Buscar

RESUMO-DIREITO E UTOPIA

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você viu 3, do total de 9 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você viu 6, do total de 9 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você viu 9, do total de 9 páginas

Prévia do material em texto

DIREITO E UTOPIA
Introdução
A Constituição Federal de 1988 está longe de realizar a utopia descrita neste livro. Mas o povo organizado fez avanços, nessa fase da historia brasileira, talvez a mais rica de todas para o crescimento dos movimentos populares.
Este livro reúne reflexões filosóficas ou sociológicas sobre o Direito, é a crença na utopia e a tentativa de encontrar caminhos para a realização da utopia no Direito.
Este livro invariavelmente aponta para o sonho da construção de um novo Direito. Mas não um sonho impossível. Muito pelo contrario, um sonho realizável pela luta do povo, especialmente dos oprimidos e de seus aliados, com destaque, nesta aliança, para os juristas comprometidos com a edificação de um Direito libertador.
Capitulo 1
O Direito e a utopia
O presente trabalho constitui uma exaltação da utopia. Percorre o pensamento utópico através dos tempos, examina seu teor progressista e revolucionário e termina por concluir que um papel decisivo esta reservado à utopia, no campo do Direito.
A utopia, no seu sentido mais genérico, é a antevisão de um projeto. A palavra, em grego, significa " que não existe em nenhum lugar ".
O pensamento utópico sempre esteve presente no mundo, como sinal de vitalidade de povos e gerações. Só onde se instalou o desespero ou onde se degradou, longamente, o ser humano sob os fuzis da repressão, só ali feneceu o pensamento utópico.
A primeira função do pensamento utópico, segundo Pierre Furter, é favorecer a critica da realidade. Mas não se esgota aí seu fim: a utopia é também uma forma de ação. Para que a utopia seja força progressista, é preciso transformar as aspirações em militancia, a esperança em decisão política.
No Direito, um papel decisivo está reservado ao pensamento utópico. É a utopia que dá instrumentos para ver e construir, pela luta, o Direito do amanha: o Direito de igualdade; o Direito das maiorias, aquele que beneficiara quem produz, o Direito dos que hoje são oprimidos; o Direito que proscrevera a exploração do homem pelo homem, o Direito fraterno, e não o Direito do lobo; o Direito que o povo vai escrever depois que conquistar o Poder, o Direito que nascera das bases.
Em oposição à utopia que se pode tornar realidade, muitos acenam ao povo com formulas para vencer na vida. Todo um esquema de pensamento tenta convencer as pessoas de que as regras estão colocadas, como devido, de que tudo está certo e de que basta trabalhar para dominar a terra. Ao jurista, inclusive, não restaria outro papel que não o de se inserir no sistema vigente para, quando muito, corrigir algumas de suas arestas.
Capitulo 2
Analise sociológica do fenômeno jurídico e reencontro do Direito com o povo
Numa acepção corrente, fenômeno é tudo aquilo que é percebido pelos sentidos ou pela consciência. É o intuitivamente dado. Noutra concepção, é qualquer fato de natureza moral ou social. O desenvolvimento do saber e das formas de investigação gerou a necessidade de dividir a ciência em ramos, cuidando cada um de determinados tipos de fenômenos.
Duas peculiaridades parecem distinguir o fenômeno jurídico. A constatação tem sido assinaladas por diversos autores. O fenômeno jurídico exaure-se de homem para homem. É relação determinada inteiramente pela coexistência humana. O fenômeno jurídico, que se exaure de homem para homem, que disciplina a conduta humana, tem outra nota distintiva. Não é apenas o Direito que dita regras de conduta. Também a Religião e a Moral têm preceitos. Outrosim, os diversos grupos sociais estabelecem regras de comportamento. Mas somente as normas do Direito são ditadas coativamente, sob sanção.
O fenômeno jurídico é, portanto, este que ocorre no mundo das relações entre os homens, disciplinando comportamentos sancionados pela norma.
A operação mental de analise é aquela que procura compreender uma situação global ou um fenômeno totalizador em termos dos componentes que o integram. O conhecimento cientifico tem na analise uma de suas características. O objeto da analise sociológica são as relações humanas, o comportamento do homem no processo de interação que caracteriza a vida social.
O que justifica o interesse da Sociologia pelo fenômeno jurídico é que este é um fato social. Esse interesse é aguçado pela ponderação de que o Direito é o instrumento institucionalizado de maior eficácia para o controle social.
