguesas os swahili-árabes controlavam o ouro vindo do Império de 
Muenemutapa. Foi fundamentalmente o ouro que trouxe os portugueses a Moçambique. O 
ouro permitia-lhes comprar, entre outras coisas, as especiarias asiáticas com as quais a 
burguesa mercantil portuguesa penetrava no mercado europeu de produtos exóticos. 
Moçambique passou a constituir uma espécie de reserva de meios de pagamento das 
especiarias e essa foi a razão por que os portugueses se fixaram no País, primeiro como 
mercadores e, só mais tarde, como colonizadores efectivos. A fixação fez-se, inicialmente, no 
litoral, particularmente em Sofala em 1505 e na Ilha de Moçambique em 1507. Com a fixação 
em Sofala esperavam os portugueses controlar as vias de escoamento de ouro do interior e, 
em menor escala, de marfim, as quais tinham em Sofala o seu términos. Até 1530, os 
mercadores portugueses tentaram lutar sem êxito contra a concorrência que fizeram os 
swahili-árabes, que transformaram Angoxe no novo centro escoador do ouro, tornando, 
assim, estratégica a via fluvial do Zambeze, bem como contra o bloqueio de certas dinastias 
Karanga-Chona à passagem das mercadorias da costa – tecidos e missanga – para o interior. 
É exemplo deste último caso o soberano Inhamunda, do Estado de Quiteve que, em aliança 
com os Changamire do Butua, dificultou durante muitos anos os contactos com o 
Muenemutapa. Outro exemplo do mesmo tipo de bloqueio encontra-se na dinastia de 
Chicanga de Manica. 
A partir de 1530, os portugueses decidiram penetrar no vale do Zambeze. Como corolário, 
Tete e Sena são fundados em 1530 e Quelimane em 1544. Tratava-se, agora, já não da 
tentativa de controlo das vias de escoamento do ouro, mas do próprio acesso às zonas 
produtoras. Os swahili-árabes foram gradualmente substituídos como intermediários 
comerciais em Zimbabwe e no vale, não sem intensa luta. O processo parece ter culminado 
aparentemente em 1629, quando os portugueses deram ao Muenemutapa Mavura o prazo 
de um ano para expulsão definitiva dos mercadores swahili-árabes. O Muenemutapa lutava 
na altura para manter sob a sua tutela não apenas os restantes membros da aristocracia do 
Muenemutapa, como, também, o estrato dominante dos Estados satélites. É neste contexto 
de luta intra e interdinastias que os mercadores portugueses se introduzem na capital de 
Muenemutapa, tornando aqueles crescentemente dependentes do auxílio militar português. 
Os portugueses obtiveram, em 1607, de Gatsi Lucere, o Muenemutapa reinante na altura, a 
concessão de todas as minas do Estado, depois de uma força militar vinda de Sena – para 
onde Lucere solicitara auxílio ˗ o ter ajudado a debelar uma insurreição interna comandada 
por Matuzianhe. Em 1627, o Muenemutapa Capranzina, que representava uma facção oposta 
aos interesses mercantis portugueses, foi deposto e substituído por seu por seu tio Mavura. 
Os portugueses baptizaram Mavura e este declarou-se vassalo de Portugual. Em 1629, a 
dependência cristalizou-se na forma de um novo tratado que garantia aos portugueses a livre 
circulação de homens e de mercadorias isentas de qualquer tributo, a obrigatoriedade de o 
Muenemutapa consultar o capitão português de Massapa ˗ que assegurava e protegia a 
penetração mercantil nas feiras comerciais de Tete e Zimbabwe ˗ antes de tomar qualquer 
decisão, a permissão para os mercadores entrarem na corte do Muenemutapa sem respeitar 
o protocolo˗ anteriormente observado com o descalçar os sapatos e tirar o chapéu˗ e a 
autorização para construção de igrejas. A penetração mercantil fez˗se acompanhar do influxo 
de tecidos adquiridos na Índia e de missanga comprada em Veneza, destinados ao estrato 
dominante do Muenemutapa. Esses tecidos e essa missanga perdiam a sua qualidade de 
mercadorias ao entrarem no Estado e transformavam-se em bens de prestígio, suportes de 
lealdade política e de submissão. Por outras palavras, os canais por que passavam a circular 
não eram mais os mercantis, mas os de poder e parentesco. Foi a necessidade de um 
suprimento regular de tecidos e de missanga ˗ cuja missão era política e não económica- que 
conduziu o Muenemutapa a fazer concessões crescentes aos mercadores portugueses e a 
alienar quase virtualmente o território. A alienação expressou-se na cedência ou na venda de 
terras ricas em meios de ouro ou em ouro fluvial. 
A erosão da economia natural das Mushas tornou-se tão evidente nos meados do século XVIII 
que milhares de camponeses passaram a dedicar menos tempo à agricultura e a minerar quer 
directamente para os portugueses quer para o Muenemutapa. Às minas acudiam milhares de 
pessoas e, por vezes, os aluimentos, provocados por deficientes condições técnicas de 
produção ceifavam a vida de outros tantos milhares. O processo de trabalho nas minas 
geralmente organizado no quadro das relações de parentesco e a divisão das tarefas no 
decorrer do processo produtivo faziam-se de acordo com esse quadro. Eram sobretudo 
mulheres e crianças que trabalhavam nas minas ou, pelo menos, cabiam-lhes as tarefas mais 
duras e perigosas, nomeadamente a de penetrar nas escuras galerias à procura de ouro. Este 
facto pode ser comprovado não só através de documentos escritos, mas também pela análise 
dos esqueletos encontrados pelos arqueólogos. 
O trabalho forçado nas minas provocou, por outro lado, a fuga de comunidades inteiras, 
particularmente nas áreas mineiras mais trabalhadas. Entretanto, o capital mercantil, apesar 
dos aluimentos e apesar da fuga de comunidades, submetia cada vez mais a produção ao 
valor de troca numa sociedade onde, antes, predominava a produção de valores deuso. Não 
foi o comércio que veio criar a exploração: ele veio antes inscrever-se nas anteriores relações 
de produção e exploração, intensificando-as e fazendo desviar o campesinato para uma 
produção que não era interior à estrutura social. Essa actividade produtiva nas minas e nos 
cursos fluviais, a qual, antes da penetração portuguesa se fazia nas épocas mortas, fora do 
plantio e das colheitas, passou a efectuar-se, também, nos períodos produtivos agrícolas. 
Quer dizer: a penetração mercantil portuguesa não agiu unicamente ao nível da aristocracia, 
mas, igualmente, ao nível do próprio campesinato. A antiga renda em géneros que o estrato 
dominante exigia aos camponeses foi gradualmente transformada, nos Estados com minas 
de ouro, numa renda em trabalho de prospecção mineira. Anteriormente, o tributo e a renda 
em trabalho eram limitados pelos próprios padrões restritos da aristocracia e, por 
consequência, a extracção de ouro não era efectuada em escala alargada. As contradições 
avolumaram˗se, não só entre a classe dominante e o campesinato, como, também, dentro da 
própria aristocracia, onde a luta pelo poder acesso aos privilégios expressos nos bens de 
prestígio se tornaram prática corrente. As contradições eram agravadas pelo facto de terem 
surgido em número crescente, não só no Estado de Muenemutapa, como, igualmente, 
noutros Estados do antigo Império˗ porque a penetração mercantil portuguesa se fizera 
igualmente em Manica e em Quiteve˗, novas unidades políticas onde o estrato dominante era 
formado por mercadores portugueses estabelecidos como proprietários de terras, terras 
essas que, como já referimos, tinham sido doadas ou compradas e, em muitos casos, 
simplesmente conquistadas. 
Eram os chamados Prazos, surgidos do Vale do Zambeze provavelmente ainda no século XVI 
na ponta dos mosquetes ou no trato dos tecidos e da missanga veneziana. Os Prazos, que 
muitos historiadores pretenderam ver como a primeira forma de colonização portuguesa em 
Moçambique e, particularmente, no vale do Zambeze, foram essencialmente bases de 
escoamento de mercadorias ̠ ouro e marfim numa primeira fase e de escravos numa segunda 
– que aproveitaram o rio Zambeze como via natural. Os Prazos mais não foram do que a 
síntese do cruzamento de dois sistemas sociais de produção: um, pré-existente na sociedade 
Karanga-Chona, com dois níveis, o dos camponeses das Mushas, vivendo num regime de 
relativa autarcia, e o da aristocracia dominante, formada pelos Mambos e pelos Fumos; o 
outro sistema, que se sobrepôs ao primeiro ˗ forma especifica de sobreposição do capital 
mercantil a economia natural, era formada pelos Prazeiros – meº-rcadores, ex soldados 
desertados, fugitivos que cumpriam penas de degredo- elite dominante, e por exercito de 
cativo guerreiros, os chamados Achicunda. Por outras palavras: os prazeiros mantiveram o 
sistema social anterior, mas determinaram-no com dois níveis estranhos à sociedade original. 
O comércio de ouro de marfim configurou a base económica dos prazos até os fins do século 
XVIII e ligou-os à cadeia de acumulação primitiva de capital. Os camponeses das Mushas 
tinham a seu cargo a produção material de subsistências, canalizadas parcialmente para 
aristocracia prazeira através da relação de produção fundamental expressa no mussoco, uma 
renda em géneros. Por outro lado, milhares de cativos, alimentados pelos camponeses ou 
pela depredação nos excedentes dos Estados Karanga-Chona e, inclusivamente, de outros 
Prazos, garantiam a segurança militar dos Prazos e o livre escoamento dos produtos 
excedentários dos camponeses (especificamente os A-chicunda); comerciavam (os 
conhecidos Mussambazes, mercadores negros especializados), vigiavam e controlavam a 
actuação dos Mambos e dos Fumbos (os Chuangas, uma espécie de inspectores que residiam 
junto dos Mambos e dos Fumos e deles davam notícia regulara aos Prazeiros), geriam a 
administração interna (os Muanamambos e os Mucazambos), mineravam (essencialmente 
cativas organizadas em colectivos de trabalho chamadas ensacam, sendo chefes, também 
cativos, conhecidos por Niacondas, ou capitais). Os Prazos, especificamente no século XVII e, 
mais tarde, no século XIX, constituíram um autentico “pivot” político do capital mercantil no 
vale do Zambeze e, digamos, como que a forma militar do capital mercantil. 
O aparato ideológico nativo foi quase integralmente aproveitado pelos Prazeiros. A utilização 
do Muáve- uma beberagem tóxica que se acreditava poder mostrar a culpabilidade de alguém 
num determinado delito ou numa acusação de feitiçaria ˗, o culto dos espíritos, e a invocação 
da chuva eram mecanismos que garantiam a reprodução das relações de produção vigentes. 
Tal como anteriormente acontecia quando da morte os Mambos, também a morte de um 
Prazeiro gerava a criação ritual de uma situação de caos generalizada. A prática de roubo e 
do assassínio configuravam toda uma rede de indicadores de perda de estabilidade e 
pressupunha o retorno à ordem social anterior. A esses “rituais de caos” chamavam-se 
Choriros – chorar mortos. Funcionavam como uma espécie de válvula de escape para as 
tensões sociais que, ritualizadas, se esvaziavam do seu sentido de luta e da sua carga de perigo 
para o statu quo. 
Por outro lado, os Prazeiros recorriam frequentemente aos adivinhos. Um autor setecentista 
escreveu: este erro [refere-se à consulta dos adivinhos; nota do coordenador] se tem 
propagado entre os portugueses, de forma que o maior número lhe dá crédito [...] Para 
empreenderem qualquer negócio, viagem, etc., são consultados os advinhões, atirando sobre 
a terra alguns cauris, e à maneira dos ciganos, profetizam conforme o desejo que observam 
no sujeito que o chama. 
Foi em função das contradições entre a classe dominante Karanga e o campesinato produtor, 
das contradições dentro da própria classe dominante e do peso político crescente dos 
Prazeiros que o Muenemutapa mandou, nos finais do século XVII, fechar as minas do Estado; 
aliás, em Manica a dinastia dos Chicanga fez o mesmo. A contradição expressa nesse interdito 
– bloquear uma das mais vitais fontes de reprodução da classe dominante – dá bem ideia do 
grau de erosão da sociedade Karanga-Chona pelo capital mercantil. Agora, a aristocracia 
procurava apoio junto das Mushas contra os mercadores, essas mesmas Mushas que tanto 
tinha explorado. Pouco antes de 1693, o Changamire reinante mandou um emissário receber 
a curva – um tributo em tecidos que os portugueses tinham de pagar regularmente a 
aristocracia Karanga-Chona – a Manica. O emissário foi chicoteado pelos mercadores 
portugueses. Pouco depois, novo emissário foi enviado a Manica, tendo retornado com as 
orelhas cortadas. 
Entretanto, a pedido do Muenemutapa reinante, o Changamire Dombo, que governava a área 
de Torwa a oeste de Manica, foi convidado a comandar um levante armado generalizado 
contra a presença portuguesa. Em dois anos esta guerra levou à expulsão dos portugueses do 
planalto do Zimbabwe. Houve apenas três encontros armados, mas a maior parte das feiras, 
situadas nas primeiras regiões de extracção de ouro, foram destruídas. Os centros de Tete, 
Sena e Sofala não foram atacados. As igrejas foram destruídas. Os portugueses deixaram de 
poder deslocar-se ao e no planalto, apenas ali penetrando os seus mercadores, os 
Mussambazes ou Vashambadzi. Paralelamente a esses acontecimentos, o centro político do 
planalto deslocou-se para sudoeste, afastando-se mais da accao e do controlo dos 
portugueses. A dinastia organizadora do levante emancipou-se, para sempre, do poder 
central de Muenemutapa. Este último teve de mudar a sua capital mais para norte, perto de 
Tete, e ai ficou relegado a um papel secundário. Os Changamire passaram a confirmar os 
soberanos de Manica até ao começo do século XIX e foram também conhecidos como 
soberanos de Quissanga durante algumas décadas. Quer dizer: ao encabeçara resistência 
contra os mercadores portugueses, a dinastia do Changamire impôs o seu poder, alargado 
territorialmente, substituindo a velha dinastia do Muenemutapa em grande parte do planalto 
zimbabweano. Com o enfraquecimento do poder português no planalto nas últimas décadas 
do sec. XVII concluiu-se o “período áureo” da penetração portuguesa, iniciado no século XVI. 
O restabelecimento do domínio político Karanga no planalto pelos Changamire na década de 
1690 levou muitos portugueses a refugiarem-se em Tete, Sena e Quelimane. Porém, os 
portugueses continuaram a procurar ouro, desta vez, no norte do Zambeze; no século XVII, o 
sistema de Prazos foi alargado para norte, de onde os portugueses têm sido forcados a retirar-
se perante a agressividade Marave por volta de 1590. Cerca de 1750, foram abertos campos 
de mineração, nos territórios do Estado Cheua-Marava de Undi. Nestas minas, chamados 
Bares, contingentes de cativos escravos, ao serviço do Prazeiro produziam ouro em 
quantidades ínfimas. 
1.3.1. A Luta Entre Portugueses e Árabes e o Domínio das Rotas Comerciais 
As lutas entre os portugueses e Árabes, em território moçambicano, eram de teor económico, 
religioso e político. Os portugueses chegaram a Moçambique com o intuito de dominar os 
povos, suas produções bem como a sua religião. A presença portuguesa data de 1498, quando 
Vasco da Gama chegou a Inhambane e mais tarde à Ilha de Moçambique. Porém, a fixação de 
mercadores portugueses na costa moçambicana verificou-se a partir de 1505, com a 
ocupação de Sofala que passou a ser a primeira feitoria portuguesa fundada por Pêro de 
Nhaia, e na Ilha de Moçambique em 1507, introduzindo, portanto, profundas transformações 
na estrutura socio-política e económica da sociedade Shona. 
Sofala era na altura o ponto de convergência das rotas de ouro produzido no interior. Com o 
estabelecimento da feitoria de Sofala, os portugueses esperavam todas vias de escoamento 
de ouro que vinha do interior à costa e, em menor escala, de marfim, onde Sofala era o seu 
local final. A impossibilidade de os portugueses poderem concorrer com os mercadores 
asiáticos conduziu-lhes para a procura de soluções extraeconómicas. Com a ameaça 
portuguesa no comércio, os Árabes transformaram Angoche no centro de escoamento de 
ouro, uma estratégia para fugir a presença dos portugueses na rota de ouro que ia dar a 
Sofala. 
Em 1511, tentando aniquilar a actividade mercantil árabe que tinha como base o Sultanato 
de Angoche, os Portugueses atacaram este reino Afro-islâmico, mas não conseguiram pôr 
termo a superioridade dos mercadores asiáticos. Foi exactamente com o objectivo de 
monopolizar a via fluvial do rio Zambeze, utilizada pelos Árabes, e fugir ao bloqueio movido 
pelos soberanos de Quiteve e Sedanda que fundaram os entrepostos comercial de Tete e 
Sena por volta de 1530. Eram também objectivos dos portugueses a ocupação de posições 
próximas das fontes de ouro e da classe dominante do império para gradual e facilmente se 
envolverem na esfera política ideológica da sociedade shona. Desta forma, a partir de 1541, 
surge a primeira comunidade portuguesa permanente nas proximidades da capital do 
Monomotapa, onde a coexistência era pacífica. Para reforçar este sistema e captar mais 
comércio. 
 
