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1.3. Tales de Mileto

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4.2. Tales de Mileto 
“Muitas palavras não revelam opinião sábia. Procura uma única sabedoria, 
escolhe um único bem, pois assim calarás as línguas inquietas dos homens 
loquazes.” 
 
Não se sabe ao certo se ele era casado ou não, mas conta-se que a sua mãe lhe 
indagou por que não se casava e ele respondeu, que era cedo. Anos depois quando a 
sua mãe lhe perguntou novamente, ele respondeu que era tarde. Questionaram-lhe 
porquê não tinha filhos e ele respondeu: por amor às crianças. Tales disse que não 
havia distinção entre a vida e a morte. Interrogaram-no, então, por que não morria? E a 
resposta foi que não fazia diferença. Para ele a coisa mais difícil é “conhecer-se a si 
mesmo” e a mais fácil é “dar conselhos aos outros”, enquanto a mais agradável é o 
sucesso. 
Tales viajou ao Egito: “Hierônimos conta-nos que Tales mediu a altura das 
pirâmides pela sombra das mesmas, fazendo a medição na hora em que a nossa 
sombra corresponde ao nosso tamanho.”1 
 
 
Sobre ele Platão e Aristóteles contam duas histórias antagônicas, as quais servem 
para jogar luz sobre essa personagem: “Ahí tienes, Teodoro, el ejemplo de Tales, que 
también observaba los astros y, al mirar al cielo, dió com sus huesos en un pozo. Y se 
dice que una joven tracia, con ironia de buen tono, se burlaba de su preocupación por 
conocer las cosas del cielo, cuando ni siquiera se daba cuenta de que tenia ante sus 
pies. Esta burla viem muy bien a todos aquellos que dedican su vida a la filosofia.”2 Essa 
história mostra-o como um homem contemplativo, que não se preocupa com o mundo 
ao seu redor. 
Aristóteles conta que Tales utilizando os seus conhecimentos astronômicos previu 
uma grande colheita de azeitonas, por isso alugou todas as moendas da região, 
enquanto estavam baratas, quando as suas previsões se confirmaram alugou-as a um 
preço alto, o que lhe deu um grande lucro. 
 
Trata-se de uma das especulações gerais para alcançar a fortuna, mas atribuída a ele 
por causa de sua sabedoria. Como o censuravam pela pobreza e zombavam de sua inútil 
filosofia, o conhecimento dos astros permitiu-lhe prever que haveria abundância de olivas. 
Tendo juntado todo o dinheiro que podia, ele alugou, antes do fim do inverno, todas as prensas 
de óleo de Mileto e de Quios. Conseguiu-as a bom preço, porque ninguém oferecera melhor 
e ele dera algum adiantamento. Feita a colheita, muitas pessoas apareceram ao mesmo 
tempo para conseguir as prensas e ele as alugou pelo preço que quis. Tendo ganhado muito 
dinheiro, mostrou a seus amigos que para os filósofos era muito fácil enriquecer, mas que eles 
não se importavam com isso. Foi assim que mostrou sua sabedoria. Em geral, o monopólio é 
um meio rápido de fazer fortuna.3 
 
Essa história mostra-o como um homem prático, que pode ganhar fortunas, mas 
o filósofo é um homem, que não tem estas preocupações menores. 
 
1 LAÊRTIOS, Diôgenes. Op. cit., p. 19. 
2 PLATÃO. Teeteto, 174 a. 
3 ARISTÓTELES. Política, I, 11, 1259 a. 
O que nos chama atenção como relevante nessas narrações é o entendimento, 
que nos propicia da personalidade do filósofo: 
 
O que salta logo à vista na figura humana destes primeiros filósofos - que, 
naturalmente, não se deram a si próprios este nome platónico - é a sua típica atitude 
espiritual: devotamento incondicional ao conhecimento, estudo e aprofundamento do Ser, em 
si mesmo. Esta atitude pareceu totalmente paradoxal aos gregos posteriores e mesmo aos 
contemporâneos, mas suscitou ao mesmo tempo a sua mais alta admiração. [...] Nestas 
anedotas, o filósofo é o grande extravagante, algo misterioso, digno, porém, de estima, que 
se ergue acima da sociedade dos homens ou dela se aparta deliberadamente para se 
consagrar aos seus estudos. É ingênuo como a criança, desajeitado e pouco prático, e está 
fora das condições do espaço e do tempo.4 
 
