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CURSO EAD PARA CUIDADORES DE PACIENTES COM DEMÊNCIA 2ª EDIÇÃO Manual do Curso EAD Cuidador da Pessoa com Demência 3 *Reminiscência: Facilidade em reter e reproduzir conhecimentos adquiridos. Lembrança vaga e quase apagada. Módulo 4 - Atividades Ocupacionais Entre todos os processos de doenças que acometem o idoso, a demência tem particular importância. Além de ser uma doença frequente, a demência é provavelmente a mais devastadora das enfermidades, com sua ação nociva sobre o idoso, a família, os cuidadores e a sociedade em geral (PAPALÉO NETTO, 2007). Por isso são tão importantes as sugestões de modificações no ambiente e no comportamento do cuidador na rotina para ajudar no cuidado com esse tipo de paciente (GARRIDO; ALMEIDA, 1999; ROPACKI; JESTE, 2005). O tratamento não-farmacológico dos pacientes com síndromes demenciais envolve todo o processo de cuidado ao paciente pela família, cuidadores e equipe de saúde. O tratamento ideal é escolhido conforme o estágio da doença, conforme a motivação do paciente e de seus cuidadores, bem como os recursos ambientais e financeiros disponíveis. Uma forma de terapia não medicamentosa é a reabilitação cognitiva - que pode incluir treinos de orientação para a realidade, treinamento de memória, reminiscência*, os quais são explicados aqui adiante. Além da reabilitação cognitiva, cuidadores profissionais podem encontrar benefícios nas técnicas propostas pela arteterapia, dança, musicoterapia e exercícios físicos específicos (FREITAS, 2006). Esse tipo de atividade é oferecida em ambulatórios especializados de neurologia em alguns hospitais, nas clínicas-escola das universidades com cursos da saúde (psicologia, fisioterapia, fonoaudiologia e terapia ocupacional), bem como em algumas clínicas de baixo-custo. A seguir, explicaremos sobre algumas das principais técnicas ocupacionais para esse tipo de paciente: 1. Técnicas comportamentais O comportamento é a resposta a um estímulo, influenciado por muitas variáveis, inclusive a percepção da pessoa sobre a situação em que se encontra, do seu aprendizado e das suas experiências passadas (KRASNER, 1971). As técnicas comportamentais são utilizadas para gerar a mudança no comportamento não funcional do paciente, focando na conduta que queremos alcançar como alvo. As intervenções podem ocorrer focadas Manual do Curso EAD Cuidador da Pessoa com Demência 4 nas situações que vêm antes de determinado comportamento ruim, no comportamento em si ou nas consequências que ele gerou. Estas devem envolver o reforço positivo ao paciente, valorizando as atitudes desejadas, limitar ao máximo as indesejáveis, tais como críticas e xingamentos. As técnicas comportamentais para a reabilitação cognitiva exigem que se volte o foco de atenção para as atividades positivas e desejáveis que o paciente venha a desenvolver, que se evite dar atenção às resistências e que se encontre recompensa para cada uma das etapas envolvidas. Para se ter bons resultados com essas técnicas, é recomendado o uso de materiais que sejam importantes e interessantes para o paciente. (WILSON, 1996; HOLDEN; WOODS, 1995). Logo, foque nas ações e comportamentos que você quer que o idoso continue fazendo e nunca no que ele deve parar. Seguem alguns exemplos para esclarecermos: • Quando o paciente organiza e limpa sua coleção de livros. Reforçar esse comportamento como positivo, de modo a aumentar a sua motivação pessoal. • Quando o paciente acorda e arruma sua cama, é aconselhado que o parabenize por isso. • Trocar a frase “você não pode fazer isso (qualquer situação indesejável aqui)” por “o senhor não gostaria de fazer aquilo? É muito bom!” 2. Terapia de orientação para a realidade A noção de tempo nasce de sua relação com as coisas, confundindo-se com a própria consciência. Os eventos são gravados na