1.4. Resumo 
Esta unidade resumiu as relações comerciais da antiga colonia de Moçambique, o povo 
Asiático e os Português. A unidade também resumiu os conflitos entre Portugal e os povos 
asiáticos que se instalaram na costa entre os seculos VI a XV. As relações comerciais entre 
estes povos e os chefes tradicionais de moçambique foram marcadas por desigualdade e 
exploração, principalmente em questões de trocas comerciais e produtos de troca. 
 
1.5. Bibliografia 
ANTUNES, Luís Frederico Dias. Os mercadores baneanes guzerates no comércio e a navegação 
da costa oriental africana (século XVIII)‘, in Moçambique: navegações, comércio e técnicas 
(ata), Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses, Lisboa, 
1998, pp. 67-93. 
__________, A actividade da companhia de comércio baneanes de Diu em Moçambique 
(1686 - 1777), tese de mestrado em História dos Descobrimentos e da Expansão Portuguesa 
apresentada à Universidade Nova de Lisboa, 1992. 
__________, O Ultimátum na perspectiva de Moçambique. As questões comerciais subjacentes‘, 
in Moçambique: navegações, comércio e técnicas (atas), Lisboa, Faculdade de Letras da 
Universidade Eduardo Mondlane de Maputo; Comissão Nacional para as Comemorações dos 
Descobrimentos Portugueses, 1998, pp. 261-279. 
NEWITT, Malyn, História de Moçambique, Lisboa, Publicações Europa-América, 1995 
SERRA, Carlos, ‗Introdução‘, in Serra, Carlos [et. al.], História de Moçambique, Maputo, 
Tempográfica; Departamento de História da UEM, 1982, vol. I, pp. 23-47. 
SERRA, Carlos (coord.). História de Moçambique: Parte I - Primeiras Sociedades sedentárias e 
impacto dos mercadores, 200/300- 1885; Parte II - Agressão imperialista, 1886-1930. Vol. 1, 
2.ª edição, Maputo, Livraria Universitária, Universidade Eduardo Mondlane, 2000. 
 
 
UNIDADE TEMÁTICA II: SITUAÇÃO POLÍTICA, ECONÓMICA, SOCIAL E CULTURAL DAS 
INSTITUIÇÕES MOÇAMBICANAS NO SÉC. XV 
2. Introdução 
Os “Estados” pré-colonial podem ser considerados monarquias nitidamente expansionistas 
cujo território aumentou consideravelmente em superfície graças ao emprego da força 
armada. O Poder Central foi reforçado por vários processos: apropriação de espólios de 
guerra, sobretudo mulheres e gado bovino; acumulação de excedentes por meio de 
oferendas e tributos; exigências redobradas em direitos de trânsito; aumento das vendas de 
ouro, marfim, cobre, ferro e outros produtos, incluindo manufacturados como enxadas, aspas 
e «machiras» de algodão; utilização cada vez mais intensiva de armas-de-fogo, etc. Novos 
bens de consumo, nomeadamente os provenientes das importações, premiavam a lealdade, 
gratificavam os guerreiros, atraíam crescente número de aderentes, e permitiam a realização 
de obras públicas de alguma envergadura (Zimbabwe, Mutapa, etc). 
Os testemunhos históricos do surgimento do estado de Zimbabwe não são muito claros, por 
esta razão o uso de fontes arqueológicas tornaram-se cruciais. Por esta razão, a compreensão 
desta unidade deve ser complementada com a leitura integrada dos livros de história de 
África e Historia de Moçambique e algumas obras arqueológicas. 
 
2.1. Objectivos 
▪ Prover informações para resolução desta unidade, 
▪ Caracterizar as instituições e ou estados pré-coloniais usados com fontes de 
penetração colonial. 
 