A analise sociológica do fenômeno jurídico é o próprio objeto da Sociologia do Direito. O fenômeno jurídico pode ser encarado, dentre outras perspectivas:
a-) Mediante a captação da realidade jurídica por meio de sua relação com as causas primeiras e os princípios fundamentais, no estudo da própria natureza do Direito e da sua significação essencial.
b-) Em termos adequados à atividade profissional dos juristas como um conjunto sistemático de normas de conduta, de natureza dogmática, obedecendo a uma lógica interna.
c-) Como fato social, realidade do que ocorre na sociedade, causa e conseguencia de outros fatos sociais, captando a realidade jurídica e projetando-a somente em relação a causas e princípios verificáveis.
A primeira perspectiva é da Filosofia do Direito; a Segunda, da Ciência Dogmática do Direito; finalmente, a terceira é a perspectiva da Sociologia do Direito. O fenômeno jurídico presta-se a vários tipos de analise sociológica.
Uma visão do Direito, exclusivamente sob o angulo dogmático - normativo, conduz o jurista ao legalismo. Seu raciocínio será lógico, preciso. Essa postura intelectual terá, em seu apoio, uma longa tradição hermenêutica, que valoriza a interpretação doutrinaria, a interpretação lógico - sistemática, ou mesmo, nos extremos de abertura de um espirito liberal, a interpretação teológica.
Contudo, por mais que se apure a técnica, o jurista, dentro dessa linha, ainda tem todo o seu raciocínio centrado no sistema legal, de onde brotam suas conclusões, mesmo aquelas mais criativas.
A formação do jurista brasileiro é bastante marcada por essa diretriz. O homem comum, consciente do legalismo que predomina na Justiça, encara o aparelho como mecanismo rígido que não satisfaz suas idealizações do justo.
Assim se, de um lado, o Direito como ciência dogmática - normativa afasta-se da realidade, para habitar um mundo de abstrações, que tantas vezes se choca com a Justiça, levando a sentenças ou outras decisões que afirmam valores dissociados dos valores do grupo a que o procedimento jurídico se dirige, as elucubrações do sociólogo do Direito pairam num plano exclusivamente teórico, à falta de conteúdo impositivo para as conclusões a que chega.
A Ciência do Direito deve acolher a visão sociológica do jurídico como legitima. O jurista sociólogo não é menos jurista, pelo contrario, é o verdadeiro jurista.
Capitulo 3
Paralelismo de direitos, sociedade convivencial e direito à utopia
Conceito de Lei: definição clássica, que não é de um jurista, mas que enfoca a lei dentro de uma visão absolutamente jurídica, é a de Santo Tomas de Aquino, para quem a lei é a ordenação racional para o bem comum, promulgada pela autoridade social.
Conceito sociológico da lei: segundo Miranda Rosa, " é o instrumento institucionalizado de maior importância para o controle social ". A norma jurídica " é um resultado da realidade social. Ela emana da sociedade, por seus instrumentos e instituições destinados a formular o Direito, refletindo o que a sociedade tem como objetivos, bem como suas crenças e valorações, o complexo de seus conceitos eticos e finalisticos ".
Para o jurista, o Direito é um conjunto sistemático de normas de conduta, coercitivas, que guardam uma lógica interna. Para o sociólogo, o Direito é um fato social, é o instrumento institucionalizado de maior eficácia para o controle social. Juristas e sociólogos, ao abordarem um mesmo fenômeno, o fenômeno jurídico, fazem-no, contudo, sob ângulos diferentes: o jurista cuida da norma jurídica em si, como fato dogmático - normativo, numsistema de lógica e coerência. O sociólogo vê o fenômeno jurídico como fato social, a que se aplicam as regras que comandam os demais fatos sociais.
Não resta duvida de que o Direito formal brasileiro tem suas raízes rurais, como assinalaram Raymundo Faoro, Gilberto Freyre e outros. Não obstante, nem sempre o legislador se manteve fiel a essas origens. Muitos preceitos legais foram editados ao arrepio do Brasil rural. No Brasil, a legislação é preponderantemente nacional. Outrossim, o conhecimento da lei é presumido, poios ninguém se escusa de não a cumprir, alegando que não a conhece.
Para o sociólogo, o Direito não formal é matéria de sumo interesse, uma vez que pode estudar e constatar sua eficácia sem as peias dos dogmas jurídicos.
Aplicando o Direito em tese aos casos concretos, o juiz efetiva a lei e, no interior, é um mediador entre a cultura da Capital e a cultura local.
O Direito formal, elaborado nos centros de decisão nacional, sofre uma metamorfose quando levado à sua aplicação efetiva, pelos juizes, no interior.