memória das pessoas a partir das noções delas sobre o espaço e o tempo de vida. O passado tem de ser relembrado com certa frequência, o presente exige independência e o futuro pede realizações. Para o paciente com demência essa noção temporal está prejudicada. Por outro lado, para o cuidador, a conduta ideal para agir com o paciente, em relação ao tempo, seria: a) Passado – Revisão dos laços afetivos e história de vida comum. Exemplo: estimular que o paciente conte casos do passado para reavivar memórias antigas. b) Presente – Revisão da nova realidade de vida. Exemplo: conversar com a pessoa Manual do Curso EAD Cuidador da Pessoa com Demência 5 com demência no presente, perguntando como ela está se sentindo. O que gostaria de estar fazendo naquele dia. c) Futuro – Estimular a preservação da individualidade e independência do paciente, preparando para possíveis pioras da doença e estímulo à realização de projetos de vida. Exemplo: deixar que o paciente arrume sua cama e estimular que ele faça planos futuros (mesmo que ele vá esquecer ou que seja impossível de realizar) (CAMARA et al., 2001). A realidade atual só faz sentido se estiver conectada ao passado. O cuidador pode usar dados simples tais como nomes de pessoas, relembrar ambientes, datas importantes ou acontecimentos marcantes, olhar fotografias e relembrar daquelas situações. Repetir as informações e condutas várias vezes são reforços para auxiliar o reaprendizado e a reorientação, buscando não reforçar comunicações erradas (como dizer ao paciente para não fazer algo). Reforçam-se os sucessos dos pacientes para que a atenção seja mantida, assim como o bom estado de humor (HOLDEN; WOODS, 1995). 3. Estimulação cognitiva A estimulação cognitiva deve desenvolver as áreas básicas da função mental: atenção, linguagem, memória, noção espacial do local em que se encontra através da visão, e associação de idéias (KRASNER, 1971). As dinâmicas da estimulação cognitiva têm características lúdicas*, objetivando estimular as funções cognitivas, dar suporte psicológico, dar informações que eduquem o paciente quanto a sua saúde além de divertir. A praticidade na aplicação da dinâmica é importante: a estimulação deve focar nos atos da vida cotidiana. É preciso estimular o paciente a estar atento ao que vê e ao que ouve e a reter o fato globalmente. Para isso, o cuidador pode fazer uso de técnica de memorização utilizando cores, calendários (dias da semana, mês e dias do mês), relógios (hora). Uma atividade interessante e que estimula a cognição é usar a mão não dominante para fazer desenhos, linhas ou qualquer ato que faríamos tranquilamente com a mão que domina em nós. (Na maioria das pessoas, a mão dominante é a mão direita, portanto nessa atividade deve-se estimular o paciente a utilizar a mão esquerda, mas se a pessoa *Lúdico: Atividade lúdica é todo e qualquer movimento que tem como objetivo produzir prazer durante sua execução, ou seja, é uma atividade que busca divertir o praticante. Manual do Curso EAD Cuidador da Pessoa com Demência 6 for canhota, deve-se fazer com a mão direita). Na condução dessas atividades, o humor deve ser estimulado, mas devemos evitar situações onde o paciente possa se sentir ridicularizado. Temas muito difíceis devem ficar fora das conversações, como atualidades políticas, por exemplo. Melhor é explorar os temas do cotidiano do paciente. No quadro abaixo é possível verificar algumas sugestões de atividades e como executá-las. Atividade Descrição Introdução Começa-se como ponto de partida um aspecto necessário e benéfico, como: mostrar como cumprimento de mãos, repetir os nomes para identificar as pessoas. Utilização do quadro negro Escrever nele datas, os comentários, os desenhos, sobre estações de ano, etc. Emprego de letras Utiliza-se letras bem grandes, em cartões, podendo ter diversas utilidades, como