2.2. Desenvolvimento 
Entre cerca de 1450 e 1550, o Grande Zimbabwe foi abandonado pela maior parte dos seus 
habitantes e não são muito claras as razões do abandono. Na sequência da invasão e 
conquista do planalto zimbabweano pelos exércitos de Mutota, ocorrida por volta de 1440-
1450, desenvolveu-se, entre os rios Mazoe e Luia, o centro de um novo Estado, chefiado pela 
dinastia dos Muenemutapa. O núcleo dirigente do grupo invasor, que deu origem a essa 
dinastia, constituíu-se deste o início em aristocracia dominante recobrindo e subordinando o 
“stock” populacional pré-existente. Os povos submetidos, como por exemplo, os Tonga do 
vale do Zambeze, não falavam a língua Karanga-Chona. O grosso dos efectivos do grupo 
invasor deu origem, no vale do Zambeze, a uma nova etnia, denominada, pelos povos locais, 
Macorecore. O grupo dirigente era conhecido por machinde (príncipes). 
O núcleo central de Muenemutapa, que a dinastia governava directamente entre os rios 
Mazoe e Luia, era circundado por uma cintura de Estados vassalos cuja aristocracia 
dominante, constituída por parentes dos Muenemutapa, tinha tendência a rebelar-se quando 
o poder central enfraquecia. Entre os Estados vassalos encontravam-se Sedanda, Quissanga, 
Quiteve, Manica, Báruè, Maungwe, além de outros mais no interior. Os seus chefes pagavamtributo ao Muenemutapa reinante e eram confirmados por este quando subiam ao poder. Os 
Muenemutapa dominaram a Sul de Zambeze até finais do sec. XVII, perdendo depois a sua 
posição em favor da dinastia dos Changamire, cujo papel no levante armando contra a 
penetração portuguesa estudaremos mais a frente. Contudo, o Estado de Muenemutapa 
sobreviveu no vale do Zambeze no sudoeste de Tete até ao começo do sec. XX. 
Nos seus traços mais gerais, a sociedade Karanga-Chona (com a designação cobrimos todo o 
império) caracterizava-se pela coabitação no seu seio de dois níveis sócio-económicos 
distintos: de um lado, a comunidade rural relativamente autárcica e estruturada pelas 
relações de parentesco; de outro lado, a aristocracia dominante (que se confundia com a 
família que reinava e esta com o estado, com tradição de ter conquistado a zona que ocupava) 
controlando o comércio a longa distância e dirigindo a vida das comunidades. É na articulação 
desses dois níveis correspondentes à classe dominada e à classe dominante, que devemos 
procurar o segredo último do modo de produção da sociedade Chona. 
2.2.1. As comunidades rurais 
A actividade produtiva essencial das comunidades rurais Karanga-Chona baseava-se na 
agricultura. Os principais cereais cultivados eram a mapira, a mexoeira, o naxenim (eleusine). 
Ao longo dos rios e, sobretudo na zona costeira, em solos aluvionares, cultivava-se arroz, 
usualmente para venda, segundo Frei João dos Santos. Mas o nível das forças produtivas era 
ainda baixo. Nos trabalhos agrícolas, o principal instrumento de trabalho era a pequena 
enxada de cabo curto e a agricultura praticava-se sobre queimada. A pecuária, a pesca e caça, 
bem como as actividades artesanais, surgiam como apêndices complementares da 
agricultura, submetendo-se aos imperativos do ciclo agrícola. À excepção do Butua (um 
estado que parece não ter sido satélite do Estado de Muenemutapa), desconhecia-se a 
tracção animal e o boi, por exemplo, não era usado como montada, animal de carga ou força 
energética na lavra em áreas do planalto isentas de mosca tsé-tsé. O trabalho nas minas 
aparecia às vezes como uma imposição do “exterior” (da aristocracia dominante ou dos 
comerciantes estrangeiros), sendo integrado geralmente como actividade sazonal na 
actividade produtiva normal. A esse respeito, o missionário Frei João dos Santos escreveu, 
referindo-se ao Butua (ou Abutua, território de Changamire, que Santos localizava, 
erradamente, a noroeste e não ao sudoeste). Os jazigos auríferos situavam-se, 
essencialmente, nas terras planálticas: Muenemutapa (ou seja, Chidima e Dande), Butua e 
Manica. Em algumas regiões, o trabalho de mineração ocupava, apenas, uma pequena parte 
do ano. Mesmo as correntes comerciais eram marginais e não afectavam, no essencial, a vida 
comunitária. 
Porém, com o correr do tempo, a penetração árabe-swahili e portuguesa trouxe novas 
necessidades (nomeadamente em bens de prestigio), as quais, voluntária ou coercivamente, 
levavam as populações das comunidades a praticarem a mineração do ouro em escala 
considerável, bem como a sua comercialização. As mushas, que integravam no geral uma 
família no sentido lato ou um grupo de famílias com o mesmo antepassado, viviam num 
regime de auto˗ subsistência e estavam fundamentalmente orientadas para a produção de 
valores de uso. É, pois, compreensível que os excedentes fossem de pouca monta, facto que 
é assinalado por muitos documentos escritos. Do fraco nível das forças produtivas decorria, 
por um lado, a persistência das forças colectivas de produção (a solidariedade comunitária 
condicionava o individualismo inovador, sempre olhado com desconfiança); decorria, por 
outro lado, a procura de eficácia ao nível de práticas mágicas e de rituais de persuasão, 
tendentes a propiciar uma natureza cheia de desígnios que se considerava não directamente 
controlável pelo comum dos mortais. Todas as relações entre os membros da sociedade 
Karanga˗Chona, ao nível das mushas, eram fundadas no parentesco de membros da musha 
ou de súbditos. Acima das mushas, como entidade superior, como que fora delas, erguia˗se a 
aristocracia dominante, benfeitora ou punitiva, habitando a imponência dos madzimbabwe , 
símbolos físicos de exploração e testemunhos em pedra de estratificação social. 
2.2.2. A aristocracia dominante 
Na sociedade Karanga˗ Chona, o Estado era personificado pela pessoa do soberano, o 
Mambo, que devia desligar ˗se da sua origem terrena para conferir à ʺ realezaʺ um carácter 
sagrado. Tornava˗se, assim, o representante supremo de todas as comunidades, o símbolo 
da unidade de interesses dessas comunidades. Para o efeito, recorriam os mambos a práticas 
que os aproximavam dos seres sobrenaturais: A fim de quebrar todas as ligações com a sua 
linhagem, para se tornar representante de toda a sociedade,indiferente às rivalidades 
familiares,[o Mambo] comete, no momento da sua entronização, o incesto com uma parente 
próxima, infringindo desse modo o mais absoluto interdito. Numerosos testemunhos 
confirmam que a principal mulher do Monomotapa era a sua própria Irmã. 
A autoridade efectiva do Mambo processava˗se através dos seus subordinados territoriais 
que integravam um já complexo aparelho de Estado. Além de nove funcionários, as três 
principais mulheres do soberano desempenhavam funções de grande importância. Ainda sob 
a sua alçada directa, o Mambo possuía alguns funcionários subalternos: os Mutumes 
(mensageiros) e os Infices (guarda pessoal do soberano). A população encontrava˗se dividida 
administrativamente. Diversas comunidades (Musha), à frente de cada uma das quais se 
encontrava um Mukuru ou Muenemusha (o ancião mais idoso), integravam˗se num conjunto 
mais vasto (província), dirigido por um Fumo ou Encosse, dependente do Mambo. 
É interessante notar que, de acordo com uma fonte do século XVII, elegia˗se como Fumo 
quem tivesse maior riqueza material: têm também eleições de seus Fumos, que nestas 
muzindas os que são eleitos têm a primeira voz em tudo, o tempo que lhe concedem que não 
é mais senão enquanto têm que gastar,e são eleitos deste modo, algum cafre que sabem que 
é rico, manda˗lhe aquela muzinda dizer que o queira honrar e fazer grande, ordinariamente 
aceitam, vão buscá˗lo onde quer que more, com muita festa, em vindo dentro da povoação 
dão˗lhe casas, onde todos concorrem a fazê˗las , e à porta o assentam num quite muito 
laurado [...] e ali vêm todos os Estados, de homens, mulheres meninos e meninas a bailar, 
cada um por sua vez, e põem ˗se dez velhos dizendo˗lhe mil louvores, e ali há˗de haver muito 
de comer, e muito pombe, que é o seu vinho, afora datas (provavelmente no sentido de 
dádivas; nota do coordenador ) que faz aos grandes de panos para vestir, joias para as 
mulheres [...]. 
Enquanto governasse, o Fumo, “chefe de terra”, deveria de forma ostentatória (festas, 
doações, dons) redistribuir não apenas os bens que acumulara antes de ser nomeado Fumo, 
como aqueles que recebia enquanto chefe. Depois que ficava “pobre”, a comunidade 
destituía˗o através de uma cerimônia através da qual lhe eram atribuídos certos símbolos de 
prestigio (um bordão e um chapéu de palha). O Fumo deposto passava, então, a pertencer ao 
grupo dos “grandes” por mérito. Era então eleito um outro Fumo, que tinha de aceitar o 
cargo, pois caso o não fizesse, [...] às vezes matam˗no, outras fazem que não o vêem, 
deixam˗no fugir, o que lhe apanham gado, mantimentos machiras, [tecidos de algodão; nota 
do coordenador], escravos, gado , e o mais de mantimento, ali comem tudo. Quando daqui 
escapa, armam˗lhe por outro modo, se há muito sol dizem que solte a chuva, se há muita 
chuva dizem˗lhe que solte o sol [...]. 