O juiz transmite ao povo os valores consubstanciados no sistema jurídico do pais, mas também absorve, na administração da Justiça, os valores imperantes na comunidade. Têm os juizes do interior acentuada consciência de seu poder e dever de adaptar o Direito nacional e demais valores culturais à realidade da vida interiorana.
Sob as mais diversas formas, no passado e no presente, espíritos criativos manifestaram insatisfação diante das formas institucionalizadas do aparelhamento legal. Parece que a legitimidade da lei e a do Poder estão na razão direta da convergência entre os valores da norma e os valores dos grupos a que as normas de dirigem. O Direito vigente é um direito conservador. No Brasil, as leis asseguram privilégios seculares, geração sobre geração, quando não criam novos privilégios. Talvez na sociedade do futuro tribunais, Códigos, aparato legal, tudo isso desapareça para que os conflitos entre os homens sejam solucionados por simples círculos de giz.
Capitulo 4
Violência, lei e Direito
" Na medida em que o homem reage pela violência, isso não significa absolutamente a desagregação desse homem na violência, mas sim a recuperação desse homem na violência." ( Sartre).
Violência é a qualidade ou característica daquilo que age com impetro, que se exerce com força, ou que se faz contra o direito e a justiça.
Dentro de uma perspectiva psicológica, deve distinguir-se agressividade de violência: a agressividade é uma modalidade de existir e tem aspectos construtivos. Significa dinamismo e energia vital. É uma função necessária, contradição essencial inerente à constituição do Ego. Seu oposto seria a passividade.
Esquematicamente, podemos distinguir três níveis em que se manifesta o fenômeno da violência:
a-) A violência institucionalizada, decorrente da estrutura socioeconômica vigente;
b-) A violência privada, de indivíduos ou grupos, que se manifesta através de comportamentos definidos como criminosos, pelo sistema legal;
c-) A violência oficial, representada pela repressão policial e por aquela exercida pelo aparelho judiciário e prisional.
Os três níveis de violência mantêm nítida conexão.
Qualquer pessoa identifica o componente de violência num homicídio ou num roubo. Entretanto, nem sempre se percebe o conteúdo de violência na cena de uma criança raquítica que morre de sarampo. A violência institucionalizada é o conjunto das condições sociais que esmagam parcela ponderável da população, impossibilitando que os integrantes dessa parcela tenham uma vida humana. A violência institucionalizada não é fruto do acaso, nem estagio necessário e incortonável do subdesenvolvimento. A violência institucionalizada decorre de uma estrutura mantida à força, que privilegia poucos, em detrimento de muitos.
Num sentido restrito, a violência poderia ser identificada com o crime. Todo crime seria uma violência porque implicaria um ato ou uma omissão gravemente lesivos aos valores da lei. A gravidade da lesão, na ótica do legislador, é que torna criminosa uma determinada conduta. Se a lesão é leve, a sanção respectiva é de natureza civil, ou administrativa, ou o ato é definido como contravenção penal; se a lesão é grave, é tipificada pela lei penal, ou seja, passa a ser crime.
Violência oficial à sombra da lei é a manutenção de todo um sofisticado aparato de controle das iniciativas sociais e políticas, especialmente através dos grandes meios de comunicação social, com a finalidade de excluir a maioria da distribuição equânime do bolo social.
Lei e Direito não são conceitos equivalentes. Lei é a norma vigente, justa ou injusta: pode desempenhar o papel apenas de regulamentar a opressão. O Direito tem um sentido que transcende e, com freqüência, se opõe ao da lei. Só é Direito o Direito justo. A nosso ver, é Direito justo o Direito das maiorias, aquele que beneficia quem produz, o Direito dos que hoje são os oprimidos.
A lei que temos é sancionadora da violência. Sancionadora da violência institucionalizada, porque fornece os instrumentos jurídicos para a perpetuação das injustiças sociais. Na atualidade brasileira, lei e violência são sinônimos.
O Direito será o antídoto da violência. O Direito será a redenção do povo. O Direito será a libertação do oprimido.
Mas o Direito não é uma vara de condão, não é magia. O Direito só será libertação quando os oprimidos conquistarem o Poder. No Poder, os oprimidos editarão o verdadeiro Direito: o Direito que nasce das bases, o Direito da igualdade, o Direito que proscreve a exploração do homem pelo homem.
O Povo escrevera esse Direito. Se a violência, em sentido estrito, tem aumentado no Brasil, é porque tem crescido, em ritmo acelerado, a exploração da classe verdadeiramente produtora.