passar informações, jogos, etc Frutas e Flores Utiliza-se para lembrar as estações do ano e para estimular o olfato, o tato e o paladar. Relógio grande com ponteiro paraorientar Marca-se o horário das atividades comuns do dia-a-dia. Culinária Utiliza-se livros de receitas e discute-se sobre pratos favoritos. Caso não saiba cozinhar ou não queira, pode ser estimulado no sentido de lembrar de tipos de comida que gostava. Atividades da vida diária Treina-se nomes de utensílios de cozinha, mobiliário, objetos de uso pessoal, etc. 4. Terapia de reminiscências Reminiscências criam novos sentidos para o passado e permitem a vivência da continuidade do paciente através do tempo. Relembrar fatos passados e evocar lembranças faz com que o idoso una um começo a um fim, ordenando no tempo eventos que são significativos para ele. Manual do Curso EAD Cuidador da Pessoa com Demência 7 A terapia da reminiscência valoriza o paciente através do seu conhecimento a respeito do seu passado permitindo a conversação e orientação para o presente. A prática indica focar nos contrastes e nas similaridades entre o presente e o passado. Os profissionais não devem corrigir as histórias contadas pelos pacientes. Como aplicar reminiscência na prática? A terapia da reminiscência se faz com objetos e lembranças importantes da vida do paciente, como, por exemplo, colocar canções antigas para escutar; rever cartas guardadas, fotos, presentes, álbum de família. Filmes, jornais e músicas antigas podem também ser utilizados como recursos para relembrar o passado (COLEMAN, 1986; WOODS, 2005). 5. Exercícios físicos Estudos avaliaram o benefício do exercício físico em pessoas com mais de 65 anos com demência ou outros déficits cognitivos. Houve melhora significativa de capacidade física, desempenho funcional, função cognitiva e comportamento em relação aos indivíduos de grupos sem exercício (HEYN; ABREU; OTTENBACHER, 2004). O cuidador pode estimular o paciente com demência a caminhar perto de casa, quando possível, levantar pesos leves para reforço muscular com orientação profissional de educador físico, evitar dar-lhe tudo nas mãos a fim de deixar que o paciente tenha certa independência para realizar suas atividades e que se locomova para isso. É importante lembrar sempre que cada nível do estágio da doença vai permitir mais (se no estágio inicial) ou menos (em estágio mais avançados) a realização de exercícios físicos. Os profissionais da Educação Física e Fisioterapia são muito importantes para a recomendação das atividades físicas adequadas para a pessoa com demência. 6. Musicoterapia Os efeitos terapêuticos da música passaram a ser sistematizados de forma científica após a II Guerra Mundial. Profissionais da saúde, nos Estados Unidos, perceberam alterações favoráveis nos processos de tratamento de doentes, mutilados e traumatizados pela guerra, quando em contato com a arte dos sons. Depois disso, os estudos aumentaram Manual do Curso EAD Cuidador da Pessoa com Demência 8 para diversos tipos de doenças (RAGLIO et al., 2014). As intervenções com música podem ser individuais - como colocar uma música e deixar o paciente ouvir sozinho - ou em grupo. A musicoterapia tem se mostrado benéfica para prevenir depressão, ansiedade, alucinações e irritabilidade, sintomas muito comuns em pacientes com demência (RAGLIO et al., 2015; RIDDER et al., 2013). Uma forma de utilizar esse tipo de terapia seria colocar músicas para o paciente escutar, por um determinado tempo, em alguns dias da semana. Deve-se priorizar músicas que o paciente goste ou, caso ele não consiga expressar sua preferência, que sejam alegres. Além de escutar, é aconselhado estimular o movimento com a música, o dançar (GÓMEZ GALLEGO; GÓMEZ GARCÍA, 2017). 