Talvez seja possível interpretar todo esse processo como uma tentativa de a comunidade 
controlar a acumulação de riqueza por parte dos chefes (ao nível das ˝muzinda˝, que eram 
um conjunto de povoações),obrigando˗os a “gastar” essa riqueza e evitando, desse modo, 
que os Fumos se servissem dela para fortalecimento de um poder político que se erigisse à 
margem do controlo das comunidades aldeãs. Importa salientar, contudo, que semelhante 
controlo não se operava ao nível dos Mambos, geralmente oriundos da aristocracia invasora 
descendente de Mutota, na qual a transmissão do poder se fazia por via hereditária. 
À morte do soberano no Quiteve (por exemplo), nem sempre escolhiam para rei “o príncipe 
mais velho, nem mais chegado, senão o mais prudente e esforçado”, como escreveu Frei João 
dos Santos, o que denota claramente a importância atribuída ao cumprimento de funções 
técnico˗ administrativas pelos dirigentes. Concorria no mesmo sentido a prática de os 
soberanos se suicidarem quando atingidos por alguma enfermidade contagiosa ou por defeito 
físico, considerados sinais de incapacidade governativa. Mais significativo era ainda, como 
salienta um autor contemporâneo, o facto de que, na maior parte do território, a organização 
racional da produção agrícola e da utilização das colheitas dependia da intervenção directa 
do estado. O estado aparece, neste caso, como o organizador da produção e a aristocracia 
dominante como a detentora do “saber”. Constituíam também funções do Estado, entre 
outras, a manutenção da paz interna, a defesa do território dos ataques externos e a 
organização de obras de beneficiência. Mas a aristocracia dominante não se reproduzia 
unicamente cumprindo funções técnico-administrativas. É no quadro da dominação política 
que essas funções se exerciam. 
2.2.3. Articulação aristocracia/comunidade 
Um missionário do século XVII, assinalando o carácter desenvolvido da agricultura régia do 
Estado dos Muenemutapas, escreveu: [...] o Monomotapa [...] obriga os seus Negros a 
cultivar campos de uma fantástica vastidão [...] Finalmente, aquando da colheita desses 
enormes campos a perder de vista, consegue obter um volume de produtos suficientemente 
vasto para viverem perfeitamente à vontade durante um ano, tanto eles como as suas 
mulheres. 
Cada uma das comunidades aldeãs tinha a obrigação de prestar ao Estado de Muenemutapa 
sete dias de trabalho mensais. Era ao nível desta renda em trabalho que se exercia a 
exploração das comunidades. Além da renda, havia ainda um tributo, que não correspondia 
propriamente a uma renda em géneros. A sua função era essencialmente simbólica, com 
pouco peso a nível económico: mais do que uma relação de exploração, traduzia uma relação 
de dominação/subordinação a nível ideológico: Ninguém fala com el-rei ou com [...] sua 
mulher, sem lhe levar alguma coisa [...] quando são tão pobres e não tem que dar lhe levam 
um saco de pedra, em reconhecimento de vassalagem, ou um feixe de palha para cobrir suas 
casas. 
Proprietário do “saber”, os Mambos tinham o direito de invocar a chuva e eram eles os 
intermediários entre as necessidades dos aldeões e os espíritos “vivos” dos antepassados 
régios: Quando padecem algumas necessidades ou esterilidades, ao rei se socorrem, cuidando 
firmemente que ele é poderoso para lhe dar todas as coisas que desejarem, e houverem 
mister, e que tudo pode alcançar dos defundos seus antepassados, com os quais lhe parece 
que fala. Pela qual razão, ao rei pedem chuva, quando lhe falta, e todas as bonanças de 
tempos para as suas novidades, e quando lhe vão pedir qualquer coisa d´estas levam-lhe 
grande presente [...]. A propriedade do “saber” dos Mambos cobria, também, a esfera dos 
contactos com as entidades sobrenaturais que se julgava povoavam a natureza e o mundo 
em geral. Essa a razão por que eram interditos os feiticeiros não devidamente autorizados 
pelos mambos: [...] é proibido pelo rei da terra que ninguém seja feiticeiro sem uma licença, 
porque somente ele e seus amigos quer que usem desta ciência. 
Portanto, as rendas em trabalho e os próprios tributos simbólicos deviam surgir aos aldeões 
não como exacções directamente humanas, mas como imposições morais ou como oferendas 
necessárias para aqueles que, se bem estivessem na terra, serviam, no entanto o céu: os 
Mambos. A eles deviam obediência todos os membros das mushas. Era como súbditos que 
obedeciam, não como parentes. Eram parentes ao nível das Mushas e súbditos ao nível do 
Estado. Garantes da fecundidade da terra e depositários da ordem do mundo, os Mambos 
constituíam os antídotos mais eficazes contra o caos. A sua morte significa a perda da 
estabilidade: Por morte, porém de qualquer mambo, e durante o octavário [...] concorre todo 
o povo [de Dande, na província e Tete, nota do coordenador], o mais indecentemente vestido 
que pode imaginar-se a chorar na povoação a perda ingente que acaba de sofrer, praticando 
toda a casta de desatinos, isto, é ferindo e roubando [...]. 
Essas demonstrações de desordem ocorriam igualmente em Manica, quando morria um 
soberano da dinastia de Chicanga. Escreveu um cronista do século XVIII que, quando morria 
um Muenemutapa e até à eleição do novo Mambo, o poder era exercido por um personagem 
que usava o nome de Nevinga. Sem ser portador de qualquer atributo régio, era morto logo 
após a eleição do Mambo de direito. A eleição do novo Mambo,constituía motivo de festa 
porque se acreditava ter a ordem sido resposta com o importantíssimo papel do Mambo vivo, 
que tamanha admiração e entusiasmo causa aos seus crédulos adoradores. 
Por outro lado, numerosas fontes referem a existência de dois termos que, aparentemente, 
serviam para designar Deus: Mulungu, utilizado nas terras marítimas, ao longo do vale do 
Zambeze e a nordeste do planalto zimbabweano; e Mwari, usado a sul do planalto. Um culto 
forte entre os Karanga-Chona era, indiscutivelmente, o dedicado aos espíritos dos 
antepassados, os Muzimu, que comportaria não apenas os antepassados de cada um, mas, 
igualmente, os antepassados de cada linhagem. Entre os Muzimu, aqueles mais respeitados 
e temidos eram os dos reis e Frei João dos Santos, em 1609, escrevia que o comum dos 
mortais no reino de Quiteve e do império de Muenemutapa, ao pedir socorro aos reis em 
caso de necessidade ou de doenças, acreditava poderem eles resolvê-los com auxilio dos 
Muzimu-régios. Era prática regular as classes dominantes do Estado de Muenemutapa e 
Estados satélites contactarem regularmente com os seus Muzimu em serras consideradas 
sagradas, como no Quiteve, através de especialistas médiuns que as fontes designam ora por 
Pondoros ora por Mondoros (significando leões). Parece que o Muenemutapa Matope, o 
segundo da dinastia, teria sido o primeiro a usar o título. A fazer fé numa fonte, Matope teria 
declarado que o seu espírito, sendo imortal, se metamorfoseava num leão, pelo que matar 
um leão era considerado um “crime imperdoável”. Ora, os médiuns, cujo nome correcto é 
swikiro, estavam estreitamente associados ao poder político e especialmente às sucessões. 
Deviam conhecer profundamente a história genealógica e parece que eram usualmente 
“estrangeiros”, para assegurar a imparcialidade em caso de arbitragem nos conflitos 
sucessórios. As boas relações com os antepassados dinásticos e as correctas ligações 
mediúnicas com aos Muzimu reias eram a garantia do bom governo e da estabilidade social. 
Portanto, os swikiro constituíam os suportes das classes dominantes, e estas, as executoras 
das ordens dos antepassados, mortos em vida e vivos na morte. Todo esse aparato ideológico 
contribuía para assegurar a reprodução do edifício social Karanga-Chona e das desigualdades 
sociais existentes. Porém, o poder dos Muenemutapa e dos mambos em geral não advinha 
apenas das rendas e dos tributos que recebiam regularmente. O comércio a longa distância 
e, nomeadamente, o comércio do ouro era a outra fonte do poder dos mambos. A expansão 
de Mutota para o norte do planalto zimbabweano, cujo objectivo pode ter sido o domínio das 
rotas comerciais do Zambeze, veio possibilitarum considerável reforço do domínio da camada 
dirigente. Tornando possível pelos excedentes tributados pela classe dominante, o comércio 
a longa distância e o seu caudal de bens de prestigio, como os tecidos e as missangas dados 
em troca de ouro, reagia, por sua vez, sobre relações de produção existentes, consolidando o 
poder de estado e intensificando as desigualdades existentes. 
2.3. Resumo 
Esta unidade resumiu as instituições políticas que surgiram no seculo XVI, particularmente o 
Estado de Mwenemutapa, como um dos principais estados pré-coloniais que surgiu no então 
território de Moçambique. Descreveu o seu surgimento, relações políticas e de subordinação 
e as razões da sua decadência. Nesta unidade aprende-se que este estado era poderoso, uma 
https://pt.wikipedia.org/wiki/Estado
vez que controlava uma grande cadeia de minas e de metalurgia de ferro e ouro, cujos 
produtos eram procurados por mercadores de outras regiões do mundo 
 