O primeiro princípio de todas as coisas, para Tales de Mileto era a água, que era 
divina, tal qual no pensamento de Ferecides de Siro: “O desenvolvimento que Tales deu 
a esse conceito pode, em si mesmo, apresentar-se aos olhos de Aristóteles como 
garantia suficiente para afirmar que Tales considerava a água como arché, no sentido 
peripatético de substrato permanente.”5 
A água é a Natureza universal: “água engendra por solidificação a terra, por 
evaporação o ar; o 'cruzamento' do ar e da terra engendra por um lado o fogo, por outro 
os seres vivos.”6 
Para Tales, tudo era formado pela água, pois todos os corpos vivos são úmidos e 
a própria vida é mantida por um calor úmido, para ver como a vida surge da água basta 
colocar água numa semente seca e ela viverá. 
Não se pode esquecer que Tales viajou para o Egito (a fim de conversar com os 
astrônomos e sacerdotes - os quais faziam parte de uma elite e dominavam todo o 
saber) e o que ele viu é o que se vê ainda hoje: um deserto cortado por um rio: viu todas 
as coisas mortas sob o sol, contudo quando o Nilo transbordava a vida renascia. 
Observou que a semente não tem vida porque está seca, contudo ao se colocar 
água nela, ela vive, logo, o princípio da vida deveria ser a água7 e não os deuses. 
Essa ação de unir ideias e tirar delas uma conclusão com coerência é o que se 
chama comumente de raciocínio. O Ocidente não seria mais o mesmo, após Tales ter 
tirado o monopólio dos deuses sobre as respostas a respeito da Natureza, por este 
motivo é considerado o primeiro filósofo que surgiu: 
 
Não há razão para contestarmos a tradição, excepcionalmente unânime, que faz de 
Tales o primeiro filósofo ou o fundador da filosofia, dispensando-nos de precisar o alcance 
dessas palavras. O pouco que se 'sabe' (ou que se supõe) da vida de Tales preenche, de 
qualquer modo, as 'condições' sem as quais o conhecimento histórico se recusaria a lhe 
conceder esse título.8 
 
 
4 JAEGER, Werner. Paideia, op. cit., pp. 179-180. 
5 KIRK, G. S. e RAVEN, J. E. Os Filósofos Pressocráticos. 2a ed. Lisboa: Calouste Gulbenkian, 1996, 
p. 93. 
6 LEGRAND, Gérard. Op. cit., p. 28. 
7 semente + água = vida 
8 LEGRAND, Gérard. Op. cit., p. 24. 
Tales, então, afirmou que o princípio de todas as coisas é a água. Como o princípio 
era esse elemento, a partir dele deveríamos explicar a origem de todas as outras coisas 
na Natureza e foi exatamente isso que ele fez. 
Ele explicou os terremotos com o seguinte raciocínio: a terra se apóia na água e 
no momento em que a água se move ocorre o terremoto: “Tales afirmava que a terra 
flutua sobre a água. Mover-se-ia como um navio; e quando se diz que ela treme, em 
verdade flutuaria em consequência do movimento da água. (Sêneca, Nat. Quaest. III, 
14).”9 
E caso alguém perguntasse como ele provaria essa afirmação a resposta não 
seria difícil: talvez tivesse respondido que bastava ver um vulcão em erupção, pois o 
que se está expelindo é líquido, que se encontra abaixo da terra. 
É bem possível que um cético tivesse perguntado como a água surge da pedra? 
Tales, talvez, respondesse que se olhasse com mais atenção para as nascentes seria 
possível ver a água brotando da pedra. E como os céticos não desistissem e lhe 
perguntassem como era possível a água virar pedra? Tales poderia recorrer à sua 
experiência no rio Nilo e diria: caso se observe a foz de um rio verá a água 
desaparecendo e se transformando em pedra. 
Tales de Mileto ainda poderia sugerir que uma criança ou todo animal nasce 
dentro de uma bolsa d'água e que o sêmen (semente) é úmido. Não faltariam 
experiências, para sustentar seus argumentos, contudo ele não conseguia explicar 
como o fogo surge da água e nesse espaço vazio irá florescer a filosofia de seu discípulo 
Anaximandro, também, de Mileto. 
Com esses argumentos, Tales criou um pensamento, que jamais recorria aos 
deuses, a fim de explicar a Natureza e suas mudanças. Esse foi o primeiro passo, mas 
foi o momento decisivo, que deixou os homens livres das garras dos deuses e das 
superstições. 
Qual a relevância do pensamentode Tales e o seu elemento essencial? É possível 
citar diversos e antagônicos filósofos, que concordam que Tales deu um salto 
monumental no pensamento ao introduzir o argumento racional, para se discutir a 
Natureza: “De todo modo, Tales parece, claramente, ter sido o primeiro a demonstrar 
as qualidades que deveriam caracterizar a ciência grega: fornecer explicações naturais, 
não sobrenaturais, sobre o mundo, e tentar deduzir as teorias subjacentes dos fatos da 
observação e da experiência.”10 
Bertrand Russell diz que essa afirmação (a origem das coisas é a água) é uma 
hipótese científica e não “uma tolice”11. Tales ao afirmar que a arché de todas as coisas 
é a água procura um princípio que unifique todas as diferenças. Simplicius mostrar 
importância desse princípio primeiro: 
 