Não será com o endurecimento da repressão, com a pena de morte, com a prisão cautelar e outras sofisticadas formas de prender, com um soldado em cada esquina, que a violência vai diminuir. Os fenômenos sociais ocorrem em cadeia: só numa sociedade justa, fundada na igualdade, será desarmado o braço do que fere, caíra a lança do agressor. Então, as relações humanas serão solidarias.
Capitulo 5
Papel progressista do Direito, dos juristas e dos juizes
Antes dos juizes e dos juristas em geral, até que ponto pode o próprio Direito desempenhar um papel progressista dentro da sociedade?
A reflexão sociológico-jurídica viu, por longo tempo, no Direito apenas uma função conservadora. Superestrutura social, desempenharia ele um papel de suporte e legitimação da infra-estrutura econômica.
A pratica jurídica, nas diversas sociedades, não autorizava a constatação de outro papel, que não subalterno, para o Direito. Nas antigas escolas jurídicas não se cogitou de qualquer atribuição progressista para o Direito.
Algumas dessas escolas colocam as tensões entre a lei e o juiz, entre o legislador e o interprete, ente os códigos e o pulsar da vida. Mas nenhuma delas chega a questionar as possibilidades de ter o Direito um papel de contestação das estruturas legais, de ser o Direito instrumento de contradição dentro de uma sociedade.
Também a reflexão filosófico-jurídica contribuiu predominantemente para uma visão de Direito a reboque das estruturas econômicas e sociais estabelecidas. O Positivismo Jurídico, que imensa e nefasta influencia desempenhou no Brasil, identificou ordem e justiça, vendo a ordem como o valor supremo do qual decorriam o progresso e o bem comum.
Recentemente, vem-se desenvolvendo um pensamento critico do Direito. Esse pensamento tem autores na Europa, como Michel Miaille, mas vem recebendo larga contribuição nos países do Terceiro Mundo. No Brasil, o debate tem sido intenso e profícuo. Esta acontecendo com o Direito algo parecido com o que está acontecendo com a Teologia. A reflexão em torno do papel libertador do Evangelho Cristão, a descoberta das sementes de luta e de revolução social presentes no testamento de Jesus Cristo,a identificação do Cristianismo como legado dos oprimidos, tudo isso tem sido visto, quer na teoria, quer na pratica, com muito mais vigor no mundo dos países pobres do que no mundo da opulência.
Por vertente pratica e profissional, designamos todo o esforço de centenas de advogados e militantes de movimentos populares e de direitos humanos que vêm procurando colocar o Direito a serviço das grandes maiorias. É toda essa luta para encontrar brechas, lareiras, no cipoal legislativo, para ver, aqui e ali, artigos e parágrafos, institutos e interpretações que possam beneficiar as multidões marginalizadas e despossuídas.
Por vertente teórica, designamos todo esforço de autores, professores e mesmo advogados para construir, no campo da reflexão cientifica, um novo Direito: o verdadeiro Direito que se oponha ao antidireito, que é o Direito estabelecido, conforme colocam Roberto Lyra Filho e outros. Vê-se, assim, que está em plena efervescência, no Brasil, a luta por uma nova visão do Direito.
Por vertente organizacional, refiro-me a grupos que já se vão formando, quer para uma atuação concreta, quer para produzir pensamento, no campo de um novo Direito. Neste campo organizacional, devem ser citados, com destaque, o AJUP do Rio de Janeiro, o GAJOP de Recife, e o NEP de Brasília.
O Poder Judiciário, a partir de sua estrutura organizacional, é extremamente fechado dentro de si mesmo. Quer na escolha dos juizes, quer nas promoções dentro da carreira, quer nos prêmios e punições, ou mesmo exclusões, quem fala sempre é o próprio Poder Judiciário, autonomamente. A promoção de juizes aos tribunais ou a ascensão pura e simples aos tribunais deveria ser precedida de concurso publico, ou de amplo debate popular, conforme fosse a hipótese. Os presidentes dos tribunais deveriam ser eleitos, ou pela generalidade dos cidadãos do respectivo território jurisdicional, ou por um amplíssimo e democrático colégio eleitoral.
A escolha dos presidentes de tribunais por sufrágio universal ou por um amplo colégio eleitoral, ou por um e outro sistema, conforme fosse o tipo de tribunal, permitiria não apenas a democratização do cargo, a garantia de sua origem popular, como especialmente permitiria uma ampla discussão do sistema judiciário e de seus problemas, na oportunidade das eleições. Também é preciso combater a idéia de que o Poder Judiciário está acima de criticas e inspeção. Todo Poder e toda autoridade publica deve estar submetida à critica e à fiscalização popular. Também não se justifica que em nome da independência do Poder Judiciário se pratique o nepotismo, no interior dos tribunais e de suas administrações, como freqüentemente acontece.