 
2.4. Bibliografia 
UEM, Departamento de História, 1982. História de Moçambique Volume 1: Primeiras 
Sociedades Sedentárias e Impacto dos Mercadores. Cadernos TEMPO. Maputo. 
SERRA, Carlos (coord.). História de Moçambique: Parte I - Primeiras Sociedades sedentárias e 
impacto dos mercadores, 200/300- 1885; Parte II - Agressão imperialista, 1886-1930. Vol. 1, 
2.ª edição, Maputo, Livraria Universitária, Universidade Eduardo Mondlane, 2000. 
NEWITT, Malyn. História de Moçambique. Mem-Martins, Publicações Europa-América, 1997. 
PÉLISSIER, René. História de Moçambique: formação e oposição: 1854-1918. 2 vols., Lisboa, 
Editorial Estampa, 1987-1988 
 
 
UNIDADE TEMÁTICA III: A EXPANSÃO MARÍTIMA EUROPEIA E A PRESENÇA PORTUGUESA EM 
MOÇAMBIQUE. 
3. Introdução 
Os historiadores geralmente referem-se à "era dos descobrimentos" como as explorações 
marítimas pioneiras realizadas por portugueses e espanhóis entre os séculos XV e XVI, que 
estabeleceram relações com a África, América e Ásia, em busca de uma rota alternativa para 
as "Índias", movidos pelo comércio de ouro, prata e especiarias. Estas explorações no 
Atlântico e Índico foram seguidas por outros países da Europa, como França, Inglaterra e 
Países Baixos, que exploraram as rotas comerciais portuguesas e espanholas até ao oceano 
Pacífico. A exploração europeia perdurou até realizar o mapeamento global do mundo, 
resultando numa nova divisão mundial, e no contacto entre civilizações distantes, alcançando 
as fronteiras mais remotas muito mais tarde, já no século XX. 
A era dos descobrimentos marcou a passagem do feudalismo da Idade Média para a Idade 
Moderna, com a ascensão dos estados-nação europeus. Durante este processo, os europeus 
https://pt.wikipedia.org/wiki/Mina_(minera%C3%A7%C3%A3o)
https://pt.wikipedia.org/wiki/Metalurgia
https://pt.wikipedia.org/wiki/Ferro
https://pt.wikipedia.org/wiki/Ouro
encontraram e documentaram povos e terras nunca antes vistas. Juntamente com o 
Renascimento e a ascensão do humanismo, foi um importante motor para o início da 
modernidade, estimulando a pesquisa científica e intelectual. A expansão europeia no 
exterior levou ao surgimento dos impérios coloniais. Entre os mais famosos exploradores 
deste período, destacam-se Cristóvão Colombo (pela descoberta da América), Vasco da Gama 
(descoberta da África, incluindo Mozambique). 
A formação do Império Colonial Português começou com a conquista de Ceuta, em 1415, 
obedecendo a objectivos geoestratégicos, políticos, económicos e religiosos. No caso de 
Moçambique, tendo como pontos de partida Sofala e a Ilha de Moçambique, os exploradores 
portugueses foram penetrando no interior do território, estabelecendo os primeiros 
entrepostos comerciais e fazendo as primeiras concessões de terras aos colonos ao longo do 
rio Zambeze, como medida para obter o controlo das rotas comerciais, ao mesmo tempo que 
asseguravam o povoamento do território pelos lusitanos. Todo este processo teve, desde o 
início, de lutar contra as movimentações árabes na região, conseguindo Portugal controlar 
praticamente toda a costa moçambicana até ao início do século XVIII, situação que se inverteu 
a partir do momento em que os portugueses perderam. 
 
3.1. Objectivos 
▪ Registar: todos os factos que ocorrem e podem ser representados na ocupação marítima 
portuguesa com particular destaque ao início da colonização de Moçambique; 
▪ Prover informações para realição de exercícios desta unidade. 
 