a água é o princípio. As aparências sensíveis os conduziram a esta conclusão; porque aquilo 
que é quente necessita de umidade para viver, e o que é morto seca, e todos os germes são 
úmidos, e todo alimento é cheio de suco; ora, é natural que cada coisa se nutra daquilo de 
que provém; a água é o princípio da Natureza úmida, que mantém todas as coisas; e assim 
 
9 BORNHEIM, Gerd A. (org.). Op. cit., pp. 22-3. 
10 RONAN, Colin, A. Op. cit., p. 70. 
11 RUSSELL, Bertrand. História da Filosofia Ocidental. Tradução: Breno Silveira, São Paulo: Cia Ed. 
Nacional, 1969, 3. ed., p. 31. 
concluíram que a água é o princípio de tudo e declararam que a terra repousa sobre a água. 
(Simplicius, Phys. 23, 21).12 
 
Como segundo princípio temos, que ele aceita que tudo está cheio de deuses: 
“Otros hay además que afirman que el alma se halla mezclada con la totalidad del 
Universo, de donde seguramente dedujo Tales que todo está lleno de dioses.”13 
Ele chega a essa conclusão após estudar os ímãs. Afirmou, também, que todas 
as coisas tem alma (é possível que Tales tenha sido o primeiro a dizer que a alma era 
imortal). 
Todas as coisas estão cheias de deuses, esta é uma visão panteísta da Natureza, 
pois a alma está misturada com o universo. Quando dizia que “tudo está cheio de 
deuses”, queria se referir a atração dos corpos e com isso coloca pela primeira vez em 
contradição a teologia natural e a tradicional, pois admite que existe uma substância 
material (e bem determinada, a água), que é a origem e o substrato do Universo. 
Com esses princípios se faz uma importante modificação no pensar, pois a 
explicação a respeito do mundo e do homem se faz utilizando a Razão e não os 
aspectos mágico-religiosos dos mitos. 
À pergunta como se chega à essência universal? Ele a respondia através da 
Razão, que é o pensamento. Com isso ensina que se deve procurar o absoluto 
(totalidade), que corresponde, para os milésios, à unidade do pensamento e do Ser. 
Essa ideia de Tales será claramente exposta por Anaximandro, que explicará a origem 
da vida devido à ação do calor sobre a umidade. 
Tales foi um pensador que se destacou em diversos campos: política, astronomia, 
matemática, física, sabedoria. 
Tales de Mileto foi considerado um dos sete sábios da antiguidade, onde a sua 
fama se baseava na sua sabedoria, com a qual procurava dar conselhos para bem 
administrar a vida e a pólis. Contudo, o que torna o estudo sobre Tales importante, hoje 
em dia, é a sua afirmação, que o princípio de todas as coisas é a água, isto é, ele deve 
ser estudado por ter criado o pensamento racional, que é a base de toda a sociedade 
ocidental. De acordo com Friedrich Nietzsche, seu mérito está em estabelecer “o 
conceito do fundamento primeiro de todo o Ser.” 
Como conclusão queremos salientar o significado e a importância da filosofia de 
Tales de Mileto. Com relação ao seu significado citaremos as palavras hegelianas a 
respeito do conceito de essência e de fundamento introduzidos pela primeira vez. 
De tudo o que proporcionou a filosofia de Tales de Mileto talvez o mais importante 
seja a sua abertura à crítica das suas reflexões. No entender de Karl Popper o livre 
pensamento ocidental tem a sua origem neste pensador: “Prefiro acreditar que Tales 
tenha sido o primeiro professor a dizer a seus alunos: ‘Esta é minha versão dos fatos. 
Tentem melhorar a partir de meus ensinamentos’.”14 Essa liberdade de pensamento 
será abortada pela filosofia pitagórico-platônica, pois com a sua orientação religiosa fará 
calar as vozes dissonantes. 
 
 
12 BORNHEIM, Gerd A. (org.). Op. cit., p. 23. 
13 ARISTÓTELES. Acerca Del Alma. 
14 POPPER, K. De Volta aos Pressocráticos. Humanidades, pp. 125-137.

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