Para que se obtenham sentenças progressistas dos juizes é preciso que haja advogados progressistas. O crescimento humano, cultural e político dos advogados pode repercutir no crescimento humano, cultural e político dos juizes. A mobilização popular pode também influir na democratização e modernização do Judiciário. A médio e longo prazos a renovação do ensino jurídico pode influenciar na criação de uma nova mentalidade, tanto entre advogados quando entre juizes.
Capitulo 6
Possibilidades hermenêuticas no uso alternativo do Direito.
Começando pela contribuição à reflexão, junto com muitos autores, tenho repetidamente afirmado que não existe a suposta neutralidade política e ideológica dos juristas, inclusive dos juizes. Os juizes que mais alardeiam uma suposta neutralidade ideológica são aqueles que, em nome dessa neutralidade, apegam-se à lei e à letra da lei, com toda sua estrutura de conservação, consagradora do antidireito.
Temos também afirmado que o sistema legal encerra contradições. Cabe aos juristas comprometidos com as lutas do povo encontrar e realçar essas contradições, buscando utiliza-las em proveito das grandes multidões empobrecidas. Entendem alguns que o bem comum a que a lei se destina é aquele que a norma, objeto de interpretação, está orientada a satisfazer. Outros entendem que deve o juiz atender as exigências ultimas e grais do bem comum, afastando a incidência da lei ao caso concreto, quando dessa incidência resulte obstrução àquele propósito.
A nova Constituição coloca contradições que constituem um desafio à criatividade dos juristas. Da mesma forma que os intelectuais orgânicos das classes dominantes vão procurar interpretar a Constituição a serviço dos interesses a que servem, os juristas populares deverão descobrir, na nova Carta, as aberturas que possam servir às classes marginalizadas. E todo esforço urge desenvolver para que tenha efetiva vigência e aplicação tudo aquilo que, na Constituição, possa eventualmente prestar-se ao reconhecimento dos direitos das maiorias.
Direito e Utopia
João Baptista Herkenhoff - 4º ed.
Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001
Conclusão
O Pensamento Utópico
O pensamento utópico teve um importante papel no Direito, uma vez que é através do mesmo que encontramos os instrumentos necessários para construir o nosso direito. É o pensamento utópico que ilumina o caminho em prol do que é justo, já que não fica restrito às imposições legais, que nem sempre estão de acordo com o que se entende por justiça.
O pensamento utópico funciona como uma espécie de libertação das amarras que prendem o Direito aos aspectos legais. Através da utopia, busca-se não o que diz a letra da lei, mas sobretudo, o que é justo. E lei e justiça não são palavras sinônimas, muito menos Direito e Lei. Essa distinção é proveniente, justamente, do pensamento utópico, que desvinculou o Direito da lei, proclamando que antes de tudo o Direito é justiça! Através do Direito, conforme o pensamento utópico, busca-se uma sociedade mais justa, fraterna, igualitária, onde os direitos das chamadas minorias (como as mulheres, os negros e os homossexuais, por exemplo) serão respeitados, um direito escrito pelo povo e em respeito, essencialmente, à dignidade da pessoa humana!
A função da Utopia
De acordo com os ensinamentos proferidos pelo mestre João Baptista Herkenhoff, a primeira função da utopia é favorecer uma visão crítica da realidade. No entanto, como salienta o mesmo, sua função não para por aí. A utopia é antes de mais nada, uma forma de ação, uma vez que provoca o movimento das pessoas, em busca do desenvolvimento de uma sociedade mais justa.
Podemos dizer, dessa forma, que a função da utopia é a de provocar um movimento social, em busca de um novo Direito, um "Direito Justo", livre de amarras pré estabelecidas; um direito que busca a igualdade entre os povos, a fraternidade e, acima de tudo a paz social; um direito que renasce a cada dia, de acordo com as novas aspirações humanas, porque o homem é um ser dinâmico, de forma que, se o direito é criado exclusivamente em prol do ser humano, não poder ser estático, pois isso acarretaria uma contradição.
A utopia serve, portanto, como um instrumento de transformação social. Trata-se de uma realidade que visa, como ensina João Baptista Herkenhoff, "desmascarar a falsidade da ideologia estabelecida". E, sabiamente, continua o mestre: "O presente pertence aos pragmáticos. O futuro é dos utopistas"!
Marco Antonio Nadalin Peixoto DIREITO – UNIC - MT

Outros materiais