3.2. Desenvolvimento 
Entre o século XV e o início do século XVII, decorreu o que veio a se chamar da “Era dos 
Descobrimento”, durante o qual, alguns países europeus (inicialmente, portugueses, depois 
espanhóis) exploraram intensivamente o globo terrestre em busca de novas rotas de 
comércio. Se traçarmos o mapa geopolítico do mundo no ano de 1500, veremos surgir um 
certo número de grandes regiões relativamente autônomas que estavam em certo grau 
interligadas fosse através do comércio ou devido a conflitos. Havia, primeiramente, o Extremo 
Oriente que, representado pelo Japão e pela China, pelas regiões do Pacífico e do oceano 
Índico, compreendendo as ilhas Moluscas, Bornéu, Sumatra e a própria Índia, era a fonte de 
abastecimento do mundo em especiarias. Em seguida, havia o Oriente Médio que cobria uma 
vasta zona compreendendo a península árabe, o Império Safávida e o Império Otomano, o 
qual logo englobou a África do Norte. Depois, havia a Europa, com os eslavos, os 
escandinavos, os alemães, os anglo‑saxões e os latinos, que permaneciam confinados dentro 
de suas fronteiras. Enfim, havia a África, com sua encosta mediterrânea ao norte e suas costas 
do Mar Vermelho e do Oceano Índico que participavam, de forma crescente, do comércio 
internacional com o Extremo Oriente e com o Oriente. O período que se estendeu de 1500 a 
1800 viu estabelecer‑se um novo sistema geoeconómico orientado para o Atlântico, com seu 
dispositivo comercial triangular, ligando a Europa, a África e as Américas. A abertura do 
comércio atlântico permitiu à Europa e, mais particularmente, à Europa Ocidental, aumentar 
sua dominação sobre as sociedades das Américas e da África. Desde então, ela teve um papel 
principal na acumulação de capital gerado pelo comércio e pela pilhagem, organizados em 
escala mundial. A emigração dos europeus para as feitorias comerciais da África fez surgir 
economias anexas que se constituíram no além‑mar. Estas desempenharam, em longo prazo, 
um papel decisivo na contribuição para a constante ascensão da Europa que impingia sua 
dominação sobre o resto do mundo. 
Do ponto de vista dos historiadores, o período que vai de 1450 a 1630 foi marcado, na maioria 
dos países europeus, em particular, naqueles do Oeste e do Sudoeste, por uma formidável 
expansão econômica, política e cultural. Com o tempo, acentuou‑se a divisão do continente 
em um Noroeste avançado, do ponto de vista econômico, uma península ibérica 
relativamente pouco desenvolvida e um vasto Centro‑Oeste em rápido desenvolvimento, 
mas, também, cada vez mais dependente dos mercados ocidentais. O período é também 
marcado por um movimento de expansão além‑mar que atingiu imensos territórios situados 
na borda do Atlântico e, até mesmo, no Pacífico. A costa africana sofreu este movimento 
desde o início do século XVI, ainda que a África do Norte conhecesse uma situação diferente 
daquela da região situada ao sul do Saara. O Mediterrâneo foi o palco de uma violenta 
rivalidade que opôs Espanha, Portugal, França e África do Norte muçulmana, ao passo que a 
influência do Império Otomano continuava em ascensão. Em 1415, Ceuta foi ocupada pelos 
portugueses visando o controlo da navegação na costa norte Africana, evento geralmente 
convencionado como o início da expansão portuguesa. Em 1517, os Otomanos 
apoderaram‑se do Egito, depois, submeteram uma grande parte da península árabe e 
estabeleceram, pouco a pouco, sua dominação sobre Trípoli, Túnis e Argel, onde se 
multiplicaramregências otomanas sob protetorado turco. Estas fizeram pairar uma grave 
ameaça sobre os navios europeus e sobre as costas meridionais da Itália e da Espanha. No 
Marrocos, entretanto, os portugueses conseguiram assegurar o controle sobre uma grande 
parte da costa, até Agadir e Safi, enquanto os castelhanos se estabeleciam em Tlemcen e 
Oran. Estas conquistas foram de grande importância, pois elas asseguraram aos portugueses 
o controle das saídas de algumas grandes rotas do comércio do ouro e dos escravos, 
estabelecido há séculos, entre o Sudão Ocidental e as costas mediterrâneas, através do Saara 
e do Magreb. As saídas de outros grandes eixos, de orientação norte‑sul e leste‑oeste, 
estavam nas mãos dos turcos e de representantes mais ou menos autônomos do Império 
Otomano na África (Argel, Túnis e Trípoli). Estes acontecimentos ocorreram 
aproximadamente um século após o início da expansão portuguesa pela África Ocidental, o 
que explica o fato de os europeus terem desviado, em benefício próprio, uma parte do tráfico 
do ouro e dos escravos que, anteriormente, era destinado ao mundo muçulmano. Na época, 
pensava‑se, com razão, que a costa da África Ocidental e da África Oriental permaneceria por 
muito tempo sob dominação econômica e política de Portugal, que exercia também uma 
certa influência cultural sobre seus parceiros comerciais africanos. Durante todo o século XV 
e no início do século XVI, os portugueses conseguiram estabelecer numerosas feitorias na 
costa ocidental, e fazer com que a população do litoral e seus chefes participassem do 
comércio com os europeus. 
Ao estabelecerem novas feitorias, os portugueses esforçavam‑se para obter a autorização dos 
chefes autóctones e para comprar, de diversas formas, a benevolência dele Na África Oriental, 
eles empregaram outros métodos: dominaram pela força os Portugueses fixaram-se no litoral 
onde construíram as fortalezas de Sofala (1505), Ilha de Moçambique (1507), e mais tarde 
através de processos de conquistas militares apoiadas pelas actividades missionárias e de 
comerciantes, penetraram para o interior onde estabelecerem algumas feitorias como a de 
Sena (1530), Quelimane (1544), onde implantaram guarnições e recolheram o imposto em 
benefício ao rei de Portugal. Ao mesmo tempo, eles procuravam apoderar‑se do comércio do 
ouro, do marfim e dos metais existentes entre a costa, o interior e a Índia. Nem todas as 
diversas feitorias portuguesas alcançaram o mesmo sucesso na África. No começo do século 
XVI, o comércio em Elmina, no estuário da Gâmbia, em Serra Leoa e, em Sofala, trouxe 
benefícios substanciais oriundos, principalmente, da compra do ouro a condições vantajosas, 
e, em menor escala, do tráfico de escravos fornecidos pelo interior. Arguin, a mais antiga das 
feitorias portuguesas, todavia, continuava declinando. O comércio com a África era assaz 
lucrativo para Portugal. O comércio com a África, e mais tarde com a Índia, acelerou 
fortemente a ascensão da classe dos negociantes portugueses, que, no século XV, ainda se 
encontravam, relativamente, pouco favorecidos. Ao longo deste primeiro quarto do século 
XVI, poder‑se‑ia pensar que Portugal entrou em uma fase duradoura de expansão econômica 
e política. Esta esperança é, todavia, arruinada pelo caráter retrógrado e estático da estrutura 
socioeconômica do país. A expansão ultramarina necessitava de importantes investimentos 
financeiros e, para comprar ouro e escravos, foi preciso escoar, pelas encostas africanas, 
grandes quantidades de objetos de ferro, bronze e cobre, bem como têxteis baratos, sem 
falar da prata, dos produtos alimentícios e do sal. Ora, estes bens não eram produzidos em 
Portugal e deviam ser comprados, no início, junto aos mercadores estrangeiros ou em Bruges, 
e, depois, nas grandes praças comerciais europeias da época. Além disso, o desenvolvimento 
da frota dependia das importações de madeira de obra e de outros produtos florestais 
provindos, essencialmente, dos países bálticos, que também forneciam um certo volume de 
cereais, cuja produção, em Portugal, era insuficiente desde o século XIV. É evidente que o 
produto do comércio exterior devia, em grande parte, ser alocado à importação das 
mercadorias necessárias para o comércio com a África. Portugal não pôde aumentar sua 
produção interna em razão de sua frágil potência demográfica e, da intensa concorrência no 
estrangeiro, notadamente, pelos produtos industriais que há anos eram muito procurados 
pelo mercado português. 
O formidável crescimento econômico da Europa acarreta no continente, a partir de 1470, 
uma alta progressiva dos preços que se tornam espetaculares durante a segunda metade do 
século XVI, e atinge, principalmente, os produtos agrícolas e industriais. O monopólio do 
comércio com a África ou com a Índia, que, ademais, procede de uma outra concepção 
econômica, não lhe foi de grande auxílio. O importante investimento, gerado pela expansão 
ultramarina, apenas seria rentável para Portugal se o país pudesse impor aos seus parceiros 
negros condições de troca que lhe fossem favoráveis, ou seja, se pudesse comprar barato e 
vender caro. Para isto, foi preciso limitar, até mesmo proibir, o acesso às feitorias aos 
imigrantes europeus, sobretudo, aos oriundos de países outros que não Portugal, através da 
manutenção de uma frota suficientemente potente para ser, de fato, dissuasiva. Esta foi uma 
empreitada dispendiosa e se revelava acima dos recursos de Portugal. 
Por volta de 1525, os portugueses começaram a encontrar dificuldades para achar ouro, 
mesmo na região de Elmina. Parece que, nas costas africanas, eles já não mais dispunham do 
suficiente de mercadorias para oferecer em troca. Desta situação, aproveitam, 
particularmente, os europeus rivais dos portugueses – a saber, os negociantes franceses, 
ingleses e holandeses – já que eles dispunham de maiores meios financeiros e não sofriam 
taxa de importação, pois suas mercadorias eram quase que exclusivamente de origem 
metropolitana. Enfim, a França, a Inglaterra e a Holanda ainda não sucumbiam sob os pesos 
de uma administração pletórica que regulamentava o comércio exterior e regia a vida nas 
colônias. O aparelho administrativo português era, ao mesmo tempo, dispendioso e lento a 
se adaptar às flutuações constantes, próprias do comércio exterior. Na África, os mercadores 
que chegavam da França, da Inglaterra ou da Holanda possuíam os meios suficientes para 
comprar em maior escala e vender a melhores preços do que aqueles de Portugal. 
Documentos datados dos anos 1570 mostram que os portugueses tinham consciência desta 
situação, mas que eram incapazes de remediá‑la. 
 