7. Referências CAMARA, V. D. C. et al. Reabilitação Cognitiva das Demências. Revista Brasileira de Neurologia, v. 45, n. 29, p. 25-33, 2009. COLEMAN, P.G. Ageing and reminiscence processes: social and clinical implications. 1 ed. New York: John Wiley, 1986. FREITAS, E. V. Tratado de geriatria e gerontologia. 2a ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006. GARRIDO, R.; ALMEIDA, O. P. Distúrbios de comportamento em pacientes com demências: impacto sobre a vida do cuidador. Arquivos de Neuropsiquiatria, v. 57, n. 2-B, p. 427-34, 1999. GÓMEZ GALLEGO, M.; GÓMEZ GARCÍA, J. Musicoterapia en la enfermedad de Alzheimer: efectos cognitivos, psicológicos y conductuales. Neurología, v. 32, n. 5, p. 300-8, 2017. HOLDEN, U.; WOODS, R.T. Positive approaches to Dementia care. 3 ed. Londres: Churchill Livingstone,1995. HEYN, P.; ABREU, B.C.; OTTENBACHER, K.J. The effects of exercise training on elderly persons with cognitive impairment and dementia: a meta-analysis. Archives of Physical Medicine and Rehabilitation, v.85, n.10, p.1694-1704, 2004. KRASNER, L. Behavior Therapy. Annual Review of Psychology, v. 22, p. 983-532, 1971. Manual do Curso EAD Cuidador da Pessoa com Demência 9 NATIONAL INSTITUTE FOR HEALTH AND CARE EXCELLENCE. Dementia: Assessment, management and support for people living with dementia and their carers. NG97. London: NICE, 2018. ORTÍ, José Enrique de la Rubia; ESPINÓS, Paula Sancho; IRANZO, Carmen Cabañés. Impacto fisiológico de la musicoterapia en la depresión, ansiedad, y bienestar del paciente con demencia tipo Alzheimer: Valoración de la utilización de cuestionarios para cuantificarlo. European Journal of Investigation in Health, Psychology and Education, v. 4, n. 2, p. 131-140, 2014. PAPALÉO NETTO, M. Tratado de gerontologia. São Paulo: Atheneu, 2007. RAGLIO, A. et al. Effects of music and music therapy on mood in neurological patients. World Journal of Psychiatry, v. 5, n. 1, p. 68-78. 2015. RAGLIO, A. et al. Global music approach to persons with dementia: Evidence and practice. Clinical Interventions in Aging, v. 9, p. 1669-76, 2014. RIDDER, H. M. et al. Individual music therapy for agitation in dementia: An exploratory randomized controlled trial. Aging and Mental Health, v.17, n. 6, p. 667-78, 2013. ROPACKI, A.S.; JESTE, D.V. Epidemiology of and risk factors for psychosis of Alzheimer’s Disease: a review of 55 studies published from 1990 to 2003. The American Journal of Psychiatry, v. 162, n. 11, p. 2022-30, 2005. WILSON, B.A. Reabilitação da memória. In: NITRINI, R.; CARAMELLI, P.; MANSUR, L.L. Neuropsicologia: das bases anatômicas à reabilitação. São Paulo: HCFMUSP, 1996. WOODS, B. et al. Reminiscence therapy for dementia). The Cochrane Database of Systematic Reviews, v. 2, 2005. Manual do Curso EAD Cuidador da Pessoa com Demência 10 TelessaúdeRS-UFRGS Coordenação Geral Roberto Nunes Umpierre Marcelo Rodrigues Gonçalves Gerência Ana Célia Siqueira Coordenação Executiva Rodolfo Souza da Silva Responsável Teleducação Ana Paula Borngräber Corrêa Equipe de Teleducação Angélica Dias Pinheiro Ylana Elias Rodrigues Desenho Instrucional Ylana Elias Rodrigues Conteudistas Ana Cláudia Alves da Silva Andressa Hermes Pereira Artur Francisco Schumacher Schuh Dimitris Varvaki Rados Revisores Bárbara Costa Beber Raphael Machado de Castilhos Projeto Gráfico Iasmine Paim Nique da Silva A Equipe de coordenação, suporte e acompanhamento do Curso é formada por integrantes do Núcleo de Telessaúde do Rio Grande do Sul (TelessaúdeRS-UFRGS). Normalização Angélica Dias Pinheiro Diagramação Angélica Dias Pinheiro Iasmine Paim Nique da Silva Lorenzo Costa Kupstaitis Roteiro Luís Gustavo Ruwer da Silva Ylana Elias Rodrigues Filmagem/ Edição/Animação Iasmine Paim Nique da Silva Lorenzo Costa Kupstaitis Luís Gustavo Ruwer da Silva Maquiadora: Roberta Machado da Silva Divulgação Camila Hofstetter Camini Jovana Dullius Equipe Responsável
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