3.3. O tráfico de escravos 
Portugal foi atraído inicialmente para a África Negra pelo ouro, que era anteriormente 
exportado pelos países islâmicos. Não obstante, eles não tardaram a perceber que a África 
possuía uma outra mercadoria, também fortemente procurada pelos Europeus: os escravos. 
Ainda que a escravidão na África fosse diferente da escravidão praticada pelos europeus, a 
tradição de exportar escravos para os países árabes era muito antiga em grandes partes do 
continente, em particular do Sudão. Nos séculos XV e XVI, esta tradição pareceu ter ajudado, 
em certa medida, os portugueses a conseguir, regularmente, escravos em uma grande parte 
da África Ocidental, notadamente, na Senegâmbia, parceira econômica, de longa data, do 
Magreb. Os portugueses, que penetravam cada vez mais profundamente nas regiões do 
sudeste da África Ocidental, aplicaram, com sucesso, as práticas comerciais utilizadas na 
Senegâmbia. 
Compreendendo o caráter indispensável da cooperação dos chefes e dos mercadores locais, 
dedicaram‑se a interessá‑los ao trato de escravos. Os portugueses não ignoravam que isto 
pudesse resultar em uma intensificação dos conflitos entre os diversos povos e Estados 
africanos, os prisioneiros de guerra tornando‑se o principalobjeto deste comércio, mas eles 
deixaram muito cedo de se opor às objeções morais, pois, como muitos outros na Europa, 
eles acreditavam que o tráfico abria aos negros o caminho para a salvação: não sendo cristãos, 
os negros haveriam de ser condenados por toda a eternidade se eles ficassem em seus países. 
Logo, um outro argumento foi enunciado: os negros são descendentes de Ham, que foi 
amaldiçoado, e, por isso, são condenados à escravidão perpétua. Estas motivações 
ideológicas não devem ser subestimadas. Devemos acrescentar aqui que os escravos negros 
começaram a aparecer na Europa em uma época em que o tráfico de escravos brancos 
provenientes da zona do Mar Negro, havia praticamente ceifado, época esta em que se 
começa a identificar o escravo ao negro, sendo, então, desconhecidos os outros 
representantes da raça negra. 
Durante todo o século XV e no início do XVI, o principal mercado da “madeira de ébano” era 
a Europa, em particular, Portugal e os países sob dominação espanhola, assim como as ilhas 
do Atlântico – quais sejam, Madeira, as Canárias, as ilhas de Cabo‑Verde e, mais tarde, a ilha 
de São Tomé –, porém, apenas em certa medida, devido às suas pequenas superfícies. O 
tráfico negreiro na Madeira, nas ilhas de Cabo‑Verde e, mais particularmente, na ilha de São 
Tomé originou‑se, primeiro, em razão da introdução da cultura da cana‑de‑açúcar e do 
algodão. 
Os portugueses tiveram, igualmente, sérios problemas na África. Durante todo o século XV, 
eles tiveram um crescente interesse pelo comércio dos escravos e, ao longo do século XVI, 
como nos outros seguintes, os territórios capazes de lhes fornecerem escravos em grande 
quantidade, cada vez mais, suscitavam‑lhes cobiça. É sob esta ótica que é preciso alocar a 
penetração portuguesa no Congo (onde não havia nem ouro e nem prata), encetada no 
começo do século XVI, e a conquista posterior de Angola, que foi precedida pelo rápido 
avanço do comércio de escravos na ilha de Luanda. Obter grandes quantidades de escravos 
era, igualmente, a preocupação dos colonos da ilha de São Tomé, não só porque eles 
precisavam desta mão de obra para suas plantações, mas também, porque vendiam os 
escravos às colônias espanholas da América e, a partir do fim do século XVI, também ao Brasil 
português. Ao longo do século XVIII, apurando a definição do direito universal ao bem‑estar 
e à liberdade, antropólogos, filósofos e teólogos voltaram‑se para o caso do africano e de sua 
condição no mundo. Sua reflexão levou‑os a modificar as noções ordinariamente admitidas 
até então sobre o negro da África e o escravo americano: de bruto e animal de carga, eles 
transformaram‑no em um ser moral e social. Sua fórmula, “o negro é um homem”, recusava 
implicitamente o consenso sobre a honradez, a legitimidade e a utilidade da venda de negros. 
Suas análises humanitaristas desembocaram na exigência abolicionista. Seu balanço do 
tráfico era inteiramente negativo. Proposições de abolição coletiva, lançadas pela Inglaterra 
em 1787, depois em 1807, haviam fracassado. Em 1810, Portugal fez vagas promessas em 
troca de aberturas para o mercado britânico. Um mundo desmoronou com o fim da guerras 
napoleônicas. No Reino Unido, Estados Unidos, Portugal e em outras partes da Europa, uma 
forte oposição foi desenvolvida contra o comércio de escravos. A Dinamarca, que tinha sido 
ativa no tráfico de escravos, foi o primeiro país a proibir o comércio através de uma legislação 
de 1792, que entrou em vigor em 1803. O Reino Unido proibiu o comércio de escravos em 
1807, impondo pesadas multas para qualquer escravo encontrado a bordo de um navio 
britânico. 
 
3.4. Presença Portuguesa em Moçambique 
A penetração mercantil europeia em Moçambique foi levada a cabo essencialmente por 
portugueses. Os Portugueses, movidos por interesses económicos, sociais e religiosos, 
ocuparam e colonizaram Moçambique. Numa primeira fase, ocuparam posições costeiras, 
junto de pontos de comércio, porém, mais tarde, foram para o interior, junto dos pontos de 
extracção do ouro. Enquanto que a penetração árabe só ambicionava comercializar com os 
nativos, a penetração portuguesa foi mais devastadora. Para além do desenvolvimento 
comercial, os portugueses pretendiam também dominar e controlar tanto o comércio como 
a produção aurífera. O objectivo dos Portugueses era de controlar o acesso às zonas 
produtoras do ouro, pois só assim poderiam acabar com a escassez de metais preciosos em 
Portugal e comprar as especiarias e produtos asiáticos muito apreciados na época. Quando 
os portugueses chegaram à Moçambique, já os Árabes-Swahili estavam estabelecidos, 
controlando o ouro que vinha do Império do Mwenemutapa. 
 
3.4.1. Factores da Penetração Mercantil Europeia/Portuguesa 
A penetração mercantil europeia, sobretudo portuguesa, foi movida por factores de 
diferentes ordens. Em Primeiro lugar, os portugueses tinham motivos económicos, depois 
seguiram-se os sociais e finalmente os religiosos. 
 
3.4.2. Factores Económicos 
Moçambique era um bom local para escoar produtos vindos de Portugal e, era um excelente 
mercado com raras e dispendiosas e apetecíveis matérias-primas, como o ouro, marfim assim 
como um lugar propício ao tráfico de escravos. Os portugueses foram provavelmente os 
primeiros europeus a fixarem-se na costa litoral de Moçambique porque precisavam de ouro. 
Quando Vasco da Gama, na viagem de procura do caminho marítimo para a Índia, passou por 
Moçambique, ouviu falar de um reino no interior muito rico em ouro. Era o Império dos 
Mwenemutapas. Com o ouro, os portugueses, especialmente a burguesia comercial, podiam 
pagar as especiarias orientais e os produtos exóticos do mercado europeu. Assim, 
Moçambique transformou-se para os portugueses, numa reserva de meios de pagamento das 
especiarias. Durante vários séculos, o ouro foi produto mais importante no comércio com os 
portugueses, mas quando começou a rarear ou quando não havia em determinada região, os 
portugueses voltara-se para o marfim. O marfim era um produto exótico e caro que os 
portugueses levavam para a Europa a fim de comerciar, que servia para a produção de 
diversos artigos de ornamentação e de bolas de bilhar. Depois dos ciclos de ouro e de marfim, 
os portugueses começaram a comercializar escravos e, mais tarde, as oleaginosas (este último 
produto sem grande impacto em comparação com c os três primeiros). 
 
3.4.3. Factores Sociais 
Para a aristocracia dos Mutapas, o importante era o desenvolvimento do comércio com os 
mercadores estrangeiros, pois com estes tinham a garantia para a obtenção de bens de 
prestígio como tecidos. Por isso, a primeira comunidade portuguesa permanente nas 
proximidades da capital dos Mwenemutapas surgiu logo em 1541. Numa primeira fase, tanto 
a penetração como a convivência eram pacíficas. Este cenário mudou com a morte do padre 
jesuíta Gonçalo da Silveira em 1561, altura em que começou o envio de expedições militares 
para impor à força a presença portuguesa na região. O grande objectivo dos portugueses na 
região era económico. 
 
3.4.4. Factores Religiosos 
Do ponto de vista religioso, os Portugueses pretendiam: Em primeiro lugar, espalhar a fé cristã 
e, em segundo plano, pretendiam enfraquecer o Islão. A vontade de evangelizar os africanos 
foi um dos motivos da expansão marítima. O clero, ordem social composta por sacerdotes e 
outros clérigos, era um dos grandes conselheiros da Coroa portuguesa. Jogando com a sua 
influência e posição privilegiada, o clero conseguiu convencer os portugueses que a expansão 
traria muitos convertidos a religião católica. Essa vontade de evangelizar era evidente na 
pressão que os Portugueses fizeram para que se baptizassem os monarcas dos primeiros 
Estados moçambicanos. 
 
3.5. Resumo 
Estudamos e discutimos fundamentalmente o conjunto de conquistas realizadas pelos 
portugueses em viagens e explorações marítimas entre 1415e 1543, e que marcaram as 
pretensões de ocupação de território por parte do governo colonial português deu-se 
enfoque as incursos realizadas dentro do “território nacional”, mas olhando a sua relação com 
o exterior. Estudamos e discutimos fundamentalmente a penetração portuguesa na costa e 
no interior de moçambique, particularizando as relações comerciais que foram estabelecidas 
no decurso da sua ocupação. Estendeu-se a explicação do surgimento, estrutura e decadência 
do sistema de prazos da coroa, que constituíram o primeiro sistema de administração colonial 
portuguesa. 
 
Bibliografia 
CAPELA, José. O tráfico de escravos nos portos de Moçambique, Porto, Afrontamento, 2002. 
__________, O tráfico de escravos na ilha de Moçambique‘, in Matteo Angius; Mario 
Zamponi, Ilha de Moçambique: convergência de Povos e Culturas, Repubblica di San Marino: 
AIEP, 1999, pp. 54-69. 
COVANE, Luís António, ‗Considerações sobre o impacto da penetração capitalista no sul de 
Moçambique, 1850-1876‘, In I Reunião Internacional de História de África. Relações Europa-
África no 3º quartel do Séc. XIX (atas), Lisboa: IICT, 1989, pp. 525-534. 
XAVIER, Alfredo Augusto Caldas. Província de Moçambique. Districto de Inhambane‘, in 
Boletim da Sociedade de Geographia de Lisboa, 2º Série, 7-8, 1881, Lisboa, Imprensa Nacional 
NEWITT, Malyn. História de Moçambique. Mem-Martins, Publicações Europa-América, 1997. 
PÉLISSIER, René. História de Moçambique: formação e oposição: 1854-1918. 2 vols., Lisboa, 
Editorial Estampa, 1987-1988 
SERRA, Carlos (coord.). História de Moçambique: Parte I - Primeiras Sociedades sedentárias e 
impacto dos mercadores, 200/300- 1885; Parte II - Agressão imperialista, 1886-1930. Vol. 1, 
2.ª edição, Maputo, Livraria Universitária, Universidade Eduardo Mondlane, 2000. 
 
 
 
 
 
UNIDADE TEMÁTICA IV: O COMÉRCIO DE MARFIM, SÉC. XVII – XVIII 
4. Introdução 
Portugal foi atraído inicialmente para a África Negra pelo ouro, que era anteriormente 
exportado pelos países islâmicos. Não obstante, eles não tardaram a perceber que a África 
possuía uma outra mercadoria, também fortemente procurada pelos Europeus: os escravos. 
Ainda que a escravidão na África fosse diferente da escravidão praticada pelos europeus, a 
tradição de exportar escravos para os países árabes era muito antiga em grandes partes do 
continente, em particular do Sudão. Nos séculos XV e XVI, esta tradição pareceu ter ajudado, 
em certa medida, os portugueses a conseguir, regularmente, escravos em uma grande parte 
da África Ocidental, notadamente, na Senegâmbia, parceira econômica, de longa data, do 
Magreb. Os portugueses, que penetravam cada vez mais profundamente nas regiões do 
sudeste da África Ocidental, aplicaram, com sucesso, as práticas comerciais utilizadas na 
Senegâmbia 
 
4.1. Objectivos 
▪ Prover informações para resolução do exercício prático desta unidade; 
▪ Caracterizar o comércio de marfim e suas implicações na colonia de Moçambique 
 
4.2. Desenvolvimento 
Ao norte do Zambeze, nos territórios situados ente o rio Luangua e Quelimane fazia-se 
bastante comércio de marfim e a sua produção, bem como a sua comercialização – troca por 
tecidos e por missanga -, eram organizadas em regime de monopólio pela aristocracia Phiri, 
especialmente pelos Phiri Caronga e Lundu. Tal como o ouro para a aristocriacia Karanga-
Chona, o marfim representava para os Phiri uma das suas principais fontes de reprodução. 
Daí que a divisão social do trabalho nos Estado Marave, sobretudo nos Estados de Caronga e 
de Lundu, contemplasse com meticulosidade a organização da caça ao elefante. Eram 
frequentes as rivalidades entre os Caronga e os Lundu para a obtenção de panos e de 
missangas, bens de prestigio que garantiam lealdades políticas e uma corte de aderentes 
numerosa. O controlo efectuado pelos portugueses do tráfico swahili e árabe, através do 
Zambeze, com partida de Angoxe, terá bloqueado consideravelmente o afluxo dos Phiri dos 
produtos trazidos por aqueles mercadores. Embora a base da partida fosse Angoxe, muitos 
mercadores vinham de Quíloa, de Mombaça e por vezes de mais longe, das cidades portuárias 
swahili que pontilhavam a costa oriental africana desde, provavelmente, o século VIII da nossa 
era. Por outro lado, a situação estratégica do Estado de Lundu, no Chire, tornava possível a 
estes interceptarem as mercadorias destinadas aos Caronga. O acesso dos mercadores, que 
viajavam no Zambeze em pequenas embarcações chamadas zambucos, ao Estado de Lundu 
era,pode dizer-se quase imediato do ponto de vista geográfico. A situação era um tanto 
idêntica àquela que permitia ao Inhamunda do Quiteve interceptar as mercadorias que saíam 
de Sofala para o Muenemutapa e para o Changamire entre 1505 e 1530. 
Terão sido aparentemente os dois eixos da contradição já indicada, isto é, bloqueio mercantil-
militar português e conflitos interdinásticos, que estiveram na origem de um extenso 
movimento armado para leste e nordeste, aparentemente conduzido pelos Lundu, sob 
pressão militar de Caronga. Os guerreiros Nianja de Lundu estenderam-se pelas pequenas 
unidades descentralizadas Lómuè, atingiram Angoxe, passaram pela área descrita na 
documentação colonial por Makuana-Utículo e Cambira, no “hinterland” da Ilha de 
Moçambique ˗ e prosseguiram para o norte, passando por Quíloa.O movimento parece ter-
se encetado no terceiro quartel do século XVI. Na documentação colonial os Nianja ou Zimba 
foram descritos como antropófagos, que à sua passagem tudo destruíam e tudo comiam. A 
descrição veiculava uma defesa ideológica contra um movimento que punha em causa os 
interesses mercantis portugueses no vale do Zambeze, em Quelimane e na Ilha e 
Moçambique. São muitas as provas de expansão militar Nianja- que pode ter incluído os 
Cheua- para o litoral. Em Pemba, Matibane e Angoxe, por exemplo, alguns chefes diziam˗se 
descendentes dos invasores ma-rudo. Há por outro lado, uma memória escrita em 1794 que 
identifica Manganja com Rundo ; o nome de Manganja da Costa pode ter sido originado de 
Manganjas , um subgrupo dos Nianjas. O movimento deixou também ficar algumas 
reminiscências do culto pluvial de M'̴bona, por exemplo, na Manganja da Costa. A expansão 
abriu uma rota comercial- Chiri- Mossuril- favorável especialmente aos Lundu que, para 
melhor a controlarem, instalaram chefes Phiri à testa de alguns pequenos reinos Lómuè. 
Porém, em 1622 os Caronga fizeram uma aliança militar com os portugueses e os Lundu foram 
derrotados, passando os Phiri Caronga a controlar virtualmente a rota Chiri-Mossuril. A 
aliança obtida deu aos portugueses uma margem de manobra política mais substancial a 
norte do Zambeze, se bem que a influência nunca tivesse sido tão lata e corrosiva como foi a 
exercida no Muenemutapa. No entanto, dez anos mais tarde, os portugueses tiveram que 
enfrentar, mesmo aos portões de Quelimanae, uma revolta militar combinada dos Cheua sob 
a liderança de Muzura e os desafectos Karanga-Chona liderados pelo deposto Muenemutapa 
Capranzina (vide 5.1). Foi apenas com uma expedição militar organizada pelo capitão-geral 
da colónia, a partir da Ilha de Moçambique, que os portugueses conseguiram debelar a 
revolta e, com campanhas militares sucessivas no Zambeze, restabelecer a sua autoridade 
política geral. 
4.2.1. Comércio e Administração 
Entretanto, a coroa portuguesa, desde a sua fixação em Moçambique, nos princípios do 
século XVI, possuía duas fontes de rendimento: os direitos aduaneiros, em grande parte 
oriundos da Ilha de Moçambique e, em menor escala, de Quelimane , e o comércio.Todo o 
aparato administrativo e militar português se destinava a apoiar essas duas fontes de 
rendimento. Ao surgirem os Prazos, que não foram uma criação régia portuguesa, mas o 
simples reflexo no sertão da faina de mercadores particulares, a Coroa pretendeu 
“nacionalizar” estas bolsas de fixação e comércio, outorgando-lhes um estatuto

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